Celina riu, um pouco tímida. — Muito. Você canta com alma... E aquela primeira música... foi pra mim mesmo? Gabriel inclinou a cabeça, olhando diretamente em seus olhos. — Se não fosse, não teria graça. Posso sentar? Ela assentiu, e ele puxou a cadeira à sua frente. E naquele instante, no meio do bar, sob as luzes suaves e o som de um piano ao fundo, algo dentro dela começou a mudar. Gabriel com aquele jeito encantador que tinha, puxou assunto. — Então... — disse ele, apoiando os antebraços sobre a mesa, olhando para ela com aquele sorriso que não se esforçava para ser encantador, apenas era. — Gostou mesmo ou está sendo educada? Celina sorriu de lado, girando o canudo no copo com a pontinha dos dedos. — Você quer a verdade? — Sempre. — disse ele, sem rodeios. — Eu não esperava. Nem pela música, nem... por estar aqui. Tudo foi tão de repente. — Celina respondeu com sinceridade. — Às vezes, o que a gente precisa é justamente isso: um pouco de improviso. — Havia
Celina olhou para o teto por alguns segundos antes de responder. Parecia querer guardar cada pedacinho daquela noite antes de dividir com o mundo — ou, no caso, com Tatiana. — Ele me ouviu. E mais do que isso... ele me viu. — Como assim? — Tatiana perguntou, agora mais curiosa do que antes. — Ele não perguntou sobre o César, sobre o que me fez triste ou de onde vinha a dor nos meus olhos. Ele apenas... esteve ali. Me fazendo esquecer. Me fazendo rir. Me fazendo sentir... — ela hesitou, como se a palavra estivesse tímida dentro da garganta — leve. Tatiana sorriu, mas se manteve em silêncio, permitindo que Celina continuasse. — Foi como respirar depois de muito tempo sufocada. Como se o ar voltasse a entrar nos pulmões e eu lembrasse do que era estar viva. — Ela riu, meio sem graça. — E olha que nem foi nada demais... só uma conversa, umas músicas, um brinde e um beijo na bochecha. — Às vezes é isso que mais toca — Tatiana disse, suave. — A leveza. A ausência de esforço. O op
O despertador tocou suavemente, mas Celina já estava acordada. Pela primeira vez em semanas, havia dormido bem, sem sonhos turbulentos ou enjoos intensos. Sentia-se mais leve, como se a noite anterior tivesse aliviado parte do peso que carregava nos ombros. Se espreguiçou, pegou o celular e viu uma nova mensagem de Gabriel na tela. "Bom dia, linda. Que sua viagem seja incrível. E que você volte logo pra eu poder te ver de novo." Celina sorriu sozinha, sentindo um calor gostoso no peito. Respondeu um simples “Obrigada, Gabriel! Nos falamos depois”, e seguiu para o banho. Depois de se arrumar, tomou um remédio para enjoo – precaução essencial para a longa viagem até Dubai. Desceu as escadas e encontrou Tatiana na cozinha tomando suco. — Dormiu bem? — a amiga perguntou, entregando-lhe um copo de suco de pêssego. — Pela primeira vez em muito tempo — Celina respondeu, sentando-se à mesa. — Deve ter sido influência do cantor bonitão — Tatiana brincou, piscando para ela. Celin
O perfume de Thor naquela manhã — forte, amadeirado, intenso como ele — começou a embrulhar seu estômago. A náusea subia pela garganta e se misturava ao nervosismo de estar ao lado dele, à lembrança do olhar fulminante que ele lançara a Roberto e à pressão que ela mesma colocava sobre si por parecer estar no lugar errado, na hora errada, com a pessoa errada. Tentou respirar fundo. Uma, duas vezes. Em vão. A tensão no carro era quase palpável. E Thor, alheio — ou fingindo estar —, mantinha o olhar fixo na estrada, os punhos apertados no volante, a mandíbula travada. O silêncio era uma tortura. Um campo minado de palavras não ditas e sentimentos reprimidos. Celina fechou os olhos por um instante e levou a mão ao abdômen. O enjoo ganhou força. — Thor... — ela murmurou, com a voz fraca. Ele não respondeu. — Thor, para o carro... por favor... agora. Ele olhou rapidamente para ela pelo retrovisor interno e viu seu rosto pálido, suando frio. Sem pensar duas vezes, puxou o carro
Celina pegou os talheres com mais força do que deveria. Começou a comer, mas mal conseguia engolir a comida. O cheiro do molho parecia enjoativo, o gosto nem se destacava. Thor, por outro lado, comia tranquilamente, distraído com algum documentário passando na tela à sua frente. Celina respirou fundo. Será que estou exagerando? — pensou. Ou será que ele está mesmo fingindo que não percebeu? Tentou forçar a barra e comer mais um pouco. Cada garfada parecia pesar uma tonelada. Definitivamente tudo estava sem gosto. A presença incômoda da aeromoça e a maneira como ela flertava descaradamente com Thor, tirou completamente sua concentração, perdendo seu apetite. A dúvida que tinha sobre a postura dele mediante aquela constrangedora cena, a corroía por dentro. Com o seu suposto "incômodo", não estava conseguindo discernir se ele realmente estava alheio ou fingindo não notar. Parecia tranquilo, entretido com um documentário qualquer. Exausta, Celina pegou a taça e bebeu um pouco de água
Celina continuava sentada na poltrona, estática, os olhos arregalados ainda tentando processar a cena que presenciara minutos antes. O coração batia acelerado, como se quisesse sair pela boca. O quarto do jatinho... Thor... e a aeromoça. Ela levou a mão à cabeça, tentando conter a confusão. Por que aquilo a abalava tanto? Eles não tinham nada. Thor era apenas seu chefe. Um homem livre, capaz de fazer o que quisesse da própria vida. E ela? Ela foi apenas uma noite. Uma maldita noite de entrega que, para ele, provavelmente não significou nada. As lágrimas começaram a cair antes que pudesse contê-las. Escorreram silenciosamente, quentes, carregando um misto de raiva, frustração e, acima de tudo, dor. Por que doía tanto? O celular tocou em seu colo. A tela acendeu com o nome: César. Uma chamada de vídeo no W******p. Celina olhou para o aparelho como se fosse um inimigo e, sem hesitar, apertou para recusar. A última coisa que queria era ouvir a voz do homem que destruiu sua vida uma vez.
Thor passou a mão pelo pescoço, nervoso tentando aliviar a tensão. Como se a tensão o estivesse sufocando, mas ela só aumentava. As lembranças vinham em ondas: o corpo de Celina se afastando, o olhar dela cravado no dele, a dor estampada no rosto dela, a forma como ela ficou ao vê-lo ali, no quarto, com a aeromoça. A reação dela… aquilo o atingiu em cheio. Aquilo mexia com ele mais do que estava disposto a admitir. Voltou a fitar o espelho, agora com um semblante endurecido, forjando a armadura que conhecia tão bem. Concluiu o que já tentava repetir como um mantra. — Foi melhor assim… — disse o olhar mais sombrio agora, em voz baixa, como se precisasse acreditar na própria mentira. — Agora ela não vai nutrir nenhum sentimento por mim. Vai me odiar. E é isso que eu quero… é isso que eu preciso. Ele fechou os olhos, engolindo em seco. — Nunca mais vou me prender a mulher nenhuma. Nunca mais vou dar a alguém o poder de me destruir. A frase ecoou no banheiro silencioso como uma
Do lado de fora do banheiro, Thor continuava sentado na poltrona, tentando focar no notebook. Mas não conseguia. As palavras de Celina ecoavam em sua mente. A firmeza com que ela o enfrentara. O olhar machucado. E agora, o silêncio... um silêncio pesado, preenchido apenas pelo leve som abafado de choro que escapava pelas frestas da porta. Ele apertou os punhos sobre os braços da poltrona, lutando consigo mesmo. Não queria sentir. Não queria se importar. Mas algo dentro dele o corroía por dentro, como uma lâmina fria arranhando a consciência. Thor se levantou e caminhou até a porta do banheiro. Encostou-se à madeira, fechando os olhos, respirando fundo. Ele ouvia os soluços abafados de Celina. Por um momento, sua mão subiu, como se fosse bater na porta… mas ele recuou. — Não se envolva. Não de novo — sussurrou para si mesmo, voltando lentamente para a poltrona. Celina, lá dentro, permanecia sentada no chão, os braços cruzados sobre os joelhos e o rosto enterrado neles. Sua m