Capítulo 4
Já estava escurecendo quando eu voltei para casa carregando minhas flores. Aquela era a casa que eu havia comprado à vista assim que cheguei à Alcateia Silvermoon. Mas, quando tentei digitar minha senha, a fechadura eletrônica emitiu um som agudo de erro.

Entrei em contato com o escritório de administração, desesperada. Disseram que, duas horas antes, um homem que se identificou como meu companheiro havia usado cópias do contrato de compra e uma procuração falsificada para, descaradamente, mudar a senha e as fechaduras. Pedi imediatamente que minha gerente de propriedades pessoal viesse resolver a situação.

Logo, a porta se abriu.

No instante em que entrei, fui atingida por um fedor sufocante de perfume barato. Avancei mais um pouco e descobri Serena mergulhada confortavelmente na banheira, cheia do meu vinho limitado e caríssimo, aquele que eu vinha guardando para uma ocasião especial. Ela tinha despejado a garrafa inteira na água e ainda estava se esfregando com o meu creme corporal francês de altíssima qualidade. O frasco já estava quase vazio.

O filho dela conseguia ser ainda pior. Tinha pegado um por um dos meus discos de vinil autografados, cuidadosamente colecionados e de edição limitada, e estava usando-os como se fossem skates no chão da sala. A superfície dos discos estava toda arranhada.

Meus preciosos livros de primeira edição, expostos nas estantes, colecionados ao redor do mundo, haviam sido rasgados por ele. O menino estava dobrando as páginas em forma de aviãozinho e jogando-as por todo o cômodo.

Fiquei furiosa na hora, sentindo a vista escurecer de tanta raiva.

— Quem te deu permissão para mexer nas minhas coisas?! — Meu grito chamou a atenção dos três.

Serena apenas ergueu a taça de champanhe que segurava.

— Eu sou a dona da casa agora, de qualquer forma. Qual o problema em me acostumar logo?

Antes que eu pudesse responder, Marcus apareceu vindo do quarto dos fundos, com uma expressão irritada.

— O que você está fazendo aqui?

Eu estava tão tomada pelo ódio que nem consegui falar por um instante. Quando finalmente recuperei o fôlego, falei fria:

— Parece que essa é a minha casa.

O menino, de repente, me lançou um vaso.

— Essa é a casa do meu papai! É o nosso lar! Vai embora!

Serena falou comigo com uma falsa doçura:

— Não liga pra ele, Aria. Crianças não entendem nada.

Ela se aproximou e pegou as flores das minhas mãos, sem nem pedir.

— Você comprou isso pra mim e pro Marcus? Obrigada pelo carinho.

Estendi a mão pra pegar o buquê de volta, mas o pestinha agarrou antes e o jogou com força no chão.

— Essas flores baratas de lojinha de R$ 1,99 não combinam com a mansão onde minha mãe mora!

Na hora, senti o sangue subir. Cerrei os dentes.

— Seu pirralho! Esse buquê custa mais do que a roupa inteira que você está vestindo. E hoje mesmo vocês vão me pagar!

Marcus se afundou ainda mais no meu sofá de couro italiano sob medida, como um preguiçoso monte de lama, revirando os olhos.

— Ah, qual é, Aria. Fazer esse escândalo por causa de umas florzinhas quebradas? Coisa barata...

— Baratas?! — Peguei o buquê encharcado de água e taquei com força sobre a mesa de centro, fazendo ele derrubar o champanhe que estava bebendo. — São rosas Julia, valem mais do que três meses do seu “mesadão”. E você... quando tava comprando tênis de edição limitada com o meu cartão black, não achou caro, né?

Ele se levantou num pulo, o cinto do robe de seda caríssimo pendendo frouxo na cintura.

— Como você pode usar dinheiro pra me humilhar?! Eu sou um guerreiro!

Revirei os olhos, tirei o celular do bolso e enfiei o extrato bancário na cara dele.

— Humilhar? Cem mil reais pra alugar aquele Porsche no mês passado, cinquenta mil em doações pra streamers de jogo... E não vi você reclamar de humilhação nenhuma. Agora resolveu se ofender?

Quando virei pra sair, Marcus teve a audácia de me empurrar.

— E daí que você ganha bem? Nem sabe receber uma visita! Vai abrir uma Romanée-Conti agora mesmo. Não faz a Serena pensar que somos uns pobres.

Fitei o relógio cravejado de diamantes no pulso dele, meu presente de aniversário do ano passado, e senti um nojo profundo.

— Marcus, gostando de brincar de ricaço com o meu dinheiro, né? A partir de hoje, o limite do seu cartão é zero. Limpa essa casa, arruma suas coisas e cai fora da minha casa!

Ele franziu a testa.

— Aria, você podia ser mais razoável. Desde a cerimônia de acasalamento, você tá surtando, criando caso com tudo.

— Antes tava todo mundo convivendo numa boa. Você é quem fez tudo virar um caos.

Suspirou de novo, com ar cansado.

— No fim das contas, a criança é inocente. Aria, você é adulta. Não custa nada aguentar um pouco. Depois eu compenso tudo em dobro pra você.

Meu coração congelou de vez.

— Última vez que vou falar: limpa o quarto e sai!

Olhar pro rosto dele, tão cheio de razão, me fez rir. Dez anos de dedicação, e só agora eu enxergava quem ele era de verdade.

Foi nesse momento que o menino pegou um caco do vaso quebrado no chão e cravou com força no meu braço.

— Vai embora! Sai da minha casa!

Empurrei o garoto com força, e ele caiu no chão com um baque.

Começou a chorar na hora, correndo pros braços de Serena.

Pelo visto, Marcus já tinha ficado tanto tempo naquela casa que se esquecera de quem era a verdadeira dona. Planejava viver ali, como uma feliz família de três, com outra Ômega.

Os olhos de Serena se encheram de lágrimas quando ela disse a Marcus, com voz trêmula:

— A culpa é nossa. A gente não devia ter vindo. Vamos sair agora mesmo.

Mas Marcus bloqueou a passagem dela, com um olhar arrasado.

— Já tá escuro, e a Serena tá com o filho. Vão pra onde? Aria, custa ser um pouco mais generosa?

Assenti.

— Tudo bem. Mas eles têm que sair ao nascer do sol, ou eu vou chamar a patrulha de execução.

Marcus franziu o cenho.

— Se você insistir que eles saiam... então eu vou ter que ir junto.

Soltei uma gargalhada.

— Ótimo.

Abri a porta do meu quarto, pronta pra descansar um pouco.

Mas o que vi lá dentro me deu ânsia de vômito.

Os lençóis estavam amarrotados. O edredom, revirado como se alguém tivesse dormido ali. Fios de cabelo seco e quebradiço estavam espalhados; da mesma cor do cabelo de Serena. O quarto inteiro fedia ao perfume barato dela. Havia até roupas íntimas usadas largadas por cima da cômoda.

Senti o estômago revirar.

Ela já tinha dormido na minha cama?!

Peguei meus documentos importantes, sem nem verificar se estavam completos, e saí rapidamente, batendo a porta com força.

Ia dormir num hotel aquela noite. Aquele quarto estava contaminado. Já liguei pra uma empresa de limpeza especializada pra higienizar a casa inteira no dia seguinte e substituir tudo lá dentro.

Tudo que precisasse ser descartado, seria jogado fora!

Depois de um dia tão exaustivo, me sentia em frangalhos.

Após tomar banho, me deitei na cama do hotel, quando o celular tocou.

Alguém queria me adicionar como amiga.

Aceitei. A pessoa me mandou uma sequência de fotos.

Cada uma mais repulsiva que a outra. Na verdade, eram vídeos. Marcus e Serena fazendo sexo dentro da minha casa, com ela vestindo minha camisola de seda.

No final da sequência, havia uma mensagem:

“Entendeu agora? Pare de se agarrar a ele. Ele não te ama.”

O nojo me dominou por completo. Respondi:

“Pode ficar com a camisola e com o homem. Mas cai fora da minha casa.”

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