Capítulo 01

A semana passou rapidamente e eu escolhi um vestido que minha mãe disse ser perfeito. Não vi muita diferença. Tiraram quinhentas fotos minhas, e lá fui eu a caminho da festa.

Eu pedi um Uber e esperei, dentro de dez minutos o motorista parou a minha frente. Quando eu entrei notei que algo estava estranho. Dei boa noite; eram apenas sete horas, me sentei no banco do passageiro atrás do motorista. Segui olhando pela janela esperando o meu destino, a faculdade ficava um pouquinho distante da minha casa e eu não quis pegar ônibus. Notei que o motorista seguia por uma rua deserta e aquilo estava me deixando nervosa. Abri minha bolsa discretamente onde eu carregava um spray de pimenta e um estilete.

— Eu acredito que o Senhor esteja seguindo o caminho errado. — Falei, observando sua expressão pelo espelho da frente.

— Estou no caminho certo. Allyssa Garcia, não é? — Ele ergueu os olhos e me olhou pelo mesmo espelho. Meu coração entrou em choque, ele tinha a íris de seus olhos na cor branca, como o gelo.

—  Como sabe meu nome? Preciso que pare o carro, pois eu quero descer. —  Falei sem me importar se a rua estava deserta, eu só queria sair daquele carro e correr.

— Não precisa ter medo. Você é a escolhida, vai dar tudo certo! —  Ele abriu um sorriso que mais parecia frio. Minha mente começou a zunir e eu fiquei me perguntando para que eu era a escolhida.

Não pensei em mais nada, engoli em seco e esperei pensando no que iria fazer, ele diminuiu a velocidade para passar numa esquina e então eu abri a porta com tudo e me joguei. Cai embolando e fui parar ao lado do asfalto, me levantei sem me preocupar com os machucados e sai correndo, ainda bem que estava de sapato. A rua era realmente deserta, não tinha para quem eu pedir ajuda, não passava carros e nem pessoas! Continuei correndo e quando olhei para trás o carro estava fazendo a volta, então tentei correr o mais rápido que um vestido me permitia, eu havia escolhido um vestido solto, florido. Nossa, eu tinha bom gosto...

Quando pensei que estava ganhando o mesmo carro passou por mim me fechando, dei meia volto e corri para o outro lado, o cara desceu abruptamente.

— Eu estou segurando uma arma, pare ou irei atirar. —  O cara falou me fazendo tremer ainda mais.

Eu continuei correndo até que ele atirou para cima me fazendo congelar no lugar, eu me virei.

— O que você quer de mim? — Gritei, tentando controlar ao máximo o pavor.

— Quero que venha comigo, por bem ou por mal. — Ele foi claro e objetivo.

— Tudo bem. — Não adiantaria perguntar o porquê nem nada do tipo, ele não tinha cara de quem iria me explicar. Eu entrei no carro agora sentando no banco do carona, ele travou a porta do carro e seguiu fazendo novamente a meia volta.

Eu não iria com ele para onde ele queria, não sabia o que ele iria fazer. Ele seguiu caminho entrando e saindo em ruas de São Paulo, pelo menos eu sabia onde estava. Segurei minha bolsa com firmeza, peguei meu celular que estava dentro e desligado.

— Não adianta ligar para ninguém Allyssa, só vai colocar mais pessoas em perigo. — Ele disse dando de ombros.

— Eu não vou ligar. — Falei respirando fundo.

Eu estava concentrada em bolar um plano para me livrar daquela situação quando uma BMW deu cavalo de pau no meio da rua em que estávamos ficando na frente do nosso carro e bloqueando a passagem para seguir adiante. O meu sequestrador tentou dar a ré e já estava conseguindo quando um homem saiu do carro a nossa frente. Ele parecia ter um metro e setenta, era moreno e tinha um rosto duro, impassível. Ele levantou a arma e mirou nos pneus dianteiros, furando os dois.

— Saia do carro. —  Ele falou para mim, segurando pelo meu braço enquanto destravava a porta. Eu saí com ele me segurando e ele saiu pela mesma porta que eu.

— Preciso que solte a garota. — O cara a nossa frente gritou, impaciente.

— Sabe que não vou fazer isso. —  Ele deu de ombros. — Seria mais fácil você nos acompanhar. — Ele estava com a mão em meu pescoço e segurando a arma sobre a minha cabeça ao mesmo tempo em que me usava de escudo.

— Você não vai atirar nela, sabe que não vai. Vocês precisam dela viva, mas eu posso atirar. —  O cara que falou, mirando em mim.

— Você não vai fazer isso, é um bunda mole, então posso usá-la como escudo. — Ele gritou. — Anda logo, segue seu caminho e aceita que não consegue mudar mais nada. Já está tudo pronto, e vai acontecer.

— Não posso. — O outro falou. A minha cabeça estava girando e a única coisa que eu entendi com aquilo é que alguém morreria ali. E isso me fazia perceber que seria eu, que meus pais me encontrariam morta naquela noite. Eu não consegui pensar mais em nada além da defesa pessoal.

Antes que um dos dois pudessem atirar, eu apoiei todo o peso do meu corpo no joelho e desci com força ao mesmo tempo em que segurei a mão dele que estava com a arma, girando o corpo ficando de frente com ele e torcendo o seu braço para que ele pudesse largar. Ele segurou no braço com o outro braço e entramos em luta corporal, até que eu finalmente consegui fazê-lo jogar a arma longe e o imobilizei no chão, o enchendo de soco até que ele desmaiasse. Eu estava com tanta raiva, por todo pavor que havia sofrido que nem vi quando o outro cara se aproximou. Ele tocou em meu ombro e aquilo me causou uma onda de choque, no reflexo eu segurei sua mão me levantando no impulso e o empurrei, ele caiu no chão e eu me sentei em cima dele forçando seu pescoço.

— O que vocês querem comigo? — Perguntei o olhando nos olhos. Se olhassem de longe veriam olhos num tom azul ciano, olhando de tão perto o quanto eu estava, dava para ver toques brancos iguais aos do sequestrador.

— Você lutou muito bem, mas preciso que venha comigo. — Ele falou em tom mínimo por conta do sufocamento.

— Eu não vou com ninguém. — Falei cerrando o maxilar para o ódio que estava sentindo.

— Seus pais estão em casa agora, lhe esperando. Suas amigas: Luísa e Lorena, estão na festa que está sendo dada na faculdade em que você faz administração, também lhe esperando. Eu sei onde você mora e estuda, e eles também. Eu não vou lhe machucar, mas eles vão. E tem mais vindo aí. Ou você me solta e seguimos adiante ou volta para casa ou para a festa e causa uma chacina com todos que você ama. Eles não vão parar. — Ele disse após reverter à situação e me prender ao chão enquanto segurava as minhas mãos e ficava por cima.

— Como sei que também não vai me machucar? — Eu falei sabendo que dali eu não conseguiria sair, eu realmente estava imobilizada.

— Eu sei que é pedir muito, mas preciso que confie em mim. Ally. Estou tentando proteger você. — Ele falou respirando fundo e soltando minhas mãos. — Se eu quisesse lhe matar já tinha metido uma bala em sua cabeça.

— Tá. — Recuperei o fôlego enquanto o encarava, Ele havia me chamado pelo nome íntimo, nome que só a minha família chamava e aquilo havia me causado algo estranho. Ele havia vencido e eu não sei o porquê mas parecia estar sendo sincero, era lógico que ele já teria me matado se quisesse. — Pode sair de cima de mim agora.

— Me desculpe. — Ele falou se levantando e me dando a mão para levantar.

Assim que nos levantamos do chão percebemos um carro ao longe na velocidade da luz, corremos até o carro dele, entramos e ele deu a partida, seguimos caminho entrando e saindo de ruas até despistar o carro que nos seguia. Além do pavor de tudo que estava acontecendo, uma ironia rodava em minha cabeça... "Não morri com malucos e sequestradores para morrer por entrar em uma rua errada dessas e ser alvejada de tiros" Ainda estávamos no Brasil. 

— Por que tudo isso está acontecendo? O que eu fiz? Quem é você? — Perguntei tentando controlar todo o desespero que surgia em minha mente.

— Gael. Não é o que você fez. — Ele falou com a voz mais tranquila. —É o que você pode fazer. Eu não tenho como lhe dar as respostas que você quer agora. Mas, darei quando estivermos num lugar seguro. Ok?

— Ok. Gael. — Falei me conformando por hora. Aquelas palavras estavam rodeando minha mente.

Meus pais ficariam preocupados quando percebessem que eu não voltei para casa e aquilo estava me matando.

— Meus pais vão ficar preocupados. – Eu falei.

— Você vai ligar para eles e vai dizer que vai dormir na casa de uma das suas amigas, a Luísa. Os pais dela estão viajando e os celulares estão fora de área então não terá como eles conferirem, sua amiga perdeu o celular hoje. — Ele deu de ombros.

— Como você sabe de tudo isso? — Perguntei confusa.

Ele me encarou novamente e voltou a olhar para a pista, acredito que aquilo tenha sido a resposta.

— Meus pais vão viajar amanhã, vão desconfiar de eu não estar lá para me despedir. — Falei tentando mais uma vez.

— Não vão; você vai tentar ir, mas vai ter um engarrafamento num dos caminhos para a sua casa e você não vai chegar a tempo para se despedir.

— Você vai criar um engarrafamento? — Falei ironizando.

Ele me olhou novamente com um sorriso no canto dos lábios. Eu suspirei. Ficamos na estrada por uns vinte minutos e eu percebi que havíamos saído da cidade.

— Para onde estamos indo? — Perguntei olhando o nada adiante.

— Normalmente, você costuma fazer tantas perguntas assim? — Ele falou estreitando os olhos para a estrada.

— Não, só quando sou sequestrada por um louco de olhos brancos, e entro em um carro com outro para um lugar que eu nem sei onde. — Ironizei enquanto olhava pela janela.

Ele abriu um sorriso que parecia ser sarcasticamente descontraído. Não era nada engraçado, mas ele estava achando!

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