Allah! Com certeza, ele está aqui para me intimidar

Fecho os olhos, tentando ficar calma.

Allah! Com certeza, ele está aqui para me intimidar

— Suas roupas chegaram, foi fácil trazê-las. Elas estavam arrumadinhas em uma mala. Mostrando claramente que é uma mentirosa, você ia fugir de novo. O que te barrou foi à tempestade, não foi? — Sua voz é grossa, irada.

Eu o encaro.

—Por que vou explicar alguma coisa? Não importa o que eu diga, o senhor não acreditaria em mim.

Ele se joga para trás na cadeira, e dá uma gargalhada diabólica.

— Não mesmo!

Ele se levanta.

—Depois, preciso falar com o Senhor.

Ele vacila e depois sorri. Quando ele ia se sentar na cadeira novamente, eu suplico:

— Por favor, aqui não.

—Te dou cinco minutos. Meu tempo é dinheiro.

Quando ele sai, me levanto da banheira e pego uma toalha branca perfumada, que está dobrada sobre o aparador. Me enxugo rápido e coloco meu vestido em tempo recorde. Descalça, com os cabelos molhados vou até o quarto. Said está de costas para mim, em frente à janela.

Ele se vira quando sente a minha presença, isso me faz engolir em seco. Ele parece irritado.

— Fala logo! Não tenho tempo a perder.

— Uma amiga está doente. Internada no hospital Al-Osrah. Eu gostaria de ligar todos os dias para saber o estado dela.

Seus olhos correm pelo meu rosto, parece procurar a verdade nas minhas palavras.

— Espero que não esteja tramando algo. —Então me observa um tempo e dá de ombros. — Tudo bem. Você terá sua ligação, mas a fará na minha presença.

— Obrigada. — Eu digo e não consigo deixar de sorrir por puro alívio.

Ele trinca os dentes e enfia as mãos no bolso da calça.

— Seu sorriso te revela. Esse homem sabe a ladra que você é?

Eu me irrito:

— Não há homem nenhum.

Sinto meu rosto em chamas. Seus olhos passeiam pelo meu rosto novamente.

— Não acredito!

Ele se vira e começa a caminhar para fora do quarto, seu passo é tranquilo, parece o andar de um felino, uma pantera negra. Ao sair, fecha a porta. E para aumentar o meu desânimo, escuto ele virar a chave na fechadura. O desespero me bate com essa situação toda, fico parada por um tempo tentando não chorar. Mas não tem jeito, as lágrimas teimam em cair. Enxugo com raiva por ser tão fraca.

Preciso ser forte!

Vou até minhas malas e as abro. Minhas roupas estão todas reviradas.

O que eu esperava afinal?

Com certeza minhas roupas passaram uma imagem ruim, pois não são roupas que as mulheres simples como minha irmã, usariam aqui e também são roupas de uma mulher que trabalha fora e ousadas para os padrões daqui. Ele vai me ver como uma odalisca! Estou ferrada!

Um suor frio surge na minha testa quando me lembro do meu passaporte e de meus documentos. Por pura sorte, ficaram em um esconderijo na casa, em um buraco atrás de um quadro. Usávamos esse esconderijo para guardar dinheiro e todo tipo de documentos, aprendemos como nossos pais quando eram vivos. Então tão logo cheguei de viagem, recorri ao nosso lugarzinho secreto. Lá pude ver também os documentos da minha irmã.

Tadinha! Suspiro.

Guardo minhas roupas fazendo uso das gavetas e cabides disponíveis. Muitas estão amassadas, isso me irrita. Quando pego um vestido azul nas mãos, suspiro. Eu fui na festa de Jéssica com ele, uma das poucas amigas que fiz em Londres. Ela trabalha comigo no hospital. Eu na ala das urgências e ela na ala de queimados.

Quando soube da minha irmã, tirei uma licença no hospital, pois eu não sabia quanto tempo ficaria afastada e isso para mim é uma incógnita agora. Pelo visto, Said está disposto a me fazer pagar por todos os pecados da minha irmã. Agindo como um Juiz, sem misericórdia. E sem defesa eu fui julgada e agora estou condenada a servi-lo.

No banheiro tento escovar meus cabelos e encontro uma grande dificuldade. Pela ausência do condicionador, os fios estão bem armados e ressecados.

Eu perdi a cor das mulheres daqui, estou bem branca. Sou diferente nesse aspecto de Adara. Said, com certeza, não a conhecia, ele deve ter reunido informações para caçá-la, pois se ele a conhecesse, enxergaria essa distinção em nós. Fora isso, os cabelos de minha irmã são mais compridos e ela é mais magra. Tudo isso fruto de uma vida dura de trabalho braçal. Sempre quando ela me enviava fotos por cartas, eu percebia essa diferença física entre nós.

Ouço o barulho na porta do quarto, com o coração aos pulos, saio do banheiro e com alívio vejo Zafira. Ela está com uma porção de caftans brancos e um chinelo. Ela os deposita na cama.

— Já temos um trabalho para você. Suas roupas não são apropriadas, por isso Said providenciou essas roupas. Vista-se! Eu aguardo.

Sem argumentar assinto e obediente me troco. Prendo meus cabelos em um coque bem alto. Eu me olho no espelho. A imagem é de uma empregada, mas só a imagem, pois eu nunca precisei limpar coisa alguma. Desde que fui para Londres, sempre estudei e trabalhei, não estou acostumada a realizar trabalhos domésticos.

Bem, mas não deve ser um bicho de sete cabeças. Com certeza eu me sairei bem. Saio da minha prisão e a sigo por um enorme corredor. Logo que entro na sala me deparo com Said rindo de braço dado com uma linda moça. Quando ele me vê fecha a cara, eu baixo minha cabeça para ele não ver meu rosto. A casa parece um palácio, mas eu não consigo reparar em nada, só sinto seus olhos postados em mim enquanto eu sigo Zafira para a parte externa da casa.

Suspiro, sentindo o calor escaldante do lado de fora, em contraste com a temperatura fresca de dentro da mansão. Deparo-me com um lindo jardim com um grande gramado, mas cheio de folhas. A luz do sol que passa por entre as folhas das palmeiras e dos chapéus-de-sol refletem o verde vivo. Deve ser bem irrigado para ser tão vistoso assim. Ao lado dele corre por toda sua extensão um caminho de piso frio. Ao longe pude ver uma linda piscina.

Zafira me dá uma vassoura e uma pá. Aponta uma grande lixeira. Depois me mostra todas as folhas derrubadas pelo vento e toda a areia na varanda e ao redor da mansão para eu varrer. Assinto para ela, calada. Percebo então a chegada de um guarda, que com certeza ficará aqui para me vigiar enquanto eu faço esse serviço.

Zafira me observa por um breve tempo, como se me avaliasse. Talvez se perguntando se eu darei conta do recado, então, entra na mansão.

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