Com Amor, Samara por Magno Novaes: Quando Adam Wason é agrupado com Bill Lewis e sua turma pelo destino – e uma decisão da professora de artes do colégio Doctor John Dalton – ninguém poderia prever as reviravoltas que viriam a seguir. Encarregados de investigar histórias assombradas locais, Adam desafia seu novo e relutante aliado, Bill, a explorar o cenário de um crime hediondo. No entanto, Bill, já assombrado pela perda recente de seu querido cão Pirulito, encontra-se à beira do abismo. Ele é atormentado por visões de um homem sinistro que afirma ser Tommy-balão. Seriam essas visões simples alucinações ou algo mais sombrio se esconde nas sombras?
Leer másNa varanda dos Lewis havia uma mosca-varejeira que ia de lá para cá em rodopios sincronizados. Ela saiu do porão tão rápida, que não parecia um inseto, senão um pequeno e maquiavélico fantasma de barata, pronto a embocar alguém rapidamente. A animalesca criatura voadora chegou à sala atraída por um foco de luz que piscava cintilante, iluminando os jovens que ali estavam — era a luminosidade da TV e estava exibindo o filme clássico de terror: Nosferatu, de 1922.
A mosca chegou ao cômodo naturalmente, como se não se importasse de ser apanhada inesperadamente — era o que costumava acontecer quando insetos de sua infeliz categoria eram visto por humanos — Desengonçada, repousou sobre o pedestal de um abajur branco de seda, que a senhora Lewis ganhara do seu melhor amigo, o carteiro da cidade, Daniel Smith. A mosca esfregou suas patinhas como se estivesse arquitetando um plano maléfico e deu um pequeno pulo, no mesmo instante que os jovens gritaram com a cena de terror que viram na tevê. Ainda inquieta em sua curta vida, subiu mais um pouco no mastro do objeto e como se quisesse beijar a lâmpada que a aquecia, ela voou até ela, se queimando e caindo dura, ali mesmo…
— Filmes de terror antigos são tão exóticos… — disse Melissa, baixo, talvez ao ponto de ser um desabafo para si mesma. Ela falou aquilo apertando o cobertor que cobria seu corpo. De todos ali presente, talvez fosse a única que sentia sensações desagradáveis em uma sessão de horror. Ela era a mais velha do grupo, mas não se importava em demonstrar se sentir amedrontada.
— Bill! Olha para os dentes do desgraçado! Esse deve ser o filme de terror mais tosco e gostoso que eu já vi — acrescentou, Edward, um dos garotos, chamando a atenção do outro que quase cochilava no sofá.
— Ah! Os dentes... Isso, Edward, são realmente feios — respondeu ele, confuso, quase se reconectando ao mundo real. Bill Lewis cedia a casa para os amigos fazerem sessão de filmes clássicos de terror quase todo final de semana. Apesar de ter 17 anos, os pais sempre confiaram no garoto e as viagens de final de semana costumavam dar ao jovem dois dias de pura privacidade e liberdade, virtudes das quais ele tinha orgulho.
— Se você se deitar mais um pouco nesse sofá, você acabará dormindo… — reclamou Edward, jogando uma almofada no amigo e fazendo-o se endireitar. Edward era um nerd amigável e de poucos amigos, mas que sempre se mostrou corajoso em relação a filmes de terror, mas demasiadamente frouxa com os valentões do colegial. Ele usava óculos com lentes grossas e um aparelho extrabucal. Adquirira na última vez que esteve no consultório do Dr. Menezes, dentista esse, que ele odiou logo de cara, afinal de contas, o bullying no colégio triplicou.
No canto do grande sofá, quase que imperceptíveis, dois adolescentes se agarravam, como duas lagartixas na época do acasalamento. Eram Julia e Frank, o casal do grupo de amigos. Juntos, formavam o não muito peculiar grupo de bobões do Colégio Doctor John Dalton, a instituição de ensino mais velha de todo o condado de Delaware.
— Dá para se comer em outro canto? Eu posso ouvir a língua de vocês fazendo contato e isso me dá ânsia de vômito — resmungou Melissa, mas eles não ligaram. Talvez ela estivesse um pouco enciumada, afinal, todos sabiam que Melissa Bayer tinha uma quedinha pelo Frank.
— Vocês estão sentindo esse cheiro? — perguntou Frank, parando por um momento a pegação desenfreada e prestando atenção no silêncio daquela noite de outono. Julia colocou a mão frente a boca e soltou o ar, de modo a checar seu hálito, mas não era sobre isso que Frank se referia.
— A única coisa que posso sentir são os salgadinhos fedidos que Melissa está comendo. Por Deus, eles fedem a mijo de cachorro — retrucou Edward, sorrindo e exibindo seus dentes amarelados e fixos às hastes de metal de seu aparelho. Talvez os salgadinhos da Melissa malcheirosos fossem menos podres que a boca suja do fedelho.
A garota atirou uma almofada na cara dele, retirando com o impacto, os óculos que repousavam sobre seu narigão. Ele recebeu aquilo inesperadamente, quase torcendo o pescoço em noventa graus.
— Dá para parar, vocês dois? — Bill tomou a almofada que Edward tinha em mãos, pronto para arremessar de volta — agora eu estou sentindo…
O anfitrião se levantou do sofá e calçou suas pantufas que tinham um formato de vaquinhas orelhudas, em seguida caminhou até a parede onde havia o interruptor. Tateou até finalmente alcançá-la e por fim, ligá-la, quase na intenção estúpida e irracional de sentir melhor o cheiro.
— Ah! Eu não estou sentindo nada! — Edward disse, tragando o ar para seus pulmões. Suas narinas se dilataram ao puxar o oxigênio.
— Isso sim, definitivamente, é estranho… — Melissa disse me deboche, olhando para o nariz do amigo. Ela se levantou em seguida, sentindo com mais intensidade —, fede a carniça. Talvez um rato morto.
— Que droga! Vou ter que procurar… — resmungou Bill, já se abaixando e olhando debaixo do sofá. De todos os lugares da casa onde se poderia encontrar alguma coisa morta, quase sempre estava debaixo do sofá. É um submundo de poeira e restos de insetos mortos.
— Parece que vêm de outro cômodo — acrescentou Julia, indo até o corredor que dava acesso aos demais cômodos da casa do Bill — sim, talvez da cozinha.
— Vamos até lá então. — Melissa disse, chegando até Julia que agora, evitava puxar o ar para seus pulmões, pois estava cada vez mais fedido.
Os cinco jovens caminharam até a cozinha, com a sensação quase iminente de que o odor estava realmente mais intenso naquela parte da casa. Não era nada agradável...
— E… Vem do porão… — Julia balbuciou suas palavras com uma cara de nojo. Ela detestava porões e com certeza o do Bill não diferiria dos demais
— Que droga! O cheiro aqui tá mais intenso — falou Bill, com desgosto, colocando a manga do seu pijama sobre o nariz na intenção pouco favorável de impedir o mau cheiro, mas ainda era possível senti-lo. Aquilo fedia a podridão, tão malcheiroso como da última vez em que Bill encontrou uma vaca morta na estrada que dava acesso à fazenda de sua avó, ao norte da cidade.
— Vamos lá! Desce lá e veja o que tem — pediu Edward. Bill olhou para o amigo, ainda próximo à porta do porão, com uma cara de quem precisava de coragem e isso ele tinha, mas lhe faltava quando recém assistia filmes de terror, como o que acabara de ver.
— Se eu encontrar o Drácula lá embaixo, eu vou ter um treco — brincou ele, abrindo a porta. O fedor de carniça aumentou. Como a cebola podre que fazia olhos saudáveis implorar por água fresca.
— Urgh! Por Deus, você esconde um cadáver aí embaixo? — Edward debochou, tapando o nariz e a boca com as duas mãos. Se ele prendesse a respiração por mais alguns segundos, com certeza o Bill teria um cadáver em sua casa.
— Que merda! O Pirulito. — Bill falou em desaponto. Ele conseguia ver no final da escada, seu cachorro de estimação, estendido próximo ao último degrau da escada.
— Fala sério! Você se esqueceu do seu cão no porão? — Julia falou aquilo como se condenasse antecipadamente o amigo, pela morte do bicho de estimação.
— Não... Tá louca? Ele estava aqui na cozinha, mais cedo. Não sei como ele foi parar lá embaixo. Ele estava velho e adoentado — Bill lamentou a morte, soltando o ar num suspiro miúdo de culpa por não ter feito muito pelo velho amigo.
— Mais cedo? Ele parece estar há dias aí — Frank retrucou e Bill apertou a mente para tentar se lembrar. A única lembrança era do Pirulito lambendo seu rosto ao acordá-lo de manhã.
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HOTEL HUSTER - CELEBRANDO A VIDAO Hotel Huster foi palco de grandes eventos durante os anos oitenta e costumava receber muitos hóspedes durante a alta temporada, mas os anos de glória do Huster estavam com os dias contados. Administrado pelo ex-banqueiro de Liontown, Chad J. Graham, os negócios pareciam ter atrofiado. Os moradores costumavam chamar o Chad de dedo de ouro, por ser bom nos negócios, mas aquele em especial, fora sua primeira e última investida no ramo da hotelaria. O hotel perdeu capital por 20 anos, antes de fechar as portas há dez anos. Agora, era uma construção inútil à beira da rodovia Clyde. Clyde era conhecida por cortar toda a cidade e ser um dos principais pontos de entrada e saída do município. Mas não tinha um ser humano sequer que saísse ou entrasse em Liontown e não reparasse o hotel. Ele ainda par
4 de novembro de 1977 - 16:30— Se você não falar para onde foi aquela retardada, pode ter certeza que eu tiro todos os dentes de sua boca e te mando para o céu, santinho — disse James, dando um soco na barriga de Paul. Tony segurava-o pelos braços, como alguém que segura um porco para o abate. — Fala!Paul puxou o ar para os pulmões e olhou para a floresta que havia logo depois da rua atrás do colégio. Era um aglomerado de árvores altas e densas. Era o caminho mais rápido se quisesse chegar à rodovia principal da cidade.— Ela foi para lá…— Maldita hora para ir pela floresta, aberração — falou James. Tony soltou Paul, que
4 de novembro de 2007Quando o opala preto que Adam Wason estava dirigindo parou frente a antiga casa dos Morris. Ele teve uma intuição esquisita de que Edward não estaria ali. O tipo de intuição que ele não poderia compartilhar com os outros. Ele achava que essas coisas só eram sentidas por mulheres. Sua intuição se intensificou ao perceber haver rastros de pneu de carro por toda parte. Se Edward estivesse ali, não estaria mais.— Será que chamamos a atenção? — perguntou Melissa, com uma preocupação evidente. — Aqui é muito silencioso.— Se chamamos, quero estar preparado e saber que estou armado — retrucou Adam, com orgulho. Um orgulho quase doentio.<
4 de novembro de 1977.Ninguém quer morrer. Pelo menos é assim que a maioria das pessoas pensa. Temos um instinto de defesa e sobrevivência que evoluiu há milhares de anos e nos preparou para os piores cenários. Algo que Bill Lewis sabia muito bem. Lutar ou fugir, estas eram as duas opções interessantes quando a questão era apenas sobreviver, e Bill estava usando-as. Já Samara Morris, em seu íntimo, tinha uma certeza que era assustadora. O tipo de certeza que ela tinha medo de verificar para ver se era realmente aquilo tudo, pois sabia que poderia ser muito pior. Ela ia morrer. Assassinato talvez. Só não sabia quando, como e porquê, o que era péssimo também. Entretanto, ela tinha esperança, do tipo que a fazia viver e esquecer o inevitável. A esperança que ela encontrou t
Liontown. 4 de novembro de 2007Bill achou fácil convencer sua mãe a sair depois do almoço, pelo fato de que haviam prendido o suspeito do desaparecimento de duas crianças na região e de… Ele se esforçou para manter a imagem de Edward em um lugar seguro, mas ele só conseguia vê-lo flutuando de barriga para baixo, às margens do rio Wax. Isso o deixava mal. Mas era difícil de deixar de pensar em coisas ruins. Sua mente estava viciada em possibilidades negativas e ele se odiava por isso. Bill cruzou a avenida principal da cidade e se encontraria com Melissa e Adam depois dos trilhos da estação ferroviária de Liontown e ficariam ali debatendo as investigações. E entre fatos verdadeiramente concretos e imaginários, Bill e Adam estariam sempre divididos nas opiniões. Era o que cos
Edward estava algemado à cama em um quarto escuro com paredes azuis. Suas roupas eram elegantes e pareciam ser da década passada. Um suéter de lã de cor vermelha-escura cobria seu torso — na vestimenta havia um broche. Era uma pombinha dourada. — O jovem olhou para os lados quando acordou novamente de seu sono nada agradável e viu, agora que seus olhos se adaptaram à escuridão, que o ambiente estava repleto de fotos de uma garota. Era Samara? Edward sabia que sim. Até onde ele se lembrava, ele veio para a casa dos Morris e sabe-se lá o motivo, ele estava no quarto que intuitivamente soava ser de uma garota. De uma garota morta. Os olhos do garoto varreram o quarto, observando cada canto e com um receio que estava no centro de sua garganta, como uma bola de muco quando se está muito gripado. Edward então escutou alguns passos que faziam as madeiras do piso rangerem
Último capítulo