Camilly
Eu nunca entendi o porquê dos meus pais me odiarem tanto, desde pequena, nunca tive nada deles, nem amor, atenção ou algo parecido, tudo que eu recebi de afeto foi da minha babá, que se parecia mais com uma mãe. Hoje estou completando quinze anos, e para variar, os meus pais nem se lembraram. Minha mãe mal fica em casa, vive em salões de beleza ou em clínicas de estéticas, quando não é isso, sempre está em festas. Meu pai vive para o trabalho e para bancar os gastos que tem com a minha mãe.
Eu nunca pude sair sozinha ou mesmo ir a qualquer festa porque nunca deixaram e com eles não tinha conversa, se eu fizesse qualquer coisa errada, era surra na certa. Minha mãe não tinha dó, eu guardava em meu corpo as marcas, o meu pai nunca ligou, ele sempre fingia que não via, era omisso. Sempre me perguntei por que eles me odiavam tanto.
Se eles não queriam ter tido um filho, por que me colocaram no mundo?
Levanto-me, vou fazer a minha higiene, tomo meu banho, escovo o meu cabelo, coloco o uniforme do colégio, pego a minha mochila e saio do quarto, mas quando chego à sala para tomar o meu café, lá está ela toda arrumada, nem mesmo consegue me olhar nos olhos, antes de se levantar apenas fala:
— Quantas vezes eu tenho que falar para levantar-se mais cedo, depois se atrasa e o motorista tem que sair correndo para levá-la até o colégio.
— Como se a senhora se importasse se algo me acontecesse.
— Não me importo, mas, o motorista tem família, quem vai sustentá-los se ele morrer num acidente por sua causa?
— Não estou atrasada e nunca foi preciso que ele saísse correndo.
— Sente-se e tome seu café e não demore — fala encerrando o assunto.
— Sim senhora.
Ela se levanta da mesa e sai, respiro fundo, não vou chorar, passo por isso desde pequena, já devia estar acostumada, porém, estou cansada dessa vida.
— Bom dia, Camilly!
— Bom dia, Nina!
— Tenho uma surpresa para você, espere que eu vá pegar.
— Não precisa, eu só queria que eles pelo menos uma vez na vida, se lembrassem, mas sei que estou pedindo muito.
— Sabe o que eu penso filha? Que um dia seus pais irão se arrepender por tratá-la dessa maneira, só espero que quando isso acontecer, você ainda sinta amor por eles e que seja capaz de perdoá-los, mas vamos deixar isso para lá, olha, eu comprei um presente, sabe que não tenho muito, mas fiz questão de não deixar essa data passar em branco e as outras funcionárias fizeram um bolo.
— Como a vida é injusta, queria muito que fosse você minha mãe, não preciso de presente, só de amor e carinho.
— Não diga isso, se a Dona Paola, a ouvir, me manda embora.
— Um dia eu vou embora dessa casa e a levarei comigo.
— Eu só quero que você seja feliz, não quero nada, além disso, tenho você como uma filha e a sua felicidade é a minha, tome, abra seu presente, espero que goste.
Peguei a pequena caixa de suas mãos, quando abri tinha um colar com coração pequeno e dentro havia uma foto minha e dela quando eu ainda era um bebê, levantei os meus olhos que agora estão marejados, porque ela sempre lembrava e sempre que podia me dava um presente.
— Obrigada Nina, vou usar e nunca vou tirar.
— Eu gostei tanto dessa foto que mandei colocar nesse colar para que se lembre de que é amada, mesmo que eles a desprezem, eu a amo como minha filha.
Eu a abracei, ficamos por alguns minutos assim, enxugamos as nossas lágrimas, peguei a minha mochila e segui para a porta, o motorista já estava me esperando, e assim que o cumprimentei, entrei no carro e seguimos para o colégio.
Minha vida continuava a mesma. E assim, passaram-se três anos, terminei meus estudos e consegui passar nos exames para a faculdade. Em casa, nada nunca mudava, eu continuava sendo ninguém para os meus pais, que sempre estavam ausentes, de companhia, tinha os empregados quando estava em casa ou no colégio, onde eu só tinha um amigo, as meninas não gostavam de mim, mas eu não ligava.
Não teve a última aula hoje, por isso cheguei mais cedo, e quando estava subindo as escadas, escutei gritos vindos do escritório do meu pai, minha mãe está histérica, falando e chorando, eu voltei e fui até a porta para poder ouvir o que eles falavam.
— O que vamos fazer agora Carlos, vamos perder tudo, não quero ficar pobre, não aceito isso.
— Você sempre pensou só em você, e quanto a mim, que sempre trabalhei para que saísse por aí gastando tudo, eu quis aumentar o nosso capital, fiz o que muitos empresários fazem, investi, mas infelizmente a bolsa despencou, agora tenho que fechar a empresa e mandar todos os funcionários embora e ainda tenho que arrumar dinheiro para pagar todos eles.
— Tem que haver um jeito de sairmos dessa, fale com seus amigos, peça ajuda, diga que quando estiver bem novamente você paga.
— Você acha que é assim tão fácil! Quem em sã consciência seria louco o bastante para me dar dinheiro? Em que mundo você vive? Muitos deles também perderam o mesmo que eu ou até mais, e quem tem dinheiro não vai querer comprar uma empresa cujo dono colocou tudo a perder.
— Então venda essa empresa e com o dinheiro pague os funcionários, mas não pague tudo, e vamos sumir desse lugar.
— Você ficou maluca! Eu não vou para a cadeia por sua causa, não posso fazer isso com as pessoas que trabalharam por anos na empresa, não posso virar as costas para eles desse jeito.
— Então vamos ficar pobres por causa deles? É isso mesmo que você está me dizendo?
— Venda as suas joias, pare de ficar gastando dinheiro com clínicas e com suas idas em festas e as compras de vestidos que só usa uma única vez.
— Não vou vender nada!
— Então ficará sem nada.
Saí de trás da porta sem fazer barulho algum, subi as escadas e me tranquei no quarto, e agora o que eles irão fazer?
Ainda bem que consegui passar na faculdade Federal, como eu já estava planejando ir embora assim que fizesse os meus 18 anos, agora nada vai me impedir, como eles estão sem dinheiro, com certeza vão me tirar do colégio, só vou sentir falta do meu amigo. Sou tirada dos meus pensamentos quando a porta do meu quarto é aberta por Nina.
— Chegou cedo hoje?
— Sim não tive a última aula e estava ansiosa para chegar, queria te mostrar isso.
— O que é?
— Eu consegui passar na faculdade Federal, vou poder estudar medicina como sempre quis e sumir dessa casa.
— Camilly! Como estou feliz por você, menina, agora quem sabe as coisas mudem não é mesmo, vai contar para os seus pais?
— Não! Daqui a um mês é meu aniversário de 18 anos, atingirei a maior idade e poderei sair dessa casa para nunca mais voltar, eles nem sentirão a minha falta, e mais, agora que estão pobres, não vão se importar comigo, já que nunca se importaram antes, acho até que darão graças a Deus por eu estar indo embora.
— Como assim, pobres?
— Eu os escutei conversado, o meu pai perdeu todo o investimento que fez, terá que vender a empresa e minha mãe estava chorando por perder tudo, em nenhum momento eu os vi falar em meu nome.
— Isso quer dizer que vão me mandar embora juntos com as outras e ficarei sem emprego.
— Nina! Eu não pensei nisso, não vou poder te levar para a faculdade, não sei como será lá, mas, de uma coisa eu tenho certeza, de que se for preciso, vou tentar te ajudar e eu conseguir.
— Não precisa menina, eu consegui juntar um dinheirinho e comprei um cantinho para mim, é pequeno, mas é meu, esses anos de trabalho aqui me deram a chance de tornar o meu sonho em realidade, quanto a outro emprego, tenho experiência e vou conseguir arrumar com certeza, em outro lugar.
— Fico feliz por você, sabe que te amo muito né? Mesmo que a gente se separe por um tempo, eu nunca a esquecerei, e quando eu terminar a faculdade, volto para te buscar para ficar comigo, só espero que tudo que sonho se torne realidade, não quero mais ser podada como sou dentro dessa casa, já estou cansada deles.
— Ah, minha filha, não precisa, eu também a amo muito, não pude ter filhos e você foi à filha que sempre sonhei, se eu pudesse, a levaria comigo para bem longe deles, eles com certeza não merecem ser pais de ninguém.
Continuamos conversando, não desci para jantar, Nina trouxe para mim no quarto, segundo ela, eles jantaram calados, disse que minha mãe não parecia bem, mas, eu não ligava para eles, assim como ele faziam comigo, eu só quero que esse mês passe rápido para ter a minha liberdade.
CamillyO meu aniversário chegou e depois do que ouvi no escritório do meu pai, um mês atrás, as coisas em casa pioraram. Eram brigas todos os dias, minha mãe já não falava mais comigo, o meu pai parecia uma barata tonta de tanto que falava ao telefone ou ficava trancando dentro do escritório. Mas hoje, eu estava muito feliz, já tinha combinado tudo com Nina, que iria embora daqui a uma semana, sem ninguém ver, só estava esperando a documentação que viria da faculdade para isso. Deixei Nina responsável por qualquer correspondência no meu nome, para que os meus pais não a pegasse e descobrissem o que eu pretendia. Estava em meu quarto quando minha mãe entrou, pela primeira vez em anos, me surpreendendo. — Hoje é seu aniversário, vamos fazer uma comemoração entre alguns amigos de seu pai.— Por que hoje? Se nunca se lembraram do meu aniversário. — Por que sempre tem que questionar tudo?— Não estou questionando nada, há dezoito anos vocês nunca se lembraram de mim e hoje do nada resol
CarterOntem, depois de um jantarzinho de merda e de mostrar para a minha futura noiva quem é que manda, resolvi voltar para casa, sei que terei muito trabalho com aquela menina desobediente, mas, eu vou com certeza ter muito prazer em mostrar para ela, quem está no comando.— Jessica!— Sim senhor.— Quero que arrume um dos quartos de hóspede no andar de cima.— Para quem senhor?— Que eu saiba não lhe devo satisfação, faça o que eu mandei e tem mais, me casarei daqui um mês, não se esqueça do seu lugar, nunca deve me tratar diferente na frente da minha esposa. — Vai casar-se novamente, senhor?— Sim! Por que a pergunta?— Pensei que depois da morte de sua mulher, não fosse se casar novamente, não foi isso que sempre disse?— Isso quem decide sou eu, não você, não esqueça o seu lugar nessa casa.— Sim senhor.— Agora suma da minha frente, vá fazer seu trabalho, peça para que o Hernandes venha até o meu escritório.— Sim senhor.Vou para o meu escritório, preciso resolver alguns assu
CamillyDepois de tudo, acabei pegando no sono e não ouvi a porta sendo aberta, só quando escutei a voz do meu pai, foi que despertei.— Saia Nina! — disse com autoridade.— Camilly, quero que me escute porque eu só vou falar uma vez, quase me fez perder tudo essa noite com sua malcriação, ainda bem que ele não desistiu do contrato, porque se ele tivesse feito isso, eu não sei o que eu seria capaz de fazer com você, se estou fazendo isso, é porque não achei alternativa, e quando ele me fez a oferta, não pensei em recusar. Você um dia teria que se casar e nada melhor do que fazer isso com um homem que vai poder lhe dar tudo que sempre lhe dei ou achou que iria casar com qualquer um, o meu nome não vai para a lama. Eu só pensei em manter a nossa vida como sempre foi, mas nunca viu isso não é mesmo? Nunca deu valor para nada que lhe demos.— Você me vendeu como uma mercadoria barata para um homem que eu nunca vi, não pensaram que eu tenho planos para a minha vida, que não quero viver no
CarterAcordo com uma tremenda dor de cabeça, ontem depois que cheguei, destruí todo o meu quarto. Eu não posso e não vou deixar que o meu passado voltasse. Aquela vida miserável tem que ficar onde está. Se Victor pensa que eu tenho medo dele, está muito enganado. Ele parece ter esquecido quem eu fui naquele inferno e do que eu passei para chegar aonde cheguei.Levanto-me para ir tomar o meu banho, assim que coloco o pé fora da cama, olho para onde estou, não me lembro de ter vindo parar no quarto de hospede, pelo visto bebi demais.Assim que saio do quarto, vou para o meu, quando eu abro a porta, vejo que está todo arrumado, com certeza foi a Jessica quem fez isso, vou para o banheiro, deixo que a água fria banhe o meu corpo, mas, minha cabeça lateja, quando eu fecho o chuveiro, me enrolo na toalha e saio, assim eu entro no closet, escuto a porta sendo aberta.— Senhor!— O que quer Jessica?— Trouxe seu café e um remédio, sei que com certeza deve estar com dor de cabeça, depois de q
CamillyDepois que voltamos, fui direto para o meu quarto, mas não demora muito e alguém entra, me viro, mas a pessoa que está na minha frente não me agrada muito.— O senhor Carter ligou, ele vai mandar o motorista vir buscá-la às 21h00min, disse que não quer atraso.— E por que eu tenho que ir até ele?— Não esqueça que ele é seu futuro marido e já tem direito sobre você, eu já avisei que você irá, esteja pronta.— Não pretendo ir, ele que venha, não posso imaginar o porquê disso agora, o contrato já foi assinado.— Você irá, de qualquer jeito, nem que eu tenha que arrastá-la desse quarto e entregá-la para ele pessoalmente.Ela se vira e sai, me jogo na cama revoltada, o que esse homem pode querer comigo? Tenho vontade de não ir, mas, sei que a minha mãe é capaz de fazer o que falou, respiro fundo, sei que nada de bom pode sair desse encontro.Como previsto, no horário combinado, eu estava pronta e vi quando um carro preto parou frente à minha casa, resolvi descer antes que ela vies
CamillyQuando entrei no carro, não conseguia parar de chorar, como ele foi capaz de fazer aquilo? Eu ainda sou virgem. Depois que passamos pelo portão, o motorista para o carro e me entrega um lenço.— Tome senhorita, limpe suas lágrimas, não pode chegar desse jeito em sua casa, seus pais não vão gostar de vê-la assim.— Os meus pais são iguais a ele ou pior.— Não fale isso senhorita, os pais amam seus filhos, lógico que existem alguns que nunca deveriam ter filhos, mas os seus com certeza vão ficar preocupados quando a vir desse jeito.— Com certeza não irão — respondo.Voltei o meu rosto para o outro lado, estava uma noite linda, sem nuvem, o céu estava cheio de estrelas, como eu gostaria de sumir e nunca mais encontrar com eles, todos são iguais, só queria entender o porquê estou passando por isso, já não basta tudo que passo com os meus pais, ainda tem esse homem tão cruel.Assim que o carro para em frente à minha casa, me despeço do motorista e desço, quando entro em casa, vejo
CarterEstou em meu escritório, quando Hernandes entra.— Senhor, bom dia.— O que foi?— Aqui está o relatório sobre a família Barrett.— Deixe aqui que depois vou olhar.— Eles já compraram uma casa, senhor, irão se mudar.— Isso é muito bom, quero-os bem longe.Ele só me olha e não fala nada, sei muito bem o que deve esta pensando, com certeza imagina o que eu fiz com a Camilly ontem, em silêncio, ele saiu da sala.Depois que termino de analisar o contrato da minha nova aquisição, pego o relatório que o Hernandes deixou na mesa e começo a ler, as coisas que leio não me agradam em nada, essa família tem muita sujeira, principalmente a mãe, que é uma mulherzinha imunda, uma verdadeira puta, e o trouxa do marido, sempre foi corno e não sabe, mas, eu vou acabar com eles depois, se acham que vão viver felizes para sempre, estão bem enganados, ligo para o Hernandes que me atende no segundo toque.— Senhor...— Hernandes, venha até a minha sala.— Já estou indo senhor.Não demora muito e
CamillyQuando o motorista me deixou na porta do colégio, assim que desci do carro, fui até o meu amigo que me esperava, depois de cumprimentá-lo, seguimos para dentro da instituição.— Que cara é essa Camilly? — pergunta Ryan. Não faço rodeio e conto que irei me casar. — Como assim se casar? Que eu saiba nem namorado tem, desistiu da faculdade assim?— Não vou mais, em menos de um mês estarei casada, e não sei se o meu marido me deixará estudar.— Então não se case, não pode deixar que seus sonhos mudem por causa de um casamento?— Foram os meus pais, eles estão me obrigando a isso, não tem como eu me livrar.— Os seus pais? Eles não podem fazer isso, em que século eles vivem? Não pode aceitar o que eles querem assim sem fazer nada.— A empresa do meu pai teve problemas e para não falir, teve que vender e o comprador pagou um valor bem maior, mas com uma condição, que eu me casasse com ele, e o meu pai aceitou, então, tecnicamente, eu fui vendida, para que as outras pessoas não perd