1º capítulo - Papai

Eu estava ao lado de Caled, eu sabia que nada de ruim me aconteceria, eu sabia que ficaríamos juntos, porém quando ele insistiu por entrar pela porta da frente, minhas pernas bambearam e eu quis fugir do olhar severo que eu sabia que minha tia lançaria sobre mim, mas ainda assim entramos, e não foi diferente do que eu tinha imaginado, minha tia me olhou com raiva, mas logo o seu olhar se transformou e ela me abraçou com força.

-Oh menina o que tinha na cabeça quando saiu pela janela daquele jeito?

-Desculpe tia, precisava fazer algo.

Segurei com mais força a mão de Caled para ter certeza de que ele ainda estava ao meu lado e o olhar de minha tia também se voltou para ele.

-Sei, entendo bem isso.... Por onde andou Caled?

-Viajando, fiquei sabendo a pouco o que tinha acontecido, sinto muito não ter estado aqui para ajudar...

Como ele era modesto, tinha salvado a todos, mas é claro eu não podia dizer isso, somente Dan agora me olhava sabendo muito bem o que se passava ali.

- Certo, vamos almoçar então.

Sentamos a mesa e almoçamos em silêncio a paz tinha voltado a reinar e o ambiente estava calmo, percebi que Helena tinha ficado intima do médico que cuidava das crianças doentes, mas não fiz nenhum comentário tinha certeza de que ela me contaria tudo depois com direito aos detalhes mais sórdidos. Sai com Caled de mãos dadas e andamos até a ponte olhando o vapor que subia da cachoeira.

- Caled, você não vai mais partir?

- Há muito mais coisas a serem discutidas Alicia, a verdade é bem mais complexa do que você é capaz de imaginar, é muito complicado saber se eu vou ficar ou não, eu quero, quero muito ficar aqui, mas não é algo que eu posso escolher...

- Como assim?

- Alicia, talvez eu seja enviado a alguma missão e você precisa resolver a sua situação também...

- Minha situação? Que situação, eu estou bem.

- Sei disso, mas você foi enviada a terra com um propósito, me livrar da escuridão e me guiar e você conseguiu me salvou me livrou dos meus pecados com seu amor, cumpriu sua missão, precisa voltar para casa agora...

- Eu já estou em casa, Caled esse é o meu lar não posso deixar Helena, e não quero deixa-la...

Sei disso, Alicia, mas pense há algo incompleto na sua vida, não tem curiosidade para saber o que está reservado para você?

- E o que quer que eu diga a ela? Que eu sou um anjo e sei lá para onde eu estou indo agora, mas que eu preciso cumprir minha missão?

- Não precisa ser irônica. – Falou ele com desgosto. – Escute, precisa voltar para o seu lugar, tem pouco tempo para fazer isso, se não fizer ficará presa aqui e eu não sei se isso é bom ou não.

-Não posso, Caled, não quero partir, eu quero ficar, quero estar perto de você só de você...

- Alicia eu também não sei se vou ficar, não sei para onde eles vão me enviar em a que eu estou destinado, talvez eu simplesmente descanse ou talvez eu viaje para outra dimensão, mas a verdade é que eu não sei.

Abaixei a cabeça olhando para a ponte.

- O que foi Alicia?

-Não sei como voltar para casa.

- O que?

-Eu não sei como fazer para voltar para casa, não sei como faço para encontra-los, já tentei, enquanto dormia tentei mentaliza-los, mas há um bloqueio cada vez que chego perto é como se outras coisas me segurassem e não me deixassem partir, tenho medo Caled, medo do que não posso imaginar como será, tenho medo de partir.

- Alicia, não precisa ter medo de nada escute precisa seguir com a sua vida, escute vou continuar ao seu lado, não vou te abandonar, e mesmo que parta poderá voltar para ver Helena, claro talvez seja diferente, mas poderá vê-la.

- E o que acontece se eu não quiser voltar?

- Não sei o que acontece, mas acredito que sua alma vá ficar presa na terra até que seu corpo comece a definhar.

Definhar? Definhar era o mesmo que morrer aos poucos? Eu não queria morrer, mas também não estava mentindo não queria partir, tinha medo de partir, medo do sofrimento que causaria a Helena, ela iria sofrer sem mim, eu tinha que ficar com ela, tinha que ficar com Sophia e com os outros eu não queria uma nova missão, mas não queria morrer também, por que tudo tinha que ser tão complicado, seria tão mais fácil se eu fosse simplesmente normal...

Olhei para Caled que tinha o olhar fico nas árvores, então percebi a neblina negra que brotava meio as árvores e tomava conta da ponta, recuei um passo para trás e coloquei a mão sobre a boca, aquele queiro era pavoroso, parecia enxofre ou algo do gênero fazia com que meus olhos lacrimejassem e minhas narinas ardessem, foi então que dois olhos negros como a noite sem luar surgiram diante dos meus olhos entre as árvores e com eles um sorriso presunçoso e confiante, aquele rosto, eu já o tinha visto outras duas vezes e ainda me lembrava bem dele, a pele branca não parecia tão envelhecida quanto deveria parecer devido à idade, na verdade ele não parentava ter mais do que 40 anos, tinha um corpo jovem e bonito, aliás qual deles não era bonito? Eles pareciam ter sido criados com o intuito de atrair olhares, olhei para Caled que segurava minha mão com força, por alguns minutos acreditei que ele estivesse com medo e por que não? Quem não estaria, ele engoliu seco e eu pude ver quando sua mão se voltou da minha e ele deu um passo à frente se colocando diante de mim, sua boca se abriu sibilando uma palavra fria e dura demais para seu significado.

- Papai...

Asmodeus de aproximou de nós mais rápido do que eu pudesse ver seus pés a verdade é que ele se movia com tanta elegância que nem mesmo parecia que andava parecia que flutuava.

- Filhos queridos, quanta saudade, minha nora...

Ele se aproximou de mim como se quisesse me abraçar, mas Caled o impediu.

- Nos poupe de sua gentileza, o que deseja papai?

- Ora, por acaso isso é jeito de tratar um pai? Não acha que meu filho é muito mal-educado Alicia?

Olhei para Caled, mas não ousei abrir a boca, meu corpo inteiro tremia por um motivo desconhecido.

- Tudo bem... vamos deixar os cumprimentos de lado então, o que eu desejo, ora senti saudades... – ele se aproximou e estendeu os braços para Caled. – Dê-me pelo menos um abraço meu filho.

Caled me olhou e então deu mais um passo à frente abraçando o  homem que esperava de braços abertos, a ação foi rápida demais, de repente percebi que ele segurava Caled pela nuca com força, os joelhos dele cederam e ele se curvou de dor, seus olhos tinham as pupilas dilatadas e ele gritava, tentei correr até ele porém uma barreira de vidro foi imposta entre mim e ele e eu não podia avançar, com uma mão ele me mantia presa enquanto com outra torturava Caled, cai de joelhos e comecei a gritar com todas minhas forças.

De repente percebi que ele perdia os sentidos, vi que Asmo falou algo em seu ouvido direito e logo o soltou o deixando cair no chão, eu fiquei livre no segundo seguinte e corri até ele, Asmodeus desapareceu diante dos meus olhos sob a nuvem negra na qual surgirá, sacudi Caled que ainda tinha os mesmos olhos fixos de pupilas dilatadas, era como se ele não estivesse me vendo, era como se ele não estivesse ali, apenas seu corpo, ele suava frio perdido em um mundo só dele...

- Caled, Caled responda...

Demorou um pouco para que finalmente ele voltasse a si e me olhasse, lentamente as pupilas antes dilatadas voltavam a sua forma normal, ele piscou algum, mas vezes e então uma lágrima rolou pelo seu rosto.

- O que aconteceu com você? O que aquele monstro fez a você...

- Ele me mostrou o que fez a ela...

- Ela?

- Minha mãe, ele me mostrou como a matou, como a destruiu, eu vi o sofrimento dela, vi quando ela implorou para que ele a deixasse viva, vi quando a perseguiu...

- Sinto muito Caled...

- Ele vai fazer o mesmo com todos que eu amar.

- Por que?

- Por que agora eu sou um de vocês, eu fui salvo, não estou mais do lado dele, então sou visto como um inimigo, mas ele sabe que se destruir a mim estará acabado, então ele prefere destruir as pessoas que eu amo, para assim me ver totalmente acabado.

- Deus, como ele pode ser seu pai...

- Ele nunca foi meu pai, ele apenas me trouxe ao mundo, mas nunca foi um pai.

Eu o abracei, então senti que ele afundou o rosto em meu ombro e como nunca o tinha visto antes ele chorou, Caled era mais frágil do que eu imaginava que ele pudesse ser, talvez eu tivesse subestimado a força dele, ele então não era indestrutível.

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