Marcus – Chicago
Marcus – Chicago
Por: PequenaVick
Capitulo 01

E tem mais: não deixe de fazer algo de que gosta devido à falta de tempo.

Não deixe de ter pessoas ao seu lado por puro medo de ser feliz.

A única falta que terá será a desse tempo que, infelizmente, nunca mais voltará.

- O Tempo, Mário Quintana

* * * * * *

Chicago, Illinois, EUA

Samantha Preston 

Antes

Estava em Chicago há quase três semanas esperando Marcus ficar totalmente recuperado do maldito tiro. 

Três semanas antes o namorado da minha melhor amiga, John Peters, deu fim ao ciclo de dor que o mafioso Walter Black iniciou, livrando todos da cidade de suas garras venenosas. Mas isso deixou feridas de todas as formas em muitas pessoas. Em mim também apesar de eu não estar em Chicago quando aconteceu. Mas estar na sala de espera do hospital enquanto Marcus corria risco de morte havia me feito muito mal. Não pensei que pudesse sentir tanta dor no peito de uma vez só, não achei que pudesse chorar ou rezar tanto. Nunca senti tanto medo de perder alguém, ainda mais alguém que mal conhecia. Afinal, mesmo que meu coração dissesse o contrário, Marcus não passava de um desconhecido. 

Levei a xícara de boca larga aos lábios e aproveitei o chocolate quente enquanto assistia à cidade da varanda do apartamento de Marcus. As luzes da cidade estavam todas acesas, havia música tocando no final da rua estreita e o cheiro de comida preenchia o ar de forma que fazia meu estômago roncar alto. 

É uma bela cidade, admiti. Inclinei-me para ver um casal de idosos andando de mãos dadas, a senhora sorria e ria do que o homem dizia meio curvado para ela, como se lhe confiasse um segredo.

Atrás de mim, a voz de Marcus surgiu chamando meu nome e sorri, girei nos calcanhares e sai da varanda. 

O apartamento de Marcus era grande, aberto, meio rústico e sem cores vividas que eu tanto estava acostumada. Rosa, vermelho, azul, verde ou amarelo não faziam parte do ambiente como era comum na minha casa. Marrom e perto? Absolutamente sim. A sala e cozinha eram separadas apenas por um balcão, os móveis eram novos e recém-saídos da loja e em tons escuros. Havia um pequeno, mas moderno lustre acima do balcão, deixando o ar da cozinha mais gostoso. A porta da entrada era grande e pesada, deixava meus braços doloridos só de pensar em abrir. Havia uma escada levando o segundo andar, mas uma rápida olhada deixou claro que não havia muito para se ver. O quarto era separado da cozinha e sala por uma parede de tijolos aparentes contendo alguns livros colocados ali de qualquer forma. Aquele cantinho dos livros era realmente a única coisa quente e confortável no apartamento. A cama grande estava quase fora de visão já que o ocupante era um homem forte que parecia mais um personagem da Laurann Dohner do que uma pessoa real. 

Talvez fosse isso que me deixasse tão caída por ele. 

Marcus era lindo. 

Não lindo do tipo Ian Somerhalder. Ele era incrível de um jeito tão mais forte para mim que me deixava sem palavras. Seus olhos azuis eram claros e brilhantes, os lábios eram finos, mas macios, a sensação de beijá-lo era como andar de bicicleta pela primeira vez. Era um homem alto, musculoso, mas não desproporcional. Havia massa bem definida por todo lado. O cabelo era loiro quase dourado nas pontas, mas a raiz era mais escura. A barba sempre presente estava maior. 

Eu senti seus braços ao meu redor apenas por um dia, um belo, sensacional e inacreditável dia, mas fora suficiente para desejar ter diariamente. Todas as noites. 

Mas eu não poderia. 

Marcus era tão inacessível para mim quanto eu era para ele. 

Mesmo que eu revidasse e brigasse o quanto quisesse, não era idiota ao ponto de não entender que nossa diferença existia e era gigantesca, algo que meus pais nunca permitiriam. Apesar disse, havia convencido meu pai a me deixar ficar com ele por algumas semanas, alegando que ele não tinha ninguém, o que era verdade. Minha mãe foi duramente contra, mas meu pai disse que desde que fosse acompanhada por meu irmão não teria nenhum problema. Felizmente meu irmão decidiu que existia coisas mais importantes para fazer em Chicago do que ser minha babá. 

Encostei-me na parede de livros e o encarei. Marcus havia se erguido sem dificuldade apesar do curativo no abdômen, a manta que o cobria deixava todo seu peitoral a mostra, caindo apenas sobre seu colo. Desviei rápido os olhos de qualquer lugar impróprio. 

— Obrigado por ter ficado — ele disse após um instante. 

Balancei a cabeça.

— Eu não poderia voltar para casa sabendo que você ficaria aqui sozinho. 

— Eu sei me cuidar bem, Sammy.

— Mas você não precisa. 

Marcus deu um sorriso de lado.

— Quem diria que esse dia chegaria. 

— O dia em que Marcus Martin precisaria de uma cuidadora? 

— Não. O dia em que eu teria uma amiga. 

Sua fala fez meu coração apertar. 

Eu queria ser muito mais que sua amiga, queria ser o motivo de seu sorriso mais gigante, sua paz e até sua revolta, mas era impossível. Teria que me contentar com apenas um título. 

— Você sempre me terá — prometi — Não importa aonde eu esteja. 

— Queria dizer o mesmo, mas eu sou inconstante, Samantha. Até para você.

Neguei com uma risada. 

— Você é mais confiável do que pensa. 

— É o que acha de mim? — ergueu as sobrancelhas escuras e liberou uma risada sem humor — Está sendo mais generosa do que o costume. 

— Mas eu não sou generosa. Sou rude, lembra? 

Ele franziu a testa. 

— Você fala o que pensa. Você é real. Não rude.

— Nos dê mais algumas semanas e vai mudar de opinião — me atrevi a sentar na beirada da cama e abracei meu corpo coberto pelo moletom de crochê rosa que ganhei de aniversário da vovó — Lá em casa é tudo tão diferente. As pessoas. Não há ninguém como você. E tem muitos como a minha mãe e acabo sendo agressiva porque toda a modéstia fingida e hipocrisia me deixa doente. Sabe o tipo de pessoa que reza para Deus de manhã e torce pelo azar do vizinho o resto do dia? São todos assim por lá. Tem excessões, é claro, mas eu cresci ouvindo tanta besteira que é difícil se manter sã por muito tempo. O negócio é sair de casa antes que seja tarde demais, sabe? É o que meu irmão e eu planejamos. 

— Eu entendo. 

— Nunca me falou nada sobre sua família — notei e ele rapidamente ficou tenso — É tão ruim assim?

— Mais do que pode imaginar. 

Suspirei.

Era do meu feitio insistir até ter o que eu queria, mas daria um desconto para ele. 

— Mudando de assunto então, como está se sentindo?

— Novinho em folha. 

— Mentiroso. 

— Não está tão ruim — riu — Poderia ser bem pior. 

Tremi só de imaginar. 

Ele poderia ser como Ciara agora, destinado a ficar em coma com a possibilidade de nunca mais acordar, ou pior. 

— Mas estou bem. E sou muito grato a você por ter cuidado tão bem de mim. Você foi incrível.

O observei em silêncio. Eu não queria que ele fosse grato, não fiz porque era uma pessoa naturalmente generosa. Branna era assim, eu não. Fiz porque meu coração parecia se partir a cada segundo que não tinha notícias dele. Porque ele era tudo o que eu queria desde o momento em que o conheci. Fiz mais pelo meu desejo insano de estar com ele do que por qualquer outra razão. Era até egoísta se pensasse bem. Mas Marcus não gostava de me ver de forma tão crua.

— Foi um prazer. 

Eu tinha que ir embora em breve. 

Minha mãe não aguentaria me ter longe de seu poder por mais tempo e nem meu pai conseguiria impedir Lauren Preston de voar até Chicago e me encontrar. Mais uma coisa que minha mãe e eu tínhamos em comum era nossa teimosia. 

O olhar de Marcus escureceu e seu semblante ficou desanimado. 

— Você tem que partir, não é?

— Isso ou minha mãe vem me buscar pelos cabelos.

— Seria estranho se eu dissesse que queria mais tempo com você? 

Sorri e neguei. 

— É exatamente o que eu quero também. 

Ele ergueu a mão no claro pedido para que me aproximasse e respirei fundo, estendendo a minha em aceitação e engatinhando até estar de joelhos ao seu lado. Fiquei preocupada com seu ferimento, mas nada em sua expressão revelou alguma dor. Marcus me encarava em silêncio como se tentasse prolongar o minuto, avaliando cada centímetro do meu rosto. 

Abaixei o olhar até seu peitoral e o explorei com a mão livre, engolindo em seco quando o senti tenso sob meu toque. Sabia que não deveria me aproximar tanto. Mas a lembrança da primeira vez em que estive com ele da forma mais sexual e íntima que eu poderia ficar com alguém me tomou por completo, dominando minhas ações ou era isso que eu queria pensar. Colocar a culpa nos hormônios era muito mais fácil. 

— Samantha — ele sussurrou meu nome e o ergui meus olhos para os seus, azul claro contra o azul escuro — Não pare de me tocar — pediu. 

Assenti alucinada e precipitei-me ao encontro de sua boca, sentindo que se não o beijasse naquele instante poderia nunca ser feliz outra vez. As mãos fortes que meu corpo tanto ansiava tomaram seu lugar de direito nos mantendo unidos. 

Ele fez um som aflito e logo me afastei achando que o estava machucando, mas Marcus foi confiante ao me manter no lugar, tomando-me novamente em um beijo cheio de saudade e desejo. 

Eu voltaria para a vida ordinária da cidade pequena que chamava de lar e ele estaria tão longe de mim que meus dias mal teriam cor, mas naquele minuto e pelas horas que nos restavam eu o tinha. 

Teria que bastar.

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