5

Ele estava atrasado, de novo. Faltava uma hora para o embarque e nem sinal do homem loiro. O tempo estava ficando apertado e ele sequer havia aparecido para despachar a bagagem. O frio dentro do aeroporto jogava sujo, seu queixo já quase batia automaticamente. Seu telefone tocou, e depois da dificuldade de achar o aparelho dentro da bolsa larga, ela atendeu.

— Alô? — Houve um grande silêncio para depois seus tímpanos quase serem destruídos pelo barulho extremo vindo da ligação.

— Alô? Está me ouvindo? Alô? — Cassie conseguia ser irritante quando queria. Suas brincadeiras, embora muito engraçadas, às vezes eram acompanhadas também de um pouco de extravagância. Era escandalosa em tudo, afinal.

— Desse jeito eu vou chegar surda no Texas! — Riu. — Está tudo bem por aí?

— Está sim, na verdade estou ligando pra dizer que o escritório está recebendo uma massa enorme de processos — desabafou, estava exausta só de pensar em fazer todas as cogitações contratuais. — E como você está indo viajar, não sei se eu devo dar entrada em todos, ou organizá-los e deixar a abertura por sua conta.

Ter a sua própria empresa havia sido de longe uma das melhores decisões que já havia tomado em sua vida, mas também, era algo que já lhe havia dado muita dor de cabeça. Na verdade, ainda dava, nunca tinha um descanso digno e quando resolvia parar por um tempo para cuidar de si, as tarefas à longa distância pareciam dobrar de quantidade. A última vez em que ousara tirar férias, fora dois anos antes. O resultado de tal feito foi dormir apenas três horas por noite durante quase seis meses, reorganizando os processos que Cassie havia aberto durante seu período fora, e ela sabia muito bem que dessa vez não seria nada diferente. Talvez seria até pior, uma vez que o processo de separação de Aaron havia se tornado público e assim, atraindo ainda mais olhares para seu escritório.

— Abra todos os processos e adiante o que conseguir nesse período dos próximos trinta dias. — Seus dedos tatearam a borda do cinto, que incomodava sua cintura. — Sei que não é a sua função, mas dobrarei seu salário durante meu período fora.

— Se precisar ficar um ano, eu juro que não ligo! — A amiga deu um gritinho eufórico através da linha telefônica.

Joanne riu.

— Menos! — Pigarreou. — Essa empresa pegaria fogo sem mim!

— Não devo te lembrar então que Elisah quase incendiou o prédio essa semana e graças a mim ela não conseguiu, certo? — Brincou. O apito de embarque de um dos voos soou alto de forma que impedisse Jones de falar, dando novamente abertura à amiga. — Ainda está no aeroporto?

— Estou esperando o Ethan, ele está atrasado — resmungou. O atraso já parecia ser traço de sua personalidade.

— Mal noivou e já foi abandonada no altar?

— Muito engraçadinha. — Joanne amarrou os cabelos. Seu corpo começou a esquentar pelo nervosismo e nem mesmo o ar condicionado do aeroporto parecia normalizar sua temperatura.

Pensamentos invadiram sua mente involuntariamente, será que ele havia desistido? Deus parecia não economizar nos sinais enviados. Sabia de fato que tudo o que havia organizado não bastava de uma baita mentira. Aquilo tudo provavelmente tomaria proporções provavelmente inimagináveis, incalculáveis e sem previsões. Teria que ter o maior cuidado possível, toda a naturalidade possível poderia ainda ser pouca, uma vez que Julliet era dona de um faro aguçado para mentiras e problemas.

— Pela sua voz eu posso dizer que está irritada.

— Irritada é uma palavra muito forte, prefiro ansiosa — desabafou, mesmo sabendo que Cassie estava certa.

— Estava pensando comigo, se todo esse problema se resolver eu acho que vou escrever um livro de romance sobre isso e ficar rica. — Talvez de romance não, mas de terror, não havia romance nenhum em levar um completo estranho para passar as férias com sua família.

— Definitivamente não — suspirou. — Isso não tem absolutamente nada de romântico, Cassie.

— Se ele é gato como disse, por que não?

— Porque o nosso contrato é cem por cento profissional, não tenho cabeça pra isso. — Cassie era a parte idealizadora do seu dia, se tivesse que pensar em algum conto de fadas, ela certamente seria o pivô. — Vou estar ocupada demais tentando convencer minha família de que ele é realmente meu noivo.

— Vai ver ele desis- — Antes que pudesse terminar, as palavras em sua mente ficaram embaralhadas pela imagem estonteante de Ethan surgindo com sua mala preta entre as pessoas afobadas pelo aeroporto. Trajava uma camisa social branca dobrada nos pulsos, uma calça jeans social e nos pés um par de sapatênis cinza escuro. — Cassie, nos falamos mais tarde. — Desligou. — Achei que não viria.

Ele deu um sorriso cheio de dentes brancos.

— E você acha que eu deixaria a minha querida noiva no altar? — Um sorriso cínico vestiu seus lábios.

Ela começou a andar pelo corredor sendo guiada pelo homem.

— Na verdade, você me deixou esperando por quarenta minutos — ela protestou séria.

Joanne mantinha sua postura inabalável. Despachou as bagagens para logo seguir para o check-in. Chaos tinha uma altura fácil de se chamar atenção, e como se não bastasse, era bonito. Um conjunto daqueles era praticamente um ímã de olhares abusivos femininos. Se realmente fosse noiva dele, provavelmente estaria mandando uma a uma para o inferno.

Se mantiveram em silêncio durante todo o voo. Joanne dormiu boa parte do caminho, resultado de uma semana de puro cansaço no trabalho. Sabia que seria duro forçar a intimidade com um estranho, era algo novo para ela. Depois de duas escalas, finalmente chegaram ao Texas.

(...)

Era final de tarde, já estavam dentro do carro pela estrada barrenta em direção ao interior. O silêncio se instalava de forma maçante, quase dolorosa.

— Hmmm.

— Sim? — Ele respondeu.

Ela suspirou.

— Acho que não te contei, minha mãe é falecida. — Ele juntou as sobrancelhas piscando. — Papai se refere a ela sempre no presente porque ele costuma dizer que ela vive em cada um de nós, então não o estranhe e jamais o corrija.

Ethan baixou a cabeça.

— Meus pêsames — ele sussurrou. — Sua postura é muito rígida perto de mim, não acha que deve relaxar mais para passar uma impressão mais natural? — Ele não era somente abusado, em contrapartida, era educado também. Os olhos azuis se prendiam no caminho mesmo que suas palavras fossem totalmente direcionadas a ela.

— Eu só não estou acostumada. — Seu coração já acelerava somente com vislumbre mental de toda aquela situação dando errado. — Eu vou tentar.

— Estamos falando de trinta dias e não de três noites — relembrou. Ele conseguia ouvir sua respiração descompassada e sabia que para ela, aquilo, definitivamente, não seria uma tarefa tão simples. Embora para ele pudesse parecer apenas estar de férias com uma amiga, para ela as coisas não soariam da mesma forma, muito pelo contrário. — Sua família é tão tradicional assim?

— Não é bem assim. — Levou os cabelos atrás da orelha. — Minha família sempre foi muito correta, meu pai é um homem de princípios, sempre foi, e desde que minha mãe foi embora, tento me moldar da forma que ele quer, para ver nele um pouco mais de felicidade.

Ethan balançou a cabeça em desaprovação.

— Então quer dizer que você deixou de viver do seu jeito para agradar ao seu pai?

— A forma com que você fala até parece algo ruim. Ele deixou de viver para estar sempre presente. — Suas palavras foram atropeladas novamente pelo loiro que tentava entender os motivos dela.

— E você sente que fez o certo? — Ele botava indignações desnecessárias em sua cabeça, mas assim como uma semente quando cai na terra, as palavras dele em breve germinariam lentamente.

— Eu só quero vê-lo feliz.

Normalmente Ethan retrucaria, mas o motorista anunciou a chegada de forma repentina. Passaram tanto tempo conversando que o tempo voou como um foguete. Desembarcaram do táxi na entrada da grande fazenda que se limitava a um gigantesco cercado de madeira. Abriu o portão envernizado, entrando junto de Ethan. A fazenda continuava a mesma: o gramado bem cuidado, as árvores cada vez mais altas, que davam caminho para o bosque e o lago que tanto adorava. Caminhou pelos ladrilhos de pedra até avistar a porta da casa onde seu pai e seu primo Brendon, com a esposa, Alisha e Castle, o namorado de sua prima Beatrice, os aguardavam. Sentiu Chaos rodear seu corpo com os braços rígidos e compridos, livres de um casaco. Mesmo fazendo frio, conseguia sentir sua pele quente. Sentiu o peito másculo a comprimindo em um ato de carinho, e seus lábios lhe beijando a cabeça.

— Pai! — Abraçou seu pai com todas as forças que tinha. A saudade a consumia e algumas lágrimas escorreram por seu rosto, tamanho era o amor por aquele que a gerara.

Joanne abraçou a irmã mais nova, assim como Brandon e Castle, que fitaram Ethan no aguardo de uma saudação amistosa. Jonathan, seu pai, adquiriu uma feição séria enquanto olhava Ethan, que logo tomou a frente e apertou sua mão com vontade, assentindo com a cabeça, respeitosamente.

— É um prazer, senhor Jones. Me chamo Ethan Chaos — se apresentou. O semblante de Ethan era sereno, seus olhos se estreitaram com o sorriso que varreu seus lábios, exibindo seus dentes impecáveis.

— O prazer é meu. Joanne me falou muito sobre o senhor. — Jonathan balançou a cabeça o fitando de cima abaixo.

A advogada assistia à cena admirada. Não havia contatado apenas um acompanhante, mas também um ator nato! Não podia deixar de admirar, estava adorando a boa atuação de Chaos.

— Então foi você quem conquistou o coração de gelo dela? — Brincou Brendon, apertando a mão de Ethan que lhe direcionava um sorriso caloroso. — Precisa me dar umas dicas.

Os olhos de Jonathan se arquearam em aprovação.

— Então você é o homem que minha filha escolheu — disse o pai. — Vejo que condiz com a escolha dela. — Um sorriso sincero deu lugar a uma feição dura. — Bom, mais um para a família!

Castle riu, passando as mãos ásperas pelos fios ruivos e curtos, afim de aliviar a tensão do momento. Aquele era um momento histórico, já que Joanne jamais havia ido acompanhada à fazenda da família.

— Já começou com as indagações, Jon? — Castle riu ainda mais alto enquanto Ethan e Jonathan permaneceram se olhando. — Finalmente te conhecemos, ficamos curiosos. Eu sou Castle, sobrinho de Jonathan e primo da Joanne.

— Fico feliz que tenha vindo, Ethan. Vamos entrar, aqui fora está frio! — Exclamou Alisha, a esposa de Brendon. O clima seco do Texas era irresistível, o ar gelado dava a aparência de um sereno contínuo, que transformava o vento agradável em friagem. — Levarei suas malas para o quarto. — Sorriu Alisha.

O patriarca dos Jones se sentou no sofá largo e extenso de camurça azul escuro. O assoalho de madeira deixava o ambiente com um cheiro atípico, as paredes de pedra, bem lapidadas, davam um toque rústico ao que mais parecia ser um enorme chalé. Jonathan era dono de longos cabelos grisalhos, presos em um coque apertado no alto de sua cabeça. A camisa branca e a calça marrom estavam sujas e as botas em seus pés o delatavam: provavelmente estava cuidando da fazenda quando chegaram. Joanne sentou-se apreensiva ao lado de Chaos no outro sofá. Embora soubesse que deveria demonstrar afeto ao seu suposto noivo, a vergonha em ser mal interpretada a vetava de dar uma de noiva apaixonada.

— Vou fazer um café — sugeriu Alisha, mesmo que a real intenção fosse dar privacidade a Jonathan para conhecer melhor o noivo de Joanne, que jamais imaginou que um dia conheceria. Brendon se manteve em pé na sala até que sua esposa o levou para a cozinha pelos braços junto de Castle.

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