— Está tudo bem, garotinho? — uma voz doce veio de encontro ao seu ouvido esquerdo. Em um choque de realidade, corrigiu a postura ajeitando sua camiseta que já transparecia a sua barriga por cima da bermuda.
— Sim, moça! — respondeu abaixando a cabeça.
Lentamente, olhou para o lado e viu uma mulher fantasiada de Virgie, a personagem do novo jogo que tanto aguardara. Não sabendo que atitude tomar, começou a andar, mas foi segurado por ela.
— Calma, não precisa se envergonhar! Olha pra mim!
Um longo vestido preto com um uma faixa verde na cintura lhe cobria o corpo deixando apenas os braços nus. Em seu pulso, um bracelete de serpente e nas orelhas, dois brincos com diamantes verdes.
— Quer ver uma coisa bacana? — indagou enquanto passava a mão sobre a cortina da cabine que até pouco tempo estivera Ruben.
Quando a moça puxou a cortina, uma luz intensa brilhou. Virgie entrou na cabine, se virou e...
— Venha Auro! — fez um gesto com a mão para o garoto que estava boquiaberto.
— Não seria interessante se descobríssemos que existe outro mundo? — indagou. —Venha! — insistiu com um belo sorriso.
Naquele momento, Auro estava em parafuso, o sentimento de incerteza, tristeza e solidão que ocupavam seu ser se dispersavam.
Ao seu redor, as pessoas caminhavam, riam, cantavam e ali estava ele, se sentindo em outra dimensão. “O que meu vô faria numa situação dessas?” — pensou. — “É melhor ficar na minha e sair daqui, mas o que ela quis dizer com descobríssemos que existe outro mundo?”
Olhando para a moça de cabelos ruivos, pele clara, sorriso angelical e voz suave, experimentou uma sensação que até outrora não vivera. Seu corpo estava com um calor intenso, mas não suava;
Sua mente parecia apagar todo sentimento de ansiedade, angústia e timidez. Deu alguns passos, segurou a mão daquela linda mulher e entrou na cabine que aparentava ser bem maior do lado de dentro do que de fora.
Uma pequena mesa de madeira posicionada ao centro bem na sua frente e do outro lado, Virgie posicionou-se de costas para ele.
Observou o local, constatou que havia uma lâmpada em cada extremidade emitindo luz com cores diferentes: a sua direita, luz azul; a sua esquerda, luz vermelha; a sua frente, luz verde e virando levemente a cabeça, viu que a lâmpada emitia luz cinza.
Ainda notou que o chão era coberto por um tapete branco da mesma cor do teto. Quando pensou em questionar a ruiva sobre tudo aquilo, levou um susto. Ela agora o fitava, segurando um pequeno vaso marrom enquanto uma adaga dourada com detalhes verde estava em sua cintura:
— Será que precisamos mesmo estar sempre dispostos a lutar?
— Vale tudo pra vencer a batalha?
— Afinal, é muito mais confortável observar os outros jogadores, dar palpites do que deve ser feito e assistir o que irá acontecer, não acha?
Ela acomodou o vaso sobre a mesa, colocou as mãos ao lado do corpo com a palma das mãos viradas para o jovem garoto, que permanecia calado e com olhar fixo diretamente em seus olhos castanhos.
— O que quer de mim? — Auro questionou-a.
A ruiva riu: — O que eu quero? Quero viver intensamente, saber que aproveitei cada momento com as pessoas certas. Ter coragem para ir adiante e enfrentar meus desafios.
Bateu com as duas mãos sobre a mesa e falou mais alto: — — E você? Quando vai parar de ficar na defensiva?...Quando vai entender que precisa lutar?...Quando?
Auro abaixou a cabeça, não tinha respostas e nem forças para aquelas perguntas. Fechou os olhos, viu seu avô sorrindo e dizendo que iria ficar tudo bem.
— Olhe para mim!...Estou aqui para lhe dar isto!
Abriu os olhos, estendeu a mão e pegou um cartão em branco oferecido por ela. — O que faço com isso? — questionou enquanto batia o cartão na palma da outra mão, tentando disfarçar a ansiedade.
— Primeiro. A partir de hoje sua vida irá mudar. Olhe para frente, meu garoto. Veja o seu destino.
Apontou para o vaso. Auro olhou, deu um sorrisinho: — Não acha que sou jovem demais para pensar em ir para debaixo da terra? hahaha.
Virgie curvou-se:
— Gostaria de participar de um torneio?
Os olhos dele brilharam: — Sim, quero!
— Pois bem! Ouça com atenção!
— Quando eu sair, coloque o cartão sobre a terra e em convite... ele se transformará!... — Mas, as instruções do convite precisam ser seguidas à risca!
— Vá sozinho até o local indicado e na hora marcada para ser aceito no nosso torneio!
Começando a andar em direção a saída, pegou a adaga e colocou ao lado do vaso:
— Ops! Sabia que estava me esquecendo de algo! Assim que colocar o cartão pegue a adaga e finque-a no cartão até que a lâmina esteja completamente enterrada!
— E mais uma coisa... não conte o que aconteceu aqui ou sobre o torneio!
A moça passou pela cortina.
Auro permaneceu em pé, colocou o cartão sobre a terra, pegou a adaga e, com as duas mãos segurando o cabo, seguiu o que foi dito.
Neste momento, soltou a adaga, fechou os olhos e, mesmo assim, conseguia ver o ambiente iluminado pelas luzes que se esvaiam conforme um forte sentimento de coragem percorria pelo seu corpo.
As luzes foram diminuindo, abriu os olhos e ao seu redor, as luzes estavam correndo para o cabo da adaga que diminuía conforme um convite verde “brotava” sobre a terra.
— Mas o que??? É idêntico ao que estava com Ruben. Será que?
O vaso e as lâmpadas deram um estalo e se quebraram.
Foi então que Auro percebeu o tanto de tempo que já estava ali e saiu para procurar Virgie. Ao passar pela cortina, fitou a cena que acabara de acontecer. Ruben consolando Odisseu.
O tempo não passara nem um segundo!
— Olá? Sou a Gloria! Lá de longe, vi você e o Ruben aqui.
O garoto ainda atônito, guardou o convite em sua bolsinha. Na sua frente estava uma bela garota alta, morena de cabelos cumpridos e com um sorriso fantástico.
— Oi! Sou o Auro.
Gloria segurou em sua mão: — Venha, ainda temos muita coisa para aproveitar nesta quarta-feira!
Durante o evento, Gloria reuniu todos os garotos. Deu uma bronca em Ruben por deixar Auro sozinho, arrancando-lhe a peruca ruiva e deixando a mostra que o garoto tinha a cabeça raspada.
Odisseu fez uma brincadeira e acabou tendo seu disfarce revelado, pois também estava de peruca e seu cabelo ruivo caiu-lhe até os ombros. Andavam por cada estande, riam e uma amizade verdadeira surgia entre eles.
Algum tempo depois, Auro estava no banheiro sentado no vaso e perdido em suas ideias.
“— Gloria é sensacional! Ainda bem que apareceu e fez tudo dar certo. Pena que Mia não pode vir.”
Um estalo em sua mente o fez relembrar tudo que aconteceu na cabine. Abriu a bolsinha e ainda tinha seu convite.
Analisou atentamente ao que estava escrito, uma gota fria desceu pela sua fronte.
Em seu convite verde, lia-se:
"Você foi escolhido"
"Compareça ao local indicado com este convite"
"Torneio M.A.R.G.O."
"Auro"
"Dia 15 de Junho de 2025"
"Às 09:00h, rua: Noah Sophia, 418."
"Vale tudo para ser o campeão?!?"
"Virgo"