Depois que Kristy se mudou para o meu quarto de casamento, ficou visivelmente mais arrogante.

Todos os dias, ela se comportava como se já fosse a luna oficial, exigindo que Eugene ficasse ao lado dela vinte e quatro horas por dia. Não permitia, sob hipótese alguma, que ele viesse me ver sozinho.

A única hora em que nos víamos era nas refeições, mas até isso ela usava para monopolizar Eugene, sempre falando da criança em seu ventre, desviando toda a atenção dele para si.

Só no dia do meu aniversário Eugene veio até mim.

— Selena... Me perdoa por tudo o que aconteceu ultimamente. — Disse ele, com o rosto carregado de culpa. — Amanhã é seu aniversário. Eu prometo que vou te acompanhar de verdade. Ouvi dizer que no Mar de Gelo ao norte estão pescando um bacalhau beija-luar delicioso. Vou até lá hoje e pesco um só pra você, tá bom?

Eu estava prestes a dizer “sim” quando Kristy apareceu atrás dele.

— Amor. — Chamou ela, toda charmosa. — Vem aqui... Preparei uma surpresa pra você.

Eugene se virou de imediato.

— Que surpresa?

— Vem logo, você vai ver.

Ele deu alguns passos e foi até ela. Kristy segurou sua mão e a levou até sua barriga.

— Sente aqui. — Disse ela com ternura.

Os dois olharam para a barriga com olhos cheios de expectativa. De repente, Eugene arregalou os olhos, eufórico:

— Ele se mexeu? O bebê se mexeu! Ele está me cumprimentando!

Kristy sorriu e deu a ele um beijo nos lábios, como um prêmio:

— Você nem imagina o quanto seu filho é levado... Não para de me chutar. Você tem que fazer mais carinho nele. O curandeiro disse que, se o pai conversar com o bebê desde o ventre, ele vai reconhecer sua voz quando nascer.

Eugene a abraçou e começou a conduzi-la para fora.

— É sério? Então vou falar com ele todos os dias. Ele vai saber muito bem quem é o pai dele.

— Ah, Eugene, mais uma coisa... Que tal adiantarmos o casamento pra amanhã? O sacerdote disse que é um dia abençoado.

— Claro, é só mudar a data. Não vai fazer diferença.

Os dois foram se afastando de mim, passo a passo.

— Eugene! — Chamei, com a voz apertada.

Ele se virou, como se só então se lembrasse do meu aniversário. Um leve desconforto surgiu em sua expressão.

— Selena... Amanhã é um dia importante. A cerimônia vai ser linda. Venha assistir, tá? A gente deixa a pescaria no Mar de Gelo pra outro dia.

O peso da decepção caiu sobre meu peito como uma rocha.

Vi o olhar triunfante de Kristy, mesmo que ela tentasse disfarçar.

Segurei as lágrimas e forcei um sorriso.

— Claro.

Mas eu sabia...

Não haveria outro dia.

Essa era minha última chance para ele.

No dia seguinte, enquanto Eugene e Kristy celebravam seu casamento, eu segui com minha empregada em direção ao norte, rumo ao Mar de Gelo.

Pisamos sobre a espessa camada de gelo e fomos nos afastando, cada vez mais, rumo ao vazio gelado.

Quando chegou a hora do início da cerimônia... Eu ainda não havia aparecido.

Kristy, vestida com um vestido de noiva exuberante, segurava firme o braço de Eugene.

— Selena ficou magoada, né? — Disse ela, com voz meiga. — Você não foi com ela no aniversário. Ela tá se vingando, faltando à cerimônia.

Grace bufou, com o rosto escurecido pela raiva:

— Ela? Aquela coisa se acha no direito de fazer birra?! Uma Ômega inferior, que talvez nem tenha glândulas desenvolvidas, e ainda quer bancar a ofendida? Devia agradecer por ter um teto, por servir como descarrego pro nosso Alfa. E ainda foge? Inacreditável!

Ela olhou para Eugene e completou:

— Ainda bem que insisti pra você ficar com a Kristy. Se dependêssemos da outra, nossa alcateia estaria perdida! A Kristy sim, nos dá orgulho.

Kristy acariciava a mão de Grace com paciência e um sorriso doce nos lábios:

— Fica tranquila, mamãe. Eu vou te dar muitos netos, pode ter certeza. Os filhos que eu tiver com o Eugene, todos com sangue Alfa, vão ser tão fortes quanto ele. Nunca deixaremos o poder sair das mãos da nossa família.

Grace não conseguia conter a felicidade. O rosto se iluminava com orgulho.

Enquanto isso, Eugene, inquieto, perguntava pela terceira vez ao empregado:

— E a Selena? Já mandaram procurar por ela?

O empregado assentiu... E depois balançou a cabeça.

Mandaram, sim, mas ninguém me havia visto.

Grace bufou:

— Melhor assim. Se não voltar logo, que Eugene desfaça logo esse laço de companheiros verdadeiros. Já passou da hora.

Mas Eugene sentia algo diferente. Um pressentimento ruim apertava seu peito.

Era o mesmo tipo de sensação que teve anos atrás, quando quase levaram Selena para um casamento arranjado em outra alcateia.

De repente, lembrou-se do que havia dito sobre pescar para ela no mar congelado.

— Ela pode ter ido para o Mar de Gelo. — Disse ele, com a voz tensa. — Mandem mais gente pra lá, agora. Se encontrarem qualquer sinal dela, me avisem imediatamente.

Kristy, com um risinho malicioso nos lábios, comentou:

— Será que a Selena ficou mesmo magoada comigo? Fazer esse tipo de drama justo no dia do nosso casamento... Arriscar a própria segurança? Que atitude infantil.

Os brincos pendiam em suas orelhas, reluzindo à luz do salão, Eugene reconheceu o par imediatamente.

Eram meus brincos. O presente que ele mesmo havia me dado, símbolo do nosso compromisso.

Ele franziu o cenho.

— Por que está usando esses brincos? Eles são da Selena.

Kristy tocou levemente a orelha, fingindo inocência:

— Ela deixou. Quando mudou de quarto, deixou várias caixas pra trás. Não levou nada. Esses estavam no topo.

A dúvida crescia dentro de Eugene como uma neblina espessa.

“Por que ela teria deixado tudo? Nem ao menos levou as lembranças mais valiosas... Por quê?”

A cerimônia seguiu o cronograma. A hora da marcação se aproximava. Tudo estava prestes a se concretizar.

Foi então que um lobo entrou às pressas no salão, o rosto pálido de puro pânico.

— Alfa Eugene! Temos más notícias, o cheiro da Selena desapareceu perto das cavernas de gelo. Tudo indica que... Ela caiu no mar!

O sangue sumiu do rosto de Eugene.