No domingo de manhã eu levanto cansado. é dia de ir ao parque com meu primo, mas não tenho a menor vontade. Acontece que eu e meu primo temos nossas diferenças, mas ele gosta de me encontrar aos fins de semana para manter a amizade, ele diz que ajuda a manter as origens.
Eu escuto a buzina do carro dele, então ponho a mochila sobre os ombros e saio para a rua onde ele me espera dentro de sua BMW. É, ele é rico, um fato que prefiro esquecer e me concentrar apenas naquilo que nos une.– E aí? – cumprimento entrando no carro.– Beleza? – ele pergunta. – Pronto pra corrida de bike?– Será que dá pra ser sem a bike? – pergunto. – Tô precisando movimentar os músculos. – Claro! – exclama ele. – Aconteceu algo de estranho?– Meu amigo foi atropelado ontem, a coisa foi um pouco feia.– Qual deles? – Meu primo pergunta.– O jungler. – respondo sabendo que ele não ligaria o nome à pessoa. – A gente tinha ido ao mercado, íamos assistir a final do CBLoL na casa dele, mas, na volta, um motorista bêbado veio na contramão e acertou ele em cheio.– Uau! E conseguiram pegar o cara? Vocês fizeram B.O.?– A mãe dele disse que faria. – respondo. – É você? Como vai a faculdade?– Larguei. – Você fez o quê? – pergunto chocado. – Murilo você sabe quanto eu teria que trabalhar pra juntar um mês da mensalidade daquele lugar?– Calma. – diz ele. – Eu só tranquei. Talvez eu volte no próximo semestre. Arrumei uma briga com um aluno e não quis mais ter que olhar pra ele.– Queria que a vida fosse fácil assim pra mim também. – Você faria o mesmo no meu lugar. – ele diz. – Eu ainda não te contei a história inteira.– Pois então conta. – peço curioso.– Eu tava num grupo pra fazer as atividades e fiz amizade com uma das meninas, o que é normal. Mas nesse semestre o namorado dela pediu transferência pro nosso campus e veio pra nossa turma. O cara cismou que eu tava dando em cima da mina dele. Eu só tava sendo legal. E aí...Ele tira os óculos escuros revelando a marca roxa já amarelada em volta de seu olho direito.– Ele me acertou em cheio. – diz Murilo. – Me pegou desprevenido e eu revidei. É claro que virou uma confusão e a coordenadora do curso interveio. O safado virou a história para que ele parecesse a vítima. – Isso é um absurdo. – digo. – Você podia processá-lo.– Somos dois alunos de Direito e Ele tem mais dinheiro que eu, não daria em nada e só ia torrar minha paciência, mas eu não duvidaria se ele me processasse.Então chegamos ao parque, nossa conversa é trocada por passos rápidos que iniciam a corrida. É um pouco difícil acompanhar o ritmo de Murilo, mas à medida que as lembranças de ontem vão surgindo na minha cabeça eu, aos poucos, deixo meu primo para trás. Corremos por cerca de uma hora. Minha camiseta já está ensopada e mal consigo respirar, então chegamos ao fim da pista e eu aproveito para sentar-se em um banco.– Nada mal priminho! – diz Murilo. – Aquele acidente mexeu mesmo com você.– Bastante. – respondo. – Falando nisso, será que você pode me levar até a casa dele para eu poder ver como ele está?– Levo, mas não vou ficar esperando. Você vai ter que se virar pra voltar pra casa. – Beleza. Vou ligar para avisar que vamos.Então tiro o celular do bolso e disco o número do Samuca. Ele demora, mas atende.– E aí, Math! – E aí, tá melhor? – pergunto.– Tô sentado no sofá vendo TV. Minha mãe disse que eu poderia alugar o filme que quisesse.– Legal, cara! Tô pensando, posso dar uma passada aí?– Claro. – concorda ele. – O Rodrigo já tá aqui, pode vir.– Então beleza, tô indo. Até já!– Até!Eu desligo e tiro a camisa molhada, depois passo a toalha na cara e desodorante. Aí coloco uma camisa limpa e bebo um pouco d'água. – Sorvete antes de irmos? – Murilo pergunta. – Você me deve um Mcdonalds. – respondo. – Eu venci hoje.Ele concorda e dirige até o drive-thru. Peço um combo duplo de Big Mac e McMelt, com fritas e uma coca e meu primo pega um Big Taste com nuggets.Nós comemos enquanto seguimos o caminho, ele coloca o endereço de Samuca no GPS e liga o rádio colocando numa estação sertaneja, que, aparentemente, ele não para de escutar.Seguimos o caminho com ele cantando a plenos pulmões enquanto eu observo o movimento dos outros carros. O trânsito está calmo, nos pontos de ônibus e relógios as propagandas da MissBeauty atraem atenção e eu me distraio olhando.Ao chegarmos, eu me despeço de Murilo e agradeço a carona e depois desço do carro. Meu primo acena com a mão e acelera levando segundos para sumir do meu campo de visão, então toco a campainha. Quem abre a porta é Rodrigo, que me recebe com um sorriso e me manda entrar. Eu passo pela porta e Ele a fecha em seguida. Então, quando eu olho para a sala, meu coração parece congelar. Sentados no sofá estão Samuca, com o par de muletas descansando ao lado dele enquanto ele fala. E, no outro sofá, à frente dele, estão sentados Magnus, o filho do prefeito e Marianne Sinclair, herdeira da MissBeauty e também a garota pela qual eu sou totalmente apaixonado.