Não pode ser verdade, só pode ser mentira. Eu devo estar em algum tipo de pesadelo.
Fico paralisada no lugar sem conseguir me mexer e gritando de dor por dentro.
Eron é meu companheiro, e eu sou a companheira dele, não Rayka, não era para ser assim. Está tudo completamente e absolutamente errado.
Eu vou falar com Eron, deve haver uma explicação para essa situação toda, e uma explicação muito boa.
Me aproximo do casal a passos pesados e lentos, minhas forças me traem além da dor da traição. Meu corpo ainda está fraco pela magia que usei para salvar Eron de perder a luta contra os desafiantes e garantir sua posição como alfa.
Ele é o único alfa da nossa matilha e por mais que ninguém vá me dar crédito por isso, eu sempre estive lá por ele. Em todas as lutas eu estive lá dando forças. Todas as vezes que ele precisava de um encantamento para se curar mais rápido ou para treinar com mais foco, sempre que ele precisou de mais força ou qualquer tipo de apoio, eu estava lá.
Não posso aceitar que Rayka simplesmente venha e tome o meu lugar por direito ao lado do meu alfa.
Reúno as minhas forças e percebo que o meu problema não é físico, é emocional. Graças a magia de cura eu me estou fisicamente bem, só não estou melhor por não ter me alimentado, mas a noite de sono foi o bastante para que eu ficasse completamente bem.
O meu problema é ser uma bruxa fraca, eu nunca exercitei os meus dons, minha mãe sempre dizia que eu deveria focar em ser uma loba e dedicar todo o meu tempo e concentração em conseguir me transformar.
Essa falta de treino é o que me esgota. Eu tenho muita magia bruta e milenar presa dentro de mim, e ela piorou depois da morte da minha avó, acho que ela me dava algum tipo de suporte sem que eu soubesse.
Caminho a passos largos cada vez mais rápidos em busca de impedir essa união.
Eu abdiquei de tudo por ele, por meu alfa, por Eron. Quando perdi os meus pais e minha avó tentou me levar para a fortaleza das bruxas, eu decidi ficar, fiquei do lado de Eron ao invés de ir com alguém que parecia verdadeiramente interessada em mim, ao contrário de todos nessa matilha.
Eu fiquei por Eron, pois deveríamos ser um do outro. Eu sou dele e ele é meu e assim deve ser.
Não existe Eron e Rayka.
Existe Eron e Verônica.
Paro em frente aos noivos recebendo felicitações, prestes a iniciarem o ritual sagrado de união de companheiros.
— Este é o meu lugar por direito — declaro e espero uma reação de Eron.
Ele me falou que eu deveria me impor mais, que eu não deveria deixar os outros pisarem em mim. Talvez isso tudo seja um teste para provar que sou digna dele.
Rayka desvia o olhar para mim sem se incomodar com a minha presença, Eron por outro lado parece insatisfeito.
— Seu lugar por direito é bem longe desta alcateia — alguém grita na multidão e outros começam a gritar frases parecidas.
— Eron, eu estou aqui, como sempre estive, se isso era um teste para eu me impor, então estou aqui. Eu, Verônica Feris reivindico você, alfa Eron Ranolph como meu companheiro — falo com um grande sorriso nos lábios.
Rayka sorri, se aproxima mais de Eron, do meu Eron e cruza o braço com o seu demonstrando posse, ele nada faz para que ela se afaste. Isso está começando a me incomodar e passar dos limites. Ela não tem esse direito.
— Acha que tem algum direito aqui, bruxinha? Eu fui a escolhida pelo alfa, eu sou a companheira mais digna para estar ao seu lado. Isso foi dito em alto e bom som. Agora dê o fora daqui antes que passe mais vergonha.
Me aproximo para puxar Rayka de perto de Eron, não me importa quais sejam as consequências de entrar em uma briga com ela, tenho que defender o que é meu.
Quando me aproximo para a puxa pelo braço Eron se põe no meio e me encara de frente.
Poderia dizer que tive esperança por um segundo, mas não foi isso o que aconteceu. Seus olhos desde o momento em que dei o primeiro passo foram contra mim e para defender a escolhida.
— O que pensa que está fazendo, sem loba? — as palavras de Eron partem o meu coração e me fazem encolher.
— Eron, você… de todos aqui. Por que está me chamando assim?
— Por que é o que você é. Você não passa de uma sem loba, uma anomalia mágica. Você não tem direito algum de fazer reivindicações.
Dou um passo para trás. Suas palavras têm o poder de me cortar por dentro. É como se ele tivesse me empurrado e nem precisou fazer isso com as próprias mãos. Teria doido menos se ele tivesse usado a força física contra mim.
— Não, você me disse que somos um do outro. Só está esperando que eu complete 21 anos para que possamos nos escolher como companheiros, você me disse isso! — imploro para a razão dele.
Eron me olha impassível, tento enxergar bem dentro dos seus olhos e o máximo que vejo é raiva. Sua postura é firme e os lobos e lobas ao redor protestam contra minhas palavras.
— Eu nunca me uniria a alguém tão fraca quanto você, sua anomalia mágica e sem loba. Não confunda a minha compaixão com promessas.
Ouço tudo calada tendo vontade de gritar aos quatro ventos cada palavra dita a mim. Cada promessa feito no leito que dividimos por anos.
Era comigo que ele passava as noites. Comigo que ele se deitava. Para mim que corria quando precisava de algo ou quando queria compartilhar algo.
Sempre fui eu, sempre fomos nós. Ele nunca deu atenção especial para Rayka, não entendo essa situação. Ela pode até ser forte, mas nós somos companheiros.
— A deusa da lua está de testemunha de que somos companheiros, se quer que eu prove a minha força e lute por você, tudo bem, eu luto. É isso o que deseja, que eu prove a minha força? — pergunto e Rayka ri saindo de trás dele.
— Vamos acabar logo com isso para que eu possa me unir ao meu companheiro em paz. Se quer se envergonhar o problema é seu, e se quer morrer, eu vou ter o prazer de cortar cada pedacinho inútil e presunçoso seu. — Rayka diz e é segurada por Eron.
Ele se põe no nosso meio e rosna para ela.
Penso que ele deva estar recuperando a razão ao me ver ameaçada, mas ele se vira para mim e seu olhar não é nada parecido com os que guardava para mim. Esse é puro ódio e desprezo.
— Eu sou o alfa dessa matilha e escolhi a minha companheira, nem uma anomalia mágica indigna vai lutar por este lugar.
— Todas as fêmeas têm o direito de competir para se provar digna de ocupar o lugar ao seu lado.
Eron se aproxima de mim e pega em meu pescoço. Ele não usa violência de fato, mas nem precisa, sinto sua intenção e ela me dói.
— Você nem sequer é uma fêmea, não tem uma parte loba, é só uma anomalia mágica. Enxergue o seu lugar antes que minha piedade acabe e eu resolva que merece o exílio.
Eron me solta e caio de no chão pela fraqueza repentina em minhas pernas. As lágrimas ardendo em meus olhos caem.
— Eron… eu fiz tudo por você, sempre… eu… eu amo você, você não pode fazer isso comigo, não pode me negar assim — volto a implorar aos seus pés.
Eron só me olha e acho que vejo um lampejo de tristeza perpassando por seu rosto, logo passa, pode ter sido somente um engano.
— Vá embora daqui, Verônica, antes que sua situação piore — ele diz e dessa vez eu não imploro mais.
Todos ao redor assistem e comemoram a minha humilhação.
Me levanto aos tropeços e corro para longe, para o lugar que chamo de casa. Neste momento sou tão insignificante que nem se dignam a me humilhar, estão ocupados demais comemorando a união do alfa com a nova Luna da alcateia.