2 Um homem de cabelos escuros...

Fiz uma negativa com a cabeça, rindo dos meus próprios pensamentos conturbados, e joguei a garrafinha no lixo reciclável, resmungando que apenas deveria ir dormir, ao invés de ficar criando teorias conspiratórias sobre um fantasma que muito provavelmente era fruto da minha mente alcoolizada.

Quando estava prestes a ir dormir, ouvi batidas na porta, fazendo arrepios subirem pela minha coluna, assustando-me, e teria corrido para me esconder no quarto se não tivesse ouvido uma voz familiar chamando o meu nome. Fiquei tão surpresa, que quase não podia acreditar que ele realmente veio para passar a noite de natal comigo.

– Feliz Natal! Dylan exclamou com seu sotaque marcante e um sorriso enorme nos lábios carnudos, estava vestido em um sobretudo preto longo por sobre a camisa de gola alta e seus cabelos negros estavam cheios de neve, contrastando a dualidade de cores.

– Feliz Natal! Desejei de volta sorrindo também, e o abracei com força, puxando-o para dentro do apartamento, tirando-o do frio. – Você está cheio de neve, vai ficar resfriado.

– Não se preocupe, eu vou sobreviver... – Ele resmungou sorrindo de canto, e quando me fitou sob a luz trepida do poste, pareceu surpreso com a minha aparência. – O que você fez com seus cabelos?

            Fazia apenas alguns meses que estávamos nos envolvendo. Quando nos conhecemos meus cabelos já estavam cortados em um long bob curto, mas há duas semanas atrás, eu havia feito um corte unissex que sempre tive vontade de testar, um bowl cut que salientava bastante os cachos revoltos, sem contar o colorido verde, no mínimo escandaloso.

            Sua reação me assustou. Eu gostava dele, muito na verdade, e não queria abrir mão daquele relacionamento que estávamos construindo, mas não suportaria a ideia de outra pessoa tomando parte nas minhas decisões, me impedindo de ser quem eu sou.

– Quis mudar... – Murmurei baixinho, e depois de alguns instantes ouvindo apenas o silencio, ergui os olhos para fita-lo um tanto incerta. –  Minha colega da faculdade inaugurou um salão novo, parecia legal.

– Ficou parecendo uma cantora de indie... – Dylan comentou não parecendo incomodado e logo um sorriso provocativo surgiu em seus lábios enquanto enroscava meus cabelos em seus dedos. – Posso te chamar de matinho?

Ri concordando, satisfeita por não ter me enganado com ele, e estiquei os braços, enroscando-os ao redor de seu pescoço másculo enquanto sentia meu corpo sendo erguido do chão com uma facilidade impressionante, nossas bocas se encontraram e logo, estávamos trocando beijos apaixonados enquanto íamos em direção ao quarto.

Retirei seu sobretudo e a camisa, jogando-os sobre a cadeira da escrivaninha, em seguida, pousei meus olhos sobre seu peito, sentindo arrepios, juntamente com um calor que subia para todo meu corpo. Nossas bocas se encontraram novamente e logo senti suas mãos que antes agarravam minha cintura, começando a puxar meu casaco de moletom para cima, jogando-o em qualquer canto.

O chamei de bagunceiro entre os beijos e ele riu baixo enquanto me deitava sobre o colchão de solteiro, a cama era pequena, mas não seria a primeira vez que nos aninharíamos nela. Dylan ergueu-se, fitando-me com uma expressão de desejo que me fez derreter em seus braços, e em seguida, puxou minhas pernas, fazendo-me sentar em seu colo.

De repente, ele me abraçou com força, colando o rosto ao meu busto e esfregando o nariz na pele enquanto segurava-me como algo extremamente precioso, nossos olhos se encontraram, aquele calor subindo novamente, porém, a euforia havia sido substituída por uma sutil tranquilidade por causa daquele abraço carinhoso.

Beijei sua testa, mexendo em sua franja e deslisando os dedos pelo curso natural do corte, olhos nos olhos, sorrindo um para o outro, e suspirei ao sentir sua boca correr para o meu pescoço.

– Senti a sua falta. – Ele sussurrou próximo ao meu ouvido, e pareceu distrair-se enquanto fitava meu rosto daquela posição. – Tão linda, minha plantinha.

– Também senti a sua... – Devolvi o sussurro enquanto nossos olhos se encontravam, e entreabri os lábios, gemendo baixinho por causa dos movimentos sensíveis que ele estava fazendo.

Dylan aproveitou dos meus lábios abertos para mordiscar meu lábio inferior, introduzindo lentamente a língua em minha boca, aprofundando o beijo ao passo que suas mãos alcançavam meu pescoço, apoiando-se sob minha nuca, mas sem fazer peso.

Deslisei as mãos sobre suas costas, acariciando os músculos onde ficava a enorme tatuagem de uma serpente extremamente detalhada, e ao deslisar meus dedos por seu ombro, percebi leves relevos parecidos com uma cicatriz. Quando o beijo foi quebrado, aproveitei da altura em que estava – por estar sentada sobre suas pernas – e fitei o local, notando uma nova tatuagem.

– Quando fez? Perguntei tentando ver melhor o que era aquele desenho.

– Tem uns três dias... – Ele respondeu com certa displicência, claramente não fazia muita diferença para um homem que tinha tatuagens até nas mãos.

Senti meu corpo sendo deitado novamente, e sorri de canto, deslisando as mãos por seus braços musculosos igualmente cheios de tatuagens, e suspirei ao sentiu suas mãos escorrerem por meu corpo de maneira nem um pouco casta.

“Como alguém pode ser tão gostoso?” Pensei comigo mesma enquanto o via rasgar a embalagem de um preservativo com os dentes, e fiquei um pouco surpresa ao ver que ambos estávamos nus e eu sequer havia percebido quando ele fez isso.

Soltei um gemido um tanto manhoso ao sentir nossos corpos se conectando e procurei uma posição para me acomodar, notando que, cada movimento que fazíamos, parecia que iriamos cair da cama a qualquer momento.

Dylan pareceu ter o mesmo pensamento que eu, pois, puxou o travesseiro, colocando-o sob as minhas costas, arrumando uma posição em que ocupávamos o mesmo lugar na cama. Em seguida, espaçou minhas pernas, afundando-se mais entre elas, fazendo-me arquear as costas enquanto abria a boca procurando ar.

Nesse momento, nossos corpos eram praticamente um só. Os movimentos que fazíamos eram sincrônicos, e já não sentíamos mais frio, substituído por um calor e a umidade do suor. Não sabia quanto tempo havia se passado, ou sequer me importava com o que estava acontecendo ao meu redor, ainda mais depois que minha mente começou a ficar em branco devido ao intenso prazer que sentia.

Fechei os olhos, agarrando-me aos seus cabelos e arfei, chegando ao clímax, sentindo que era o mesmo para ele.

Ficamos ainda um tempo parados no mesmo lugar, abraçados enquanto tentávamos recuperar o fôlego perdido, e depois de algum tempo, comecei a sentir frio agora que o calor estava se dissipando do meu corpo, já que não estava mais tanto em movimento, sentei-me na cama, enrolando-me no lençol e o fitei, puxando-o pela mão para que fossemos tomar um banho.

Não muito diferente do quarto, o banheiro era igualmente pequeno, e quase não cabíamos no box de vidro fosco, tendo que ficar abraçados novamente para que pudéssemos nos molhar. Vez ou outra, eu ria, notando que suas costas grandes tomavam toda a água que acabava por não pingar em mim, então ele ria também, afastando-se para me molhar enquanto passava sabonete em minhas costas.

– Devia ter perguntado antes... – Murmurei apoiando minha cabeça sobre seu peito, esticando-me para que nossos olhos se encontrassem. – Mas, você já jantou?

Um sorriso ladino formou-se no rosto alheio e percebi imediatamente a piadinha que havia feito sem querer, fiz uma negativa com a cabeça, praticamente dizendo que não se atrevesse e ele roubando-me um beijo.

– Achei que passaria o natal com suas amigas... – Ele comentou mudando de assunto e tornou a deslisar as mãos por meu pescoço, apoiando-as na curva do ombro.

– Estava planejando dormir cedo... – Respondi evitando dizer que minha única amiga passaria com seus pais, ela até havia me convidado, mas não aceitei e não diria isso a ele. – E porque você não está passando com sua família?

– Meus pais tem novas famílias agora... – Ele respondeu parecendo não se importar muito com isso, e franziu o senho enquanto lembrava-se de algo que pareceu desagradável. – Meus irmãos ainda são pequenos e barulhentos, então não obrigado.

Era a primeira vez que conversávamos sobre isso. Quase não falávamos sobre nossas famílias, e sendo honesta, ele também não sabia muito sobre mim.

Quando voltamos para o quarto, seus olhos fixaram-se imediatamente no pequeno mural de fotografias que eu estava montando, olhou ao redor, deslisando os dedos pela linha vermelhar que eu usava para uni-las e virou-se arqueando uma sobrancelha indagadora.

– Investigação policial? Questionou sério, mas havia um tom de brincadeira em suas palavras. – Alias, você está ficando ótima nas fotografias...

– Parece melhor para organizar as ideias... – Expliquei me aproximando enquanto voltava a vestir meu moletom quentinho. – Tenho praticado bastante ultimamente, e comprei uma nova lente para a câmera.

– Imagino a bagunça dentro dessa mente criativa... – Ele comentou parecendo pensativo enquanto secava meus cabelos com a mesma toalha que havia usado para secar os dele. – Parece que não serei o único a pegar um resfriado.

– Tenho secador! Exclamei abrindo a gaveta do guarda-roupas e pegando o objeto, mas parei no lugar ao seu abraçada pelas costas novamente, sentindo seu nariz roçar no meu pescoço, causando arrepios gostosos.

Era uma sensação muito agradável, o tamanho de seu corpo me fazia sentir segura, porém não representava um bom sinal na verdade.

– Você tem que ir, não é? Questionei retoricamente, fitando as mãos que se uniam sobre minha barriga, e sentindo meu animo se esvaindo.

Sempre me sentia uma amante quando isso acontecia. Era como se ele estivesse se despedindo porque não podia dormir fora de casa ou a esposa desconfiaria, e para piorar, eu acabava aceitando, porque o amava, agindo realmente como uma amante resignada.

Contudo, a resposta que recebi foi diferente das outras.

– Estou planejando passar a noite aqui... – Ele sussurrou contra o meu ouvi, com sua voz grave e colando ainda mais os nossos corpos. – A menos que não queira, claro.

– Não foi isso que eu quis dizer... – Tratei de me explicar, percebendo que iria me atrapalhar com as palavras, então achei melhor cortar o assunto antes que falasse alguma besteira. – Esqueça!

Dylan não disse mais nada, ao invés disso, pegou o secador das minhas mãos e sentou-se na cama, chamando-me com um gesto, e quando fiz o que pedia, ele começou a secar meus cabelos com o vento morno.

Fechei os olhos, soltando o ar pela boca e me permiti receber aquele tratamento gentil, senti seus dedos longos, ouvindo apenas o som tranquilizante do secador enquanto aquecia meu couro cabeludo.

– E então, o que achou? Ele questionou depois de terminar seu “trabalho”.

Levantei-me da cama, caminhando alguns passos em direção ao meu guarda-roupas, fitando meu reflexo no grande espelho da porta. Passei a mão pelos fios verdes, gostando da forma como ficaram soltinhos e voltei-me a ele concordando com um sorriso.

– Você é muito bom nisso... – Comentei pegando o secador de suas mãos, usando-o para terminar de secar os cabelos dele, e sorri ao notar como o formato mudava por estar sem o gel. – Você é cabelereiro por acaso?

– Não! Ele respondeu rindo, parecia descrente das minhas palavras, como se fosse uma ideia absurda. – Mas é sempre interessante saber um pouco de tudo, não?!

            Concordei, balançando a cabeça positivamente enquanto guardava o secador de volta na gaveta, em seguida, peguei mais um travesseiro e retornei para a cama, arrumando o espaço para que pudéssemos dormir o mais confortável que posse possível naquelas condições.

– Posso dormir no sofá! Dylan comentou ainda parado em frente a cama, parecia hesitante em se aninhar no pequeno cubículo comigo.

O puxei pela mão, resmungando qualquer coisa sobre o frio e nos acomodamos no colchão de solteiro, usando os dois cobertores pesados que já estavam sobre a cama para ficar mais aconchegados. Ele se remexeu por alguns minutos, procurando uma posição, e acabou por deitar-se com um dos braços sob a cabeça, formando um ângulo perfeito para que eu me apoiasse, abraçada ao seu tronco.

Passei uma das pernas sobre as suas, fechando meus olhos enquanto sentia seu braço livre pousar sobre minhas costas de forma possessiva, e sussurrei que tivesse um boa noite de sono, ouvindo-o retribuir com algo parecido.

Foi assim que dormimos agarradinhos, ouvindo o som de uma chuva que batia nas janelas de vidro, funcionando como um calmante natural.

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