Mundo ficciónIniciar sesiónAs manhãs na casa das Parker eram sempre barulhentas. Felícia ouvindo música alta no banheiro enquanto se arruma, Hazel andando pela casa reclamando que tudo por ali estava uma baderna e ao mesmo tempo, o vizinho de cima estreava a cama nova. Às sete horas da manhã!
— Eu mereço ter que ouvir essa baixaria logo cedo. Felícia, saí do banheiro que eu quero usar!
Hazel gritou enquanto guardava suas coisas na bolsa. Depois foi até a cozinha em busca de cafeína.
Ela fez seu café e voltou até o banheiro, se irritando com a porta fechada.
Se aproximou e bateu na porta com força.
— Oh madame, não existe só você no mundo, sabia? — gritou para a irmã sair.
Felícia então desligou a música e abriu a porta. Encarou Hazel com uma expressão esnobe.
— Quer entrar para quê se você nem se arruma?
Essa garota.
— E por acaso não mijo também?
— Credo, que linguajar — Felícia saiu do banheiro jogando seu cabelo curto e moderno.
Se parecia bastante com Hazel, exceto pelos olhos. Os de Felícia eram escuros como jabuticaba, enquanto os de Hazel pareciam bolas luminosas de mel.
Hazel revirou os olhos, abandonando o copo de café na pia antes de se aliviar. Com a porta aberta.
Existia muita intimidade entre aquelas irmãs.
Hazel observou a irmã bater com as unhas postiças no celular enquanto dava descarga. Até que enfim.
— Talvez eu chegue tarde hoje de novo — disse lavando as mãos. — Deixei dinheiro pra você em cima da mesa, pede uma pizza.
Felícia então olha para a irmã, assentindo. Depois arqueia sua sobrancelha bem delineada.
Ela se aproximou guardando o celular no bolso da calça.
Hazel foi empurrada para o banheiro antes de sair.
— O quê?
— Me deixe arrumar essa sua cara. Olha esse cabelo. Mana, você deveria cuidar do seu cabelo...
Felícia passava a mão na cascata de fios castanhos de Hazel.
Hazel ainda não tinha entendido o que havia dado nela.
— Eu cuido do meu cabelo. Você ouviu o que eu disse? — Hazel perguntou olhando a irmã atrás de si pelo espelho. — Felícia?
— Ouvi. Dinheiro na mesa. Pedir pizza. E você, me ouviu?
— Não tenho tempo pra isso.
Felícia impediu a irmã de fugir.
— Ah, ah. Nada disso. Venha e me deixe pelo menos te deixar apresentável.
Hazel então suspirou, desistindo de vencer a irmã. Felícia era como ela e por isso sabia que não desistiria até conseguir emperiquitá-la.
Primeiro, Felícia penteou os cabelos de Hazel e passou um produto cheiroso que eliminou o frizz. Nossa.
Hazel se encarou no espelho impressionada.
— Esse produto é ótimo. Importado e caro, mas vale a pena. Já deveria ter ele na sua penteadeira faz tempo. Ah, é — Felícia sorri para Hazel. —, você nem se maquia para ter uma penteadeira.
Hazel empurrou a irmã tirando dela uma risada.
— Já acabou? Tenho que trabalhar.
— Espera. Eu já volto.
Felícia saiu do banheiro e voltou com algumas coisas na mão e com uma camisa e um cinto jogados sobre o ombro.
— Tira essa camisa feia — ordenou.
Hazel olhou para seu corpo. Usava uma camisa azul, larga e colocada dentro da calça. Calça larga, aliás, com o jeans gasto.
Depois encarou Felícia.
— O que tem de errado com minha camisa?
— É seis números maiores que você. Parece que recebeu doações de roupas de um ex-obeso.
Aquilo doeu. Hazel tirou a camisa e colocou uma preta e bem coladinha no corpo. Depois Felícia passou um cinto fino de oncinha pelas tiras da calça.
Hazel não pôde deixar de pensar em como a irmã era boa com moda.
— Olha. Parece outra mulher — Felícia a virou pelos ombros.
Hazel se olhou no espelho e concordou que a diferença era gritante. Nada mal.
Se achou uma mulher diferente naquele instante.
— Agora vou dar um jeito em suas olheiras.
— Fe, eu tenho que trabalhar.
— E você vai, só que vai ir linda.
Com pressa para sair, Hazel não quis mais insistir. Quanto antes Felícia acabasse, mais rápido ela irá para a empresa.
Felícia foi rápida. Cobriu as olheiras com corretivo, passou um blush suave e um gloss rosado. Eca.
— Não gosto de gloss — Hazel reclamou.
— Hoje você gosta. Pronto. Está linda. Case-se comigo!
Felícia segurou a mão da irmã.
Hazel riu e a mandou se arrumar para não se atrasar para a escola.
Então saiu do banheiro atrás das chaves.
— Fe, você viu as chaves?
Silêncio.
— Felícia?
A garota saiu do banheiro com seu celular na mão. Depois mirou na direção de Hazel.
— Este não é seu chefe?
Ah, droga!
(...)
A St Tec estava um furdunço!
Repórteres na porta da empresa se amontoavam como formigas sobre o doce. A rua foi praticamente interditada, não se passava por ela sem antes afundar varias vezes a mão na buzina.
Hazel se espremeu entre eles para conseguir entrar.
— Com licença. Aí! Eu quero passar. Ai, meu cabelo... Ai!
É por isso que vivo de coque.
Cruzou as portas de entrada rapidamente. Os seguranças trabalhavam mais do que nunca naquela manhã, já que o poderoso Ulisses St Jhon foi flagrado vomitando após bater com uma Ferrari contra o poste estando alcoolizado.
Ele estava bem. Por Deus, como Hazel agradecia por aquele desmiolado estar andando devagar quando houve a batida.
Cumprimentou os seguranças, vendo um deles a impedir de entrar.
Hazel ergueu o rosto.
— Fred? Me deixe passar!
— Desculpe, senhorita. Apenas funcionários.
O que Felícia fez comigo?
— Fred, sou eu, Hazel. Eu só me maquiei hoje.
Fred esticou o pescoço para frente com uma mão no queixo. Eu mereço...
— Hazel...?
— Isso. Secretária do chefe.
Logo Fred sorriu sem graça, abrindo passagem para ela e pedindo desculpas.
Hazel acelerou seus pezinhos pequenos pela empresa. Algumas pessoas a encaravam, o que fez ela se sentir estranha.
Não sabia que andava tão desarrumada assim. Um gloss fez tudo isso?
Entrou no elevador soltando o ar em alívio. Ao chegar no andar que trabalha, deu de cara com duas moças desconhecidas.
Terninho cinza. Saltos. Óculos e expressão de sensacionalista. Repórteres?
O andar estava vazio.
Elas correram até Hazel.
— Ah, que bom. Eu sou Melissa Dalars, do Morning Show. Você pode me responder algumas perguntas?
— Eu...
— Não ligue para ela — a outra repórter empurrou a primeira e se apresentou. — Vim falar com Ulisses St Jhon. Ele se encontra?
Hazel negou com a cabeça.
— Vem cá, como vocês subiram aqui?
— Fazemos de tudo para uma exclusiva. Então, é verdade que o senhor St Jhon saiu do A.A há alguns meses?
Elas já estavam com bloquinhos na mão e canetas preparadas para a fofoca do momento.
Hazel ficou tão indignada que mal conseguiu falar.
— Vocês subornaram nossa segurança? — Hazel perguntou. — Terei que pedir para se retirarem.
— Não vamos a lugar nenhum — uma delas disse
Nesse momento o elevador se abriu. Ulisses!
— Ah, que merda! O que vocês estão fazendo aqui também?
Ele vinha até elas arrumando o cabelo e segurando um capacete preto.
— Oi, lindo.
Uma delas sorriu e se adiantou empurrando Hazel.
Ela cambaleou indignada.
— Espera, vocês se conhecem? — perguntou, irritada com a repórter atrevida.
E foi nesse momento que Ulisses percebeu que uma das mulheres ali, era sua amiga Hazel.
A desarrumada Hazel. Sempre usando coque no cabelo. Nunca maquiada. Nunca com rupas da moda. O óculos sempre na gola da camisa como uma vovózinha.
Por alguma razão, Ulisses sentiu seu coração disparar. Minha nossa, como nunca a vi assim?
Os olhos desceram pelo corpo da amiga.
Logo ela estralou o dedo contra o rosto dele.
— Ei, eu estou falando. Conhece elas? O que quer que eu faça?
Ulisses piscou rapidamente, se lembrando que sua empresa estava caótica.
— Oh, sim. Conheço, mas—
— Mas, você vai me levar para dar uma volta, não é? Que tal me dar uma entrevista exclusiva. Em nome dos velhos tempos — a repórter que falava com ele deu de ombros sorrindo.
Ulisses uniu as sobrancelhas.
— Eu não vou falar com ninguém. Por favor, saiam!
— Mas...
— Saiam. As duas. Haze, você pode falar para um dos seguranças vir acompanhá-las?
— Claro.
Hazel então se apressou até sua mesa, deixando que Ulisses falasse com as duas. De longe, com o telefone no ouvido, pôde ver o quanto o amigo estava a flor da pele.
A gravata de Ulisses estava com um nó forçado, como se tivesse feito movido pelo ódio.
Dois minutos depois o telefone estava no gancho.
— Estão subindo — ela disse se aproximando.
— Ótimo. Obrigada, Haze. Estou em minha sala. Passe lá depois — sussurrou a última parte, tocando ela no braço.
Depois ele passou deixando um rastro de seu perfume caro.
As repórteres se deram por vencidas quando Ulisses foi e não voltou. Os seguranças chegaram e as levaram de lá.
Finalmente Hazel respirou aliviada. Que loucas! A.A...?
Hazel riu a caminho do escritório do chefe.
Ela entrou sem bater.
Encontrou Ulisses fazendo flexão. Não era a primeira vez, então revirou os olhos e cruzou os braços se encostando na porta.
— É sério? Flexões?
— Gosto de me exercitar quando fico chateado.
Hazel soltou um Hum, fazendo ele a olhar enquanto subia e descia.
Depois olhou para frente.
— Está linda hoje. O que te deu para vir arrumada?
Hazel o encarou antes de responder.
— Felícia. Ela é irritante quando que alguma coisa, mas até que gostei.
Ela saiu da porta e andou até a mesa de Ulisses, se encostando nela agora. Também ficara mais perto de Ulisses.
Ele a olhou e sorriu.
— Eu também gostei.
— Obrigada.
Logo mudou o assunto.
— Ei, não vai me dizer o que aconteceu?
— Bebi demais, saí com a Ferrari e bati em um poste. Depois vomitei toda a porcaria que eu bebi — concluiu e se jogou no chão. — Meu bebê está no mecânico toda amassada.
Hazel riu. A Ferrari era mesmo o bebê de Ulisses.
— Antes ela que você.
— Owns, ficou preocupada comigo, coisa pequena? — ele fez um bico.
Ela apenas o encarou tediosamente, sem humor para as gracinhas do amigo.
— Poderia ter morrido. Eu te mataria se isso acontecesse!
— Mas não morri. E não vai acontecer novamente. Detesto beber como bebi ontem.
Ulisses fez uma careta infeliz. Droga de Bourbon.
— Então por que bebeu?
— Já disse que não sou do tipo que irá causar pena nas mulheres.
Ulisses deitou e cruzou os braços atrás da cabeça. Deitado no chão de seu escritório e com a camisa social aberta.
Hazel já o vira assim muitas vezes. Em algumas dessas vezes admirava o físico do amigo, mas em outras lhe parecia indiferente.
Suspirou se sentando no chão. Ela cruzou as pernas o olhando.
E seu olhar dizia tudo.
Ulisses deu risada.
— Não me olhe assim. Não irei te contar.
— Pensei que contávamos tudo um para o outro.
— Tudo. Menos isso.
Hazel cruzou os braços emburrada.
— Por que está agindo assim comigo? Te fiz algo?
— Claro que não, Haze. É que... Eu acho vergonhoso.
— Mais vergonhoso do que levar um bolo no dia do baile e acabar a noite com o nerd da escola?
Ulisses riu, ofendido.
— Está se referindo a você?
— Me conta logo o que está acontecendo!
Ele não conseguiria. Talvez sim, mas o que Hazel acharia dele?
Ulisses a olhou por alguns segundos. Os olhos dela, tão lindos, esperava ansiosa por uma resposta dele.
Um banana! Ela o achará um banana!
A opinião de Hazel sempre fora muito importante para ele.
— É que eu descobri que minha amiga vai se casar. Fiquei deprimido porque eu não me casarei tão cedo.
Deixou de lado a parte do voto.
— Está brincando?
— Não — Ulisses se sentou e apoiou um braço no joelho erguido. — Eu fiquei feliz por ela, não é isso. É que eu cansei dessa vida. Sempre quis um relacionamento, mas... Quer saber, deixa quieto.
Ulisses se levantou.
Hazel fez o mesmo.
— Espera, eu não estou te julgando. Bom, talvez um pouco. Mas é que você foi muito egoísta.
— Eu sei...
Ele se jogou na cadeira. Sabia que tinha sido um escroto, mas se sentiu infeliz. Não por Brenda, mas porque sua amiga é mimada e irritante, e mesmo assim encontrou alguém.
Depois de muito beber, Ulisses se sentiu um merda por pensar assim. E de fato era.
Ele realmente amava Brenda e estava feliz de verdade por ela. E se ele a amava, outro poderia ter conhecido o lado gentil de Brenda e aprendido a amá-la como ele.
Uma hora chegará a minha vez.
— Ei, não faz essa cara.
Ulisses levantou o rosto para ela. Que linda ela está hoje.
— Que cara estou fazendo? — perguntou sorrindo.
— Como se fosse um cara ruim. Não conto pra ninguém que ficou com inveja da sua amiga.
— Não é inveja. Sei lá, é... Indignação. Só interesseiras cruzaram o meu caminho. Fiquei chateado por ser o único a nunca cruzar o caminho com alguém legal, uma mulher de verdade. Entende, Haze?
A pergunta era real e ela percebeu nos olhos dele que Ulisses era de fato, menos cafajeste do que imaginara.
— Uma hora acontece. Olha pra mim, não estou preocupada com homens. Nem sei se quero casar.
Ulisses riu se encostando na cadeira.
— Você faz o tipo mulher sem dono mesmo.
— É... Mas quem sabe um dia. Dependendo do cara eu posso ceder um pouco.
Ela sorriu e pela segunda vez, o coração de Ulisses acelerou. Era bom estar com Hazel.
— Você é demais. Me sinto muito melhor.
— Amigos são pra isso. E da próxima vez vá beber na minha casa. Assim você fica jogado no meu tapete e não contra um poste.
Hazel sorriu e no fim, fechou a cara como se o repreendesse.
Ulisses balançou a cabeça.
— Ok. Farei isso.
— Ótimo. Preparado para a agenda do dia?
Ulisses suspirou esfregando as mãos.
— Manda.







