Capítulo 2

Fechei a porta de casa e me deitei no sofá, tentando me aquecer mais do que aquelas bebidas aqueceram. Não tem como, sou um típico britânico que ama os Pubs da cidade e adoro viver assim, literalmente como um boêmio. Ainda não tinha encontrado uma vida melhor do que essa, onde se pode curtir ao lado dos amigos e se ter o que quer.

Tinha acabado de fazer um pequeno show e minha conta bancária acolhia mais uma mísera quantia para a futura carreira como músico que eu tanto idealizava. Programava viajar em alguns meses para promover minha música e tentar arranjar alguma gravadora. Isso é! Se eu realmente conseguisse ter o dinheiro o suficiente para bancar algumas passagens. Isso era algo muito complicado, na minha opinão.

Ainda eram seis e meia da manhã. Estava completamente ligado por causa da noite e resolvi ficar navegando pela internet, para buscar um pouco do sono que tinha desaparecido. Obrigado, insônia, por nunca me abandonar. Enquanto as páginas iam carregando, abri meu armário para trocar de roupa, mas como tudo que eu toco simplesmente cai no chão, com uma pilha de fotos antigas não foi diferente. Ótimo. Peguei tudo de qualquer jeito para jogar em seu lugar de origem, mas parei ao ver a imagem. Eu e Kristine, brincando na pracinha em frente as nossas casas. Uma certa nostalgia bateu quando olhei direto nos olhos daquela minha amiga que tive por alguns anos. A família dela e a minha eram completamente unidas por nossos pais terem feito o colegial juntos. Acabou que viraram vizinhos, meus pais me tiveram e, três anos depois, Kristine nasceu. Ela sempre fora a irmã que eu não tive. Tantos anos sem notícias, sem um mínimo contato, que acabou me dando ume estalo na mente. Ela deveria estar com uns vinte anos e com certeza teria algum perfil na rede social. Não demorei em digitar o nome dela e esperar os resultados, até que o familiar rosto apareceu. Por que eu não pensei nisso antes? Enviei a solicitação de amizade, torcendo para que ela estivesse online e lhe mandei uma mensagem.

“Kristie? Não sei se você lembra de mim, mas sou o Thomas, filho da Claire e Douglas. Éramos vizinhos aqui em Londres. Achei uma foto nossa de quando éramos crianças e resolvi te procurar por aqui! Espero que se lembre.

Thomas”

Pelas fotos, Kristine estava bem diferente. Seu cabelo louro e longo quando éramos crianças agora era castanho, picotado e ela fazia faculdade. Ainda estava completamente surpreso por ter encontrado uma pessoa que realmente achei que nunca mais fosse ver na minha vida. Definitivamente, o mundo era um lugar estranho de se habitar.

***

Acordar com uma bela ressaca não é o que se espera quando é necessário levantar e ir para a faculdade em poucas horas. Eu não podia reclamar, já que algumas de minhas amigas estavam me levando para sair, tentando não me deixar em depressão em casa por causa do idiota do Michael. Sem ter para onde correr, liguei meu notebook e fui tomar um banho, na tentativa de aliviar minha dor de cabeça. Apenas uma tentativa mesmo, porque eu tinha certeza que nada disso ia melhorar aquela coisa infernal.

Assim que estava quase pronta para a aula, entrei em minha rede social e pasmei com o que vi. Thomas. Thomas Carter. E ele tinha me deixado uma mensagem. Um filme passou em minha cabeça. Thommy sempre esteve na minha vida até eu deixar Londres e era muito estranho ter algum “contato” após dez anos. Ele era um tonto por achar que eu não recordava dele. E tinham exatos vinte e três minutos que ele tinha deixado essa mensagem.

“Thommy? Meu Deus, quanto tempo! Achei que nunca mais fosse ter notícias de vocês! E como vão as coisas por ai? Sinceramente espero que você ainda esteja online para a gente se falar! Tem muito tempo que ninguém me chamava de Kristie, sabia?

Grande beijo!”

Torci com todas as minhas forças para ele me responder. Era coincidência demais! Eu e ele éramos inseparáveis, mas no meu último ano em Londres, as coisas começaram a mudar. Lembro que Thommy estava deixando de ser criança para se tornar um adolescente, enquanto eu continuava infantil, brincando de bonecas e pedindo para ele fazer o mesmo. Atualizei a pagina e vi que ele tinha respondido.

“Eu também achei que nunca mais fosse ter uma notícia de vocês. Mas por que não nos falamos na sessão privada? É melhor do que ficar mandando mensagens por aqui.

Beijos.”

Ri e brinquei com ele.

“Tô vendo que você ficou inteligente. Nos encontramos em alguns segundos.”

Era ele, o meu melhor amigo de Londres, o irmão que eu tinha perdido contato há dez anos. Não tive

nem tempo de olhar suas fotos. Não imagino nem como ele pode estar  fisicamente, na verdade nem

lembrava muito. Será que aquele seu jeito tinha mudado? Era a hora de saber.

Thomas: Oi Kristie!

Kristine: Nossa! É você mesmo na foto? Que surreal!

Thomas: Sou eu mesmo. Surreal é abrir seu armário pra tocar de roupa, deixar fotos caírem no chão, lembrar da antiga amiga e estar falando com ela alguns minutos depois. Isso que é o mais doido e estranho, pode ter toda a certeza do mundo.

Kristine: Eu concordo contigo... Isso é meio louco!

Thomas: Mas me conta... O que tem feito? Vi que você está na faculdade.

Kristine: Sim, de cinema. Faltam só dois anos, graças a Deus. Quero ser roteirista.

Thomas: Isso é bem legal, mas acho que não tenho o tino para a coisa... – ele demorou dez minutos para falar alguma coisa. Que conversa doida e sem nexo! E eu parada observando o tempo se passar

Kristine: Então acho que é isso, Thomas! Tenho que ir para a faculdade. A gente se fala mais tarde?

Thomas: - Se o fuso horário colaborar... Podemos tentar.

Kristine: - Ah sim, esqueci! Então a gente se esbarra virtualmente. Beijos, cuide-se por ai.

Thomas: Pra você também.

Ele era bipolar? Não lembrava desse fato. Ele deveria ter adquirido alguns probleminhas nesses dez anos. Tentei esquecer essa conversa estranha, peguei as chaves do carro e fui para a faculdade. Mesmo tentando, nosso diálogo não saia da minha mente. Para quem estava animado em me reencontrar, suas ações foram completamente opostas. Até um amigo de mil anos atrás me rejeitava. Eu deveria ser um bom pedaço de lixo mesmo. Estacionei ao lado do carro de Hayley e segui para minha aula de roteiro.

  • Que cara é essa? Acordou virada? – Hayley indagou, tirando seu caderno da mesa que guardava para mim.

  • Só um pouco cansada e estressada. Principalmente dos homens. – bufei, colocando a bolsa no meu colo, retirando as minhas coisas.

    • Michael de novo?

    • Não

    • Então o que houve?

    • Não teve nada não, amiga! Só tô querendo que essa aula acabe mesmo para eu dar uma volta de

    carro.

    • Logo na aula que você mais gosta? O que tá acontecendo com você? Dá pra me explicar?

    • Nem sempre estamos aptos ao que gostamos. Meu humor não tá um dos melhores hoje. Vou ficar quieta porque eu não quero te dar uma patada de graça.

    • Acredite, você já tá fazendo isso.

    O tempo demorou a passar, mas passou. Não sabia o porquê de eu estar mais melancólica que o comum, mas nada melhor do que dirigir até a praia do farol e observar as ondas batendo enquanto eu ficava jogada na areia. Com certeza não me sentia curada, mas também não queria ter que ficar nessa situação e foi ali, naquele momento em que eu me obriguei a esquecer do Michael. Ele não era cara dos meus sonhos. Ele nunca seria nada disso. Eu deveria desconfiar de todas as vezes que o celular dele vibrava e ele olhava, com receio de eu estar observando o que ele fazia. Michael nunca seria de uma só. Pena que eu um dia acreditei que ele pudesse ser único comigo.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo