De volta a cidade

Atualmente

Winnipeg, Canadá.

— Uau, aqui é tão frio. – Simon esfrega suas mãos, protegidas por luvas.

Seus olhos azuis escuros brilham enquanto ele observa a paisagem pela janela do carro, segurando firmemente seu ursinho de pelúcia.

— Mamãe, mamãe! – Sebastian puxa meu casaco, tentando chamar minha atenção. – Vamos parar ali, é uma lanchonete! Estou com fome!

Olho para ele pelo retrovisor, lançando-lhe um olhar severo. Sebastian volta ao seu lugar, ao lado do irmão.

— Você sabe das regras, mano. Não pode fazer isso com a mamãe dirigindo! – Scott fala, entregando a Sebastian seu pacote de cookies. – Toma, sabia que você ia continuar com fome e por isso não comi.

Sebastian sorri para o irmão, seus olhos cor de mel brilham animados com os cookies.

— Obrigado, Scott! – Sebastian diz com a boca cheia de biscoitos. Tenho que me controlar para não rir.

— Não fale de boca cheia, você vai se engasgar! – Scott diz em um tom de desaprovação.

Às vezes, me surpreendia com sua personalidade adulta. Apesar dos três serem gêmeos, Scott era o que mais se parecia com o homem misterioso do bar. Seus olhos eram bicolores, idênticos aos de seu genitor, assim como suas sobrancelhas e cabelo. Até mesmo o formato de seus olhos, rosto e cor da pele. Era impossível esquecer aquele homem, pois toda vez que via meu filho, me lembrava dele.

Dos três, Simon era o único que tinha algo semelhante à minha aparência. Seus olhos azuis escuros eram idênticos aos meus, mas o restante já não remetia a mim.

Paro em frente a antiga casa de Kendall, as lembranças da última vez que estávamos aqui juntas voltam a minha mente.

Sabia que ela e Isaac estavam felizes em sua casa em Londres, mas ainda iria sentir falta das nossas aventuras.

Voltar a cidade depois de tantos anos ainda me trazia um pouco de receio, mesmo já sendo uma adulta completa agora. Mas os fantasmas do passado ainda me incomodavam, mesmo sabendo que agora não poderiam me ferir.

Embora minha vida em Londres estava sendo boa, sempre senti algo em mim que dizia que eu deveria voltar ao Canadá, como um chamado. Como se algo estivesse me esperando para se iniciar.

Londres foi um sonho, lá me formei advogada, exerci minha profissão e ainda consegui juntar o suficiente para sair do apartamento que dividia com Kevin, mesmo ele sendo uma pessoa maravilhosa, sabia que as crianças poderiam atrapalhar sua vida romântica, ainda mais depois que Isaac e Kendall haviam se casado e mudado para uma casa em Manchester, longe de onde morávamos.

— Essa casa gigante é nossa? – Simon pergunta impressionado.

— Tia Kendall tem mais dinheiro do que pensei. – Scott diz enquanto olha pela janela.

— Crianças, vou sair do carro e abrir a porta da casa. – Digo tirando o cinto de segurança. – Não saiam da cadeirinha. Isso vale pra você também, Sebastian.

Olho para trás, encontrando Sebastian abrindo sua trava da cadeirinha, ele sorri constrangido.

— Nem precisei olhar pra saber que iria me desobedecer! – Suspiro saindo do carro. – Esperem até que eu volte.

Saio do carro, travando suas portas. Era quase inverno e eu não queria que as crianças saíssem andando pela neve e ficassem doentes. As temperaturas de Winnipeg eram mais baixas que qualquer coisa que eles já sentiram antes, não queria que se machucassem.

Andando rapidamente, chego a porta da casa e destranco a porta. Volto ao carro, esvaziando rapidamente o porta malas.

Uma sensação peculiar de estar sendo observada toma conta de mim, olho ao redor encontrando apenas a imensidão branca da neve. Uma tempestade se aproximava.

— Mamãe! – A voz de Sebastian me leva de volta a realidade.

— Vamos entrar em casa, meu pequenos. – Digo, abrindo a porta do carro.

Ao atravessar a porta de entrada, sinto um misto de familiaridade e estranheza ao adentrar a casa que um dia foi o lar de uma das pessoas mais importantes da minha vida. As crianças me seguem de perto, seus passos ecoando pelo hall de entrada. Apesar das mudanças feitas pela faxineira contratada por Kendall, a essência do lugar permanece inalterada, como se o tempo tivesse congelado naquele espaço.

Sebastian segura firmemente meu casaco, seus olhos brilhando com espectativa.

— Mamãe, podemos pedir uma pizza? – Sua voz infantil soa fofa, acaricio seu cabelo.

— Claro que sim, meu amor. Vamos procurar na agenda, deve ter alguns números úteis próximos à lareira. – Um sorriso carinhoso se forma em meus lábios.

Caminho até o cômodo familiar, onde a velha agenda telefônica de Kendall repousa, como uma reliquia do passado. Ao folhear suas páginas desgastadas pelo tempo, uma enxurrada de lembranças vem à tona, recordações de dias felizes e momentos compartilhados.

Mas, mesmo imersa nas lembranças, mantenho o foco em encontrar o número da pizzaria, precisávamos de comida e eu não havia feito compras, em breve uma tempestade se iniciaria.

Encontro o número da pizzaria, coloco a mão no bolso do meu casaco buscando meu celular.

Ao perceber que meu celular ficou no carro, uma pontada de frustração atravessa meu peito. Peço às crianças, com um tom suave:

— Por favor, aguardem aqui até que eu retorne. Deixei meu celular no carro. – Digo antes de retornar ao hall de entrada.

Uma sensação estranha percorre meu corpo, uma espécie de alerta silencioso, uma presença imponente que me deixa inquieta. Varro o entorno com os olhos, buscando indícios de quem poderia estar me observando, mas só encontro pegadas de um animal próximo ao meu carro na neve. Um arrepio percorre minha coluna ao me aproximar.

— Essas pegadas são maiores que as minhas! — Murmuro para mim mesma, observando o rastro na neve.

Com um nó de medo se formando em meu peito, adentro rapidamente o carro, sentindo meu coração pulsar descompassado. Leva alguns segundos até que eu consiga controlar minha respiração, enquanto inicio a busca frenética pelo meu celular.

Um uivo agudo e próximo corta o ar, fazendo-me saltar de susto. Lobos? Será que as pegadas pertenciam a um lobo? O que mais poderia ter deixado uma marca tão grande na neve?

Finalmente, encontro meu celular entre os bancos, mas ao me levantar, sou tomada pelo horror ao ver um lobo gigante encarando-me com seus olhos bicolores através da janela do carro. Um grito escapa dos meus lábios, ecoando no interior do veículo, e o animal se afasta, desaparecendo na direção da floresta.

Tremendo de medo, mal consigo processar o que acabo de presenciar. Nunca vi um lobo tão grande, tão imponente. Era surreal acreditar que algo desse tamanho pudesse existir. Meu coração parece querer escapar do peito, acelerado ao ponto de quase sufocar-me, enquanto o suor frio escorre pelas minhas costas.

A imagem do lobo, com seus olhos bicolores penetrantes, assombra-me. Havia algo estranhamente familiar naquele olhar, uma sensação que não consigo explicar. E então, a ficha cai: os olhos do lobo... tinham as mesmas cores dos olhos do meu filho Scott, e também a heterocromia.

Desconcertada, saio do veículo e retorno à casa, cada passo pesado pelo peso do medo que me oprime. Minha mente está em turbilhão, atormentada pelo pensamento de que aquele lobo gigante não pode ser algo normal. Alguma coisa está acontecendo, algo que eu não consigo compreender.

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