A noite caiu com rapidez sobre a mansão Draven, envolvendo o local em uma escuridão que parecia viva. Selene permaneceu em seu quarto, o corpo tenso e a mente repleta de perguntas. Não conseguia ignorar o que Lucien havia dito: "Damian escolheu você."
Escolhida para quê? E por que ela sentia que algo dentro dela, uma parte que não compreendia, já sabia a resposta? Ela tentou distrair-se, caminhando pelo quarto, analisando as mobílias antigas e os detalhes ornamentados do ambiente. Havia uma grande janela que dava para os jardins envoltos na penumbra. Do lado de fora, o vento soprava entre as árvores, produzindo sons que pareciam sussurros distantes. Sentando-se na beira da cama, Selene respirou fundo, tentando acalmar sua mente. A lógica dizia para ir embora, abandonar o retrato e a mansão. No entanto, algo a mantinha ali, um fio invisível que a prendia cada vez mais. Decidida a descobrir a verdade, pegou um casaco e saiu do quarto. Sabia que não conseguiria dormir. Sua curiosidade era mais forte do que o medo. Ao passar pelo corredor em direção ao estúdio, ouviu um som leve: passos ecoando ao longe. — Lucien? — chamou, mas ninguém respondeu. Ela continuou andando, os passos cautelosos. A mansão parecia um labirinto à noite, com sombras que dançavam nas paredes e portas que rangiam ao menor movimento. Quando chegou ao estúdio, a porta estava entreaberta. Selene hesitou por um momento antes de empurrá-la devagar. A sala estava mergulhada em escuridão, exceto por uma leve luminosidade que parecia emanar do retrato. O ar estava mais frio ali dentro, como se a sala tivesse sido isolada do resto da casa. — O que está acontecendo aqui? — murmurou para si mesma, aproximando-se lentamente do quadro. Os olhos de Damian pareciam ainda mais intensos sob a luz fraca. Havia algo neles que parecia chamá-la, um convite silencioso que não podia ignorar. Selene parou diante do retrato, sentindo o coração bater descompassado. O ambiente estava tão silencioso que ela podia ouvir sua própria respiração. — Damian Draven... — sussurrou, quase sem perceber. E então, tudo mudou. O ar ao seu redor ficou pesado, como se uma força invisível a envolvesse. A luz da vela tremulou violentamente antes de apagar-se, deixando a sala na penumbra. Um frio gélido percorreu sua espinha, e o som de um sussurro encheu o ambiente. — Você veio. Selene deu um passo para trás, os olhos arregalados. A voz não era a de Lucien, nem de qualquer outra pessoa que ela conhecesse. Era profunda, grave, e parecia ecoar de todos os cantos. — Quem está aí? — perguntou, a voz trêmula. — Não precisa ter medo. Eu estive esperando por você. Ela olhou ao redor, mas a sala continuava vazia. Então, algo no retrato chamou sua atenção. A pintura estava mudando diante de seus olhos. O fundo escuro parecia se mover, como se estivesse vivo, e os olhos de Damian pareciam brilhar. Selene não sabia se estava sonhando ou perdendo a sanidade. — Damian? — sussurrou, o nome escapando de seus lábios antes que pudesse detê-lo. — Sim. A voz estava mais próxima agora, e, por um momento, ela jurou ver os lábios do retrato se curvarem em um sorriso. — Isso... isso não é possível. Você é apenas uma pintura. O retrato parecia vibrar, como se risse de sua afirmação. — Eu sou muito mais do que isso. E você sabe disso. Selene balançou a cabeça, tentando afastar a sensação de que estava sendo puxada para dentro do quadro. — Por que eu? — perguntou, sem saber por que sentia que precisava de uma resposta. — Porque você me vê, Selene. Não apenas como um retrato, mas como algo além. Você tem o que muitos perderam: a capacidade de ouvir os ecos do que está além do véu. Ela recuou mais um passo, o coração batendo freneticamente. — Isso é loucura. O riso de Damian ecoou novamente, suave e provocador. — Talvez. Mas a loucura muitas vezes revela verdades que a sanidade esconde. Selene sentiu suas pernas fraquejarem. O que era aquilo? Quem era ele? Antes que pudesse responder, o som de passos ecoou no corredor, trazendo-a de volta à realidade. A porta do estúdio abriu-se com um rangido, e Lucien entrou, seus olhos imediatamente fixando-se nela. — Selene, o que está fazendo aqui? — Sua voz estava firme, mas havia algo em seu tom que parecia quase alarmado. Ela olhou para Lucien, depois de volta para o retrato. Tudo estava como antes, como se nada tivesse acontecido. — Eu... achei que ouvi algo — respondeu, a voz fraca. Lucien aproximou-se dela, o rosto sério. — É perigoso vir aqui à noite. Damian... ele é mais ativo nessas horas. Selene engoliu em seco. — Então é verdade? Ele está... vivo? Lucien hesitou, como se estivesse escolhendo cuidadosamente as palavras. — Vivo, não. Mas preso, sim. Este retrato é uma âncora para sua alma. Ele não pertence completamente a este mundo, mas também não partiu para o próximo. — Por quê? Lucien suspirou, cruzando os braços. — Damian fez escolhas em vida que o condenaram. Ele buscava poder, mas o preço foi sua própria essência. Agora, ele existe entre os dois mundos, sempre buscando alguém que possa ajudá-lo a se libertar. Selene sentiu o peso das palavras de Lucien. — E você acha que eu sou essa pessoa? Lucien olhou para ela, a intensidade em seus olhos deixando claro que ele sabia mais do que estava dizendo. — Talvez. Mas ajudar Damian não é algo simples. Ele é... perigoso. — Perigoso como? — Ele é persuasivo, Selene. Ele tem o dom de manipular corações e mentes. Muitos já caíram sob seu feitiço. Alguns nunca escaparam. Selene sentiu um arrepio, mas, ao mesmo tempo, havia algo irresistível em tudo aquilo. A presença de Damian, mesmo através do retrato, despertava nela sentimentos que nunca havia experimentado antes: medo, sim, mas também fascínio. — Eu não vou a lugar nenhum — disse ela, mais para si mesma do que para Lucien. Lucien a observou em silêncio por um longo momento antes de balançar a cabeça. — Espero que saiba o que está fazendo. Ele virou-se e saiu, deixando-a sozinha no estúdio. Selene voltou-se para o retrato, sentindo o peso do olhar de Damian sobre ela. — O que você quer de mim? — perguntou, a voz baixa. E, embora o retrato não respondesse, ela sabia que, de alguma forma, a resposta viria. A partir daquele momento, Selene não estava apenas restaurando uma obra de arte. Estava mergulhando em um mundo de sombras e segredos, onde cada escolha poderia levá-la mais fundo no abismo.A madrugada encontrou Selene ainda acordada, sentada na cama de seu quarto. Apesar das cortinas fechadas, a luz pálida da lua entrava em filetes, criando sombras alongadas no chão. Seus pensamentos giravam em círculos, tentando decifrar o que havia acontecido no estúdio.Damian Draven. Um nome que agora parecia carregar um peso próprio, impregnando o ar à sua volta. Selene não podia negar o fascínio que sentia por ele, mesmo sabendo que aquilo era perigoso. A mansão Draven parecia estar se transformando em uma extensão de sua presença, viva com sua energia.Sem conseguir mais suportar a inquietação, levantou-se. Se havia algo que ela aprendera sobre si mesma, era que não conseguia ignorar um mistério.Os corredores da mansão estavam mergulhados em escuridão. Selene carregava uma pequena lanterna, cujos feixes fracos mal conseguiam iluminar o caminho. Cada passo que dava parecia ecoar, reverberando nas paredes como se a casa estivesse escutando.Seu destino era a biblioteca. Se havia a
A manhã chegou à mansão Draven como uma lâmina fria, cortando o silêncio com luz pálida que mal conseguia atravessar as grossas cortinas do quarto de Selene. Ela acordou com a mente pesada, como se não tivesse dormido. Os ecos da noite anterior ainda vibravam em sua memória: a voz de Damian, a intensidade de seu olhar no retrato, e a promessa que ele sussurrou.Selene sabia que estava sendo puxada para algo que não compreendia, mas havia uma parte de si que não queria resistir. Apesar de toda a lógica lhe dizendo para ir embora, sua curiosidade — e algo mais profundo — a mantinha presa ali.Ela desceu as escadas, seguindo o som de passos ecoando no hall principal. Lucien estava lá, organizando alguns papéis sobre uma mesa de madeira maciça. Ele olhou para ela com um misto de preocupação e desaprovação.— Não parece ter dormido bem — comentou ele, sem tirar os olhos do que fazia.Selene parou no pé da escada, cruzando os braços.— Não dormi. É difícil descansar quando... — Ela hesitou,
A tensão na mansão Draven pairava como uma tempestade iminente. Depois do confronto no estúdio, Selene tentou se afastar, mas a presença de Damian parecia impregnar cada canto da casa e, pior, sua mente.Naquela manhã, sentada no jardim, Selene sentiu o sol tocando sua pele como um conforto distante. A mansão estava em silêncio, mas o silêncio era enganador. Lucien mal falava com ela desde a noite anterior, como se as palavras que ele realmente quisesse dizer estivessem presas em sua garganta.Ela segurava um caderno de desenhos no colo, tentando esboçar para acalmar os pensamentos. Seus traços começavam como rabiscos confusos, mas logo, quase sem perceber, ela desenhava os olhos de Damian. A intensidade de seu olhar, o magnetismo que a puxava para ele.“Eu preciso sair daqui.”Mas mesmo enquanto pensava nisso, ela sabia que era tarde demais. Damian a havia enredado, e fugir não seria tão simples.— Tentando desenhá-lo de novo?A voz de Lucien quebrou o silêncio. Ele estava parado a p
A mansão Draven parecia ainda mais silenciosa na manhã seguinte, mas o silêncio era uma armadilha. Selene sentia como se o lugar estivesse segurando a respiração, esperando que ela agisse. A voz de Damian ainda ecoava em sua mente, suas palavras tingidas de sedução e ameaça: "Você não pode fugir de mim."Selene estava na cozinha, tentando comer algo, mas o simples ato parecia inútil. Seu apetite havia desaparecido, substituído por uma inquietação que crescia a cada minuto. Lucien entrou no cômodo, trazendo consigo a mesma tensão que havia pairado entre eles desde a noite anterior.— Não vai dizer nada? — ela perguntou, olhando para ele.Lucien hesitou, os olhos carregados de preocupação.— Não sei mais o que dizer, Selene. Parece que cada vez que tento te proteger, você se aproxima mais dele.— Não é como se eu tivesse escolha! — explodiu ela. — Você acha que eu quero isso? Ele está dentro da minha mente, Lucien! Ele me puxa como... como se eu fosse uma peça em um jogo que nem sei com
O silêncio da madrugada era denso, carregado de promessas sombrias e segredos por revelar. Selene estava sentada no parapeito da janela de seu quarto, olhando para o jardim da mansão. Os acontecimentos das últimas horas rodopiavam em sua mente, como um redemoinho impossível de ignorar.Damian. Lucien. Ela mesma.Era como se todas as peças de sua vida tivessem sido rearranjadas sem seu consentimento, formando um quebra-cabeça que ela não sabia como montar. O que era ela, afinal? Uma marionete de Damian? Uma vítima? Ou algo mais?Lucien bateu levemente na porta antes de entrar, sem esperar por uma resposta. Ele carregava um pequeno baú de madeira, suas feições sérias.— Não consegui dormir — disse ele, como se justificasse sua presença.Selene olhou para ele, exausta.— Eu também não.Lucien colocou o baú sobre a mesa e se aproximou dela, puxando uma cadeira.— Chegou a hora de você saber mais, Selene. Sobre Damian, sobre mim... e sobre você.Ela ergueu as sobrancelhas, cruzando os braç
A luz da manhã mal havia tocado a mansão quando Selene desceu para a biblioteca. A noite fora longa, e o peso das revelações ainda pairava sobre ela. O diário de Lilith estava em suas mãos, as páginas desbotadas marcadas por palavras que prometiam tanto esperança quanto condenação.Lucien já estava lá, cercado por pilhas de livros antigos e símbolos desenhados à mão em folhas espalhadas pela mesa. Ele parecia exausto, mas determinado.— Encontrou algo? — Selene perguntou, sua voz baixa no silêncio cavernoso do lugar.Ele levantou o olhar, passando a mão pelos cabelos desgrenhados.— Confirmei o que o diário disse. O ritual pode prendê-lo novamente, mas há complicações.— Claro que há — murmurou ela, sentando-se ao lado dele.Lucien pegou uma das páginas amareladas e colocou-a diante dela.— O ritual exige duas coisas essenciais. Primeiro, a conexão de sangue. Como descendente de Lilith, você é a única capaz de canalizar o poder necessário para trancá-lo de volta.Selene sentiu um frio
O cheiro de tinta e verniz impregnava o ar, misturando-se ao som suave das cerdas de um pincel deslizando sobre a tela. Selene inclinava-se sobre sua última peça, uma paisagem bucólica do século XIX, enquanto ajustava os detalhes de uma árvore. A perfeição em cada folha era mais do que um reflexo de seu talento; era a sua obsessão. Arte era o único lugar onde ela se sentia verdadeiramente viva.O mundo real, com suas expectativas sufocantes e compromissos vazios, parecia distante quando estava em seu estúdio. Ali, entre os quadros antigos e o brilho fraco de lâmpadas amareladas, ela se refugiava. Até que o telefone tocou, interrompendo sua concentração.— Selene Grey, restauradora — atendeu, a voz prática, porém carregada de cansaço.Do outro lado, uma voz grave e pausada respondeu.— Senhorita Grey, meu nome é Lucien Draven. Tenho um trabalho que pode lhe interessar.Selene apertou os olhos. Ela já havia lidado com todos os tipos de colecionadores: desde os excêntricos obcecados por
A madrugada em Blackthorn tinha um peso peculiar. As horas pareciam se arrastar, enquanto o silêncio preenchia os espaços como uma presença quase física. Selene passou a noite inquieta, virando-se na cama, os olhos fixos no teto, tentando ignorar o frio que parecia se infiltrar pelas paredes do quarto.Apesar do conforto da cama, havia algo naquela mansão que não permitia o descanso. Quando o primeiro feixe de luz atravessou as pesadas cortinas, ela desistiu de lutar contra o sono ausente. Levantou-se e vestiu uma roupa simples, amarrando os cabelos em um coque para iniciar o trabalho.Lucien já a aguardava no estúdio. Ele estava junto à lareira, uma taça de vinho em mãos, como se a madrugada também não lhe trouxesse paz.— Bom dia, senhorita Grey. Dormiu bem? — Ele sorriu, mas sua voz carregava uma nota de ironia.— Dormir nunca foi meu forte — respondeu, mantendo o tom profissional.Lucien inclinou levemente a cabeça, os olhos avaliando-a de forma quase imperceptível.— Entendo. O r