POV Liah Dois anos se passaram desde que o fogo consumiu os traidores e o sangue selou meu trono. Dois anos em que os gritos de guerra cessaram, mas dentro de mim... a tempestade jamais se calou. Aelyra crescia silenciosa e sombria. Seus olhos negros sempre sabiam mais do que deviam. E Raelorne, meu doce filho, curava com um toque, mas chorava ao ouvir vozes que ninguém mais ouvia. Eles não eram apenas filhos de um rei. Eram filhos da maldição. Da profecia. Meus filhos. Rhaziel os tratava como se fossem dele. Treinava Raelorne com a espada e ensinava Aelyra a se proteger dos próprios dons. Era paciente, leal, silencioso em seus desejos — e dormia ao meu lado todas as noites... sem nunca me tocar. E eu? Eu deixava. Deixava que meus filhos o chamassem de pai. Deixava que ele segurasse minha mão diante do conselho. Deixava que me olhasse com adoração enquanto os outros alfas baixavam a cabeça. Mas à noite, quando seus olhos cerravam em paz... eu sonhava com outra coisa. Com den

POV Magnus O gosto do sangue me era mais doce do que o vinho negro dos clãs antigos. Cada vez que minhas presas se cravavam na garganta de um traidor, eu via o rosto dela — fria, inalcançável, soberana. Minha loba. Minha maldição. Minha perdição. Ela havia desaparecido da cama que um dia dividimos. Agora dormia sob os panos de linho real, ao lado de um verme de outro reino, um Alfa enfeitado que ousava sorrir para meus filhos… e ser chamado de pai por eles. Eu queria arrancar sua garganta e banhar o trono com seu sangue. Mas o que me feria mais profundamente… era o modo como ela o olhava. Com a ternura que um dia foi minha. Como se, no fundo, já tivesse me esquecido. Mas ela não esqueceu. Ninguém esquece a dor que transforma. Ninguém esquece o toque do alfa que a marcou com dentes e fogo. As sombras me obedeciam. Meus homens recuavam quando eu passava, como se pressentissem que meu controle estava se esfarelando. Eu não era mais rei. Eu era a tempestade. E se ela ousasse

POV Liah O vento soprou forte, fazendo as cortinas negras do salão balançarem como véus fúnebres. Ainda havia cinzas no chão desde a execução da princesa. Cinzas e sangue. Meus cabelos estavam presos no alto da cabeça, mas os fios soltos batiam contra meu rosto enquanto eu me erguia do trono como uma sombra. A pele marcada pela guerra ainda ardia, mas não mais doía. Não depois daquela noite. A noite em que Magnus se entregou como fera faminta, e eu — estúpida — me deixei levar. De novo. Meus lábios ainda guardavam o gosto da sua boca selvagem. O corpo, as marcas de sua brutalidade apaixonada. E a alma... a alma queria esquecê-lo, mas sangrava por ele. Por cada toque, por cada palavra de ódio sussurrada como jura de amor. Desci os degraus de pedra com passos firmes. Os soldados abriram caminho como se temessem minha presença. E deviam. — Onde estão meus filhos? — perguntei ao guarda da entrada, sem sequer olhá-lo nos olhos. — No pátio de treino, Majestade. A pequena Aelyr

POV Liah O trono ainda guardava o calor do meu corpo, mesmo após horas sentada em silêncio absoluto. Nenhuma palavra fora dita desde o último conselho. Nenhuma ordem foi dada. Nem precisava. Quando a Rainha da Noite silencia… o reino prende a respiração. As paredes negras estavam revestidas com tapeçarias de luto. Os estandartes de guerra ainda não haviam sido içados, mas todos sabiam. Era só uma questão de tempo. O gosto do sangue ainda pairava no ar. O gosto do passado. E do que ainda estava por vir. Minha respiração era lenta. Deliberada. Como se cada inspiração fosse uma batalha, e cada expiração, uma sentença. Os ecos da noite passada ainda estavam em mim. O peso do corpo de Magnus sobre o meu. O som da sua respiração ofegante ao meu ouvido. As juras sussurradas entre os dentes, como promessas que sangram. O calor selvagem da sua pele… e o frio absoluto que veio depois. Quando levantei, nua, coberta por nossos pecados, e o deixei dormindo entre os lençóis manchados de d

POV Liah O trono estava frio sob meu corpo. Não importava quantas peles de lobo cobrissem a pedra ancestral — aquele lugar jamais aqueceria. Nem mesmo com os gritos do povo do lado de fora, exigindo sangue, respostas, guerra. Ou meu silêncio. Minhas mãos tremiam sob o peso da coroa, mesmo que eu fingisse força. As últimas palavras de Aelyra ecoavam como lâminas: “Ele não está mais inteiro. O pai. Ele quebrou.” E se Magnus estava quebrado… o que isso fazia de mim? A mulher que o quebrou? Ou a sombra que ainda o segurava pelas correntes? Rhaziel permanecia imóvel à minha esquerda, seus olhos escuros como breu, analisando cada detalhe do salão. Mas não era apenas o salão que ele vigiava — era a mim. Seu olhar não era mais o do homem que me amava em silêncio, mas o do general que temia o que eu poderia escolher. Que temia o que já havia escolhido, sem dizer. “Você voltou para ele?”, ele havia me perguntado na noite anterior, com a voz embargada de algo que se parecia demais com