CAPÍTULO 2

━ • ✿ • ━ Nicoly ━ • ✿ • ━

A Dona Jinn me ensinou como chegar na praça, a cidade é bem organizada com placas, ótimo para que eu não me perca e eu posso ouvir a música alta daqui, não tem como eu não saber onde é, ela também é como a Vivian, prefere sua casa ao ir a uma festa. Visto algo simples, o de sempre na verdade, minha calça de couro preta, blusa cinza com o desenho de uma caveira com rosas negras ao redor, minha jaqueta de couro preta e minha bota cano longo de salto.

Avisto as barracas iluminadas de cada coisa, bebidas, comidas, jogos, da história da cidade, se é o Dia do Fundador realmente precisa de uma barraca de história para saber como tudo ocorreu. Há muitas pessoas mas todas estão direcionadas a um púlpito no meio da praça, acho que vai haver algum discurso, então preciso ficar calada na minha porque não quero atrair mais atenção do que já atrai.

Vejo um casal sentando em duas poltronas vermelhas como a dos reis na antiguidade, bem pomposo, o homem é um senhor muito bonito de olhos azuis, parece até ter a mesma idade que eu, as pessoas aqui são todas assim? Lindas e perfeitas? Cidade perfeita demais. A mulher ao seu lado está radiante com um sorriso largo de orelha a orelha, seu olhos castanhos parecem duas lanternas e seus cabelos castanhos cheios de cachos são lindos.

— Boa noite à todos. — vejo um belo homem de olhos verdes e cabelos negros falar em um microfone. Se ele não for comprometido eu gostaria muito de conversar com ele, ou não conversar. — Moradores de Thompson recebam com muitas palmas nosso regente, Damien Hancock!

Ele fala e todos começam a bater palmas, resolvo ir na onda e bato palmas fracas para não chamar a atenção, quando vejo o homem que pega o microfone minhas pernas fraquejam, eu pensava que o outro cara era gato, mas esse, esse dá vontade de correr até ele e tirar suas roupas, detalhe, com a boca. Peito forte, posso apostar que tem oito gomos, oito perfeitos gominhos para eu passar a língua em cada um, subindo mais vejo seu rosto esculpido, já vi homens com rostos bem estruturados, porém esse, meu Deus! É perfeito.

O queixo firme, como se estivesse travando o maxilar, esse queixo e essa boca em outros lugares causaram um grande estrago, sinto até um latejar em antecipação. Eu preciso desse homem, para ontem, meu corpo sente falta dele, e ele nunca esteve nem sequer perto dele, isso é algo que não consigo explicar.

— Boa noite. — ele fala simplesmente e os pelos da minha nuca se arrepiaram. — Quero começar dizendo que estou honrado em discursar nesta noite tão especial para todos nós. Esse é o primeiro ano de muitos que irei participar na regência com todos vocês e posso afirmar que a cada ano será melhor. — mais palmas soam alto o fazendo parar seu discurso e sorri fraco, não parece um sorriso real. É apenas um sorriso dizendo “pensem que estou bem ao sorrir”, porém o que que quer dizer é “quero fugir daqui”.

Seus olhos são de um azul celeste que me hipnotiza, nem presto atenção direito no que ele está falando, aqueles olhos buscando algo na multidão, seu olhar não para em canto algum, apenas procurando e procurando até que param em mim. Minha respiração engatou com a intensidade, ele finaliza seu discurso e enquanto as palmas vão aumentando nosso olhar se mantém firme, sinto meu corpo se aquecer e minhas mãos ficam úmidas de suor, vejo o homem que lhe apresentou tocar em seu ombro o fazendo quebrar o nosso olhar.

Aproveito isso para me misturar, as pessoas perto de mim me olham tentando entender de onde vim, me afasto mais para a parte com algumas árvores e ouço alguns ruídos, eu deveria agir como uma pessoa sensata e me afastar, como se eu fosse sensata, quem estou querendo enganar? Uma coisa que eu não sou é sensata. Sigo os sons que aumentam a cada momento que me aproximo, ouço um choro de uma criança, isso é o que preciso para saber que não posso recuar, se há uma criança em perigo eu vou ajudá-la.

Pego um tronco grande que acho no percurso e vou pronta para bater, vejo que um homem está curvado por cima de um menino, não lhe violentado ou batendo, e sim mordendo, mordendo o pescoço da pobre criança. Ele já parece fraco agonizando no chão sujo, por reflexo acerto a cabeça do homem que acaba caindo para frente libertando a criança que mal consegue abrir os olhos. Verifico seus pulsos e o carrego para lhe tirar daqui, sinto um cheiro de algo morto, sei que não é a criança porque ele ainda está vivo, quando dou um passo para sair algo me empurra e bato contra a árvore.

— Dois coelhos com uma cajadada só. — percebo que o odor vem do homem que mordeu a criança. Vejo o menino, que deve ter no máximo 5 anos, caído no chão, que ele esteja vivo, seus cabelos loiros caem no rosto me impossibilitando de ver se seus olhos estão abertos.

— Vá se ferrar. — rosno me levantando. — Uma criança é fácil, quero ver pleitear um adulto, babaca. — fiz aula de auto defesa por três anos antes de viajar. Músculos nem sempre são bem usados.

O homem fedorento é um marombado, ele tem cabelos negros e suas roupas estão rasgadas e sujas. Eu posso estar enganada mas os olhos dele são vermelhos, vermelho sangue.

— Como se uma humana fosse me derrubar. — ele gargalha alto, porém me mantenho firme.

— Veremos. — avanço para cima dele e lhe dou soco com toda força que tenho. Ele vira o rosto um pouco e me olha sorrindo.

— Isso é tudo o que pode fazer humana? — arregalo os olhos por ele ainda estar consciente, e por que raios ele só vive me chamando de humana? Que eu saiba ele também é humano, ou era para ser.

— Você deveria estar... Inconsciente. — murmuro alternando o olhar entre ele e o menino.

— E você deveria fechar a boquinha e deixar eu me alimentar. — esse babaca não vai me m****r calar a boca. Não mesmo!

— Como é?

— Esse já está quase no fim, entretanto você está bem cheia para me saciar. — ele lambe os lábios e percebo sangue neles.

— Que coisa você é? — resmungo percebendo que ele bebia o sangue do menino, quem faz isso?

— Seu pior pesadelo. — ele começa a andar até mim sorrindo.

— Não dessa vez meu chapa, não sou do tipo que perde fácil assim. — me encosto na árvore atrás de mim esperando ele chegar.

Assim que ele está perto o suficiente me apoio contra a árvore e me impulsiono para lhe empurrar com meus pés, acerto bem no meio do seu peito fazendo ele ser jogado para trás, dessa vez capricho na força que ele bate em outra árvore do outro lado. Corro até o menino e vejo que ele ainda está vivo, com a respiração quase nula, mas vivo, o carrego de novo e olho para o homem que só então percebo que ele tem o peito perfurado pelo galho da árvore, bem onde está o coração, seus olhos vermelho estão fixos em um ponto distante, eu o matei, sem querer, porém o matei.

Eu nunca matei nada antes, sou aventureira não assassina, mas vendo pelo outro lado ele iria me matar, matar essa criança inocente, só que isso não muda o fato de ele estar morto, seus olhos abertos, sangue escorrendo da boca, o galho enfiado em seu peito lhe tirando a vida. Ouço a criança gemer e desperto do meu estupor, preciso salvar ele, corro de volta para o festival para pedir ajuda, espero que não me prendam, eu só tentei ajudar, a criança ia morrer e ele ia me matar e eu preciso ir embora assim que deixar essa criança segura, nem que eu arraste minha Dyna até o próximo estado.

━ • ✿ • ━ Damien ━ • ✿ • ━

Eu juro que pensei que ia enlouquecer de desejo só de ver aqueles olhos de lobos me encarando, se não fosse o Coy eu ia descer e reivindicar aquela boca carnuda para mim, eu posso estar enganado, mas ela me queria tanto quanto eu a queria, preciso dessa mulher linda nos meus lençóis essa noite. Tive que cumprimentar alguns Pure Blood importantes que nos dão muito apoio, principalmente financeiramente, tive que deixar ela lá, espero que eu não a perca de vista assim que sair disso.

— O que você tem? Parece que não lembra onde enterrou o osso. — ele franze a testa em confusão.

— Osso não, mas perdi uma mulher linda com olhos de lobo por causa dessas malditas saudações a esses puxa saco. — falo caminhando entre a multidão procurando por ela.

— Qual cara, é só uma mulher, quer uma mulher gostosa? Vamos atrás de uma. — ele me segue protestando.

— Eu quero aquela. — suspiro não a encontrando em lugar algum. Será que eu imaginei? Não! Ela era real.

— Dane-se isso, a Beth está me esperando então... — antes que ele possa terminar ouço alguém pedir ajuda.

— Por favor! Ele vai morrer! — vejo a mulher com olhos de lobo vir da floresta carregando o Jason quase sem vida, sinto o odor de podridão.

— Beast. — rosno e o Coy já entendeu.

— Eu não fiz nada, juro, um maluco estava... Estava bebendo o sangue dele e... — ela parecia atordoada.

— Leve ele para se alimentar e se curar Coy, eu cuido dela. — falo me aproximando dela.

— Certo. — ele tenta pegar o Jason dela mas ela o aperta não o soltando.

— Eu vou ajudar tudo bem? Só solte ele que ele ficará bem. — o Coy fala suave.

— Ele ia matar ele... Eu... Foi um acidente... — ela fala coisas sem nexo.

— Jason! — vejo a mãe dele correr até o Coy que conseguiu tirar ele das mãos dela. — Meu bebê.

— Ele vai ficar bem, vamos. — o Coy sai seguido dos pais do Jason para cuidar dele.

— Você está bem? — me aproximo devagar dela, acho que ela está em estado de choque.

— Ele morreu... — ela fala olhando para o nada. — Eu nunca matei ninguém e ele está morto. — deve ser o Beast que mordeu o Jason, ela o matou? Definitivamente eu quero essa mulher.

Vejo meus irmãos e meus pais se aproximarem preocupados.

— O Coy nos contou, como ela está? — meu pai perguntou olhando para ela.

— Em estado de choque. — falo. —  Acho que ela matou um Beast, D e Dimi verifiquem isso para mim, caso ele não esteja sozinho. Domi acalme a população e diga que tudo vai ficar bem. Duran preciso que pegue algo para limpar ela, acho que ela está ferida.

Falo as ordens e todos se mexem, acho que ela feriu seu supercílio porque escorre sangue, percebo melhor o seu corpo e vejo várias curvas, uma cintura perfeita, além dos seios espetaculares. Seu rosto então, ela me lembra as sereias que encantam os homens, sereia com olhos de lobo, será a minha morte.

— Você vai ficar bem querida, venha e se sente. — minha mãe fala suave lhe confortando.

— Eu matei alguém... — ela repete sem olhar para canto algum ou se mexer, isso já está me preocupando.

— Ela está em estado catatônico, Damien traga ela antes que ela perca sangue demais e morra de frio aqui. — minha mãe fala e assinto.

Ela se mantém repetindo que matou um homem, que foi em legítima defesa, que ele ia matar ela e o Jason. Eu apenas a ouço em silêncio, entro em uma das tendas do festival e logo o Duran aparece com curativos e um copo de água. Se fossemos destreinados o sangue dela nos deixaria loucos, se bem que se ela sangrasse ou não isso teria facilidade de acontecer mediante a sua beleza.

— Obrigado irmão, eu cuido disso. — começo a pegar as coisas que irei usar para limpar seu ferimento.

— Se precisar estou com o Domi, as pessoas estão muito assustadas, o Jason quase morreu, se ela não tivesse... — o interrompi porque ela já viu e ouviu demais por hoje.

— Falamos depois irmão. — aceno com a cabeça para ela e ele entende.

— Certo. — ele sai e me deixa cuidando dela.

— Agora, sereia com olhos de lobo, preciso que beba essa água para mim, beba toda ela por favor enquanto cuido do seu machucado. — ela segura o copo tremendo e a ajudo a levar até a boca, ela bebe um gole e suspira.

— Obrigada. — ouço sua voz mais calma e sorrio de canto, bem melhor assim.

━ • ✿ • ━ Nicoly ━ • ✿ • ━

Não sei o que houve comigo, eu sou forte, mas a morte não é algo que lidamos assim, eu matei algo vivo e isso mexeu comigo, me mudou de alguma forma, jamais serei a mesma. Vejo o lindo homem que fez o discurso me chamar de sereia com olhos de lobo e se eu não estivesse nesse estupor iria adorar esse momento para flertar.

Entretanto não consigo, bebo a água que ele me dá e começo a voltar a mim, fiquei tão assustada que pareci uma maluca, sei disso, péssima primeira impressão. Sinto minha mão tremer menos e a água acabar, ele limpa meu rosto com cuidado e delicadeza que nem parece esse musculoso com cara de mal. Após limpar tudo ele põe um curativo e joga os gazes fora, ele arruma a maleta de medicamentos e me olha.

— Melhor? — ele pergunta com cautela. Eu devo ter parecido uma psicopata.

— Sim, desculpa pelo lapso momentâneo. — ponho as mãos no rosto envergonhada, sempre fui mais forte do que isso.

— Não tem problema, você pelo visto não matou nada na vida, isso deixa marcas. — ele fala sério e o olho. Agora de perto seus olhos parecem ainda melhores, sua barba rala deve causar arrepios ao ser passada pelo pescoço. Sinto meu rosto aquecer enquanto ele não desvia o olhar.

— Eu só pensei em ajudar a criança, eu não ia matá-lo. — pouso minhas mãos em meu colo e mexo meus dedos em nervoso.

— Eu sei disso. — ele toca meu ombro e congelo no lugar. Sua mão irradia calor, um calor que me deixa aquecida, me faz querer me esconder em seus braços.

— Sabe? — o olho surpresa, não só pelo toque, mas pelas palavras, ele não parece do jeito que conforta alguém. Tá mais para o tipo em que quebra a cara de alguém.

— Você salvou o Jason, não acho que tenha matado aquele Beast por querer. — ele se levanta e toma um pouco de distância.

— Beast? — franzo a testa tentando entender o que ele disse.

— Você faz parte dos que não conhecem não é? — ele põe as mãos nos bolsos meio deslocado. Será que fiz algo errado? A pouco ele parecia confortável.

— Não conheço o quê? — questiono curiosa.

— Os vampiros, há humanos que sabem da nossa existência. — ele fala direto, sem rodeios.

— Vampiros? Como o drácula? — isso só pode ser piada. Se bem que aquele maluco estava bebendo o sangue do menino. E esse deus grego não tem cara de piadista.

— Não exatamente. — ele solta uma risada sem graça e logo se recompõe, como se ele não pudesse sorrir. Isso é triste na verdade. — Somos divididos em quatro cadeias, aquele que você matou era um Beast, eles são os vampiros maus, matam tanto humanos quanto os outros vampiros, como se fossem feras descontroladas. — ele explica.

— Vampiros. — ele está falando sério, ele não está sorrindo então é realmente sério. Estou rodeada de vampiros que bebem sangue.

— Isso, ele já matou muitas pessoas inocentes, então não fique mal por ele, ele mereceu, sua vida estava em jogo. — é muito sério, ele é um vampiro, o menino era um vampiro e eu estou cercada de vampiros. Se estou numa cidade de vampiros a Vivian, o Cory, a Jinn, são todos.

— Vampiros. — começo a rir nervosa, eu já passei por muitas coisas mas, vampiros? Isso é inacreditável, se eu não tivesse visto eu poderia dizer que esse cara é louco. Um fodido e gostoso louco. — Você é um vampiro? Toda a cidade é? — me levanto e sinto uma tontura.

— Sim, espero que você esteja bem com isso, não vamos te machucar. — ele me olha apreensivo, ou ele está irritado por minha reação surpresa.

— Eu matei um vampiro do mal, fiz algo bom. — dou um passo e vacilo um pouco. — Então não vou ser presa pelo que fiz? — o olho mais de perto.

— Não. — ele aperta o maxilar como se não me quisesse perto dele. Não entendo, pensei que ele quisesse algo comigo, pelo menos antes de tudo acontecer.

— Só preciso dormir e absorver isso. — forço um sorriso. — Espero que o menino, Jason, não é? Que ele fique bem.

— Ele vai sim... Graças a você. — ele fala dando de ombros.

— Ok. — começo a caminhar para sair da tenda.

— Onde você vai? — ela tira as mãos dos bolsos e se põe na minha frente.

— Para a pousada, preciso dormir, ou acordar, talvez eu tenha sonhado isso, então preciso descobrir. — rio nervosa e saio da tenda.

— Eu te levo, você parece abalada. — ele me segue saindo.

— Não quero incomodar, pode ir fazer o que quer que vampiros façam. — eu tive que abrir minha boca idiota. Ando mais rápido olhando para o chão.

— Como é? — sua voz soa divertida, mas deve ser só coisa da minha cabeça. Ele é rígido demais para isso. — Eu me chamo Damien. — ele se apresenta.

— Nicoly, mas me chamam de Nic. — sigo o caminho de volta para a pousada. — O festival acabou? — estava tudo bonito para acabar assim.

— Não, vamos até de manhã, só foram ajudar o Jason e limpar as coisas. Está tudo bem, você pode ficar se quiser. — paro abruptamente e o olho.

— Posso?

— Claro, afinal de contas você salvou o Jason, a mãe dele é da barraca de comidas, você vai adorar quando ela te agradecer. — parece uma piada, só que ele não sorri.

— Eu preciso me trocar, estou toda suja. — olho minhas roupas que foram lindas antes de tudo isso acontecer.

— Foi uma ideia, se quiser, estaremos lá. — vejo que paramos na frente da pousada da dona Jinn. Nem notei até chegarmos, ele me trouxe sem eu nem perceber.

— Tudo bem. — subo os degraus e dou uma última olhada para trás, ele me olhava sem piscar e sinto minha nuca aquecer. Entro na pousada com um leve sorriso, é estranho porque ele não fez nada além de ser sério e me ajudar porque ajudei o Jason, retribuiu.

Dou um passo a mais e sinto outra tontura, deve ser as coisas que passei, já vivi muitas aventuras mas nada como isso, é insano, só não sei se de um jeito bom ou ruim. Minha visão escurece no próximo passo, ouço bem longe alguém me chamar e tento ver quem é, a Jinn desce as escadas rápido falando algo que não entendo. Me ajoelho e acabo deitando no chão em fraqueza, a porta da frente se abre e braços fortes me seguraram, a última coisa que vejo é o rosto duro do homem de olhos azuis, olhos azuis brilhantes.

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