Esther Mendonça
Eu entrei em uma éspecie de transe quando vi a foto de Cecília ali, ele tinha uma foto dela no seu escritório. Eu não sabia se chorava ou se matava aquele cretino, ele não tinha esse direito. Como é que ele podia ter uma foto dela? O seu próprio assassino.
- Cecília.- Deixo escapar o seu nome e sinto as lágrimas molharem as minhas bochechas
- O que disse?- Ele pergunta e só então me dou conta do que eu tinha feito, do que tinha falado. Me viro para ele e o vejo com os olhos arregalados - Repete o que você falou.-
- E-eu não disse nada.-
- Você disse Cecília.-
- Não.-
- Você...- ele está prestes a falar mas eu não dou chance que termine
Saio disparada de seu escritório, se eu ficasse ali mais um minuto eu acabaria estragando tudo. Victor Hugo não podia saber que eu era irmã de Cecília, isso acabaria com qualquer chance que eu ainda tinha de me vigar dele, sem contar que ele podia muito bem me dar o mesmo fim que deu a Cecília. Ele saberia que me ter aqui representaria um perigo para ele, e com certeza se certificaria de me apagar do mapa também. Eu ouvia a voz dele chamando por mim, mas eu era rápida o suficiente para correr e sumir de suas vistas, eu sei que fiz uma péssima escolha em ter fugido, mas eu não saberia o que responder ou qual desculpa inventar se eu tivesse que continuar ali frente a ele. Agora o que me restava era evitá-lo o máximo possível, até que eu conseguisse pensar em algo convincente o suficiente para apagar a burrada que eu tinha acabado de fazer. Antes de sumir do corredor eu vi quando ele foi atrás de mim no elevador, nessas horas eu agradecia por odiar e temer tanto aquela coisa e sempre pegar as escadas. Talvez ele me procurasse na lanchonte, e de lá eu não teria como fugir já que era o meu trablho, eu estava simplesmente perdida e não tinha a mínima ideia de como iria consertar isso tudo. Nadja, eu precisava da minha melhor amiga agora, eu sentia que estava entrando em pânico e só ela podia me ajudar. Eu não tinha a procurado desde que tinha chegado aqui, apesesar de estarmos na mesma empresa, eu estava mais focada em não cometer nenhum erro e estar centrada no meu trabalho para não perdê-lo. O andar em que Nadja trabalhava era um pouco acima do meu, e foi nele que parei enquanto descia as escadas. O meu ar tinha fugido quase todo dos pulmões quando eu cheguei até ela e ela se levantou assustada ao ver o meu estado.
- O que é isso? Você está bem?- Ela se aproxima tocando em meu ombro preocupada e me conduzindo para o banco mais próximo dali, onde eu me sentei e esperei até que recuperasse o fôlego - Espera aí, você veio de escadas?- Ela perguntou e apenas o meu olhar a ela disse tudo - Ah é, elevadores...- Nadja conhecia muito bem o medo que eu tinha
- Não é por isso que eu estou assim.- Explico quando finalmente consigo falar, ela me olha atentamente esperando que eu desse continuidade- Eu acho que coloquei tudo a perder, Nadja.-
- O que você fez?- Ela questiona e só então parece perceber que estávamos no meio do corredor e que ali não era um lugar adequado para termos essa conversa - Vem comigo.- Ela me puxa para dentro de uma das salas vazias que tinha por perto
- Eu estava no escritório do Victor Hugo e...-
- Espera aí.- ela me corta - Você esteve de frente com ele?-
- O encontrei pela primeira vez ontem, mas isso não vem ao caso. Eu vi um retrato da Cecília no escritório dele, Nadja, e eu acabei falando o nome dela.- Revelo e a vejo levar a não até a boca, perplexa com a situação
- O que você disse a ele?-
- Nada, eu fugi.-
- O quê?-
- Eu fugi dele, Nadja.- Repito já impaciente - Ainda estou fugindo, na verdade. Você precisa me ajudar.- Faço o meu apelo segurando as suas mãos- Eu preciso me esconder, ele não pode me encontrar.-
- Você está louca, Esther?-
- Ele vai descobrir tudo se me encontrar, Nadja. Vai descobrir que eu sou irmã da Cecília e vai saber que eu estou aqui pra me vingar dele, ele... ele vai me matar também!-
- Não fala uma coisa dessas.- Ela faz o sinal da cruz repreendendo a possibilidade - Como é que você vai fugir dele se tem que trabalhar, Esther? Eles são muito rigorosos aqui e se você não trabalhar vai ser demitida.-
- E você acha que eu não sei? A supervisora da lanchonete já me odeia e ela adoraria me colocar na rua.-
- E então? Você não pode fugir pra sempre.-
- Eu não vou fugir pra sempre, só preciso evitar ele por um tempo até conseguir pensar em algo pra consertar o que eu fiz.-
- E esse tempo seria quanto exatamente?- Ela cruza os braços me olhando já com descrença
- Eu não sei, Nadja. Não me pressiona, eu não sei o que fazer!- Levo as mãos até os cabelos os puxando, eu estava a um ponto de entrar em surto, se é que isso já não estivesse acontecendo.
- Se acalma.- Ela segura as minhas mãos, as afastando do meu cabelo - Você não tem dinheiro pra comprar uma peruca.-
- Nadja.- A repreendo pela piada no momento sério
- Tudo bem, tudo bem.- Ela ergue as mão em sinal de rendição - Você está em seu horário de almoço agora, certo?- Pergunta e concordo com a cabeça - Victor Hugo também, eu imagino, geralmente o horário é o mesmo para todos da empresa.-
- Eu não ligo pra que hora aquele maldito almoça ou deixa de almoçar.- Quase grito, tudo isso estava me deixando louca
- Deixa eu terminar de falar, sua grossa. O que eu quero dizer é que ele é o Ceo, é um homem muito ocupado e não vai ter tempo pra sair te procurando pela empresa, se ele fizer isso vai ser no horário que tem vago.-
- No horário de almoço dele.- Concluo percebendo o seu raciocínio e ela dá um sorrisinho glorioso - Tá, eu acho que entendi. Então eu só preciso ficar o resto do horário escondida e torcer pra ele não me encontrar.-
- É isso, garota. E eu sugiro que você comece a pensar na desculpa que vai usar, ou melhor, na mentira que vai inventar.-
- Eu vou dar um jeito nisso, não cheguei até aqui pra estragar tudo na merda do segundo dia.- Garanto - Obrigada, Nadja.- Sorrio quando vou até a porta e seguro a maçaneta - Eu vou caçar algum lugar pra ficar até dar o horário.-
- Não deixa de comer!- Ela grita já distante
Falar que eu não conhecia Cecília certamente não era um opção, já que Victor Hugo viu o exato momento em que eu a reconheci na fotografia, ele vio meu estado de choque, a forma que eu fiquei, provavelmente também viu as lágrimas que escaparam de meus olhos. Seja lá a desculpa que eu fosse arranjar, precisaria ser convincente o suficiente para explicar a minha reação, mas precisava ser extremamente calculada para não levantar suspeitas. Eu ainda pensava na possibilidade de simplesmente negar e dizer que ele tinha ouvido errado, mas isso seria mais perigoso ainda, seria coincidência demais e ele jamais acreditaria. A forma como ele ficou quando ouviu o nome dela sair de minha boca só provava o quanto ele estava envolvido até a cabeça na morte de minha irmã, ele ficou quase tão paralisado quanto eu, eu vi o pânico na sua face, não me restavam mais dúvidas que ele era o assassino de Cecília. Eu decidi voltar para as escadas, com a quantidade que eu tinha pra descer não ia nem precisar que eu ficasse todo esse tempo escondida em algum lugar. Eu certamente gastaria ele todo só descendo todos os andares. Percebi que estava certa quando cheguei na lanchonete já no final do meu horário. Ana parecia estar a minha espera, pois assim que entrei na cozinha ela veio logo atrás de mim
- O que o senhor Ferraz queria com você?- A sua pergunta fez o meu sangue gelar por tantos motivos, eu estava fugindo de Victor Hugo, não estava me lembrando que há pouco tinha sido demitida por ele. Ana definitivamente não podia saber disso e isso entraria na lista de omissões e mentiras que eu dizia a ela
- Não era nada.-
- Como não era nada? Ele te chamou até o escritório.-
- Eu já disse que não foi nada demais, apenas algo com a minha contratação.- Digo e apesar dela não parecer acreditar muito na minha mentira, ela desiste de continuar perguntando e volta para o lado de fora, me deixando sozinha
Eu atendia cada cliente e mesa com receio, a qualquer hora Victor Hugo poderia aparecer, se bem que isso era extremamente improvável, ele era um homem muito ocupado e eu certamente não era tão revelante ao ponto dele gastar o seu tempo comigo. Eu me sentia mais aliviada conforme as horas passavam, significava que estava cada vez mais perto de acabar o meu expediente e eu poder ir embora, em casa eu poderia refrescar a cabeça e pensar em algo. Em determinado momento precisei ir ao banheiro próximo a recepção e gelei quando vi Victor Hugo ali, o seu olhar é rápido quando para em mim e ele caminha em minha direção.
- Ei!- Ele chama, cuidando para não gritar e chamar a atenção dos demais
Novamente sou rápida em fugir descaradamente, entro em um dos corredores e quando saio de sua vista começo a correr. Por sorte não havia ninguém ali para ver essa cena embaraçosa, e eu consigo despistá-lo novamente, podendo voltar para a lanchonete assim que chequei que ele não estivesse ali. Pude retornar para os meus afazeres quando me certifiquei que estava segura. Vi quando Diego se aproximou da lanchonete, por sorte agora eu estava sozinha e não iria precisar aguentar e ver Ana babar por ele. O homem era bonito de fato, eu podia entender o porquê ela ficava daquele jeito sempre que o via. Ele carregava uma caixa consigo, e eu podia ouvir um som vindo de dentro delas, eu podia jurar que eram miados de gatos, mas seria muita loucura.
- Ei.- Ele me chama quando se aproxima do balcão - Você tem alguma coisa pra gatos aí? Acho que eles estão com fome.- Ele diz olhando para dentro da caixa e arqueio as sobrancelhas
- G-gatos?-
- Sim, veja só que coisinhas mais lindas.- Ele deposita a caixa com cuidado em cima do balcão e então eu posso ver que estava certa, a caixa estava repleta de gatinhos filhotes, que miavam sem parar. Haviam pelo menos uns cinco ali
- Meu Deus, eles são lindos.- Digo levando as minhas mãos para dentro da caixa e pegando um no colo
- Você quer ficar com um? Resgatei eles da rua.-
- Infelizmente eu não tenho condições de criar um.- Sorrio triste - Eu não vou ter nada aqui pra eles, mas se quiser posso aquecer um pouco de leite e vemos se eles bebem.-
- Sério? Isso seria ótimo.-
- Fique aqui com eles então, eu volto num instante com o leite.- Sorrio antes de dar as costas a ele e entrar para a cozinha
A cozinheira da lanchonete vinha cedo e fazia todas as comidas do dia, as deixando nos compartimentos corretos para que se mantessem quentes ou geladas ao longo do dia, o lugar tinha tecnologia suficiente para que tudo ainda ficasse delicioso como se acabasse de ser feito. Se as comidas acabassem e precisassem de reposição, ela vinha mais de uma vez e cozinhava mais até que o estoque estivesse completo. Como ela estava no momento e era uma tarefa simples, eu mesma me direcionei até o fogão e esquentei o leite para os gatinhos. Usar aquelas panelas, os talheres, aquela cozinha toda em si me dava vontade de simplesmente cozinhar de tudo ali, era incrível demais e o meu amor pela gastronomia me motivava a apreciar ainda mais aquela lanchonete.
- Aqui está.- Anuncio voltando com o leite e o vejo devolver um dos gatinhos que segurava para dentro da caixa
Logo trato de colocar o recipiente dentro da caixa e vejo todos os pequenos animaizinhos avançarem até ela, bebendo do leite.
- Olha só, eles estão bebendo.- Ele aponto para a caixa - Obrigado...?-
- Esther.-
- Diego.- Ele sorri em um cumprimento - Imagino que você já tenha que fechar a lanchonete.- Diz e só agora me dou conta da hora que era - Eu vou indo, obrigado por isso.- Ele sorri novamente antes de sair
Eu pude sentir um alívio quando finamente tranquei tudo, eu tinha passado o dia inteiro fugindo de Victor Hugo e finalmente poderia ir para casa. Percebi que estava errada quando me virei me deparando com a última pessoa que eu queria ver.
- Vai continuar fugindo de mim?- Ele questiona sorrindo com sarcarsmo