Móretar - Poder Humilde
Móretar - Poder Humilde
Por: Eder B. Jr.
Parte 1

Relâmpagos cruzavam o céu incessantemente seguidos de seus trovões. Cada rajada de eletricidade acompanhava quase que em sincronia o movimento entre as espadas que se chocavam. A noite densa, a garoa fina, as folhas das árvores guiadas pelo vento desigual, que não tinha direção, imitando os outros seres que ali batalhavam também, entre fugas e quedas, cortes e mortes. Mas o confronto mais longo se destacava sob a luz inconstante do luar que se escondia e aparência. As técnicas eram perfeitas dos dois lados, apesar de diferentes. Os movimentos das pernas de um contracenava diretamente com os dos braços do outro. O primeiro com duas espadas curtas e o segundo com uma espada longa. A velocidade e a força. A leveza e a fúria. Na dança da luta, no impacto de cada golpe, eles foram aos poucos se afastando do ponto onde começaram aquele embate, embaixo das copas das árvores, atravessando algumas zonas de lama que não eram suficientes para dar vantagem ou desvantagem a qualquer um deles, até chegarem numa clareira, um grande trecho descoberto de vegetação, com apenas uma grama rasa. A chuva que tinha ficado mais forte, agora praticamente parara. A luz da lua agora refletia a calvície de um deles e não restava dúvidas: era o General Hantake, líder supremo de batalha do exército Corace. O adversário sabia bem quem enfrentava. Móretar buscava naquele confronto mais do que a defesa de seu povo, vingança pela morte de sua família, dizimada por um ataque impiedoso do General. Mas os outros ainda não tinham reconhecido quem estava ali, até então. Agora, pelo impacto que causavam os golpes, que chegavam a criar rajadas de vento, que pareciam mais golpes de energia estática, quem estava por perto desistia de seus confrontos para olhar a cena central. Blocos de rivais se dividiam e aos poucos criavam lados delimitando o confronto. Hantake era um gigante, já Móretar era pequeno e franzino e seus lindos e longos cabelos pareciam flutuar como ele próprio quando saltava ou desviava.

Quando, inesperadamente, o General pegou impulso e desferiu um golpe que mesmo defendido por Móretar, o jogou longe. Com excessiva confiança, Hantake, então começou a movimentar as mãos para lançar um feitiço Corace. Móretar, assim como Hantake, era fada de grau três e conhecia aquela técnica. Como todo feitiço de fadas, é preciso um alto grau de concentração, existe um bom consumo de energia e leva-se algum tempo para ser executado. Mais que rapidamente, o pequeno se apoiou com a lateral de uma das mãos ao chão, tocou com a espada do outro lado da grama em uma pedra, apenas para recuperar o equilíbrio e ganhar impulso e saltou sobre o inimigo. O gigante utilizou um dos pés para chutar Móretar de volta pra longe e continuar seu feitiço com as mãos. A apreensão começava a rondar os dois lados das tropas que já não sabiam se deviam intervir. Móretar parou por um momento e então, começou a correr. General Hantake começou a rir e correr atrás dele, assim como as duas tropas, incrédulas, que agora voltavam a se confrontar como que em provocação e resposta, sem deixar de atacar e correr, pra ver o desfecho do embate.

Perto de Hantake terminar de conjurar o feitiço, Móretar parou e se virou em direção do que parecia ser sua morte. O sorriso de satisfação do general estava acompanhado do deboche do restante de seu exército que a essa altura eram os únicos que haviam chegado até ali. Os companheiros de Móretar já ficavam pra trás, vencidos ou desacreditados a respeito de uma vitória àquela altura.

Quando as mãos de Hantake se levantaram lançando o feitiço de congelamento dos movimentos, as de Móretar também se levantaram lançando um feitiço de manipulação de água. Ele estava sobre uma plataforma, acima de um riacho, e fez da água se levantando a sua frente, espelhos, que refletiram e multiplicaram o feitiço, devolvendo-o para todo o exército adversário.

Após a queda da água de volta para seu leito, todos estavam congelados a frente de Móretar que clamou pelo restante dos guerreiros Salvitares, que não podiam acreditar no que viam, quando se aproximavam. Assumindo o papel de líder, que tradicionalmente no povo Salvitar só surge no decorrer de uma guerra e não antes, ele ordena com um grito que todos matem os Coraces e os golpes de espadas simultâneos deflagram a vitória esmagadora de seu povo, que havia entrado naquela guerra com a expectativa de serem dizimados com honra.

Os urros de comemoração vieram logo em seguida do som das cabeças sendo arrancadas pelas espadas. Os guerreiros Salvitares recolhiam dos corpos dos inimigos itens, relíquias, armas e se preparavam para retornar ao povoado, iniciando seus cânticos tradicionais. Móretar ficou imóvel. Via seu povo tomando o caminho de casa e decidiu ir para o outro lado. Não sabia direito o motivo. Talvez não quisesse a glória, a festividade. Sua vingança era seu objetivo concretizado, não trouxe alegria, nem sua família de volta. Estava aliviado pela paz, mesmo que temporária de seu povo, mas não sentia que era um líder. Seu destino parecia estar em algum outro lugar. Informou aos que lhe chamavam que não ia voltar. As tropas aceitaram a decisão, mas não sem entoar uma nova cantiga de um herói que salvou seu povo, criada ali, naquele momento, que contaria a história da continuidade de seu povo salvo por um pequeno herói improvável.

Móretar seguiu o caminho da floresta, sem objetivos, sem lugar pra chegar, rumo ao desconhecido. Entre pesca e caça, poupando recursos e energia, foi passando os dias pensando em desistir do que nem sabia que fazia e seguir para o leste, voltar pra casa e assumir seu papel de vitorioso do qual abriu mão. Em sua jornada, até então, não tinha encontrado ninguém, nem fada, nem elfo, por isso ficou muito surpreso quando percebeu alguém a beira de um rio. Decidiu não cruzar o caminho daquela pessoa, mas essa pessoa tomou a decisão contrária. Na verdade, parecia que esperava por Móretar. Sem se virar para ele, já tendo percebido sua presença, o homem começou a pronunciar palavras que não faziam sentido. Elas eram de seu idioma, mas não diziam nada. Móretar se aproximou, perguntou o que ele dizia, se estava bem. Notou que se tratava de um homem bem idoso, o que não era nada comum nos reinos próximos. Na verdade, no mundo todo, não era comum encontrar pessoas mais velhas. Um idoso numa densa floresta não povoada, parecia algo extremamente absurdo. Chegou a acreditar que podia ser uma alucinação, o que também não fazia sentido, já que nunca, mesmo nas piores condições que ele já tinha enfrentado em sua vida, muito piores do que estar sozinho numa floresta, ele jamais havia tido algum tipo de alucinação, algo que também era extremamente raro em fadas com poderes.

- Desculpe, você não vai entender muita coisa, mas direto vou ser, sua irmã está viva ainda! - Aquele senhor falou, deixando Móretar incrédulo.

- Como você sabe disso? Como ousa falar bobagens assim? - Móretar respondeu ainda confuso, mas acreditando que aquilo podia ser alguma armadilha, algum truque.

- Muitas perguntas que não posso dar respostas agora. Sua irmã não foi morta, na verdade, um sequestro aconteceu, não pelos inimigos que você conhece, mas por quem acredita serem amigos. - Continuava o ancião.

De repente, um relâmpago cortou o céu parecia ter o atingido. Na verdade, o lampejo de luz abriu algo que parecia um portal na frente dele.

- Algo impossível aconteceu, queria dar mais detalhes, mas preciso ir. Tentarei voltar. Boa sorte!

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