CAPÍTULO 2 JUANES CASANOSSA

O BARMAN SE CHAMAVA Juanes Casanossa, um porto-riquenho que entrara ilegal no país para fugir da pobreza e de tudo que sofrera nas mãos de seu pai, casou–se com Olivia – uma loira, obesa e extraordinariamente feia – não pelo peso em si, Juanes adorava mulheres gordinhas, dificilmente ele saia com alguma modelo esquelética, mas o problema para ele era que Olivia não se cuidava nem um pouco...

Um mínimo que fosse...

Ela vivia dizendo que era pecado tentar mudar o que Deus fez.

Mas também é pecado estragar ainda mais o que Deus fez... – pensava Juanes lutando entre seus pensamentos para conseguir entender as atitudes da esposa.

Olivia era uma pessoa completamente perturbada de espírito, vivia em depressão, comia o dia inteiro para aplacar algum demônio que insistia em perturbá-la. A igreja e seus preceitos eram apenas uma forma de esconder o que na verdade ela sentia por dentro, uma espécie de maquiagem da qual Juanes jamais se esforçou em descobrir...

Juanes se casou com ela para ser um cidadão legalmente reconhecido no país mais cobiçado para se viver e conseguir dinheiro fácil, mas tudo o que conseguiu até aquele momento sem sombra de dúvidas não fora dinheiro fácil.

***

SAN JUAN – PORTO RICO

JUANES FUGIU DE CASA e caminhou durante três dias. Roubava umas frutas para se alimentar e conversava com velhos para saber para qual lugar deveria ir.

— Você tem que ir para os Estados Unidos da América, garoto – disse um velho bêbado parecido com seu pai – lá é o melhor lugar do mundo, a terra das oportunidades e da igualdade.

Juanes começou a sonhar, principalmente depois que o velho mostrou uma revista da Playboy com fotos de diversas garotas nuas nos mais diversos lugares da América.

A oportunidade veio da forma mais inusitada.

Juanes estava no quintal de uma casa muito bonita, tentando pegar algumas maçãs e nem tinha percebido que alguém tinha se aproximado.

— Espero que alguém pague por isso – disse uma mulher rechonchuda quase bonita apontando contra ele uma espingarda.

— Me desculpe… eu juro, estou com fome…

— Todo mundo tem fome.

Ela sorriu.

— Mas tem um jeito de você me pagar por tudo isso.

— Me desculpe, eu.

A mulher pegou Juanes pelo colarinho e o levou para dentro de casa.

Naquela noite Juanes perdeu a virgindade.

QUANDO ERA DUAS HORAS da madrugada, Juanes acordou e se levantou cuidadosamente e viu que a mulher dormia sorrindo.

Que bom que alguém gostou…

Juanes viu algumas joias em cima de uma cômoda e as colocou no bolso e sorriu.

Mulherada americana, aí vou eu...

DOIS DIAS DEPOIS, Juanes conseguiu chegar ao porto onde estavam alguns navios ancorados.

— Por favor, vocês estão precisando de ajudantes?

— Quantos anos tem garoto?

— Dezessete, vou fazer dezoito daqui uma semana.

— E você aguenta trabalho pesado?

Juanes fez um movimento com os braços tentando mostrar o bíceps.

Todos riram dele.

— Claro, é um verdadeiro Hércules, é óbvio que te daremos um emprego, precisamos de um lombo novo em folha para amaciar... sobe aí.

Juanes ficou duas semanas vomitando por causa do balanço do mar, mas com o tempo foi aprendendo a controlar a ânsia.

Depois de dois meses no mar, Juanes já era um marujo nato, e trocou de embarcação outras quatro vezes, até o dia em que conheceu um capitão que fazia viagens clandestinas.

Juanes mostrou as joias, esse foi seu passaporte.

Um mês depois ele já estava vendo a Estátua da Liberdade em Nova York.

MARIA CASANOSSA RECEBEU uma carta do filho e ficou feliz por saber que ele estava vivo, mas não mostrou ao marido, para ele o filho estava morto e enterrado.

Enrico foi crescendo e quando tinha quinze anos de idade uma cena inusitada aconteceu.

Seu pai estava correndo, pois alguns policiais estavam–no caçando feito um bicho.

— Papá, o que aconteceu?

— Fica quieto garoto, matei uma pessoa para me salvar, só que agora a polícia está atrás de mim.

— E o que faremos?

— Precisamos fugir, vamos atrás de seu irmão.

— Juanes?

— Não, da Chapeuzinho–Vermelho, é claro que é do Juanes, sei onde ele está, sua mãe acha que sou idiota, mas leio todas as cartas que ele manda para ela.

COMO ERA ESPERADO, o plano de Juanes tirar sua mãe de Porto Rico era muito simples, e todas as pessoas que eles conversaram já estavam cientes do plano e tudo aconteceu exatamente como fora planejado.

***

OLÍVIA POR SUA VEZ, nem sempre fora obesa, até seus dezesseis anos de idade era de uma beleza ímpar no colegial, até se apaixonar pelo capitão de futebol da escola – Brad. Depois que ele a desvirginou, a largou no pátio da escola somente com a calcinha, fugindo e levando suas roupas, e todos na escola lhe tiraram sarro por diversos anos.

Depois desse maldito dia para ela, Olívia decidiu nunca mais se apaixonar enquanto respirasse, até o dia em que conheceu um imigrante ilegal chamado Juanes Casanossa.

Não que Olívia tenha se apaixonado logo no primeiro instante em que o viu, mas ela sentiu tamanha paz em estar ao lado de Juanes que decidiu dar novamente uma oportunidade a si mesma de ser feliz, e não seria um desgraçado infeliz qualquer que roubaria isso dela.

Olívia sentia um prazer descomunal em comer algo diferente todos os dias. Com o passar do tempo, comer virou um vício, um refúgio para sua angústia, ela jamais repetira uma comida em sua casa, todos os dias ela inovava, chegou até a escrever alguns livros que foram verdadeiros fracassos, afinal, não é só porque você cozinha bem que é necessariamente um chefe de cozinha reconhecida internacionalmente, e outra, as pessoas queriam comer e continuarem magras e bonitas, e a imagem de Olívia não ajudava muito, já que o mundo se tornara artificial demais para as pessoas de bom coração se darem bem com eles.

Com isso, Olívia acabava se afundando ainda mais na cozinha e em sua solidão, já que seu marido Juanes quase nem aparecia mais em casa.

JUANES CASANOSSA SENTIU o gosto amargo da frustração, já que não conseguiu ficar rico – muito pelo contrário – trabalhava como um louco para tentar o seu lugar ao sol...

Ou um burro de carga – como seu pai gostava de falar, sentindo pena de si mesmo.

Dia e noite ele trabalhava como um louco para ficar o mais longe possível de sua própria casa – para não se deparar com sua esposa irritante.

Juanes lembrou o que seu pai sempre dizia:

Marido de mulher feia odeia feriados e finais de semana...

Juanes sentia aquilo na pele agora, já que, todo dinheiro adquirido por ele, gastava sem peso na consciência com prostitutas e garotas fúteis que conhecia no bar do restaurante – ele era, indiscutivelmente, um rapaz boa pinta e bonito demais para aquela mulher feia e destrambelhada que tinha em casa.

Todos ficavam imaginando mil e umas situações completamente diferente quando viam aquele casal desproporcional zanzando por aí:

Um homem bonito com uma mulher completamente feia...

Muitos imaginavam que ela deveria ser extraordinariamente rica, outros, imaginavam que ele a conhecera em um momento em que ela era bela, mas depois de alguns filhos, ou problemas hormonais, ela não conseguira mais recuperar o corpo que tivera antes, apenas o que restava era o amor que dois sentiam um pelo outro, mas tinham outros tantos ainda que pensavam positivamente – o que levava a mente de muitos imaginarem–se naquela mesma situação – que Olívia deveria ser extraordinariamente quente na cama, e que Juanes se apaixonara por ela depois de uma noitada daquelas em que ela fez de “tudo” e mais um pouco, e ele ficara fascinado com aquela mulher, afinal, para aqueles que gostavam de mulheres gordinhas, ela era um prato cheio.

Mas a verdade nua e crua para Juanes era o seguinte:

Um: Olívia não era nada daquilo que eles pensavam, já que não era rica; dois: Não tinha nenhum filho – muito pelo contrário, Olívia era estéril – o que era bom para Juanes que nem sonhava em ser pai depois do desastre de relacionamento que tinha com o seu, e; por último: Nada excitante na cama, nem fazia nada além do “convencional”, isso é, quando fazia...

Juanes sempre arranjava uma desculpa esfarrapada para sair daquela grande encrenca em que entrara quando disse sim na igreja de St. Peter, e é claro, Olívia mesmo se mostrava desinteressada ao estremo quanto a esse assunto, fazia apenas para agradar o marido quando chegava bêbado em casa e não a deixava dormir.

***

JUANES ESTAVA OLHANDO o casal Heringer sentado à mesa e começou a se lembrar com alegria dos bons tempos em que Ivy trabalhava com ele como garçonete – o que ele sempre achou o fim da picada, afinal, ela poderia ser o que quisesse na vida, modelo, atriz, empresária... – e se lembrou também da incrível e inesquecível noite em que teve que pagar um café para David porque perdera aquela aposta maluca – para não dizer ridícula.

Onde ele estava com a cabeça para fazer uma barbaridade tosca daquelas?

Muitas coisas haviam mudado naqueles últimos anos, afinal, David – que não tinha dinheiro nem para pagar aquele mísero café se tornou um astro internacional da música, suas canções tocavam em todas as rádios, era o primeiro lugar disparado na Billboard nos últimos quatro anos seguidos, MTV e em todas as paradas de sucesso no mundo inteiro, seja TV, rádio ou internet, além do fato, também, mas não menos importante para Juanes Casanossa, de agora ele ser um milionário e sempre lhe pagar um café aonde quer que se encontrassem.

Ivy J. Heringer também mudara bastante, ele jamais acreditou quando ela falava que seria uma grande escritora de sucesso, filha de quem era, poderia ser o que quisesse na vida, mas era uma história mais maluca do que a outra que ficava difícil de acreditar em tudo que lhe falavam, afinal, a última coisa que se espera é que pessoas falidas ao seu lado vão ser melhores que você no futuro, e aquele era o caso...

Juanes não acreditara quando ela disse que era advogada...

Quem iria acreditar que uma advogada bem–sucedida, filha do maior empresário do século, e da escritora mais bem sucedida dos últimos anos vinte anos, escritora de vários ‘Bestsellers’, iria procurar emprego de garçonete?

O pior de tudo... – e mais cômico ainda – é que era a mais pura e incontestável verdade...

Juanes não sabia se ria ou se chorava diante daquela situação, porque ninguém em sã consciência iria querer aquela malfadada vida de garçonete naquele boteco de esquina de quinta categoria...

Se comparado aos restaurantes que seus pais poderiam pagar, ou até mesmo comprar...

Juanes estava olhando atentamente a cena que se desenrolava naquele momento e de certa maneira se sentiu feliz e frustrado ao mesmo tempo ao olhar o casal de amigos e sua felicidade.

David segurava delicadamente a mão de Ivy e lhe colocara um anel de brilhantes.

Juanes ficou pensando quanto tempo teria que trabalhar para sequer sonhar em comprar um anel como aquele...

Logo em seguida, Ivy colocou um relógio no pulso esquerdo de David, percebia–se descaradamente que ambos estavam muitíssimos felizes, o que trazia uma frustração dupla – quiçá, tripla em seu único coração.

Primeiro; porque Juanes tentou de todas as maneiras conquistar Ivy e desfrutar de uma vida de regalias e sonhos inimagináveis, Ivy era extraordinariamente bela, sensual, riquíssima e muito inteligente: e, segundo; Juanes era casado com a mulher mais infeliz de todo o mundo inteiro, não porque ela era feia, Juanes nunca ligou para isso, ele gostava de mulheres de todas as maneiras, gordas, magras (não muito magras, cheinha estava perfeito para ele), lindas, feias (ele usava o termo “as não tão bonitas”, porque no escuro ele dizia que toda mulher se comparava à Angelina Jolie), altas, baixas... e por incrível que pareça, para ele, as feias eram as mais incríveis na cama – menos Olívia –, que parecia uma estátua com pernas abertas, esperando ansiosamente que ele terminasse o mais rápido possível o que tinha que fazer para que pudesse dormir, e no dia seguinte pudesse voltar à sua rotina de comilança, infelicidade, encheção do saco alheio e pensamentos de suicídio.

Por mais que Juanes Casanossa pensasse no divórcio, mais ele tirava essa ideia ridícula da cabeça, afinal, para ele se tornara cômodo a situação de estar casado com Olívia, que dava a ele uma vida de mordomia, seu dinheiro era apenas para suas escapadelas noturnas e frivolidades que ela nunca teve satisfação de onde ele gastava seu dinheiro.

Nem sempre dava para sair com mulheres que pagavam suas próprias contas, e quando isso não acontecia o jeito era sair com uma prostituta e saciar sua fome de sexo.

Os sentimentos de Juanes eram os mais variados possíveis ao ver àquela cena incomum, não era todo dia que o casal mais famoso do mundo dava as caras por aí em um jantar romântico. Não era necessariamente inveja o que sentia, mas ele percebeu que fora o único naqueles anos todos que não evoluíra em nada na vida, muito pelo contrário, estava com vinte e cinco anos e a idade estava começando a afetá–lo.

 Estou realmente ficando velho...

Como diria seu pai:

Estou só o pó–da–rabiola...

Sua pinta de conquistador estava começando a abrir falência, a vida tinha sido uma mãe bondosa e caridosa na adolescência, mas hoje em dia era a madrasta da princesa que vestiu o sapatinho de cristal com um príncipe encantado aos seus pés.

David foi até o bar do restaurante, sentou–se e cumprimentou Juanes.

— Tudo bem, irmão?

— Claro – respondera Juanes, voltando seus pensamentos para o mundo real – mil maravilhas, como sempre, afinal, sabe como é... também faço meus showzinhos por ai.

Ambos deram risada.

— A vida passa, Juanes... espero que se encontre no meio do caminho.

— Ou me perca de vez...

DAVID E IVY SAÍRAM do restaurante e Juanes ficou trabalhando até às 02:00h da manhã, e isso vinha se tornando um ritual nos últimos tempos em sua vida.

Juanes chegou em sua casa com uma vontade louca de transar, mesmo que fosse com sua esposa Olívia. Tomou um banho bem quente e demorado – como sempre fazia para relaxar um pouco –, comeu um lanche de presunto e partiu para cima de Olívia como um gato que encontrava uma gata no cio.

OLÍVIA ACORDOU ÀS 04:17H da madrugada e sentiu a infelicidade abraçá–la como a amiga mais íntima que já teve em toda a sua infeliz e decadente vida. Ela olhava atentamente para seu marido e sentia pena dele, no fundo ela sabia que ele era um pobre coitado tão infeliz e decadente quanto ela. Olívia sentia um ódio mortal de Juanes por não ser como ele, Juanes por mais infeliz que fosse, ainda buscava em outros braços o que ela não poderia jamais dar a ele...

E ela?

E como poderia? Depois daquela noite...

Juanes era a cópia idêntica de Brad, o rapaz que fizera mil e umas promessas de amor para ela e depois que tinha conseguido o que queria, a largou sem roupa para viver o maior vexame de toda a sua vida.

Depois desse dia, Olívia jamais voltou a sentir prazer novamente em sua vida, nem mesmo com Juanes, por mais que ele se esforçasse, e ela sabia que ele tentava desesperadamente dar a ela um pouco que fosse de prazer.

Olívia em sua infinita inocência imaginou que se casando com alguém idêntico a Brad compensaria sua desilusão com a vida... mas como ela mesmo descobriu com o tempo... era tudo desilusão...

Uma terrível e frustrante desilusão...

Olívia começou a cozinhar coisas diferentes todos os dias para ver se era isso que estava faltando em sua vida, afinal, apesar dos pesares, cozinhar trazia uma realização para ela, ela realmente amava cozinhar... mas como tudo que já havia tentado em sua vã existência, aquilo também fora um tiro certeiro no pé com uma Calibre .12.

Sua vida era um verdadeiro lixo, seu casamento então...

Que casamento?

Ia de mal a pior, e seus pais não lhe davam a mínima, dizer que se sentia só nesse mundo era lucro, porque nem mesmo ela lhe dava a mínima...

Foi então que ela tomou a decisão...

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