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Heloísa encerrou o dia na Glover Time e foi direto para a boate Star Wars, ela sempre gostou de trabalhar em locais onde não chamava a atenção. Se sentia mais segura assim, certeza de que não encontraria ninguém indesejado no seu caminho. Ela tinha dois empregos, uma longe da loja de restauração e conserto de relógios antigos e a boate Star Wars, o lugar onde só pessoas do mundo Geek frequentavam.

Glover time é um desses lugares onde é certeza que não vai encontrar pessoas indesejadas, quem em sã consciência perderia tempo no conserto de relógios antigos? Ninguém! Por isso a garota tem que completar sua renda trabalhando a noite em uma boate como bartender, Heloísa é uma mulher de peso, literalmente. Bom, ela às vezes exagerava e era muito dura consigo mesma em relação ao seu peso e sua aparência, ela estava mais para midsize.

— Boa noite,Mackenna? — A mulher de 25 anos desejou ao entrar na boate e se deparar com a colega de trabalho. — Ainda não está pronta para o show de hoje? — Perguntou à cantora ao perceber que Mack não estava com suas roupas habituais.

— Estou, mas minha back vocal aloprou no pó. — Mack respondeu e Helô não conseguiu evitar uma risada, Marília sempre estava aloprada demais no pó.

— É uma pena, uma pena mesmo. — Lamentou por sua colega e começou a caminhar em direção ao bar.

— Helô? — Mackenna a chamou sem se mover de seu lugar, o tom de voz esperançoso.

— Hoje não, Mack — a garota dispensou a colega sem nem olhar para ela.

— Vou falar com o Osório, quero ver você dizer hoje "não, Mack". — A cantora dos olhos cor da noite tinha razão, ela não diria não ao patrão, o sonho de Mack era arrastar Heloísa para a vida dos palcos. Mas isso jamais vai acontecer, tudo o que ela não quer é ficar sob a luz dos holofotes… preferia continuar por trás deles, na escuridão.

— Heloísa, você vai para o palco com a Mack. — Osório avisou a bartender em um momento bem apinhado no bar. A mulher respirou fundo e olhou para o patrão.

— Vai me pagar a mais por isso? Sou paga para preparar drinks e não para estar no palco. — Ela o lembrou irritada.

Odiava o fato dele sempre fazer as vontades de Mackenna. Infelizmente, o que a cantora fazia por ele, Heloísa jamais faria. Tremeu só de lembrar da vez que os pegou tr@ns@ndo no escritório do chefe.

— Seu pagamento vai ser continuar tendo um maldito emprego. — O homem disse dando-lhe as costas logo em seguida.

— Égua, será que ele não ver como o movimento tá grande? Não acredito que vou ficar sozinho de novo aqui, mas quem pode contra o poder do charque? — Pietro reclamou depois de Osório se afastar.

— Desculpa, Pi. Eu disse a Mack que não dava hoje, mas sabe como ela é. — Helô se desculpou com o companheiro de trabalho. Os dois faziam uma ótima dupla no bar.

— Aquela gala seca ainda não entendeu que você odeia aparecer. — O homem um pouco mais velho fala furioso, Pietro adora Heloísa, sua gordelícia como ele chama nas horas de descontração e em seus pensamentos.

— Não gosto, mas hoje vai ser só uma hora de show, depois vem o DJ. — Helô sorriu, o sorriso com a covinha que Pietro adora. Ele está completamente apaixonado pela colega de trabalho, mas ela não abre espaço para que se aproxime. Na verdade, não abre espaço para que ninguém se aproxime.

A mulher tira o avental e segue para o palco "só tenho que aguentar uma hora" pensou ...

Foi no final da última nota que seu olhar se cruzou com o do homem na área vip da boate.

Ela não deveria ter balançado com isso, por deus, ela é Heloísa Teixeira, a mulher inseduzivel. Mas aqueles olhos, aquela postura e a forma como ele a encarava, aquilo a desconcertou.

Então ele deu um meio sorriso e ela quase desafinou, quase perdeu a voz por causa daquilo. "Que coisa ridícula!" Pensou e voltou a focar na finalização da música.

— Obrigada, jedis! — Mack agradeceu com um grito animado, finalizando o seu show, então Heloísa aproveitou aquele momento e saiu às pressas do palco, retornando para o seu posto, longe das vistas daquele homem que lhe causou arrepios apenas com seu olhar e quase a fez perder a voz apenas com um meio sorriso...

— Você oscilou lá em cima, você nunca oscila. — Pietro observou quando Helô se juntou a ele novamente no bar. Qualquer outra pessoa não teria percebido, mas como ele estava sempre atento a ela, percebeu.

— Helô, tem três drinks de manga para a área Vip e dois de coco. — Ele avisou para sua paixão, já que é a especialidade dela. Infelizmente, a casa estava lotada e não poderiam parar.

A mulher com sorriso de menina começou a preparar as bebidas. Ela adorava fazê-los. Apesar de quase nunca beber e quando bebia, era bem pouco. Era uma boa menina, apesar de tudo.

— Eu me distraí, foi isso que aconteceu. — Heloísa explicou para o colega de trabalho enquanto preparava as bebidas.

— Se distraiu? — O bartender ficou incrédulo. — Você nunca se distrai, tudo que faz é com perfeição. — Ele espera que ela perceba a paixão com que acabou de falar.

Mas aquela frase fez Heloísa oscilar de novo. Ela não era perfeita, se fosse perfeita não teria sido descartada como se fosse um objeto quebrado, imperfeito.

Pietro já conseguiu ficar até com a deusa Mackenna, mas Heloísa é diferente, ela é educada demais, perfeita demais, difícil demais, discreta demais e o principal, linda demais, ela é uma cheia de curvas que tem o excesso de peso bem distribuído, seu cabelo ondulado castanho com tons vermelhos na ponta, os olhos cor de amêndoas deixam qualquer garota de padrão ideal no chinelo. Os lábios, como ele sonha com aqueles lábios carnudos que parecem tão macios e suculentos, a pele parece tão sedosa e convidativa ao seu toque, mas ela nunca abre espaço para nenhum homem se aproximar dela. Nem mulher, eles sempre questionaram a sexualidade da colega, mas como ela não abre espaço para nenhum dos sexos, eles nunca tiveram certeza de nada. Eles são todos os colegas que trabalham com Heloísa na boate, apenas isso, ninguém sabe sobre a vida dela fora do trabalho.

Heloísa sempre mantêm o sexo oposto a distância ou melhor, qualquer pessoa a distância.

— Pi, pode levar os drinks pra mim, por favor — Helô pediu arrumando as bebidas perfeitamente na bandeja.

— Égua, porque você não leva? — Ele estava aperreado com a quantidade de pessoas pedindo destilados.

— Por favor! — Ela faz beicinho, se ao menos ela soubesse o que esse gesto causa nas partes baixas dele.

— Sabe que sou estabanada e corro o risco de derrubar a bandeja antes de chegar na área vip. — Heloísa insiste chorosa.

Pietro não resiste e deixa seu posto para atender ao pedido de sua Afrodite.

A mulher se sentiu aliviada com a ajuda do colega, nunca foi covarde mas não estava pronta para ficar frente a frente com um homem que conseguiu lhe causar arrepios de longe. Ela só pode estar louca em evitar alguém que nem sequer conhece.

Helô começa a servir os destilados com uma habilidade sem igual, Osório fitava de longe sua funcionária mais competente quando um homem elegante e imponente se aproximou dele.

— E aí meu chapa? Está gostando da nossa boate temática? — perguntou orgulhoso por ter alguém tão importante em sua boate geralmente frequentada por nerds.

— Já estive em buracos piores. — O homem é arrogante, olha na mesma direção que o outro estava olhando quando ele chegou e lá estava, a back vocal, que pelo visto tem inúmeras habilidades.

— Então isso é um sim? — Osório perguntou na expectativa, ignorando completamente o fato de sua boate ter sido chamada de buraco.

— Se puder contar com sua descrição, sim. — Ele respondeu sem desviar a atenção da bartender. — Como a moça se chama? — perguntou ao dono da boate com certa curiosidade, olhando diretamente para Helô. Osório acompanhou o seu olhar.

— Aquela mulher talentosa? — Osório precisava ter certeza de quem o homem falava ao apontar para a bartender de curvas avantajadas, mas tremeu ao perceber o olhar frio do homem à sua frente.

— Heloísa. — Osório respondeu por fim.

— Heloísa. — O homem repetiu. O nome parecia não combinar com ela…

Heloísa e Pietro saíram juntos da boate, andando lado a lado conversando sobre a noite agitada de trabalho. Ambos estavam exaustos, ainda não conseguiam entender como a boate enchia dia de semana, parecia até que o povo não tinha que acordar cedo para trabalhar no outro dia.

— Heloísa, que tal um cinema no domingo pela manhã? — O rapaz arriscou depois de um tempo tentando criar coragem para fazer o convite. Ele morria de medo de ser rejeitado, de novo.

— Hum, obrigada pelo convite, mas… não, obrigada. — Mais uma vez Pietro sentiu o baque de outra rejeição de Heloísa Teixeira. Balançou a cabeça, ele a venceria pelo cansaço. Era brasileiro e não desistiria nunca.

— Porque não estou à sua altura ou porque sou seu colega de trabalho? — Pietro perguntou num tom brincalhão, se sentindo um bobo por ter feito o convite.

Ela o olhou de esguelha, Heloísa não podia e não queria ser mal educada com seu colega de trabalho. Apesar de sempre manter certa distância entre eles, gostava dele. Pietro é um bom rapaz e um bom colega.

— Só não quero ir ao cinema, domingo é o único dia que tenho para dormir até tarde. — A moça explica de maneira educada.

Pietro fez uma careta de desgosto, era sempre assim quando tentava ser algo mais que um colega de trabalho. Mas um dia ele iria vencê-la pelo cansaço. Isso era uma certeza.

— Helô, você precisa de um pouco de diversão. — O bartender tenta argumentar, mas Heloísa não estava muito suscetível a argumentos. Ela precisava descansar, apenas isso.

— Já disse não. — Heloísa foi firme sem deixar a boa educação de lado, educação que nos últimos dez anos ela tentou revogar incansavelmente de dentro de si. Não de como tratar os outros, mas a forma como falava e agia, ela queria se parecer mais com as pessoas que convivia e menos com… ela balançou a cabeça e deixou aquele pensamento de lado.

— Neste momento, tudo o que quero é chegar em casa, amanhã terei um dia longo na Glover Time então… — ela dar de ombros e franze os lábios em uma linha tênue, abrindo o sorriso que ele adora em seguida, — eu te peço que não volte a falar sobre isso, porque realmente o domingo é um dia sagrado de descanso pra mim. — Sua gentileza acalentou o coração do rapaz.

Os dois fazem sinal para o táxi que estava passando, é costume deles dividirem o preço da corrida…

Heloísa entrou no kitnet, agradeceu mentalmente por chegar segura, jogou a mochila em cima do sofá cama surrado, que comprou pelo marketplace no F******k. Estava com um preço bom, então não se importou se ele estava novo ou não, ela não tinha condições de ficar exigindo muito, aprendeu a lavar a seco por um tutorial do YouTube e voilá, ficou novinho em folha e pronto para uso, bom, novinho não, mas quebrava um galho.

Ela olhou em volta, o lugar está mais para um quarto amplo, com poucas coisas que conseguiu comprar no decorrer dos anos, um fogão de quatro bocas, uma mesa de vidro redonda que comprou em uma loja de novos e usados e duas cadeiras, ela nem sabia porque comprou uma segunda cadeira. Não tem televisão e nem celular da moda, apenas um modelo que pega w******p, um tapete no meio da sala de cor verde, ganchos para pendurar suas poucas roupas no cabide e uma penteadeira, onde estava preso no espelho seus bens mais preciosos, as lembranças de seus irmãos, entre eles uma foto do jornal onde anunciava a morte de uma jovem mulher cujo o rosto lembrava a um anjo.

— Mais um dia irmã. — fala pegando o recorte em suas mãos, — pode não acreditar mas sou mais feliz agora…

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