CAPÍTULO 5

Quando cheguei à casa de Nick já estava escurecendo. Acendi as luzes e chamei por ele. Como não obtive resposta, resolvi tomar um banho bem demorado e depois, preparar algo para comer. Aquele lanchinho há muito se fora. Não que eu seja uma pessoa gulosa. Depois que terminei meu namoro com Artur, fiquei vários dias sem me alimentar direito, e foram minhas roupas que mais sentiram. Porém um mísero pão de forma com presunto e queijo, não é lá uma refeição que se preze. Precisava comer algo com mais substância. Enquanto vasculhava a cozinha a procura de arroz, Nick chegou:

— O que está fazendo? — Perguntou, novamente, com aquela voz profunda.

— Isso já está ficando embaraçoso! Estou tentando fazer o jantar. Posso? — Encarei-o ameaçadoramente, com uma panela na mão.

— À vontade! Só não incendeie a cozinha.

— Engraçadinho! Posso ser uma advogada, mas antes de tudo, sou mulher e faço coisas de mulher – disse irritada, sem me dar conta de minhas palavras.

— Estou vendo que é mulher. Seu cheiro não me deixa pensar o contrário. — Respondeu, e me deixou novamente.

Jesus! Eu queria matar aquele homem arrogante. Coloquei o arroz para cozinhar e temperei três filés de frango, mesmo não sabendo se aquele “serarrogante comeria comigo. Quando o arroz ficou pronto, ele entrou na cozinha e sentou-se num banco alto, tipo aqueles de bar, e descansou os braços na ilha que havia no centro da cozinha.

— Tomou banho? — Perguntei, tentando desviar os olhos daquele peito largo embaixo da camiseta branca, e dos cabelos molhados que caiam de forma sedutora em sua testa.

— É o que parece. Está pronto? — Olhou esperançoso para a panela fumegante.

— Quase. Está com fome?

— Estou.

— Como estão as coisas? — Perguntei, tentando levar a conversa para o motivo de minha ida até lá.

— Tudo bem. Quer ajuda com os tomates?

— Não mesmo. Gosto de fatiá-los bem fininho. Podemos conversar?

— Eu prefiro comer, se não se importa. Amanhã teremos tempo para isso.

— Amanhã? No dia do casamento?

— Daremos um jeito, advogada.

Jantamos calados, cada qual perdido em seus próprios pensamentos. Cada movimento dele era preciso e me vi gostando de observar a estrutura de seu maxilar. De vez em quando nossos olhos se cruzavam, o que era suficiente para me fazer perder a fome, já que tinha que lutar contra aquele frio irritante na barriga. Que diabos estava acontecendo comigo? Jurei não pensar mais em homens por um bom tempo, mas naquele momento, só conseguia pensar naqueles músculos embaixo da camiseta fina, e na textura suave de sua pele.

— Em que está pensando? — Disparou, me encarando.

— Em nada. — Respondo sem jeito.

— Então se já terminou de me analisar, — deixou–me vermelha de raiva — vou para o escritório. Pode deixar a louça na pia. Amanhã cedo eu mesmo arrumo.

Ele saiu da cozinha e eu não tive coragem de dizer uma palavra. Aquilo foi humilhante. Estava acostumada com argumentos, porém, tudo o que fiz foi fitá-lo boquiaberta. Arrumei a cozinha, sem querer dar motivos ao brutamonte para mais um comentário maldoso. Estava irrequieta demais e sem condições de pegar no sono. Pensei em dar uma volta pela fazenda, mas fazia frio e também não quis arriscar encontrá-lo lá fora.  Não me sentia cansada, apesar do dia ter sido extremamente agitado, mas mesmo assim fui ao quarto, me troquei e deitei.

A luz do luar entrava pela janela de vidro, e nem o som dos grilos cantando, me fazia conciliar o sono. Depois de muito rolar pra lá e pra cá, entre o sono e a vigília, ouvi o som de uma chave girando na fechadura, o que me fez sentar na cama, sobressaltada. A casa estava em profundo silêncio, por isso pude ouvir nitidamente o som de uma porta rangendo, ao ser aberta devagarinho. Um arrepio percorreu meu corpo. Apurei os ouvidos, e mesmo estando com o coração acelerado, sem saber qual a real causa daquilo, ouvi a porta se fechar, e logo, tudo voltou ao silêncio. Deitei-me intrigada, porém, meu lado racional dizia que devia apenas ser o Nick entrando no quarto; embora aquela vozinha zombeteira, insistia em dizer que o quarto do Nick era ao lado do meu, e o som que ouvira, era de uma porta bem à minha frente. Depois de um tempo, o som rangente apareceu de novo.

Pulei da cama e fui devagarinho até a porta, abrindo-a lentamente. Não queria ser pega no flagra caso fosse o Nick indo para o quarto. Espiei pela fresta o corredor escuro. Não havia ninguém. Apenas o silêncio. Abri mais um pouquinho da porta assim que ouvi um som, quase imperceptível, aos meus nervos à flor da pele. A porta do quarto da noiva de Nick, aquela que jamais ficava aberta, a qual era para eu nunca entrar, encontrava-se escancarada. Intrigada, resolvi ver quem abrira a porta. Estiquei o pescoço, chegando em frente à porta e olhei para dentro do quarto, iluminado apenas pela luz da lua, e pude notar que era muito parecido com o meu. Uma cama de casal, um guarda-roupa, uma cômoda de mogno, e um espelho oval com um suporte que o mantinha em pé, colocado perfeitamente ao lado da janela. Dei uns três passos, pé ante pé, tomando coragem até adentrar, já que a curiosidade era bem maior do que o medo que sentia de ser pega ali. Não havia ninguém no quarto, então, quem abrira a porta? Coloquei mais um pé para dentro e chamei baixinho:

— Olá! Tem alguém aí?

Não conseguia entender porque meu coração batia tanto em meus ouvidos. Era a atmosfera sombria e fria do lugar que me incomodava. Uma sensação de impotência e tristeza se apossou de mim. Caminhei até à cômoda, quando senti algo roçando em minha perna, e com o susto, acabei soltando um grito. Olhei para o chão e havia um gato me olhando curiosamente.

— O que você pensa que está fazendo aqui? — Perguntou aquela voz dirigida a mim, cheia de raiva, enquanto o olhava estupefata.

— Eu ouvi um barulho. A porta estava aberta...

— Essa porta nunca está aberta. — Seu olhar era tão feroz, que me deixou realmente assustada.

— Pois estava aberta sim. — Defendi-me sentindo a raiva crescer dentro de mim.

— Dê-me a chave. — Ordenou estendendo a mão.

— Eu não tenho a chave. Já disse. A porta estava aberta.

— Saia daí, advogada. — Disse por entre os dentes. Vi seu maxilar se contrair.

Obedeci. Quando passei por ele, a porta se fechou com um estrondo, deixando-nos boquiabertos.

— O que foi isso? — Perguntei assustada.

— Deve ter sido o vento. — Respondeu inseguro, ao mesmo tempo em que levava a mão à maçaneta.

— Está trancada? Não consegue abrir?

— Não.

— O gato. Havia um gato lá dentro. — Disse perplexa.

— Deve ter saído junto com você. Vá para seu quarto. — “Rosnou”, passando a mão pelos cabelos.

— Vou, mas não porque está mandando. O que está acontecendo, Nick? — Perguntei e ele me olhou como se não me visse.

— Vá se deitar, por favor. — Pediu me deixou só, a olhar aquela porta misteriosa.

Retornei ao quarto, mas não consegui ficar na cama. Odeio as coisas quando não consigo clarificá-las. Aquelas pessoas agiam de modo nada convencional. Primeiro a moça do cavalo que só me ignorava. Portas que misteriosamente se abriam e fechavam com estrondo. E sem falar no cara arrogante que me deixava inquieta cada vez que punha meus olhos nele. Andei de um lado para outro até me sentir esgotada. Quando resolvi me deitar, ouvi vozes lá embaixo. Curiosa, desci a escada vagarosamente. Da sala, pude ouvir Nick conversando com alguém no alpendre. Aproximei-me da janela, e afastei a cortina. Uma moça estava ali, de frente para ele, com as mãos em seu peito, enquanto suplicava:

— Nick, por favor — pedia a morena aflita — Vamos fugir. Não suporto mais isso.

— O que a faz pensar que fugiria com você, Roberta? — Perguntou, enquanto tentava tirar as mãos da moça de seu peito.

— Você me ama. Eu te amo. Não posso me casar amanhã. Venha comigo. Podemos ir a qualquer lugar. — Implorava, agarrando sua camiseta.

— Roberta, eu não sei de onde tirou a ideia de que a amo — disse, passando a mão pelos cabelos, cujo gesto, já se tornara um hábito — Vá embora antes que alguém a veja aqui.

— Não posso. Quero você Nick. Não sei viver sem você. — Descansou o rosto em seu peito, de forma íntima.

— Santo Deus, Roberta. Eu não te amo — afastou-a bruscamente, segurando-a pelos punhos — Não quero nada com você. O melhor que faz é se casar amanhã. Todos esperam por isso, inclusive seu pai.

— Você ainda a ama?

— Isso não é da sua conta. — Soltou-a e se afastou.

— É por causa da advogada? A cidade inteira já sabe que sua advogada veio te procurar. Você a está hospedando em sua casa, ou em sua cama? — perguntou com raiva — Está tendo um caso com ela?

— Roberta, para com isso. — Pedia entredentes, enquanto se defendia da moça que socava seu peito.

— Quando Marilia foi embora, pensei que seria meu, mas não! Ficou com esse olhar desolado por tanto tempo, que quase acreditei que sentia realmente a falta dela. Mas era tudo mentira, não é? Você bem que gostou quando ela se foi! Não perdeu tempo em arranjar outra para aquecer sua cama.

— Você não sabe o que está dizendo. Vá embora, Roberta, ou não responderei por mim.

Ela o olhou com uma fúria mortal, e para meu espanto, e acho que para dele também, se jogou literalmente de boca sobre seu peito e o mordeu com tanta força, que quando o soltou, havia sangue em seus lábios.

— Lembre-se dessa noite, Nick. Juro que nunca vou esquecê-la.  — Disse, e seguiu correndo para o carro, enquanto tratei de correr para escada.

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