Capítulo 4: Regressão ao Passado

O meu primeiro trabalho individual foi a Regressão para ver o meu passado esquecido. Eu, Dríade e Florência passamos pelas trilhas internas da floresta até chegarmos ao Lago Ametista, o qual era pequeno, envolvido por um muro natural de ametistas a reluzir sua energia de cor violeta nas águas mornas.

Florência era uma mulher tão misteriosa que isso despertava ainda mais meu desejo de conhece-la e desvendá-la. Já a Anciã, muito simpática e comunicativa, pediu que eu me despisse, pois o trabalho seria feito na água. Enquanto meu corpo flutuava com as mãos da discípula em minhas costas, Dríade colocara uma de suas mãos em minha testa e a outra em meu peito, na altura do coração, explicando o trabalho a ser feito:

O ritual de hoje será o do Regresso ao Passado. Voltar ao passado mais remoto, compreendê-lo e perdoá-lo é essencial ao autoconhecimento e a dissolução dos bloqueios inconscientes que imobilizam sua vida. Esse processo será feito por meio da Hipnose Regressiva. Você verá aquilo que condiz com a sua própria abertura para se despertar aos fatos reais. Porém, iremos com muita calma em suas regressões, para evitar qualquer choque de realidade, tudo bem?

As imagens apareciam distorcidas debaixo de minhas pálpebras fechadas. A Feiticeira certificou-me: sempre que eu sentisse necessidade de voltar à visão do presente, deveria comunicá-la para retornar à realidade objetiva.

Finalmente eu me vi quando pequena: uma menina muito doce, apesar de sofrida. Eu sentia como se estivesse amordaçada, sem poder falar qualquer coisa. Eu estava isolada, proibida de ter contato com outras pessoas, mas eu não sabia o porquê. Uma vez fui aprisionada em um lugar pequeno e escuro, longe dos sons do mundo. Comecei a entrar em pânico ao ver aquela cena, pois sentia tudo como se estivesse acontecendo naquele exato momento da hipnose! Eu ainda era criança quando alguém tentou me matar com um punhal, como em um tipo de Ritual Macabro. Por algum motivo, fui arrastada para um túmulo... o túmulo de meus pesadelos! E lá fiquei aprisionada. Eu não podia ver o rosto da pessoa que queria me matar, minha visão já estava embaçada, mas sabia que era alguém conhecido.

Dríade pedia que eu me acalmasse, dizendo que aquilo já havia se passado, mas eu estava em convulsão, enquanto as lágrimas não paravam de rolar pelo meu rosto, por reviver de corpo e alma aquela terrível cena. Não me recordo muito bem a respeito do que a Mestra e sua discípula fizeram comigo. As palavras da mais velha já se encontravam embaraçadas em minha mente, como se minha alma fosse despida de meu corpo. No entanto, lembro-me de Florência me seguir através de seu límpido olhar, transparecendo preocupação. Ela me segurava em seu colo com ternura. Ah... na verdade, não sei ao certo o que vi. Mal conseguia ver o que acontecia no mundo externo; Sentia-me presa em meu mundo interno, semelhante a estar enclausurada no túmulo do passado. Mas também sentia um elo magnético me ligar àquela belíssima mulher.

A crise passou. Acordei no quarto de Dríade, com algumas folhas frescas e umedecidas em meus Centros de Energia. A Feiticeira pediu à Deusa da Cura que restabelecesse a minha saúde integral e deu-me um chá, cujo sabor era desconhecido ao meu paladar.

Não seria bom sofrer outro espasmo na ausência de uma sábia companhia, afinal, eu estava muita vulnerável após a convulsão e o desmaio. Dríade deixou-me dormir junto a ela. Contei-lhe então sobre meus pesadelos e passei a noite relembrando tudo o que me acontecera no encontro, imaginando Florência bater à porta à procura de notícias a meu respeito. Em minha imaginação, ela se sentou ao meu lado, na cama, colocou sua mão acolhedora em minha cabeça, acariciando-a com leveza, trazendo conforto e proteção. Somente assim, adormeci e acordei no dia seguinte, com a visita do crepúsculo. Com ervas purificadoras, Dríade preparou um banho para limpar minha aura. Em meio ao quarto místico, com a fumaça do incenso de Sândalo a exalar, ela se pronunciara:

Leve um pouco deste preparo de ervas com você. Isto lhe proporcionará encontros profundos com o seu Eu Verdadeiro, portanto, não se assuste se tiver mais catarses ao longo do tratamento. Agora vamos respirar o ar lá de fora. Hoje teremos um encontro ao redor da fogueira!

Dríade, espere! Estou com muito medo!

Ela me abraçou, sentada ao meu lado, enxugando minhas lágrimas, pois compreendia o que as cenas vistas por mim durante a hipnose poderiam causar em meu interior.

Lidar com traumas do passado não é fácil, requer muita coragem. Sei que você está em um momento frágil, porém, sei também que você é forte! Além de que, ninguém vai te aprisionar em um túmulo por aqui, tudo bem?

Voltei a chorar em seus braços. Nem sei como consegui me abrir e me entregar com tanta facilidade a ela, já que expressar meus sentimentos e minhas emoções era algo sempre desgastante para mim.

Se eu fosse forte não choraria tanto assim. Qualquer coisa me faz chorar, como se eu carregasse um oceano de lágrimas dentro de mim.

Querida, ser sensível não significa ser frágil. Você tem uma alma sensível e não fraca, afinal, os desafios que você trespassou poderiam ter lhe tornado uma pessoa amarga, vingativa, fria e cruel. Por outro lado, você foi forte por não deixar que sua pureza fosse corrompida. E ser forte não é deixar de chorar. Ser forte é permanecer na jornada rumo à elevação da consciência espiritual, rumo à vida, mesmo quando tudo parece estar perdido. Além do mais, todos temos nossa própria medida! Cada um tem um grau de sensibilidade. Uma pessoa pode se sensibilizar com o nascimento de uma criança, já outras, não. Uma pessoa pode se sensibilizar com uma palavra ríspida ou irônica dirigida para si, enquanto outras não. E assim acontece com tudo na vida: cada um tem seu ritmo, seu próprio tempo, sua própria medida, seja na alegria ou na tristeza. Não podemos exigir que todos sigam o nosso ritmo ou nos exigir caminhar sob a medida dos outros. Seria como querer que a minha roupa servisse em você assim como em mim, mas temos medidas diferentes e isso significa que em alguma parte do seu corpo, a minha roupa não vai lhe caber da mesma maneira que cabe em mim. A não ser que tenhamos medidas muito semelhantes, embora sempre haja alguma diferença, mesmo porque, cada um se desenvolve mais em um determinado aspecto que o outro e vice-versa. Por isso, a cobrança e a comparação não são saudáveis; Seria o mesmo que forçar uma árvore a frutificar durante seu período "infértil", antes do seu devido tempo, ou forçar uma macieira a fertilizar uvas!

Mas eu não quero ser tão sensível assim. Sinto-me fraca perante as pessoas quando a sensibilidade me faz chorar com facilidade, sem conseguir controlar.

Mas você agora é assim! Com o passar do tempo, pode ser que suas águas internas se equilibrem e esse é um dos trabalhos que fazemos aqui. No entanto, você precisa se aceitar como é AGORA! Não podemos esperar a perfeição para amar a nós mesmos. Você realmente se sente fraca ao manifestar a sua sensibilidade ou se incomoda com sua sensibilidade por acreditar que as pessoas te achariam fraca ao manifestá-la? Imagine se a coisa mais normal do mundo fosse o fato de todas as pessoas serem sensíveis como você. E então? Você se sentiria fraca ou incomodada com a sua sensibilidade?

É verdade: eu me incomodo mais com o que os outros pensam de mim. Penso que as pessoas me acham fraca. Na verdade, eu me sinto tão ridícula por ter sido traída pelo povo de Esplendor. Sinto muita raiva por terem me enganado. Mais raiva ainda por eu nem saber o motivo de terem me manipulado. Eu preciso tanto entender o porquê de tudo isso! Nada faz sentido para mim, Dríade... Eu quero morrer!

Voltei minha face chorosa para o colo da Anciã, que exclamara:

Certas coisas aparentemente ruins nos acontecem para despertar algo muito bom que está adormecido dentro de nós! Será que você está atenta apenas à parte negativa desse momento? Tudo tem seus dois lados, vantagens e desvantagens...

Mas eu não consigo ver nada de bom nesse momento obscuro que tenho vivido. Eu queria me matar! Mas nem isso eu posso fazer, pois não tenho livre-arbítrio para escolher a morte...

Mishra, você está confundindo as coisas. Você pode se matar. Ninguém vai te impedir de fazer isso, nem os deuses! Mas isso NÃO É LIVRE-ARBÍTRIO! Quando estamos presos nos vícios e nas dificuldades do ego, pensamos que matar alguém, nos matar, nos drogar e nos entupir de comida para tampar o buraco da alma, nos afundar em relacionamentos destrutivos (entre outros excessos) são “escolhas” que queremos fazer, mas acreditamos não ter essa liberdade de escolha, no ponto de vista espiritual, como se os deuses fossem nos julgar e condenar pelo que fizemos e por isso, cremos que não temos livre-arbítrio. No entanto, se tivéssemos realmente duas opções para escolher, escolheríamos nos matar (para acabar com o sofrimento de nossa alma) ou escolheríamos viver uma vida melhor e saudável? Tenho certeza que faríamos a segunda escolha, mas pelo fato de estarmos PRESAS às limitações e dores causadas pelo desequilíbrio do ego, simplesmente não conseguimos fazer escolhas positivas para sairmos dessa prisão e a morte passa a ser a única “saída”. LIVRE-ARBÍTRIO É PODER ESCOLHER UMA VIDA MELHOR. Se você ainda insiste em “escolher” a morte, o sofrimento, os excessos, o desequilíbrio, pode ter certeza que não foi uma escolha: você já está presa e a única coisa que consegue fazer é permanecer em sua prisão interior. Matar-se não vai libertar o que está dentro de você!

Mas...

Se você estivesse em uma jaula com a porta aberta, escolheria permanecer na jaula ou sair dela?

Sair! Óbvio!

Mas sua jaula, aqui, no seu coração, no seu interior, está fechada e por isso, você não consegue fazer outra escolha além daquelas que te trazem mais sofrimento. Somente quando começar a ter domínio sobre si mesma essa porta começará a se abrir e aí sim, você terá realmente liberdade; Livre-arbítrio para escolher. A morte não salva ninguém da dor, Mishra. Após a morte, a vida continua e, se levamos a dor conosco para a vida espiritual, não será a morte física que cessará o sofrimento da alma. Não tampe a visão para o lado positivo da vida, mesmo que haja muita dificuldade no momento atual. Mais uma vez eu direi e não me canso de dizer: Tudo tem seus dois lados!

Dríade disse que muitas coisas que não compreendemos agora é porque ainda estão sendo processadas pela vida. Quando tivermos interiorizado o ensinamento das situações até então indecifráveis, aí sim, enxergaremos o ganho que tivemos por meio de determinadas perdas, decepções ou irrealizações, concluindo o quebra-cabeça da Vida.

Uma vez, conversei com uma Deidade canalizada. Essa Divindade me disse que devemos ser gratos por tudo o que nos acontece, pois tudo foi preparado pelo universo para constituir o que somos hoje. E querer apagar certas coisas do passado ou do presente seria o mesmo que retirar importantes tijolos dessa construção e fechar o nosso coração para o que a vida quer nos oferecer. Na época em que ela me disse isso, eu passava por uma fase muito delicada e tive raiva de ter de agradecer pelo proveito que aquela situação desagradável me trouxe, mas compreendi que sem ela, eu não teria aprendido o que aprendi. Não teria crescido o quanto cresci e não estaria aqui agora, falando isso para você. Tudo tem suas vantagens e desvantagens. Se você lançar um olhar pessimista sobre as “desvantagens”, jamais aprenderá com elas e, contudo, não verá as vantagens! Por enquanto, sugiro que você vá com mais calma. Evite pensar demais sobre esses assuntos fora dos trabalhos espirituais, certo? Sinta! Viva o presente! Tente relaxar!

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