Capítulo IX.

Milena Bianco.

Sabe quando você tem a sensação de estar vivendo um verdadeiro sonho? Pois então, é exatamente isso que eu tenho sentido nesses últimos tempos, desde que Clara e eu começamos a nos aproximar dessa maneira. E caramba! Não poderia estar sendo melhor e a felicidade que tem habitado em mim, parece inexplicável. Quando eu, Milena Bianco, iria imaginar que, aquele simples crush pela minha professora de biologia iria chegar em algum lugar? É fato que, por longo desses anos, eu ficava pensando, imaginando e cenas de nós duas em minha mente, mas que pessoa apaixonada nunca fez isso? Eu imaginava, mas não tinha esperanças, para mim, sempre foi algo extremamente longe da minha vivência e agora, olha só, cá estou eu, toda boba, ao me pegar presa nas lembranças dos beijos de Clara.

Mas a única coisa que me deixa meio para baixo com toda essa situação, é saber que isso não é certo e que, na pior das hipóteses, se ao menos, alguém sonhar em descobrir isso e querer usar contra Clara, ela pode até perder seu emprego. E é por esse e outros motivos, que, mesmo estando muito feliz com tudo isso, eu vou tentar ir com calma, tanto por Clara, quanto por mim mesma. Aliás, não sei nem como será daqui para frente, se para ela isso não passa de uma ficada, ou algo do tipo, mas a forma como ela falou comigo quando veio me trazer em casa, me deixou mais segura e eu vou tentar me lembrar disso em todas as vezes que essa minha mente teimosa, tentar me auto-sabotar.

E eu preciso assumir que, se antes já era difícil agora então, eu não paro de pensar naquela morena. Sério, acho que nem se eu quiser, consigo explicar a sensação maravilhosa que está sendo poder conhecer mais um pouquinho sobre essa mulher que eu admiro tanto. O nosso encontro e a nossa conversa no café, foi algo que ajudou bastante em nossa aproximação, tivemos um papo tão gostoso, que no fim das contas, nem vimos o tempo passar. Soube algumas de suas histórias do passado, seus perrengues da faculdade e da vida profissional, Clara me contou sobre sua irmã, Kelly e como surgiu o projeto do C&K's bar, também conversamos sobre Heitor e suas peripécias. E no fim do passeio, acho que não conseguia mais parar de sorrir, tanto pelo clima tão agradável que se instalou entre nós, quanto por saber que, todo esse momento, partiu por um convite de Clara.

(. . .)

Hoje é segunda-feira, a manhã no colégio passou voando e agora, acabei de chegar em casa e enquanto minha mãe termina o almoço, eu aproveito para repassar a matéria da prova de história de amanhã que, ainda bem, é a última do bimestre. Meia hora depois, deixo meu quarto e sigo para a cozinha e fico brincando com Phellipe que, em meu colo, permanece entretido com alguns de seus brinquedos, enquanto fica gungunando e eu respondo, como se estivéssemos em uma conversa animada. Eu fico tão feliz em ver o quanto meu pequeno está ficando cada dia mais interativo e esperto, nos enchendo cada vez mais de orgulho.

Ouço a porta da sala se abrir e alguns segundos depois, meu pai aparece na cozinha. Assim, almoçamos todos juntos e quando dá meu horário de ir para a livraria, ainda ganho uma carona quando ele tem de voltar para o trabalho.

   — Boa tarde, senhor Heitor. — cumprimento o senhor que está parado próximo à porta.

   — Boa tarde, Mi. — ele sorri, divertido. — Posso te chamar assim?

   — Claro, claro que pode. — sorrio também, segurando as alças de minha mochila.

   — Meu neto fala tanto em você, te chamando assim... — se encaminha ao meu lado, até o balcão. — ele e a Clarinha...

O que? Como assim? Clara anda falando de mim em casa? Socorro!

Uma pequena risada de meu chefe me tira de meu pequeno transe. Sinto o meu rosto corar e percebendo isso, logo o senhor muda de assunto.

   — Se lembra que nos despedimos de Rebecca na semana passada, né? A mudança com os pais... — eu concordo. —  pois então, hoje chegará a nova funcionária, se chama Alice. Você pode fazer as boas vindas para mim? Preciso resolver algumas coisas com a minha filha e acho que isso tomará algum tempo.

Clara vai vir aqui hoje? Ai meu Deus! Como eu vou esconder a minha cara de besta na frente do pai dela? Se bem que, pela forma que ele fala, Sr. Heitor já deve ter percebido há um tempo o quanto eu me derreto por sua filha.

   — Quando Kelly chegar, diga a ela para ir até minha sala, por favor... dessa vez não é Clara quem virá. — ele diz e em seguida ri da minha expressão. — Como consegue ficar fora do ar assim, de uma hora para a outra? — brinca. — Isso é coisa de gente apaixonada... — se vira e segue para a sua sala.

É, senhor Heitor, realmente é coisa de gente apaixonada. Uma pessoa apaixonada por uma deusa, linda, incrível e dona de um sorriso maravilhoso, que também conhecida como sua filha mais nova, Clara Herrera.

A porta da livraria se abre e logo avisto a cabeleira ruiva passando por entre as estantes. Ela se aproxima sorrindo. Realmente, as irmãs Herrera são um espetáculo.

   — Boa tarde! Milena, certo? — estende a mão, me cumprimentando. — Ninguém teve a decência de nós apresentar direito. Eu sou Kelly Herrera,, irmã da Clara, que você deve conhecer bem... — sinto meu rosto esquentar e a mulher dá uma pequena risada. — afinal de contas, ela é sua professora.

   — Prazer em te conhecer, Kelly. — sorrio, apertando sua mão. — Seu pai está te esperando na sala dele.

   — O prazer é meu, Milena. Até mais, obrigada.

Ela entra e então eu fico sozinha por mais alguns minutos. Meu Deus, será que ela sabe o que está acontecendo entre Clara e eu? Ah, com certeza deve saber. As duas parecem ser muito unidas e pela forma que ela falou, eu tenho certeza que Clara comentou algo. Nossa, eu nem soube disfarçar essa minha cara de idiota e, provavelmente, passei uma grande vergonha ao conhecer a irmã da mulher que gosto. Eu sou uma besta mesmo!

Agora, sem Rebecca aqui para conversar, o tédio se instala no local que, ainda não está muito movimentado. Organizo algumas coisas que estão fora do lugar, e fico alguns minutos girando na cadeira que há atrás do balcão.

Que Sr. Heitor não saia de sua sala agora!

Paro no susto quando a campainha soa novamente, e dessa vez, quem entra é uma moça, provavelmente uns dois anos mais velha que eu. Saio de trás do balcão e me aproximo, ela sorri de forma simpática.

   — Olá, eu sou Alice, a nova funcionária. — estende sua mão.

   — Ah, Sr. Heitor me falou sobre você. — aperto sua mão, sorrindo também. — Prazer, eu sou Milena Bianco.

   — O prazer é todo meu, gata. — dá uma piscadinha. — Pelo visto, vai ser ótimo trabalhar aqui...

   — Bom, eu vou te mostrar algumas coisas por aqui... — digo após alguns segundos de silêncio, passando a andar um pouco à sua frente. —  Sr. Heitor está um pouco ocupado no momento, mas logo vai conversar com você. — ela concorda.

Sigo mostrando a livraria para Alice que parece bem interessada e empolgada com o novo trabalho e, por fim, lhe repasso o que Sr. Heitor havia me pedido, que é especificamente sobre a sua função. Logo o movimento no local começa a aumentar, o entra e sai de pessoas se intensifica e por algumas vezes preciso ajudar Alice que, ainda parece um pouco perdida.

Algumas horas após ter entrado, Kelly sai da sala de seu pai. A ruiva passa por mim, quando estou próxima à porta, se despede e vai embora.

Nossa, preciso contar para Alexia o quanto a nova crush dela é cheirosa.

Sorrio sozinha de meu pensamento e sigo com os atendimentos. Hoje, fechamos um pouco depois das seis, já me encontro andando um pouco mais a frente, quando ouço Alice me chamando. Não estou muito afim de esperar, acho que estou doida para chegar em casa, mas acabamos seguindo conversando por boa parte do caminho, até termos de seguir por lados opostos. Durante nosso papo, acabei descobrindo que ela veio de uma cidade do interior e está tentando se reerguer e seguir sua vida após a morte de seus pais.

Chego em casa um pouco antes das sete da noite e me espanto ao ver Alexia e Henrique sentados no sofá, assistindo filme com minha mãe. Ok, o que foi que eu perdi?

   — Olá! —  dou um aceno geral e me jogo no meio deles.

Minha mãe me cumprimenta com um beijo na testa e se levanta.

   — Cadê seu celular? Não responde mensagem, não atende ligação. — me repreende e eu pego o aparelho constatando que está sem bateria.

   — Acabou a bateria e eu nem vi. — viro o celular para que eles vejam. — Ao que devo a honra da ilustre visita de vocês?

   — O Rick estava lá em casa, aí a gente pensou em ir lá no pub da professora Herrera e da irmã gostosa dela. — Alexia começa, recebendo um olhar de minha mãe por suas últimas palavras. — Desculpa, tia Estella.

    — E como você não atendia celular, nem via as nossas mensagens, resolvemos vir te falar pessoalmente. — Henrique conclui. — Já falamos com Anna, Valentina e Cecília, só falta a senhorita confirmar.

   — Vamos, Mi! Até sua mãe já deixou...  — Alexia praticamente se joga em cima de mim. — comemorar o fim da semana de provas. — junta as mãos e me olha com a expressão mais pidona do mundo. — Por favor, loirinha.

   — Mas as provas terminam só amanhã... ok, eu vou. — dou um tapa em sua testa, e ela faz uma careta. — Pelo visto, vocês já tinham certeza né? Vieram até de mochila.

   — Se você não aceitasse, a gente ia partir para a chantagem. — Henrique ri. — Vai que você encontra a professora Herrera por lá? — diz em voz baixa, quando minha mãe deixa o cômodo.

Enquanto eu tomo banho, Alexia e Henrique usam meu quarto para terminarem de se arrumar. Um suspiro satisfatório sai da minha boca quando sinto a água quentinha em contato com meu corpo e alguns minutos depois, quase que instantaneamente meus pensamentos se transportam para Clara. Será que ela estará lá no pub? Deus me ouça que sim!

Termino meu banho, saio do banheiro só de toalha e, carinhosamente, expulso meus amigos do quarto, afim de vestir minha roupa. Demoro alguns minutos na escolha do que vestir e como se estivesse adivinhando minha dificuldade, logo Alexia praticamente arromba a porta do meu quarto, com suas batidas nada delicadas.

   — Vamos, Milena, eu sei que você precisa de ajuda. Abre a porta aí.

Abro a porta e minha amiga vai direto rumo à pilha de roupas que está sobre a minha cama. Nada me parece satisfatório o suficiente e enquanto a morena tenta montar algo que me agrade, pego meu celular, ponderando se mando ou não mensagem para Clara. Fico nessa dúvida por longos minutos, até ter Alexia me encarando, com algumas peças de roupas em mãos.

   — Eu sei que você está doidinha para saber se ela vai estar lá. — minha amiga diz. — Mas ficar olhando pro celular não vai te fazer adivinhar.

Suspiro, e alguns segundos depois, meio hesitante, abro o aplicativo de mensagens e procuro pelo contato de Clara. Digito e apago algumas vezes, até, finalmente, clicar em enviar.

“Boa noite, Clara! Tudo bem?” – MB.

Ela demora quase dez minutos para visualizar, mas assim que o faz, me responde.

“Boa noite, Em! Tudo bem sim e você, linda?” – CH.

“Estou ótima, mas ficaria ainda melhor se soubesse que você fosse ao pub hoje. Estou indo lá e queria muito, muito ver você.” – MB.

“Uau! Que tipo de conexão é essa? Acabei de deixar o Heitor na casa dos meus pais e estou indo para o pub. Vou ficar muito feliz em te ver lá. Está indo com seus amigos?” – CH.

“Sim, mas me animei mais ainda agora que sei que você vai.” – MB.

“Olha, que já fique avisado aqui, que eu vou roubar você por alguns minutinhos, certo?” – CH

“Eu vou adorar, pode me roubar pelo tempo que quiser e achar necessário. Vou terminar de me arrumar e nos encontramos lá, até logo” – MB

Acho que meu sorriso se alarga bastante, no momento em que, mais uma vez, passo meu olhar pelas mensagens trocadas com Clara. Pelo visto, nem consigo disfarçar muito bem a minha expressão idiota, já que, logo sinto Alexia, de forma nada delicada, me atingir com um travesseiro.

   — Pelo visto ela vai, né? — pergunta e eu concordo. — Então, faz o favor de se vestir. Já está tudo separado ali. — aponta para a minha cama.

Pego as peças que minha amiga separou e quando termino de me vestir, por alguns segundos, fico encarando a sandália de salto sobre a minha cama. Alterno meu olhar entre o objeto e Alexia, que apenas dá de ombros, voltando sua atenção ao seu celular.

   — Vai querer ir de tênis? Bota? Chinelo? Não né, Milena? Pelo amor de Deus!  — reviro os olhos. — Anda logo, que nós já estamos atrasadas.

Termino de me arrumar em pouco mais de vinte minutos, poderia até ter sido antes, mas Henrique praticamente me jogou sentada na cama para Alexia me maquiar.

   — Você está muito gata, Milena! — Henrique me mede da cabeça aos pés. — Agora vamos, que tem uma deusa te esperando lá no pub e, com certeza, doidinha para te dar uns beijos.

— Gata eu já sou, vocês têm que entender isso. Mas muito obrigada mesmo assim.  — sorrio, dando uma última olhada no espelho. — Certo, vamos.

Minh mãe se oferece para nos levar e eu agradeço sua crise repentina de gentileza, já que Estella Bianco prefere cruzar toda a cidade andando, do que dirigir. Seguimos para o pub e, entre conversas aleatórias e risadas, o percurso dura pouco mais de vinte minutos.

O local já está bem cheio quando chegamos. Escolhemos uma mesa, próxima ao pequeno palco em que uma banda canta rock e, enquanto nosso amigos se sentam, eu e Alexia vamos até o balcão pedir nossas bebidas. Automaticamente deixo meu olhar correr pelo estabelecimento a procura de Clara, mas a grande movimentação de pessoas no local, não permite que, pelo menos por hora, eu à encontre. Fico por quase meia hora conversando com meus amigos, até sentir Anna cutucar meu braço de um lado e Valentina fazer o mesmo no outro braço.

   — Que isso, gente?! — seguro as mãos das duas, alternando meu olhar entre elas.

   — Olha para frente, sua lerda. Encontramos quem você está procurando. — Anna diz, olhando para o bar.

Fico por alguns segundos de boca aberta, numa evidente surpresa, encarando Clara que, está de pé, próxima ao balcão do bar. Meu Deus, como ela está linda! Sinto Cecília passar um guardanapo no canto da minha boca. Claro que meus amigos não iriam perder a chance de me zoar e tirar sarro da situação. Mas eu, realmente, não estou me importando. A única coisa que se passa em minha cabeça, é o quanto Clara Herrera está deslumbrante.

   — Vou precisar te arrastar até lá, Milena? — Alexia se levanta, cruzando qseus braços contra o peito.

   — Não, pode deixar. As minhas belas pernas podem me levar até lá. — dou língua e minha amiga retruca. 

Saio da mesa ainda, ouvindo as piadinhas dos meus amigos e  conforme vou me aproximando, a visão de Clara me parece mais perfeita a cada segundo. Um conjunto todo na cor preta, com um cropped que deixa a mostra uma pequena faixa de sua barriga e a saia batendo pouco acima de seu joelho. Como diz Ariana Grande ‘God is a woman'.

 Quem me vê primeiro é Kelly, ela olha para a irmã e tosse, uma tosse muito falsa por sinal, indicando a minha chegada. O cenho franzido de Clara se desfaz em um sorriso quando me vê. Me aproximo, ainda meio tímida e sou recebida de forma muito simpática.

    — Ei! — ela se levanta, e me cumprimenta com um abraço e um beijo no rosto. — Você está linda. — fala próximo ao meu ouvido, e eu nem preciso falar que me arrepiei inteirinha.

   — Não mais que você, meu bem. — digo e vejo o sorriso em seus lábios aumentar. — Bom, a Kelly você já conhece. — aponta para a ruiva que também me cumprimenta com um beijo no rosto. — E essa é Jéssica, praticamente uma irmã também. — nos cumprimentamos.

Ficamos conversando por alguns minutos. Eu já percebi que Kelly é bem extrovertida, um pouco diferente da irmã, que é mais fechada e agora, estou conhecendo Jéssica que parece ser ainda mais extrovertida que a ruiva, se é que isso é possível. A todo momento as duas lançam olhares que eu diria, serem bem sugestivos, para Clara que disfarça, ou apenas sorri. Fica bem óbvio para mim que elas sabem de nós.

   — Acho que as pombinhas querem ficas à sós. — Kelly diz, fazendo Clara se engasgar com sua bebida. — Vamos circular, Jéss! — pega na mão da ruiva, que ri e a segue.

Clara balança a cabeça de forma negativa, mas logo começa a rir. E que risada maravilhosa, gente.

   — E seus amigos, onde estão? — pergunta após alguns segundos.

Aponto para a mesa e logo o grupo acena em cumprimento à Clara e ela faz o mesmo. Chamo o barman para pegar mais uma bebida para mim, mas antes que ele se aproxime,  Clara me puxa pela mão. Mesmo sem entender e saber para onde estamos indo, eu a sigo. Saímos do grande fluxo de pessoas e andamos por um corredor, até chegarmos em uma sala no final dele.

   — Esse é o "escritório" do C&K's bar. — fala, antes que eu diga algo. — Eu sei que é meio chato precisar ficar se escondendo desse jeito... — sorri, sem graça.

   — Já ouviu falar que escondido é mais gostoso, hum? — brinco e ela ri concordando, quando me aproximo. — É o seu emprego que está em jogo, nada mais justo. — acaricio seu rosto, deixando um beijo no canto de seus lábios.

Dou uma rápida olhada pelo local e percebo que há muito de Clara nele. A decoração vai entre o preto e o vermelho, tudo muito bonito e cheio de detalhes que refletem bem a sua personalidade. Além de uma mesa de madeira no centro, um sofá preto em um canto e alguns quadros espalhados pela parede. Enfim, só fica ainda mais claro que, além de tudo, Clara Herrera tem um bom gosto enorme.

   — Aqui é a parte que eu mais opinei na hora de decorar... — conta. — Kelly queria tudo em verde, acho que, se dependesse dela, estaríamos em uma floresta aqui dentro.

   — Ficou tudo muito lindo, você tem muito bom gosto. —  digo e ela concorda, sorrindo. — Não me olha desse jeito, que eu fico fraca, Clara... — suspiro, ao ter seu rosto bem próximo ao meu.

   — Claramente, senhorita Milena Bianco, eu tenho muito bom gosto. — sua expressão beira à malícia, mordendo seu lábio inferior. — Afinal de contas, olha essa garota linda com quem estou ficando.

— Clara... — deixo minhas mãos escorregarem por seus braços, até sua cintura.

Um gritinho sai da boca de Clara, quando a puxo para mais perto, unindo nossos corpos e em seguida nossos lábios, num beijo cheio de urgência,  que faz um calor subir por todo meu corpo. Uma das mãos de Clara procura meus cabelos, se emaranhando nos fios e puxando de leve próximo à nuca, enquanto a outra desce pelo meu braço até chegar em minha cintura. Damos alguns passos meio trôpegos e sinto Clara parar no momento em que se encosta na parede. Nossas carícias vão se tornando mais quentes e eu deixo minhas mãos descerem um pouco chegando em sua bunda, matando uma vontade bem antiga, apertando ali. 

Por alguns segundos, penso que Clara irá chamar minha atenção, ao perceber minha mão boba, mas ao contrário, ela apenas sorri e enlaça as pernas em minha cintura, enquanto deixo alguns beijos em seu pescoço, fazendo a mesma soltar alguns suspiros ao pé do meu ouvido. E de repente, o clima parece ter esquentando tanto! Procurando mais conforto para nós duas, me livro das minhas sandálias e sigo com Clara até o sofá, sem tempo para recobrarmos a respiração, outro beijo é iniciado. As mãos de Clara, ainda que de forma contida, passeiam pelo meu corpo, me causando alguns arrepios, fazendo com que eu me esforce um pouco para controlar a minha respiração meio desregulada. Fecho os olhos ao sentir suas unhas descendo pelas minhas costas, até chegar em minha cintura, onde ela aperta com firmeza, não deixando com que eu me afaste, mesmo quando os beijos são cessados.  

Deito a morena no sofá e me coloco delicadamente sobre seu corpo, logo  dando início a mais um beijo intenso. Me aproveito do contato e começo mais uma trilha de beijos molhados em seu pescoço, descendo até a parte descoberta da blusa, sentindo sua respiração pesada em meu ouvido, me fazendo crer que esse nosso momento, está a agradando tanto quanto à mim. Minhas mãos sobem pelo seu tronco, retirando sua blusa que, segundos depois, se encontra em um canto qualquer da sala. Fico por alguns segundos contemplando a visão, o colo, seus seios cobertos apenas por um sutiã preto com detalhes em renda, seu abdômen se contraindo a cada toque meu.

   — Você é tão linda, Clara... — sussurro ao pé de seu ouvido, deixando uma leve mordida em sua orelha.

Um novo caminho de beijos começa ali mesmo, no lóbulo de sua orelha e vai descendo até chegar em seu colo. Posso sentir o coro de Clara estremecer quando começo a distribuir vários beijos molhados pelo seu abdômen, trilhando um caminho até chegar ao cós de sua saia.

As coisas entre nós parecem esquentar mais e mais a cada segundo que se passa. Aos poucos, a vergonha, o receio de ambas parece estar se esvaindo, dando lugar à uma explosão de sensações extremamente boas, que fazem com que deixemos, de certo modo, o medo de lado e nos entreguemos à esse momento. Mesmo com a minha cabeça a mil, tudo isso me parece surreal e por segundos, chego a não acreditar que, realmente, estou aqui, em uma sala, sozinha a sós com essa mulher. Parece um sonho. Um sonho bem quente, aliás.

De repente, batidas na porta nos fazem parar. Encaro Clara por alguns segundos, mas a mulher que parece ensandecida de desejo, me puxa novamente e ataca meus lábios, enquanto suas unhas fazem um belo trabalho, que com certeza deixará algumas marcas em minhas costas. Mais batidas na porta, mesmo que à contra gosto, nos trazem de volta à realidade.

   — Ei, Clara! Eu sei que você está aí! — reconheço ser a voz de Kelly. — Abre logo essa porta, é urgente!

Uma expressão contrariada e até meio raivosa toma conta do rosto de Clara, a mulher se levanta, enquanto Kelly continua batendo de forma à porta de forma insistente..

   — Espera, Kelly! — grita. — Que merda, eu já vou abrir!

Após vestir novamente a blusa, Clara abre a porta e do sofá, eu vejo Kelly com uma expressão preocupada em seu rosto. Ela fala alguma coisa para Clara, mas entre tudo o que diz, só reconheço ouvir o nome de Juan Carlos. 

Meu Deus!

   — Milena, não sai daqui, ok?  — se encaminha até o grande espelho próximo ao sofá, arruma o cabelo e limpa o pequeno excesso de batom borrado em seus lábios

Dou de ombros e fico sentada no sofá, apenas ouvindo o barulho de seus saltos ao se afastar. Depois de pouco mais de dez minutos, começo a ficar preocupada e decido, mesmo contrariando o que Clara disse, voltar até o bar. Quando chego, já percebo a movimentação estar maior e em um canto do estabelecimento, ainda meio de longe, vejo Clara conversando com Juan Carlos. Ou melhor, grita visivelmente irritada, enquanto o homem parece que, a qualquer momento, irá explodir de tanta raiva. Sinto meu sangue ferver no momento em que ele segura e aperta o braço de Clara, dou alguns passos à frente, mas alguém me segura, me impedindo de prosseguir. É Jéssica, ela me olha e silenciosamente, pede que eu permaneça no lugar. Kelly passa por nós duas, acompanhada dos dois seguranças que estavam na entrada no pub.

A veia saltada na testa de Clara demonstra o quanto ela está nervosa, ela diz mais algumas coisas, enquanto os seguranças carregam Juan que, está visivelmente bêbado, para fora do local. Ainda é possível ouvir os gritos irados de Juan, ao olhar para frente, vejo Clara balançar a cabeça de forma negativa e logo depois ser abraçada por Kelly.  Fico alguns segundos parada, com receio de me aproximar, mas Jéssica me solta e anda rumo a amiga.

   — Clarinha, ele fez alguma coisa com você? — Jéssica pergunta, abraçando Clara.

   — Ele está podre de bêbado, veio encher o saco, me encheu de ameaças e xingamentos horríveis. — usa as mãos para secar os olhos e eu sinto meu coração apertar. — Que inferno! — grita, ainda nervosa.

   — Vamos, eu vou te levar pra casa. — Kelly diz. — E não adianta negar, vou só pegar minhas coisas e a gente vai.

Pela primeira vez desde que me aproximei, Clara volta seu olhar à mim e, de forma silenciosa, permite minha aproximação. Dou alguns passos e me aproximo, a envolvendo em um abraço, ela se aconchega, escondendo seu rosto na curva de meu pescoço e assim permanecemos por alguns minutos.

   — Fica bem, viu?! — deixo um beijo em sua testa, a apertando mais um pouco em meus braços.

Sinto ela acenar de forma positiva, mas ainda permanecemos no contato por alguns minutos e eu posso contar uns três suspiros profundos vindos da morena. Nos afastamos por alguns segundos e a mais velha deixa um beijo em minha bochecha.

— Se cuida, tá? — digo e ela concorda, acenando.

O abraço se repete e, enfim, nos despedimos. Kelly e Jéssica também se despedem e as três seguem para fora do estabelecimento.

Volto para a mesa dos meus amigos. Eles, como todos que estão aqui, viram o show que Juan Carlos deu quando apareceu, então, me contam o que aconteceu até o momento em que eu cheguei. Fico meio chocada e também com bastante raiva do meu ex-professor de história, por uma atitude tão babaca e, principalmente, por presenciar pela segunda vez, o quanto ele consegue deixar Clara tão vulnerável, sendo um verdadeira idiota.

Ainda ficamos no local por mais um tempo, vez ou outra, me faço presente nos assuntos de meus amigos, mas agora, a minha cabeça parece estar viajando para outros cantos. Desde aquele dia em que vi Clara após a tal discussão no com Juan Carlos no estacionamento do colégio, eu percebi que a separação deles não foi tão amigável assim. E agora, depois disso, depois de presenciar algo semelhante mais uma vez, eu tenho ainda mais certeza.

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