Sete Anos Antes
Winnipeg, Canadá.— Achei você! – Kendall diz encostando sua mão em meu ombro.— Mais uma dose de whisky, por favor. – Digo ao barman que assente com a cabeça.Kendall se senta ao meu lado suspirando cansada, seus olhos verdes me observavam com preocupação. Suas mãos tocam meu rosto me fazendo olha-la.— Te procurei o dia inteiro pela cidade. Estou preocupada com você. – Ela acaricia minha bochecha suavemente.Volto a olhar para frente, meus olhos se fixam no relógio da parede que marcava meia noite, minha risada amarga a causa confusão. O garçom me entrega a bebida, agradeço com um sorriso cansado.— Já é meia noite. Sabe que dia é hoje? – A olhei sem expressão facial.— Parabéns, Hanna. – Sua voz é tímida, envergonhada.Kendall levanta um braço chamando o barman, a encaro sem entender.— Você não costuma beber. – Digo confusa.— Bem, já que você não vai embora, irei te acompanhar. – Seu sorriso é tímido. – Ninguém merece ficar bêbedo e solitário em seu próprio aniversário.— Okay... Mas não vamos transformar isso em um funeral. – Sorri me levantando do banco.Ando até a jukebox a ligando, as pessoas no bar me olham curiosas ao ouvir a música iniciar. Kendall sorri ao ouvir os primeiros acordes da música e eleva seu copo, seu canto desafinado chama a atenção de todos no bar que nos olham animados. Finjo jogar uma corda em sua direção, Kendall vem timidamente em minha direção dançando segurando seu copo de whisky.— Você é louca. – Digo ou vê-la fazer um passo de dança desajustado.— Você coloca Pump Up the Jam pra tocar e espera que eu finja ser uma pessoa normal? Essa é a música mais dançante que existe! – Ela diz enquanto faz movimentos engraçados.Enquanto dançávamos e riamos, bebemos diversos drinks e doses de whisky. O bar inteiro parecia mais animado agora, pessoas cantando com a gente, risadas, passos de danças vergonhosos. Entre uma música e outra, riamos. Era como se nada de ruim podesse nos alcançar aqui.— Aquele homem no bar não para de olhar pra você a noite inteira. – Kendall fiz próxima ao meu ouvido.Tento encontrar o misterioso homem, mas uma multidão animada de torcedores de hóquei entra no bar.— Droga, você não viu. Ele era um tremendo gato! Nunca o vi na cidade antes, deve ser novo aqui. – Seu cotovelo me cutuca. – Que tal você ir se divertir um pouco?— Você... Você está louca eu não vou... – Minha voz se perde no ar ao ver um homem alto andando em nossa direção.À medida que ele se aproximava, os detalhes de seu rosto se tornavam mais nítidos. Sobrancelhas grossas e escuras, em harmonia com sua barba e cabelos. Seu porte era imponente, alto e com músculos bem definidos. No entanto, o que mais me fascinou foram seus olhos bicolores: um mel e o outro cinza. Nunca tinha visto nada parecido. Seu olhar era intrigante, hipnotizante, como se fosse capaz de prender minha atenção exclusivamente a ele, como se mais ninguém existisse além de nós naquele momento, imersa em sua expressão séria.Não sei se foram seus olhos ou a quantidade excessiva de álcool em meu organismo, talvez até mesmo a combinação dos dois, mas o restante da noite se desenrolou como um borrão. Lembro-me apenas de flashes: nós dois conversando no bar, eu rindo das piadas dele, sua expressão intrigante que parecia ler minha alma. Depois, flashes de nós dois entrando em um carro, mas o destino permanece obscuro em minha mente.Quando finalmente acordo, estou deitada em uma cama de hotel, sozinha. Sento-me abruptamente, meu coração acelerado ao perceber minha nudez. Olho ao redor, confusa, e vejo uma carteira sobre a mesa de cabeceira, ao lado do abajur. Instintivamente, estendo a mão e a abro, encontrando alguns cartões sem nome, mas minha atenção é atraída por uma habilitação com a foto do homem misterioso. Antes que eu possa ler seu nome, o som do chuveiro sendo desligado me faz estremecer ao perceber que não estou sozinha.Fecho a carteira às pressas e me levanto, procurando freneticamente minhas roupas pelo chão do quarto. Visto-me às pressas, com a mente a mil por hora, e saio do quarto às pressas, antes que ele me encontre.Vou ao corredor, ainda ajeitando minhas roupas. Aperto o botão do elevador o chamando, assim que ele chega, entro no mesmo. Pego meu celular no bolso da minha calça, o ligo e suspiro nervosa ao ver diversas ligações perdidas de Isaac e Kendall.Chego ao saguão do hotel, fico perdida olhando ao redor. Esse era um hotel luxuoso, quem seria esse homem? Espanto esses pensamentos ao sentir meu celular vibrar novamente. Saio do hotel e o atendo.— Hanna você quer me matar do coração? – A voz furiosa de Kendall soa do outro lado da ligação fazendo minha cabeça latejar devido a ressaca.— Não grita, minha cabeça parece que está pesando uma tonelada! – Digo fazendo sinal para o táxi. Entro no veículo e dou o endereço de Kendall ao motorista.— Isaac fez uma coisa muito idiota! Eu quero mata-lo por ser tão cabeça dura! – Ela resmunga furiosa. – Ele foi até sua casa mesmo depois dos meus alertas.Um frio percorre meu corpo e meu coração acelera. Isaac não podia ter feito isso, Liam iria provoca-lo até que Isaac explodisse e fosse preso.— Ele não podia ter feito isso, Liam irá provoca-lo até que Isaac faça alguma coisa irreversível! – Minha voz é aflita, passo a mão no rosto.— Isaac não encontrou Liam, mas fez algo irreversível... Ele e meu irmão invadiram a casa e roubaram todo o dinheiro que você escondia no closet junto com algumas jóias da sua mãe biológica. – Ela ri nervosa, escuto sons de carros no fundo. – Estou furiosa, mas não posso deixar de achar que Liam mereceu essa merda.Por um segundo, sinto um mix de emoções conflituosas. Isaac era maluco, mas ao menos me deu uma chance de não estar completamente falida.— Você não deve em hipótese alguma vir pra minha casa, logo os Fishers vão saber e colocarão a polícia atrás de nós! – Kendall diz nervosa, ao fundo escuto a voz de Isaac. – Calem a boca vocês dois, se não fossem por vocês, nem teríamos que fugir!— Kendall, não sei pra onde ir. Eu sequer estou com malas aqui e tenho que me preparar para viajar no próximo mês para conhecer o campus da faculdade.— Mudança de planos! – Isaac diz no fundo da ligação, sua voz é animada. – Vamos para o Reino Unido hoje mesmo. Isso poderá evitar as acusações.— Mas... – Isaac me interrompe.— Já estamos com suas malas! – Ele diz animado. – Vá logo para o aeroporto!A ligação é encerrada, suspiro olhando para a tela do celular.— Motorista, me leve para o aeroporto. – Digo hesitante.(...)Inglaterra, UKQuatro semanas haviam se passaram desde que desembarquei em Londres. No primeiro dia, o telefone não parava de tocar, com mais de 50 chamadas perdidas de Liam. Eu não queria mais contato com ele. Troquei de número, decidida a cortar todos os laços. Ninguém iria me procurar, ninguém se preocuparia comigo. Afinal, todos aqueles que verdadeiramente se importavam comigo estavam aqui, neste apartamento, dividindo as despesas.Dividir as despesas... Isso até parecia uma afronta, considerando que até agora não tinha contribuído com um centavo sequer. As contas eram divididas entre eles três, enquanto meu dinheiro permanecia inacessível. Pensei em vender algumas joias, mas Kevin, irmão de Kendall, insistiu em bancar todos os meus gastos do último mês. Era vergonhoso. Sempre fui independente, e agora me via dependente dos meus amigos por causa de um golpista sem escrúpulos.Enquanto caminhava pelas ruas movimentadas de Londres, uma onda de tontura me atingiu de repente. Tentei me segurar em um poste, mas tudo ao meu redor começou a girar, as vozes das pessoas se tornaram distantes.— Hanna? – Uma voz me chama enquanto acaria meu rosto. – Hanna?Abro os olhos lentamente encontrando o rosto de Kevin preocupado.— Graças a deus! Você me deu um susto! – Ele suspira aliviado.— Onde estou? – Minha voz é confusa.— Você desmaiou na rua, um pedestre a viu e te trouxe para cá. As enfermeiras encontraram meu contato no seu celular e me ligaram. — Ele explicou, sua voz soando distante enquanto eu tentava processar as informações.Sentei-me na cama, uma onda de náusea me atingindo. Kevin segurou minha mão com preocupação, enquanto eu tentava juntar as peças do que havia acontecido.Nesse momento, o médico entrou no quarto, ele analisava o tablet em suas mãos.— A senhorita Payton desmaiou na rua devido a uma queda de pressão. Isso é comum em gestações iniciais. — Explicou o médico, seu tom profissional tentando acalmar meus nervos exaltados.Meu coração começou a bater mais rápido, uma sensação de pavor se apoderando de mim. Gestação? Aquela palavra ecoou em minha mente, uma revelação chocante que eu não estava preparada para enfrentar.Kevin, ao meu lado, parecia tão atordoado quanto eu.— Esses exames estão corretos? – Kevin pergunta com a voz trêmula, seu olhar alternava entre o médico e meu rosto em choque.O médico pareceu envergonhado por ter revelado essa informação tão diretamente e murmurou um pedido de desculpas enquanto lia algo em seu tablet.— Os exames estão corretos, a senhorita está em uma gestação inicial. – Seu tom é cauteloso, mas ainda profissional. – Uma enfermeira passará para coletar mais amostras para os exames e informá-la sobre o pré natal. Parabéns aos futuros papais.O médico sai apressado sem nos dar chance de responder.Como poderia estar grávida? Liam foi o único homem que me relacionei sexualmente na minha vida e nós estávamos quase um ano sem ter relações íntimas. Sempre que eu tentava algo, ele inventava uma desculpa.Minha mente volta para a noite do meu aniversário, no bar.— Não... Não pode ser. – Sussurrei sentindo meu coração bater acelerado.Eu sequer me lembrava de ter tido relações com aquele homem misterioso, não lembrava de nada naquela noite. Agora esperava um filho dele?O coração ainda estava disparado, minha mente fervilhando com perguntas sem respostas. O que aconteceu nessa noite? E quem é esse homem misterioso que parece ter entrado e bagunçado minha vida sem que eu sequer saiba seu nome? Como iria encontrá-lo?AtualmenteWinnipeg, Canadá.— Uau, aqui é tão frio. – Simon esfrega suas mãos, protegidas por luvas.Seus olhos azuis escuros brilham enquanto ele observa a paisagem pela janela do carro, segurando firmemente seu ursinho de pelúcia.— Mamãe, mamãe! – Sebastian puxa meu casaco, tentando chamar minha atenção. – Vamos parar ali, é uma lanchonete! Estou com fome!Olho para ele pelo retrovisor, lançando-lhe um olhar severo. Sebastian volta ao seu lugar, ao lado do irmão.— Você sabe das regras, mano. Não pode fazer isso com a mamãe dirigindo! – Scott fala, entregando a Sebastian seu pacote de cookies. – Toma, sabia que você ia continuar com fome e por isso não comi.Sebastian sorri para o irmão, seus olhos cor de mel brilham animados com os cookies.— Obrigado, Scott! – Sebastian diz com a boca cheia de biscoitos. Tenho que me controlar para não rir.— Não fale de boca cheia, você vai se engasgar! – Scott diz em um tom de desaprovação.Às vezes, me surpreendia com sua personalidade adulta
— Chega de videogame, crianças! — Minha voz soa suave, enquanto bagunço o cabelo de Sebastian com carinho. — Vamos lá, os três, escovar os dentes e para a cama!— Mas mamãe, eu acabei de passar de fase! — Sebastian resmunga, seus olhos adoravelmente brilhantes de contrariedade.— Amanhã têm aula cedo, não quero que acordem tarde. — Minha expressão torna-se séria, e os pequenos suspiram frustrados.Havia se passado um mês desde nossa mudança, e as crianças finalmente estavam se adaptando à diferença de horário e clima. Pela primeira vez em muito tempo, eu começava a me sentir estável, como se as coisas estivessem finalmente se encaixando.Observo os pequenos subirem a escada resmungando, seus pezinhos fofos calçados com pantufas arrancando um sorriso de ternura de meus lábios.Suspiro ao ouvir o alerta da câmera de segurança na entrada. Ao abrir o aplicativo, uma mensagem me informa que detectou alguém parado em minha porta. Um arrepio percorre minha espinha ao verificar as imagens e n
O terror me envolve quando seus olhos mudam drasticamente, abandonando sua humanidade para revelar algo sombrio, algo que não pertence a este mundo.— O que... o que é você? – Minha voz sai em um sussurro trêmulo, recuando um passo instintivamente.O homem sorri de forma sinistra, avançando lentamente na minha direção. Seus olhos continuam a se transformar, acompanhados por mudanças grotescas em seu rosto. Um arrepio percorre minha espinha ao ver longas presas surgirem em sua boca.— Você... Você não é humano, não é? – Tento manter minha voz firme, embora minhas pernas tremam. – Diga-me, criatura. O que você é?Retrocedo, entrando na sala. Minha perna esbarra na poltrona, obrigando-me a dobrá-la para frente. Antes que eu caia no chão, o homem avança rapidamente e segura meu corpo.— Oh, minha querida, eu sou uma criatura antiga. Um ser que habita estas terras a mais tempo que se possa contar, muito antes do seu nascimento. – Sua voz é dis
— Devolva meus filhos agora, ou eu chamo a polícia! – Minha voz tremia, mas eu tentava manter a determinação em minhas palavras.— Nada do que você fizer irá me deter. Você já cumpriu seu papel, os filhotes são meus. – Ele ri, dando de ombros com desdém.— Eles não são filhotes, são meus filhos! Eu não vou deixar você levá-los embora! – Grito, as lágrimas começando a escorrer pelo meu rosto.— Você deveria se orgulhar. Entre todas as fêmeas, eu a escolhi para carregar a continuação da minha linhagem poderosa. – O homem suspira impaciente, olhando-me com pena.Fico confusa, sem entender suas palavras e por que ele insiste em dizer que me escolheu.— Do que você está falando? Nós mal nos conhecemos! Aquela noite foi a primeira vez que você me viu. – Questiono, perplexa.Ele sorri, virando-se para mim.— Eu a observei por meses, Hanna. Nada foi coincidência. Eu a escolhi. – Sua voz é sarcástica, seus olhos brilham com a luz
Ele ri suavemente, como se minha incredulidade fosse apenas um detalhe sem importância.— Não, Hanna, não sou louco. Sou apenas um ser que segue as regras ancestrais do nosso mundo. E você, minha querida, foi a escolhida para desempenhar um papel crucial em minha linhagem. – Ele se aproxima lentamente, seu olhar penetrante perfurando o meu. – Agora que cumpriu sua parte, é hora de assumir seu destino. Aceitar que seu papel foi cumprido, que os filhotes agora devem ficar comigo.Eu recuo mais um passo, meu coração martelando em meu peito, clamando por uma fuga que eu sabia ser impossível.— Eu não entendo... Deixe-me ficar com os meus meninos. – Murmuro, lutando para processar tudo o que ele está dizendo. – O que você quer de mim? De nós?Ele sorri de maneira sombria, como se soubesse que sua revelação tinha abalado minha compreensão do mundo.— O que eu quero? – Ele repete, saboreando minhas palavras. – Eu quero meus herdeiros, Hanna. E
Sinto uma dor excruciante, como se cada parte do meu corpo estivesse sendo rasgada e remodelada. Cada osso, cada músculo, parece se desintegrar e se reconstruir em uma dor lancinante. A respiração se torna difícil, meu coração bate freneticamente, quase sufocando-me com sua intensidade. Tudo ao meu redor se torna turvo, distante, enquanto a dor domina meus sentidos.Meus gritos ecoavam pelo ambiente, abro os olhos percebendo que já não estava mais em minha casa. Tento falar, questionar onde estou, mas meus pulmões ardem como se houvesse fogo neles, queimando minhas narinas e garganta.— Ela não irá resistir à transformação. – Uma voz feminina desconhecida diz, próxima a mim. Tento encontrar a pessoa que disse isso, mas meus olhos doem.— Hanna é forte, irá sobreviver. – Os olhos bicolores do Alfa surgem no meu limitado campo de visão.— Nenhuma humana sobreviveu à transformação por um híbrido, ainda mais feita por um tão poderoso. – Outra voz femi
Quando finalmente acordo, me encontro em um quarto totalmente diferente do anterior. A decoração é elegante, mas moderna, com tons de cinza, branco e azul Royal. As paredes são pintadas em um cinza suave, contrastando com o branco brilhante dos móveis. Grossas cortinas cinzas bloqueiam a luz que tenta entrar pela janela, criando uma atmosfera de tranquilidade e serenidade. Ao lado da cama king size, há abajures que emitem uma luz quente e suave, iluminando o quarto com uma aura reconfortante.Sento-me na cama, olhando ao redor com confusão e curiosidade. Onde estou? Como cheguei aqui? Minha mente está turva, as lembranças da transformação ainda ecoando em minha mente como um sonho distante. Minha cabeça lateja levemente, minha respiração ainda está pesada, como se tivesse acabado de correr uma maratona. As sensações estranhas e desconhecidas fluem por meu corpo, como se eu fosse uma pessoa completamente diferente da que eu era antes.Tento lembr
Ao sentir algo tocando suavemente meu rosto, desperto de um sono agitado. Ao abrir os olhos, encontro Scott me observando atentamente, seus olhos bicolores brilhando com preocupação.Sento-me na cama, assustada, e minha mão instintivamente vai ao pescoço, onde sinto um leve curativo. Meus dedos tateiam o tecido, uma lembrança dolorosa da mordida do Alfa.Ao perceber minha agitação, Scott me abraça com força, seu rostinho infantil expressando alívio e amor. Encho seu rosto de beijos, agradecendo silenciosamente por tê-lo ao meu lado novamente.— Onde você esteve, mamãe? Sumiu por duas semanas. – A voz preocupada de Scott quebra o silêncio, seu olhar fixo em mim em busca de respostas.A pergunta de meu filho atinge meu coração como um soco, a culpa e a tristeza se misturando em um turbilhão de emoções. Como explicar para ele onde estive, o que aconteceu? Como dizer a ele que fui arrastada para um mundo de escuridão e dor?— Eu... Eu estava