Capítulo 3

O restante da manhã demorou a passar. Bruna sabia que era assim sempre que iria ver Adrian. Ela estava com saudade, mas temia o encontro entre os dois devido ao assunto que queria tratar com ele. A saudade estava misturada ao nervosismo. Era mais fácil falar pelo telefone do que pessoalmente, mas enfrentaria aquilo. Riu de si mesma e de seus pensamentos loucos. Não iria lhe propor nada ruim... Era só um pedido de casamento. Sabia que tinham planos para isso então era só adiantar o que já estava combinado.

Quando estava perto do portão principal ela viu Catita e começou a andar um pouco mais rápido para passar por ela. Fazia questão de ser vista com Adrian pela moça. Ele estava lá, encostado no portão, com sua calça Jeans clara e uma camisa amarela que ela amava. O coração dela derretia quanto o via daquele jeito, tentando um ar mais casual. Quando a viu ele não ficou parado e foi até ela, lhe abraçando com força e lhe dando um longo beijo. Nem se importavam de interromper a passagem dos outros. Demorou para que  ele a largasse.

- Estava com saudade? – perguntou Adrian.

- Sim... Sempre. – respondeu ela.

- Então vamos sair logo daqui. – disse ele pegando-a pela mão e saindo rapidamente.

Maiquel o chamou.

- Vamos fingir que não ouvimos? – propôs ela.

- Não posso fazer isso... Ele é meu amigo.

Adrian parou e ficou com um sorriso no rosto do portão esperando Maiquel e Catita.

- Bom que te encontrei. – disse Maiquel dando um abraço no amigo.

Catita não se contentou sem o contato físico e lhe deu dois beijos no rosto. Involuntariamente Bruna apertou forte a mão dele quanto ela o tocou.

- Catita vai dar uma festa na casa dela neste final de semana. Decidimos hoje, quando soubemos que os velhos dela vão viajar. Podemos contar com vocês dois não é mesmo? – falou Maiquel.

- Claro que se for para nós dois o convite, poderemos pensar. – respondeu Bruna.

Catita riu e balançou a cabeça e Bruna percebeu que estava fazendo papel de idiota. Como aquela mulher conseguia irritá-la tanto? Controlar seu ciúme... Era isso que a terapeuta dizia. Mas quando Bruna estava próxima de Catita controlar seus sentimentos era muito difícil.

- Vão almoçar? – perguntou Maiquel procurando ignorar o comentário anterior de Bruna.

- Sim. – disse Adrian.

- Quer ir com eles, Catita? – perguntou Maiquel.

Bruna ficou incrédula. Era impossível respirar fundo e suportar aquilo. Não via seu noivo há dias, tudo que queria era curtir um momento com ele e lhe dizer tudo que estava planejado. Era um dia importante para ela, pois teriam uma conversa definitiva sobre o casamento. E não... Ela não almoçaria com os dois amigos deles junto. Ela soltou a mão de Adrian e andou rapidamente, sem olhar para trás. Estava braba e sentindo raiva. Mas ainda assim andou até o carro dele, pois tinha certeza de que ele viria atrás dela. Ela cruzou os braços e ficou ali, até que ele chegasse. Ele abriu a porta e sentou-se no carro, sem dizer nada. Ela sentou-se ao lado dele. Ele não ligou o carro... Respirou fundo e disse:

- Por que fez isso, Bruna?

- Por que fiz isso? – falou ela alterada. – Por que “você” fez isso... Eu disse pra fingir que não estava ouvindo eles. Mas não... Você tinha que ouvir o que ele tinha a dizer... Não bastava ter estado toda a noite anterior com eles ainda queria ficar a quatro para o almoço em vez de ficar somente comigo? Isso é sério? Estou cansada destes dois me perseguindo por todos os cantos, forçando uma amizade que não existe entre mim e eles. Eu não suporto Catita. Tento ser tolerante, não fazer cena, mas confesso que é bem difícil. Parece-me que eles tentam me testar o tempo todo. Certamente não sabem o quanto que eu tomo de remédio por dia e que sou capaz de aturar muito.

- Será que você é mesmo capaz de aturar, Bruna? – perguntou ele seriamente. – Foi só um convite para almoçarmos juntos, nada mais. Talvez eles nem quisessem realmente almoçar conosco, mas a maneira como você os trata faz com que ajam assim. São meus amigos.

- Então namore com eles e me esqueça.

- Não seja tão ciumenta, meu amor.

- Não é ciúme. Sinto que eles estão sempre tentando estar entre nós. E Catita é uma ameaça constante.

- Bruna, você sabe que eu te amo. – ele pegou o queixo dela entre as mãos e olhou em seus olhos. – Catita não significa nada para mim. Eu nunca amei ela.

Quando Bruna olhou nos olhos viu outros olhos, como se não fossem os dele. os olhos verdes deram lugar a olhos castanhos claros, quase tom de mel. Ela piscou várias vezes, tentando se desvencilhar do que via.

- Está tudo bem, Bruna? – perguntou ele.

- Sim... Tudo bem.

- Você me olhou de um modo estranho de repente... – disse ele confuso.

- Está tudo bem, Adrian... Só... Estou chateada. E sei que Catita sente algo por você ainda.

- Eu tenho certeza de que ela não gosta de mim a não ser como amigo, querida. Faz isso só para irritar você às vezes.

- E por que ela faz questão de me irritar, Adrian?

- Não acho que ela faça isso por mal... É só uma brincadeira. Eles são assim...

- Adrian, temo que vá chegar o dia em que você terá que escolher entre eu ou seus amigos... Infelizmente. Eu já não quero mais dividi-lo com ninguém. Quero ser amada por completo, entende? Quero amar por completo...

- Você é amada por completo por mim, Bruna. E realmente espero que nunca chegue o dia em que eu tenha que fazer esta escolha...

- Por que você tem dúvida do que escolheria? Escolheria eles?

- Eu não poderia viver sem nenhum dos dois. – ele falou seriamente.

- Você não vai casar com eles. – gritou ela.

- Não quero casar com eles... Nem com você, poxa. – falou ele em tom de voz mais alto que o normal.

Bruna não acreditou no que estava ouvindo. Abriu a porta do carro e saiu correndo, deixando as lágrimas rolarem por suas faces. Adriana ligou o carro e foi atrás dela, mas ela não estava disposta a ouvi-lo ou perdoá-lo.

- Me desculpe, meu amor. – pediu ele enquanto andava devagar com o carro ao lado dela. – Eu não queria ter dito aquilo... Foi sem pensar... Não falei sério.

- Não quero ouvir nada que você tem a dizer. Me esqueça e está tudo acabado entre nós.

Ela ficou ainda mais irritada quando viu ele botar os óculos escuros e rir da atitude dela.

- Eu te amo, Bruna e você sabe disso. Não foi minha intenção magoá-la.

Bruna viu um ônibus vindo e atacou-o. Quando ele parou ela subiu, sem pensar duas vezes, sem nem saber para onde ele estava indo. Quando sentou-se puxou os óculos escuros da bolsa para ninguém perceber suas lágrimas. Conseguia ver que ele estava seguindo o ônibus. Quando chegou próximo de sua casa ela não viu mais o carro dele. Imaginou que ele iria para sua casa para surpreendê-la. Então ela não parou no ponto. Só desceu quanto o ônibus parou no fim da linha. Então ela teve que descer. Estava na área central da cidade e resolveu que não voltaria para casa pois não queria encontrar Adrian naquele momento. Ela olhou no relógio e viu que já passava das 13 h. Seu estômago estava pedindo comida. Ela tinha uma consulta de rotina no hospital as 16:30 e decidiu que iria almoçar e ficaria dando voltas por ali até chegar a hora da consulta. Ela estava um pouco abalada com o que havia ouvido de Adrian. Realmente não esperava aquela atitude dele. Se ele preferia os amigos, ela o deixaria livre para seguir com eles como solteiro. Nunca mais iria procurá-lo, embora seu coração estivesse dilacerado. Depois do almoço ela foi até uma loja procurar umas pulseiras novas, que adorava comprar e depois foi dar uma volta no parque. Tomou até um sorvete sozinha, que não fazia há tanto tempo. Sentada, tomando seu sorvete no banco abriu a embalagem com as novas compras e já colocou algumas no pulso. Ela riu. Quanto peso nos braços de uma menina tão magra. Quanto contraste de metal nos braços finos com roupas sempre básicas. Esta era uma conversa frequente na terapia: até quando esconder as marcas? Até quando achar necessário... Não há um tempo... Você decide a hora. Estas foram as palavras da terapeuta. Ela não sabia se um dia haveria a hora em que se sentisse a vontade para mostrar ao mundo que havia tentado dar fim à própria vida. Não tinha vergonha das cicatrizes, mas do que elas traziam de lembranças.

Ela olhou no relógio e percebeu que teria que quase correr para chegar há tempo no hospital. Atrasada como sempre, pensou. Mas quando chegou a mandaram esperar que o doutor estava atrasado naquele dia. Ela sentou-se e riu sozinha: sim, alguém conseguia se atrasar mais que ela. Seu médico.

Ela sabia que Adrian já não estava mais em sua casa. Ele já teria ido para o trabalho. E certamente ficaria bem preocupado por ela não ter voltado, afinal, ele não sabia da consulta. Enquanto ela estava ali, envolvida em seus pensamentos, a porta se abriu e o doutor apertou a mão do estranho que saía. Ela levantou-se, pois sabia que era a próxima. Quando ele se virou, ela sentiu o coração parar de bater e suas pernas quase a deixaram no chão. Era ele... O homem do seu sonho na noite anterior. Aqueles olhos castanhos claros, cor de mel... Não havia dúvidas. E ainda tinha certeza de que foi os olhos dele que viu em Adrian durante a briga no carro. Um arrepio percorreu seu corpo de tal forma que ela chegou a tremer. Os olhos deles se cruzaram por um segundo, talvez dois... Mas ela sabia que era ele, mesmo com a máscara que tapava seu rosto, deixando somente os olhos à mostra. Ele era muito alto, magro, usava bermuda. Quem usava bermuda para ir ao hospital? Ela ficou confusa. Enquanto ele saía ela percebeu os chinelos. Riu sozinha: chinelos, bermuda e camiseta branca no hospital. E ele tinha cabelos compridos, passando dos ombros, amarrados descoordenadamente num rabo de cavalo.

O doutor a chamou e ela entrou ainda confusa e chocada com o que tinha visto.

- Como tem estado? – perguntou ele sentando-se e fazendo um gesto para que ela fizesse o mesmo?

- Doutor, acho que estou ficando louca de vez. – disse ela sorrindo nervosamente.

O doutor Adam riu. Ela se sentia bem à vontade com ele. Conheciam-se há muitos anos e se viam mensalmente.

- Por que acha isso?

- Quem é aquele homem que saiu daqui? O de bermuda e chinelos?

- Bruna, eu não posso falar sobre meus pacientes.

- O senhor acreditaria se eu dissesse que sonhei com este homem esta noite sem nunca tê-lo visto na minha vida? Hoje pela manhã falei sobre o sonho louco com um estranho vindo do nada. Daí dou de cara com ele aqui... Por que ele usa máscara? Será que vou ter que tomar mais remédios? Acha que eu fiquei doida de vez agora?

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