Ela não mentiu quando disse que tinha uma vídeo conferência, o que isso podia me incomodar. Às vozes, as discussões. A forma como ela tenta manter a postura, mesmo quando tudo no corpo dela grita que não concordo. Eu não ia conseguir dormir com isso, por isso me envolvi com as redes sociais, conversando com Mike e Eli, e com outras primos no grupo. Ou simplesmente vendo coisas nas redes sociais. De vez em quando olhando para ela. Para vê-la com expressão seria. As vezes dando todos sarcásticos, as vezes fazendo comentários irónicos. Aquela era uma versão dela que eu não conhecia pessoalmente, só via nas redes sociais. Ela nunca respondeu a ninguém daqui, desse jeito, ou tratou de forma hostil. Mesmo quando sou mau, com ela, ela não me trata como está tratando esses homens. Como se fossem retrógrados, e com existência sem significado. A conferência começou às 22h, agora são 00h e a discussão deles continua aflorada. No meio disso tudo a porta do nosso quarto é aberta bruscamente, e

ANOS ATRÁS Nikolai Prokhorov.Andrey avançou na minha frente, com um grupo de homens para tentar derrubar o helicóptero de Christopher. Enquanto eu estou parado, de frente a um cenário que irá me atormentar, todas as noites em que eu fechar os olhos. Os pulos e tornozelos de Lyuba estão amarrados com correntes que a suspendem no ar. Seu vestido antes creme, está rasgado e machado de sangue, com cortes em suas costas, seu ombro, seu peito. Seu rosto está tão machucada e cheia de sangue que nem dá para ver suas expressões faciais ou saber se ela está viva.Eu não consegui dar um passo a mais de tanto que isso me tirou dos eixos. Dois dos meus homens passam na minha frente e vão até a alavanca, para a colocar no chão, e logo de seguida tiram as correntes que a prendem. Olho para o empenho que eles estão fazendo para a desprender e bem perto deles, a chicote fino que o filho da puta usou para ferir minha mulher.Vai haver guerra.Tirei minha camiseta para cobrir seus ombros nus, sem fal

Primeiro ele foi amarrado nos pulsos e nos pés.— Você sabia que Jesus não foi a primeira pessoa a ser crucificada na história? Na Roma antiga, os criminosos eram crucificados, havia uma ala apenas cruzes de homens como você.— falei antes de lentamente começar a pregar sua mão direita enquanto ele gritava. Com isso descobri que não é muito fácil perfurar a carne humana com uso de um prego e um martelo. Depois fui para sua mão esquerda, ele estava chorando e ranhoso. Havia até se mijado nas calças, e provavelmente se cagando de tão mal que estava cheirando.— Nikolai por favor me mata, me mata, eu te suplico.— se humilhou miseravelmente. Fui para seus tornozelos e antes de os martelar o observei.— Sabe em que estado deixou minha mulher?— Mas foi ela que começou, você sabe. Meus irmãos estão mortos por causa dela.— Não te batas. Eu mandei matar seus irmãos na cadeia, se você tivesse me perguntado ou se atentado aos factos, isto não estaria acontecendo. Eu ia destruir seu clã de um

Lyuba Urash.Como eu posso descrever Nikolai? Humm, talvez como sendo um homem, ditador, possessivo, autoritário, perfeccionista, perspicaz, muito inteligente, e a pouco tempo descobri também que ele consegue ser muito cuidadosa. Também. Também. Quando estávamos a namorar, ele também se mostrava ser uma pessoa assim, desde o momento que eu disse que não aceitaria ser tratada como prostituta. Mas agora, isto está para além, do carinho que ele já demonstrou.Às vezes preparando o café da manhã, se certificado de que cumpri com toda a medicação. Não me instigando para transar com ele, quer dizer, ele está dormindo em outro quarto. E desde que sai do hospital, nunca tentou me beijar ou disse palavras carregadas de malícia. Esse Nikolai, com certeza eu não conhecia. Deixar meus filhos comigo, okay. Mas chamar minha mãe para viver connosco isso me tirou o chão, não esperava isso dele. Um mês e meio depois deu ter cumprido a medicação, ele começou a liberar minha saída, mas com segurança.

Darina.Enquanto durmo, sinto que meu corpo pesa como concreto molhado. É como se estivesse afundando lentamente, presa num mar invisível que me suga sem pressa. Não sinto meus pés, nem minhas mãos, nem o mundo ao redor. É como se eu tivesse morrido, mas sem a paz que dizem que vem com a morte. Só o vazio. Uma ausência de tudo. Até mesmo de mim.Minha mente tá apagada. Como um interruptor desligado num cômodo escuro. Não sinto dor, nem fome, nem medo. Nem saudade. Mas sei que algo tá errado. Algo dentro de mim grita — mesmo que sem som — por algo que foi arrancado à força. Algo que não volta mais.Então, como se essa escuridão fosse feita de água pesada, uma porta aparece na minha frente. Ela surge devagar, como se estivesse sendo desenhada à mão no escuro. De ferro velho, enferrujada, com um rangido tão agudo que arrepia até a alma. Por trás dela, uma luz. Não quente. Fria. Quase indiferente. Mas é luz, e depois de tanta escuridão, qualquer coisa que brilhe parece promessa.A porta s