O Último Presente
O Último Presente
Por: Jasmim
Capítulo 1
Ponto de vista: Viya

Sob o olhar piedoso do médico, engoli o analgésico de efeito imediato.

Começava a contagem regressiva da morte: três dias.

Subi para o quarto VIP no último andar. Papai cortava frutas para Jane, enquanto mamãe assistia a um filme com ela no sofá.

Assim que empurrei a porta e entrei, o clima leve e animado desapareceu. Como se alguém tivesse apagado a luz.

— De manhã não estavam dizendo que você estava morrendo? — A voz de mamãe veio fria, cortante. — O que foi agora? Como ninguém acreditou na sua mentira, veio tentar atormentar a Jane de novo? Viya, a partir de hoje, seu pai e eu não vamos desgrudar dela nem por um segundo. Você nunca mais vai ter a chance de machucá-la!

Ela se colocou entre mim e a cama, mantendo-me a pelo menos um metro de distância.

— Nós somos da família Smith, uma das nobres da Alcateia Lua Minguante. Temos educação, somos respeitados. Mas você... — Papai se adiantou, firme, os olhos cheios de decepção. — Temperamental. Invejosa. Fingiu estar doente só pra tirar da Jane o elixir curador! Se soubéssemos que você seria tão egoísta, era melhor que nunca tivesse nascido!

E ali estavam eles, como galinhas protegendo o pintinho, mas o pintinho era Jane.

Por trás deles, Jane me mostrou a língua com um sorriso debochado e provocador.

Sorri com amargura. Essas palavras... Não eram novas.

Eu já ouvira tudo isso antes.

E, antes, reagia, gritava, discutia, negava, revelava o quanto Jane era falsa.

Mas o que eu ganhava com isso? Apenas mais desprezo. Mais desconfiança. Mais distância.

Agora, porém, eu não queria mais me explicar. Eu ia morrer. A verdade já não importava.

— Já que você veio, melhor assim. Não preciso mais te ligar. — Disse papai, ainda com o rosto fechado.

— Que coincidência. Eu também queria conversar com vocês. — Respondi com um sorriso leve, tentando aliviar o clima. Fitei Jane por um instante. — Jane sempre quis aquela minha fábrica de peles, não é? Pensei bem... Somos da mesma família. Pode ficar com ela.

No instante anterior, meus pais ainda me olhavam com frieza. Mas assim que ouviram minhas palavras, ficaram imóveis por um segundo. Trocaram um olhar entre si e então se voltaram para mim.

— Você está falando sério? — Papai franziu a testa. — Ou isso é algum tipo de plano? Está exigindo algo em troca?

Eles realmente acharam que era uma armadilha.

Sorri com amargura. Que a primeira reação deles fosse suspeitar de mim... Bem, não era exatamente surpreendente.

Jane cobiçava minha fábrica de peles, a número um da alcateia, fazia tempo.

Meus pais já tinham tentado me convencer inúmeras vezes a cedê-la para ela.

E eu sempre me negava, com firmeza.

Todas essas conversas terminavam mal. Sempre.

E a cada discussão, o que restava do nosso laço familiar se desgastava ainda mais.

Mas agora... Agora eu estava morrendo. Que sentido havia em continuar agarrada àquilo?

— Se tivesse sido assim desde o começo... — Suspirou papai, visivelmente aliviado. O olhar dele até pareceu mais afetuoso.

Mamãe se aproximou, segurando minha mão com carinho.

— Você cresceu, Viya. Está mais sensata. A empresa foi construída por você, sim, mas Jane é a melhor aluna dos cursos de Finanças e Administração da Universidade dos Lobisomens. Com certeza vai transformar sua fábrica na maior de toda a América do Sul!

Assenti em silêncio e entreguei para Jane o contrato de transferência da empresa.

Quando assinei meu nome, vi que Jane, apesar de surpresa, não conseguiu conter um sorriso vitorioso, escondido, só para mim.

Na disputa por amor e reconhecimento, eu tinha perdido.

— Toma um pouco de água, você deve estar com sede. — Disse mamãe, atenciosa, oferecendo um copo de água morna e acariciando meu cabelo com ternura.

Quase chorei.

Por que só quando eu entregava tudo a Jane, mamãe conseguia ser assim... Tão doce comigo?

Fico me perguntando...

“Se um dia eu morrer, e mamãe descobrir que Jane não é tão bondosa quanto pensa...

Será que ela, será que eles, vão se arrepender de terem sido tão frios comigo?”

Voltando do hospital para casa, encontrei meu filho e meu companheiro, Leo, jantando à mesa.

— Papai, essa sopa de cogumelo com creme tá uma delícia! — Disse Mark com os olhos brilhando.

— Sua madrinha também adora essa sopa. Depois do jantar, vamos levar um pouco pra ela. —Respondeu Leo, sorrindo.

A cena dos dois, tão próximos e sorridentes, se desfez no instante em que me viram.

O ar pareceu congelar.

— O que você está fazendo aqui? — Leo largou faca e garfo, me encarando com estranheza.

A mesa, repleta de pratos apetitosos, quase me machucava os olhos.

O olhar de Mark era distante, vazio, como se estivesse vendo uma estranha.

Foi aí que descobri... Leo sabia cozinhar.

E cozinhava bem.

Antes, eu vivia ocupada, trabalhando, cuidando da casa, tentando dar conta de tudo.

Mesmo assim, Leo sempre criticava minha comida.

Dizia que era intragável.

E Mark, ainda pequeno, aprendia a me desprezar também.

Eu dava tudo de mim para sustentar aquela casa. Trabalhava, lavava, cozinhava...

Mas, no fim das contas, ninguém me respeitava.

Antes, vendo os dois assim, frios, distantes, eu teria feito escândalo.

Teria perguntado por que não podia estar ali, por que me tratavam como intrusa.

Mas agora, não disse nada.

Apenas comecei a arrumar minhas coisas em silêncio.

Leo pareceu desconcertado com minha falta de reação.

Hesitou por um momento, depois se aproximou.

— Viya, queria conversar com você... — Disse ele, a voz baixa, talvez até um pouco envergonhada. — Sua irmã, Jane... Ela começou o tratamento agora. A poção vermelha pode afetar o humor dela, deixá-la instável. Para ajudar na recuperação... Seus pais pensaram que, se fizermos a cerimônia de marcação, ela vai se sentir mais feliz.
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