AIYANA
Nos movemos rapidamente para a parte de trás da tenda. O som dos gritos e do caos lá fora estava mais alto agora, como um rugido crescente de ferocidade e fúria. Aquelas criaturas, os lobos modificados pela magia negra, estavam se aproximando cada vez mais.
A tenda de Tuuri, com seus feixes de madeira e tecidos pesados, parecia um refúgio seguro em comparação com o que nos aguardava do lado de fora. Mas ao sair, a sensação de liberdade era momentânea, uma ilusão que logo se dissiparia.
À medida que passávamos pela borda da tenda, a escuridão da noite engolia nossos passos. As árvores ao redor estavam envoltas por uma névoa espessa, e o som dos gritos parecia amplificado pela quietude ao nosso redor.
AIYANAEu refleti muito sobre a morte ao longo dos anos, mais do quê o considerado saudável. Mas nunca foi algo que eu pudesse controlar, eu tinha tantas perguntas e poucas respostas e tudo se voltava para a morte.Então, sim. Eu pensei em todas as possibilidades que me levariam a morte,mas nunca, nunca mesmo, cogitei que seria pelas garras de uma fera sem alma, conduzida pela magia negra. Minha pequena faca de caça ainda estava na minha mão, coberta de sangue, só era inútil acreditar que tenho alguma chance.Isabela fungava atrás de mim, sua respiração entrecortada, rápida.O lobo estava parado. Não rosnava, não avançava. Só me encarava. Seus olhos não tinham alma, e ainda assim, não se movia.Meu corpo começou a esquentar. Como brasas se quebrando sob a pele, escorrendo pelas veias, subindo do estômago até o coração, do coração até a garganta. Tentei respirar, mas parecia que o ar me queimava por dentro.O lobo deu um passo à frente. Outro. O mundo ao redor desapareceu, como se est
AIYANAAcordar era como nadar em mel, espesso, lento, grudento. A luz do sol filtrava-se pelas frestas da lona, dourando o interior da tenda como um lembrete de que a escuridão se dissipou. Um novo dia.Ainda estava deitada nos tapetes felpudos, o calor da lã contra minha pele mal disfarçava o frio que vinha de dentro.Minha avó estava sentada ao meu lado, os dedos longos e calejados trançando algo que ela nem parecia ver. Seus olhos corriam de um lado a outro da tenda, fugindo dos meus.— Vó...? — Minha voz saiu fraca, mas foi o suficiente para fazê-la congelar.Ela parou de trançar.Os lábios se contraíram, primeiro num traço fino, depois num tremor sutil.— Bem, eu pensei em maneiras de como contaria a você toda a verdade, até que acreditei que nunca precisaria. Você estava bem, cresceu tão forte e independente.Esse segredo... — ela começou, e sua voz era mais velha do que jamais soou — ...é meu desde o instante em que te peguei nos braços. Poucas horas depois de você nascer.Meu co
AIYANAEu tenho dois companheiros. Mas um deles, não me quer. O outro? O outro é um estranho com mudanças de humor.Mas eles são meus. MEUS.Ao menos, é isso que a voz continua repetindo na minha cabeça. O problema é que não deveria ter nenhuma voz, e com certeza não uma tão possessiva e mandona. Empurro a sensação estranha e com gosto amarga o caminho todo de volta pela minha garganta, então abraço minha cintura e me inclino na direção da fogueira, fingindo não notar os olhares de Alyssa. Ela está agindo feito uma mamãe galinha, dando voltas ao meu redor e me vigiando de perto. O sol partiu minutos atrás, com o inverno se aproximando, os dias começam a diminuir mais rápido dando espaço a noites mais longas. O que é algo ruim na nossa situação. Muito ruim.— Você está com frio? — Alyssa pergunta pela terceira vez, e pela terceira vez eu finjo não ouvir.O aperto no peito não é só dor, é algo mais bruto, mais primitivo.Mas meu corpo inteiro está em estado de alerta.— Aiyana, por favo
AIYANA— A gente devia ajudar — digo, já empurrando a manta de lado e me levantando.Dou um passo na direção de onde os homens consertam as paliçadas destruídas, mas Alyssa engata a mão no meu braço.— Eles sofrem, Aiyana — ela diz, a voz quase um sussurro cortante. — Quando estão longe, as almas vinculadas sofrem. Como se faltassem pedaços.Fico parada. O vento levanta um redemoinho de neve fina entre nós.— Estou bem. —resmungo.— Aiayana...Inspiro devagar, o ar frio queimando meus pulmões.— A gente devia parar de falar disso — corto, puxando meu braço de volta, com mais força do que o necessário.Dou dois passos em silêncio.— Você devia levar isso mais a sério.Paro novamente, os músculos tensionados. Viro um pouco o rosto. Alyssa está ali, imóvel, seus pés afundando levemente na neve, as botas de tecido molhadas nas bordas.— Mesmo que com Maxim seja complicado agora… você ainda tem Icarus — ela continua. — Você deveria tentar conhecê-lo melhor.Reviro os olhos antes que consiga
AYIANAA visita não foi boa.Marjorie mal disse uma frase, olhando o tempo todo olhando para as mãos. Icarus disse que sua neta,a garotinha, estava com Caleb e os outros, porque Marjorie não estava bem.A brisa fresca da noite tocava minha pele enquanto caminhávamos de volta para a tenda. O som da minha respiração se misturava ao silêncio denso ao redor. Icarus estava ao meu lado, mas existia uma distância exagerada entre nós, algo tinha mudado em seu semblante desde que o encontrei mais cedo. Ele parecia com raiva. — O que você disse antes, sobre eu preferir a companhia de Maxim...— Fique quieta.— ele rosnou, parando na minha frente. Bati a testa nas suas costas e mordi a língua.Urgh.—Que diabos, não precisa ficar todo irritado.— Pare de falar.Estreitei os olhos.— Não seja um idiota.— resmunguei, puxando sua orelha. Ele gemeu e me olhou feio,puxando minha mão até que meu corpo estivesse na frente do dele, minhas costas contra seu peito. — Você não consegue receber uma ordem,n
AIYANAEu estava prestes a perguntar mais alguma coisa quando Icarus se virou abruptamente e agarrou um casaco. Eu o olhei com desconfiança. Não era meu. Tinha um cheiro diferente também, mais forte, mais masculino.— Coloque. — Ele disse, sua voz agora mais ríspida, quase um comando.— Não é meu — murmurei, observando o casaco com resistência.— Coloque logo. — Ele resmungou, claramente irritado. Sua expressão estava fechada, os olhos não encontrando os meus. Parecia que ele queria apenas me tirar dali.Eu hesitei, ainda olhando para o casaco. Não queria, mas, ao mesmo tempo, uma parte de mim sabia que precisava faze
AIYANAEstávamos prestes a sair da tenda quando Icarus agarrou minha mão de novo. Seus dedos estavam firmes, mas não cruéis, como se ele estivesse tentando segurar não só minha mão, mas também o pouco de controle que ainda restava me restava.Foi quando a aba da tenda se abriu.— Vó... — sussurrei, os olhos se enchendo de lágrimas.Os cabelos prateados estavam desalinhados e seu vestido tinha manchas escuras no tecido, sangue, ou talvez lama. Mas não importava.Ela se aproximou e envolveu meu rosto entre as mãos, sua pele áspera contra a minha, calorosa e firme como um casulo.— Vocês precisam ir. Agora. Eles estão vindo. — Sua voz era um sussurro, mas carregada de urgência.&mda
AIYANAO dia amanheceu em tons dourados e rosados, mas a tensão no ar parecia tingi-lo de algo mais sombrio. O grande evento da noite lançava uma sombra sobre cada olhar e gesto da minha prima e tia, elas estavam reluzentes e tentei ficar minimamente feliz por elas.A aldeia estava em alvoroço desde cedo. As amigas de Isabela entravam e saíam do pequeno quarto de madeira, carregando vestidos, bijuterias brilhantes e potes de unguentos perfumados. O cheiro adocicado de jasmim e baunilha impregnava o ar, tornando tudo ainda mais sufocante. Eu me encostei no batente da porta, observando minha prima sentada diante de um espelho rachado, sorrindo de forma presunçosa enquanto uma de suas amigas trançava seu cabelo negro e sedoso, que descia como um rio escuro até sua cintura. Cada movimento dela era preciso, ensaiado. Ela sempre soube como cativar a atenção de uma sala inteira, e hoje não seria diferente.— Você está especialmente pensativa hoje, Aiyana. — A voz de Isabela tinha um tom quas