Pétalas caindo

Helena e Afonso chegaram até a cozinha, enquanto Helena seleccionava os remédios do pai acompanhando a receita dada pelo doutor, Afonso colocou uma cafeteira de chá no fogo, E Helena olhando para o que ele fazia, perguntou:

-Estás mesmo a fazer o que eu penso que estás a fazer?

-Sim, chá. – Disse ele sorrindo – O melhor de sempre filha.

-Ah! Desde quando é que sabes?

-Tenho aqui os meus truques filha.

Afonso conhecia muito bem a Helena, Então aproveitou o momento em que ela estava mais confortável para sensibilizá-la e ter uma conversa séria:

-Então, vais me contar o que se passa entre tu e a Esmeralda?

-Nada pai, é que nós…

-Ouve filha, eu posso não ser o homem que te trouxe ao mundo, mas eu sou teu pai, e sei muito bem que quando estás a tentar esconder algo perdes o controle das mãos, e baixas a cabeça, consigo notar o esforço que tu fazes para parecer normal, (virou-se para ela e se aproximou). Isso é óbvio, olha para mim, eu sou teu amigo, a gente brincava de rei e princesa quando eras mais nova lembras? Sempre fomos assim, o que se passa princesa?

-Não sei como explicar, senhor Rei. – Disse rindo – A minha irmã, a Esmeralda, sei lá, ela não me vê como uma irmã, ela usou meus brincos sem a minha permissão, aqueles que me deste no meu aniversário de 16 anos, e quando eu quis explicações, ela simplesmente não quis admitir que estava errada e começou a agir como se fosse a vítima.

-É típico dela – Engoliu os remédios – A Esmeralda odeia estar errada.

-É, mas ela precisa mudar – Disse Helena, cruzando os braços.

-Faz o seguinte. Sabemos que ela espera um comportamento negativo da tua parte, mostra a ela o contrário, ajude ela, peça ajuda até, se precisar, ela vai baixar a guarda, confia em mim.

-hum! (olhou para a cafeteira). Olha pai, o chá.

-Isso aí, o melhor de sempre.

-É tão bom assim? – Disse ela brincando.

-Espera para ver.

Afonso estava a tirar um copo, quando Helena, que já estava pensativa, fez a pergunta:

-Pai, porquê que o senhor me adoptou, e será que me encontrou?

Ao ouvir a pergunta, Afonso parou por uns segundos, e disse, enquanto preparava o chá:

-Eu sabia que teria que te contar isso um dia, só não achei que fosse hoje.

-Preciso saber.

-Prometo que te conto, mas agora, estou fraco, acabei de tomar remédios, preciso  descansar e me manter calmo, mas saiba disso quando eu te adoptei, eu tomei a melhor decisão da minha vida, nunca me arrependi disso, e nem vou.

-Está bem, obrigado senhor rei. – Disse ela partindo logo para um abraço.

E então Afonso segurou no chá e deu para ela, dizendo : ``Precisas mais do que eu ´´ . E beijou a testa dela antes de sair da cozinha. Helena deu um gole no chá, e sentindo o quão amargo estava, ela riu e disse brincando:

-O melhor de sempre?

Na manhã seguinte, Helena despertou de repente ao ouvir que alguém batia a porta do seu quarto, então perguntou:

-Quem é?

-António.

-Entra. – Disse depois de cobrir-se bem.

-Bom dia Helena.

-Bom dia António.

-Mas o Luciano disse que viria a que horas então?

-Sei lá, que horas são? Ele vai vir, o que foi?

-Nada, esquece.

-Me acordaste a essa hora só mesmo para me perguntar isso?

-Não liga – Disse ele, coçando a cabeça.

Quando António saiu, Helena, ficou pensando, segurou no telefone, marcou o número do Luciano, mas não queria ser chata, então decidiu não ligar. Voltou a colocar o telefone onde estava, mas ainda se preocupava sobre o assunto, então decidiu ir ter com a Esmeralda. Chegando lá, bateu a porta duas vezes, mas não havia resposta, voltou a bater, e nada, então Helena decidiu ir buscar o chaveiro de emergências que tinham algures na sala, para o caso de alguém um dia perder sua chave, e voltando, abriu a porta e entrou, para a sua surpresa, achou Esmeralda dormindo de uma forma anormal, com os pés fora da cama, e apoiando a sua cabeça na parede, tentou então acordar ela:

-Esmeralda, Esmeralda acorda!

-Hum! Pára com isso, quero dormir.

Helena sentiu o cheiro do álcool que Esmeralda libertava pela boca ao falar, desviou o olhar para evitar o cheiro, mas acabou direccionando o seu olhar para um diário que estava aberto no chão, e era chamativo, então Helena olhou para a Esmeralda, viu que ela ainda estava apagada, ajoelhou-se pegando no caderno, desfolhou rapidamente e numa das páginas, achou o nome dela escrito no início do primeiro parágrafo, e leu:

``Tudo por culpa da Helena, ela é uma adoptada, mas recebe mais carinho e atenção do meu pai, mais atenção do que eu, que sou a verdadeira filha, a única que eles têm, ás vezes penso que, seria muito melhor se fosse só eu e a minha família nesta casa, mas aquela intrusa, está sempre no meio, se achando melhor e mostrando as pessoas tudo o que tem graças a nós, ás vezes eu desejo que ela desapareça, sei lá, acidenta ou morre num…´´

Quanto mais Helena lia, mais triste ficava, quase chorou ao ver o quanto Esmeralda a culpava por tudo o que passava, e ainda antes que acabasse de ler, fechou o diário, sentou-se na cama, e ficou olhando para o estado em que Esmeralda se encontrava, endireitou a posição dela, e ao fazê-lo, viu as garrafas que estavam debaixo da cama, pois ao se movimentar, acabou chutando numa, empurrou as garrafas mais para lá, e aí Afonso bateu a porta:

-Sim. – Respondeu Helena, Chamando atenção da Esmeralda.

Esmeralda assustou, e acordou, ficou meio assustada olhando para Helena, Helena fez um sinal para ela voltar a dormir, ela virou-se, mas permaneceu atenta.

-Helena, Posso entrar. – Disse Afonso enquanto as duas se entreolhavam.

-Sim, entra pai.

-Está tudo bem? – Perguntou Afonso, analisando o cenário.

-Sim, quer dizer, a Esmeralda está com dor de bexiga, acho melhor deixa-la descansar mais um pouco.

-Devíamos ir ao hospital, não achas?

-Não pai. – Disse ela, sorrindo – Coisas de mulheres, isso passa.

-Está bem, eu já vou então.

-Até logo pai.

Afonso sai, e enquanto se dirigia para a porta principal de casa, Mariana chamou por ele com uma cara de sono:

-Amor, já vais?

-Sim querida, hoje não é um dia qualquer. – Disse ele, enquanto se aproximava – Temos uma reunião, e talvez, só talvez serei promovido.

-Hum! Parece que as coisas vão de bem para melhor.

-Existe uma forte possibilidade de eu ser promovido, quem diria que um dia eu estaria aqui? Eu era apenas um simples funcionário, que recolhia os lixos, foi incrível quando subi para secretário, Agora estou em destaque entre os que podem ser promovidos para Director da Empresa.

-Wau! Falaste sério quando disseste que irias mudar.

-Pois é, agora não me atrases mais. – Virou-se para ir, mas virou-se quando lembrou de algo. – Hum, já me esquecia amor.

Helena apareceu, e ficou ouvindo as palavras do Afonso:

-Poderias ajudar elas antes de saíres? Para que não seja Helena a fazer tudo.

-Deixa comigo amor, até o quarto dela vou arrumar.

-Amo você. – Disse Afonso

-Eu amo ainda mais. – Disse Mariana, orgulhosa.

Helena ao ouvir que Mariana iria arrumar o quarto da Esmeralda, foi apressadamente ao quarto dela, entrou, segurou nas garrafas e levou para o seu quarto, e guardou elas num local seguro, e quando saía do seu quarto cruzou com Mariana:

-Helena, tudo bem?

-Sim mãe, e contigo?

-Como está a Esmeralda?

-Está a melhorar, mas acho melhor não lhe acordar por enquanto.

-Vou arrumar o quarto dela, e fazer o almoço, você trata do resto, Ok?

-Sim mãe.

Mariana entrou no quarto da Esmeralda, antes de começar a arrumar as coisas, sentou-se ao lado dela e ficou pensando em como começar, porque o quarto estava muito desarrumado, tanto que parecia o quarto de uma criança. Enquanto Mariana Pensava, António entrou e perguntou:

-Mas mãe, o Luciano já deveria estar aqui, nós marcamos uma ideia para hoje, e é já daqui a dez minutos que toda gente vai estar lá, eu não quero ir sozinho.

-Vocês, Sempre em ideias e ideias, assim quando é que vão me falar sobre grupo de estudo?

-Grupo de Estudo? – Disse António, enquanto caminhava em direcção ao pacote de sumo chamativo em cima da banca da Esmeralda – Esse tempo mais?

-Hum! O mal da vossa geração é esse, só porque são do tempo actual, conhecem a moda e as tecnologias modernas, acham que tudo o que é antigo não tem valor, um dia vocês vão ser pais e mães, e vão saber o que é isso, andam distraídos. Não sabes o que se passa no país, não é?

Enquanto Mariana falava, António tentou provar o sumo, mas ainda antes de colocar na boca, foi surpreendido pelo cheiro do álcool, assustado, pegou no pacote de sumo, e com ele, saiu dizendo:

-Mãe, mãe, assim vais começar uma palestra agora? Eu não sou plateia. – e saiu disfarçando um sorriso.

-Hum, Estás a ver já? Não ouvem o que é bom. – Ficou reclamando, sozinha – Essa miúda também, do jeito que desarruma, merece um bom castigo.

António saiu de casa, foi logo para o quintal, e chegando até a Helena, disse:

-Helena, Helena.

-O que foi?

-Sente isso.

António colocou o pacote de sumo perto do nariz da Helena, e ela, sentindo o cheiro, simplesmente olhou para o António, desviou o olhar e respirou fundo, sem saber o que dizer, António notou que ela não estava surpresa, então disse:

-Você já sabia disso.

-Não, Quer dizer, descobri hoje também, encontrei garrafas debaixo da cama dela.

-Então não é só uma dor de bexiga. – Descobriu – E as garrafas? A mãe está agora no quarto dela.

-Eu sei, relaxa, guardei bem.

-Mas porquê que faria isso? – António perguntou, confuso.

Ao ouvir sua pergunta, Helena olhou para ele, e deu-lhe a entender que também lamentava, então António acrescentou:

-Essa miúda, ela não tem problemas, muita gente gostaria de estar no lugar dela, recebe tudo o que quer, telefone, roupa, perfumes. O Luciano não vai gostar nada disso.

-Espera, não vamos contar isso ao Luciano, você sabe muito bem o jeito dele de resolver os problemas, ele é muito agressivo, acho que primeiro deveríamos falar com ela, e mais, nós nem sabemos se ela sempre fez isso ou se… - Parou ao ouvir o portão abrir.

Luciano entrou, tentou disfarçar, mas deu para notar que ele estava meio cansado, então ele disse:

-Como é que é? Estou meio cansado, acho que nem vou à escola hoje.

-Eh! – António admirou, porque já estava cansado de esperar.

-António, hoje não vai dar para ir contigo naquela ideiazinha, mas fica para a próxima.

-Ideiazinha. – Resmungou em baixa voz, baixando a cabeça.

-E porquê que não foste?

-Cancelaram – Disse ele, atirando o pacote de sumo no balde de lixo indelicadamente, e indo embora.

Vendo que a situação ia de mal a pior, Helena tentou falar sobre o assunto com o Luciano:

-Isso não é nada bom, sabias que ele esteve a espera de ti desde as sete da manhã?

-Ah Helena, chega, tanto faz, eu nem quis ir mesmo.

Enquanto Luciano ia para dentro da casa, Helena olhou para o Luciano , tentando entender sua atitude, mas acabou notando que a manga direita da sua T-shirt estava rasgada e ligeiramente coberta de sangue.

Mais tarde, Helena e António entravam no colégio quando Paulo, à distância, fez um sinal para a Helena, mas Helena fez outro pedindo que ele esperasse, e foi até a sala. Chegando na sala, Helena pousou sua mochila, olhou para o António que saudava seus amigos:

-Mano, não apareceste, o que foi? – Perguntou um colega.

-Tive que resolver umas cenas bro.

-Esse gajo amarela muito. – Acrescentou outro colega.

-Se ele que só não apareceu hoje, amarela, e eu que já estou há um bom tempo sem aparecer nas ideias? Eu amarelo, branco, vermelho. – Disse a menina do grupo, provocando um momento de risadas entre eles.

Helena olhou para eles, e sorriu também, mesmo sem saber do que eles falavam, e foi ter com o Paulo.

Algures no caderno:

Seria fixe se eu tivesse uma staff agora, é bom ter quem te faça rir nos teus momentos tristes, às vezes penso, acho que seria feliz se eu fosse como eles, arrumar algumas encrencas, fazer piada de coisas sérias, matar aulas para ficar com o namorado, mas eu não sou assim, talvez foi isso que fez com que a Fernanda se afastasse de mim, acho que sou só uma, betinha.

Paulo já sabia da timidez dela, então abraçou ela diante dos amigos, e de mãos dadas, foram para um canto onde poderiam ficar a sós:

-Oi princesa, Estás bem?

-Princesa? – Perguntou ela, sorrindo.

-Sim, Princesa, quer dizer, se não gostaste eu posso…

-Amei. – Adiantou ela, sorrindo – Esse nome é para pessoas importantes.

 -E você é, muito importante para mim. – Dizendo essas palavras, Paulo acariciava as sobrancelhas dela – Tem algo que eu quero te mostrar.

- Agora?

-Sim agora, vem.

O sino tocou, Paulo nem ligou e continuou andando, mas Helena não tinha o hábito de perder aulas, então chamou por ele:

-Paulo!

-O que foi? Vem.

-Pode ficar para depois? Tenho avaliação de geografia agora.

-Acho que podes atrasar uns dez minutos, hum?

-Desculpa.

Helena largou a mão do Paulo, e foi e direcção á sua sala, olhou para trás e viu que Paulo estava distraído ao telefone, e aparentava estar aborrecido, então ela entrou na sala, estava preocupada, e muito pensativa, tão pensativa que nem conseguia responder as perguntas da avaliação, e acabou entregando sem mesmo responder as questões mais simples. Ao sair, uma das suas colegas achou que ela tivesse terminado, e disse, chamando a atenção de toda turma: ``Alguém quer ser doutora sozinha ´´. Chegando fora da sala, Helena foi para um local em que pudesse ficar sozinha, e escreveu mensagens para o Paulo, pedindo que ele aparecesse, para se desculpar, mas acontece que Paulo não respondia, ela esperou, esperou, mas ele não respondia.

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