Enzo agarrou meu cabelo com força e me puxou de volta para o andar de baixo.
— Luciana já é adulta agora, Sofia. Você não pode mais continuar ignorando os sentimentos dela como fazia antes!
Meu corpo bateu com força no chão, e uma dor lancinante tomou conta dos meus joelhos.
Parado ao lado, Hélio franziu a testa e tentou me consolar:
— Sofia, adiar o casamento foi ideia minha. Não tem nada a ver com a Luciana. Se você está irritada, desconta em mim, mas, por favor, não deixe a Luciana triste.
Eu continuei encolhida no chão, incapaz de distinguir se a dor que sentia vinha dos meus joelhos ou do meu coração.
— Não briguem com a minha irmã. A culpa é toda minha. Eu deveria ter esperado mais para fazer 18 anos. Assim, meu aniversário não teria atrapalhado o casamento da Sofia e do Hélio.
Luciana enxugava algumas lágrimas enquanto dizia essas palavras, mas o sorriso satisfeito que se formava no canto de sua boca era impossível de não notar.
Enzo, como sempre, foi rápido em defendê-la:
— Que besteira é essa, Luciana? Você não escolhe quando faz 18 anos! Se alguém errou aqui, foi ela, que escolheu a data errada para o casamento. Isso não tem absolutamente nada a ver com você!
Ele então voltou seu olhar para mim, com uma expressão carregada de desprezo:
— Se você gosta tanto de ficar irritada, por que não vai para um canto e fica lá, sozinha?
Antes que eu pudesse reagir, Enzo me levantou do chão com brutalidade e me empurrou para dentro do quartinho de despejo ao lado da escada.
O pânico tomou conta de mim. Comecei a girar a maçaneta desesperadamente, tentando abrir a porta, mas então ouvi o som de uma chave girando do lado de fora.
— Fique aí dentro e pense no que fez. Quando estiver pronta para pedir desculpas, eu te deixo sair.
— Não! Por favor, me tire daqui! Eu sou alérgica, preciso tomar meu remédio agora! — Gritei, apavorada, batendo com força na porta.
Mas Enzo já estava se afastando, empurrando Luciana em direção à saída. Mesmo através da porta, eu podia ouvir parte da conversa deles.
— Reservei uma mesa naquele restaurante de frutos do mar. Está quase na hora, vamos embora logo.
— Mas e a Sofia...?
— Não se preocupe. É só deixá-la aí por algumas horas. Assim ela aprende a se comportar.
— É verdade. A Sofia tem um gênio muito difícil. Talvez seja bom ela ficar sozinha um pouco. Depois eu trago uns camarões para ela.
— Hélio, vem com a gente. Não precisa se preocupar com a Sofia. Ficar trancada algumas horas não vai matá-la.
O pavor tomou conta de mim. Comecei a bater na porta com mais força, gritando com voz alterada:
— Eu não estou mais brava! Eu peço desculpas para a Luciana! Se vocês quiserem, eu me ajoelho, mas, por favor, me tirem daqui! Eu estou tendo uma reação alérgica! Se eu não tomar o remédio, posso morrer! Por favor! — Minha voz ficou rouca de tanto gritar, mas do lado de fora não houve qualquer resposta.
Desabei no chão, derrotada. A coceira que começou nas costas e se espalhou pelo rosto, e minha garganta começou a fechar lentamente.
Era impossível ignorar a ironia: Roberto e Helga haviam me visto beber o suco de manga com seus próprios olhos. Eles sabiam da minha alergia, mas, mesmo assim, esqueceram de mim em questão de minutos.
Enquanto eles se lembravam perfeitamente do restaurante que Luciana havia mencionado semanas antes, esqueceram completamente do que aconteceu há cinco minutos.
A vontade de viver me fez levantar novamente. Com todas as forças, girei a maçaneta da porta, mas ela já estava trancada pelo lado de fora. Não havia como abri-la.
Comecei a apalpar meu corpo desesperadamente, procurando algo que pudesse me ajudar. O celular, que estava na minha mão pouco antes, havia desaparecido no momento em que Enzo me arrastou. Não sabia onde ele tinha caído.
As manchas vermelhas da alergia já haviam se espalhado por todo o meu corpo. Meu rosto estava tão inchado que meus olhos haviam se transformado em pequenas fendas.
Minha respiração começou a falhar. Se eu não conseguisse sair daquele depósito, eu sabia que iria morrer ali, sozinha.
Enquanto procurava freneticamente algo que pudesse usar para quebrar a fechadura, vi meu celular jogado em um canto do chão
Meu coração disparou de alívio. Com as mãos trêmulas, peguei o celular.
Liguei para o meu pai, para o meu irmão e até para o meu noivo. Mas nenhum deles atendeu minhas chamadas.
Depois de um tempo, recebi uma mensagem do meu irmão:
[É melhor você não ir nessa viagem para a Islândia. Não queremos que Luciana fique chateada ao te ver.]
Lágrimas começaram a escorrer por entre as pequenas fendas de meus olhos inchados. Naquele momento, eu soube. Eles não valiam mais a minha expectativa, nem o meu amor.
Sem hesitar, disquei diretamente para o serviço de emergência.
A espera pelo resgate parecia durar uma eternidade. Minhas vias respiratórias estavam inchadas, e eu mal conseguia respirar. Mesmo assim, lutei para dar instruções sobre como chegar até mim. Por diversas vezes, senti a falta de ar me dominar, quase perdendo a consciência.
Finalmente, ouvi o estrondo da porta sendo arrombada. Mas, naquele momento, tudo ficou escuro. Minha visão se apagou, e eu perdi a consciência.