Um amor para o dia 12
Um amor para o dia 12
Por: Carine Pinho
01

“ — Se não consegue enxergar a imensidão do meu amor, se não consegue ler em meus olhos o quão forte são meus sentimentos por você, então, sinto muito em te dizer isso, mas és um completo babaca.”

(Perdidos no amor, Violet Monteiro)

***

01

— Sinto muito, Zoe. Acabou.

— Mas... — Não concluí a frase, não sabia o que dizer. As lágrimas ensoparam meus olhos e meu estômago embrulhou de repente.

Tudo bem que a coisa toda era recente, eu e Pedro estávamos juntos há seis meses apenas, mas, poxa vida, eu iria apresentá-lo para minha família, no dia dos namorados, dia em que minha adorável prima resolvera se casar.

Veja bem, eu não a odiava, mas ela sempre dava um jeito de desdenhar de mim.

Anelise era uma mulher independente, bem-sucedida na área profissional (dona de uma confeitaria renomada), e agora, no âmbito amoroso também, já que Vicente, seu noivo e futuro marido, era um verdadeiro príncipe.

Pelo menos era isso que minha mãe me dizia toda vez que ligava para mim.

E eu?

Eu estava desempregada — houve cortes no hotel em que eu trabalhei por três anos como operadora de caixa —, vivendo do meu seguro-desemprego, e agora levando um belo dum pé na bunda.

Deus, por quê?!

— Desculpa, Zoe. Você é uma mulher bacana, vai encontrar alguém que te ame como...

— Como você não me amou — eu o interrompi, magoada, ferida e, sei lá, bastante chateada também.

— Podemos ser amigos.

Eu o encarei, e a vontade era de rir de desespero.

Pedro era um cara bonito, tinha os olhos castanho-claro, os cabelos escuros, a pele negra (um pouco mais escura que a minha) e o corpo sarado.

Era apenas alguns meses mais novo que eu. Fiz vinte e quatro anos em Fevereiro e ele completará em Setembro, dia 25.

Éramos bons juntos, por isso eu não entendia o motivo do término. Na verdade, eu achava isso injusto pra caramba.

— Vá se ferrar, Pedro! — Vociferei, empurrando-o. — A última coisa que quero é ser sua amiga! Adeus.

E dito isso entrei em casa e bati a porta com força. Não esperei por resposta nenhuma, deitei em minha cama e deixei o choro vir.

O que eu faria da minha vida de agora em diante?

Deus, o que eu faria?

Acordei com safanões e assobios. Os raios de sol incidiam pelas cortinas, obstruindo minha visão.

— Achei que ia ter que te jogar um balde de água gelada — Clara falou, sentando-se na beirada da cama.

— Você não devia estar no trabalho? — Perguntei, me espreguiçando.

— Tenho que ir ao dentista daqui a meia hora. Pedro me ligou, disse pra eu vir aqui cuidar de você. O que aconteceu?

Pedro.

Meu ex-namorado.

Que grande merda!

— Ele terminou comigo — respondi, tentando fingir que não me importava com aquilo.

— Mas por quê?

— Ah, Clara, o mesmo papo clichê de sempre. “Não é você, sou eu.”, “ Você vai encontrar uma pessoa melhor”, e blá, blá, blá.

— Que cretino!

Desviei o olhar. Não queria falar daquele assunto, doía demais.

— Tá tudo bem — menti.

Clara segurou firme minha mão, criando um contraste entre nossas cores. Enquanto ela era branquíssima, eu tinha a pele preta, um pouco retinta.

A diferença não parava por aí.

Clara tinha os cabelos longos, lisos e loiros, olhos cor-de-mel e lábios finos. Já eu estava em processo de transição capilar, de modo que optei por usar tranças longas e alaranjadas. Meus olhos eram pretos e minha boca; carnuda.

Clara fazia o tipo magrinha, enquanto eu sempre tive o corpo curvilíneo.

— Você precisa de um porre — disse minha melhor e única amiga —, vou cuidar de você. Mas agora eu realmente tenho que ir, se precisar de mim é só ligar.

Clara levantou-se, deu um beijo em minha bochecha e saiu, toda arrumada e perfumada, para ir ao dentista.

Sorri.

Ela e suas paixões platônicas.

Da última vez cismou que seu mecânico era um bom partido, até descobrir que o cara era casado.

Soltei um suspiro.

Honestamente, eu não sentia a menor vontade de sair da cama. Eu precisava urgentemente de um emprego, seria mais fácil para superar o término.

Talvez eu lesse um livro de autoajuda ou algo do tipo.

A muito custo, me levantei.

Lavei o rosto, escovei os dentes, ajeitei minhas tranças e saí direto para a cozinha, ainda enfiada em meu pijama de estrelinhas.

Quando eu estava sentada no sofá, depois de ter devorado uma pratada de cuscuz com ovo e café com leite, minha campainha tocou.

Me arrastei até a porta, abri, e lá estava ela.

— Querida, você está com olheiras — foi dizendo, já entrando em minha casa.

Revirei os olhos.

— Bom dia pra você também, mãe — ironizei, fechando a porta e seguindo-a.

Dona Augusta foi andando, analisando tudo, como se estivesse avaliando um imóvel que, certamente, não compraria de jeito nenhum.

Tudo bem que minha casa não era lá grandes coisas.

Sala, banheiro, cozinha americana, dois quartos, alguns quadros minimalistas, TV de plasma, paredes pintadas (por mim!) em tom de pastel, e só.

Mas era meu lar, e eu gostava bastante dele.

Bastante mesmo.

— Então — comecei, cautelosa —, a que devo a honra de sua visita?

Minha mãe jogou a bolsa Channel falsificada no sofá e sentou-se, cuidadosamente.

Ela sempre foi muito pomposa, tinha a pele da mesma cor que a minha, os cabelos pretos alisados e o corpo robusto.

Se pudesse só usava roupas de grife, mas se contentava com as falsificações que encontrava em Camelôs.

Hoje vestia um conjunto de blusa e saia verde-limão, que ganhou de meu pai em seu aniversário retrasado, quando ele ainda estava entre nós.

Ah, pai, como sinto sua falta!

— Bem, estava passeando por perto, pensei em vir te ver. Você não sente minha falta, mas eu sinto a sua.

E lá vamos nós para o momento drama do dia.

— Claro que sinto — falei, indo até a cozinha e abrindo a geladeira. — Suco...?

— Com adoçante — respondeu minha mãe.

Enchi o copo de suco de maracujá, pinguei algumas gotas de adoçante e voltei para a sala. Entreguei para ela e me sentei ao seu lado.

Respirei fundo.

— Sério, mãe, por que veio aqui?

— Quero saber de você, Zoe — disse, bebericando o suco e depositando o copo em cima da mesinha de centro. — Ainda está desempregada? Quando vou conhecer seu namorado?

— Estou tentando achar um trampo, mas não tá fácil.

— Você não respondeu minha outra pergunta, mas não precisa, eu sei que no momento certo irei conhecer esse rapaz. Pelo amor de Deus, Zoe, me diz que ele não é metido com drogas.

— Mãe, por favor!

— Só quero seu bem. Amanhã sua tia Marta vai fazer um almoço em comemoração ao casamento da Anelise, me diz que vai, querida.

Pronto, aí estava o motivo da sua visita.

Não era por saudade coisa nenhuma, minha mãe queria (e iria) competir com a irmã.

Típico das duas fazer isso, e era tão, mas tão, ridículo.

— Vou — assegurei —, posso levar a Clara?

— Pode, é claro. Agora preciso ir, irei fazer compras.

— Mais compras? — Perguntei embasbacada.

Ela simplesmente deu de ombros.

— Não quero que sua tia pense que somos pobres.

— Mãe, mas nós somos pobres! Olha pra mim, eu tô vivendo de seguro-desemprego, se meu pai não tivesse me dado essa casa, eu já estaria no olho da rua.

— Deixa de bobagem — falou, erguendo meu queixo —, sempre tem minha casa para voltar.

Já não é meu lugar.

— Precisa ver sua prima, Zoe, está com a vida ganha. Noivo rico e gentil, emprego dos sonhos. Anelise subiu na vida, soube aproveitar. É uma pena que você não tenha sequer tentado.

Engoli em seco.

— Eu te acompanho até a porta — e dei a conversa por encerrado.

Quando minha mãe saiu, me joguei no sofá e chorei.

Chorei porque eu não era — e nunca seria — como minha prima. Porque meu pai, o cara que sempre acreditou em mim, perdeu a vida por causa de um maldito câncer. Chorei porque, para minha mãe, eu nunca seria boa o suficiente.

E por fim, porque, além de desempregada, eu tinha acabado de sair de um relacionamento que eu acreditava que duraria para sempre.

Quando foi que minha vida virou esse inferno?

Ah, que se dane a dieta, eu merecia uma panela bem cheia de brigadeiro.

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