Capítulo 11

Na manhã seguinte, recebemos um telefonema do nosso pastor, nos avisando que um dos funcionários dos escritórios de direção da igreja assistiu nossa tarde de programação clássica e tinha gostado muito, aí  estava querendo montar uma orquestra sinfônica a nível distrital  e eram os nomes meu e do Marcello que estavam sendo cotados, na verdade esse era o grande sonho do Marcello, e eu também queria muito participar desse projeto só que  tudo o que eu mais queria era sair dali, pois estávamos correndo risco de vida, eu a Danny que já estava com quase dois meses e meio de gestação e pra quem prestasse muita a atenção, o que não era quase ninguém agora que ela estava comigo, notaria que a barriga já não estava do tamanho normal.

Aproveitei a oportunidade pra falar ao pastor que andávamos fazendo algumas “coisinhas erradas” que ele logo entendeu e prometeu que trataria disso logo que retornasse, não abri o jogo completamente pelo telefone, nem mesmo falei quem era essa garota, apenas joguei umas indiretas o que o pastor, experiente como era, entendeu na mesma hora, mas também foi  muito gentil comigo no telefone, mas que no momento eu deveria era me preocupar com nossa orquestra, fazer uma relação completa de todos os músicos do distrito, deixar o Marcello a par de tudo e realizarmos algumas reuniões para que quando ele voltasse tudo estivesse encaminhado, é claro que eu não poderia dirigir a nova orquestra pois ainda não tinha me formado, e isso ainda demoraria uns três períodos, o Marcello já era formado a muito tempo ele seria o Maestro assistente, nosso Maestro principal seria enviado pela associação, eu seria uma espécie de colaborador.

Mas depois de algumas reuniões nossa orquestra distrital estava se organizando, sempre depois dessas reuniões eu, o Marcello, a Danny e mais uns três ou quatro músicos de outras igrejas do distrito organizávamos nossos apontamentos e planejávamos as próximas reuniões. Cada igreja do distrito teria o seu Maestro assistente, o Marcello era o nosso, e eu tinha sido nomeado pelo pastor como secretário da comissão musical do distrito, e intermediário entre o distrito e os escritórios de direção da igreja.

Numa dessas noites, depois  de terminada a reunião, todos foram saindo até que ficamos apenas eu, a Danny e o Marcello, a Danny já estava cansada desde o meio da reunião, e não via a hora de ir embora, e sempre que as reuniões demoravam um pouco mais pra terminar ela dormia do meio pro fim da reunião, na verdade ela era meio fraca pra sono, não só reuniões mas filmes, ou programações que demoravam um pouco mais ela cochilava no meu ombro do meio para o fim, assim que acabou a reunião, deixei o Marcello fazendo os apontamentos e fomos embora, nossa sala de reuniões ficava no sótão da igreja, que tinha sido transformado numa confortável sala de reuniões, com ar condicionado, computadores e até um piano, então descemos as escadas saímos pela porta dos fundos, que dava direto pro estacionamento, eu guardava a moto sempre no mesmo lugar, nos fundo do estacionamento ao lado de uma van azul marinho e de vidros escuros, a van estava  quebrada e já estava estacionada lá a meses, fomos pra moto e estávamos quase a cinco metros da moto quando ele saiu de trás da van. Veio pra cumprir sua promessa, o pastor chegaria em três dias, e se o Daniel tivesse adiado esse seu “acerto de contas” pelo menos por uns cinco dias, eu tinha me livrado do quer que fosse que ele tinha preparado pra mim. Mas ele não tinha vindo sozinho, tinha pelo menos mais uns cinco ou seis caras com ele, cercaram a gente no estacionamento aí eu me apavorei.

– Daniel, que isso, a gente pode conversar.

– Conversar? Conversar seu idiota, acha mesmo que eu quero conversar com você? – ele me olhava nos olhos, a poucos centímetros de distância, faiscando de raiva, sua respiração era ruidosa e inspirava a puro ódio. – é tem razão, a gente vai conversar mesmo, com-ver-sar, – ele falou assim mesmo, bem pausadamente e estralando os dedos das mãos mandou que segurassem ela de frente pra gente e que a mantivesse com os olhos bem abertos.

– Daniel isso é entre a gente, deixa ela fora disso – já tinha mais uns dois ou três caras colados um em cada lado de mim e outro atrás – deixa ela fora disso, por favor, por favor, deixa ela ir embora, Daniel por favor.

– Ir embora? Uma ova ir embora, “você” não é o queridinho dela agora? Então ela vai ter que assistir tudo.

– Tudo o que? – foi aí que o cara de trás me agarrou por trás com os braços ao redor dos meus e as mãos na minha nuca, e cada um dos dois segurou um braço meu.

– Põe a cara dessa vadia pra cá.

– DANIEL POR FAVOR, DEIXA ELA, DEIXA ELA IR EMBORA, POR FAVOR – eu já sabia que o que quer que fosse acontecer não era coisa boa, queria por qualquer coisa nesse mundo deixar minha Danny fora disso, ainda que ele me matasse ali mesmo, mas que poupasse a vida dela.

– CALA A BOCA, CALA A BOCA seu nerdzinho de MERDA!!! – ele falava alterando o tom da voz, ora baixo, ora alto, ora ele berrava, ora sussurrava, eu só não sei como ninguém ouviu nada, haviam os vizinhos, havia a casa do zelador da igreja, e o Marcello ainda estava lá na sala de reuniões, nunca descobri como é que ninguém ouviu nada. A Danny já gritava muito, mas tinha um cara muito forte segurando ela e tapava a boca dela com a mão e ela chorava e se batia muito tentando se soltar. Quando o Daniel chegou perto de mim, rodeando em volta como um galo de briga tomou a pasta da minha mão e começou a folhear em tom de sarcasmo:

– O que temos aqui? Vejamos, formulários, papéis em branco, músicas, humm letrinha bonita em nerd? Que mais? Oh, “Gaiola Dourada,” dedicada ao amor de minha vida, D.A.M. Daniela Albuquerque Medeiros eu imagino não é nerd? Toma – arrancou a página da pasta, amassou e entregou ao cara que segurava ela – cala a boca dela com isso – enfiaram a folha dentro da boca dela pra abafar os gritos – eu não conseguia ver tanta violência contra ela, queria que ele me matasse mas que a soltasse, mas ele não me deu tempo nem pra suplicar nada, jogou a pasta aberta no chão, fazendo que os papéis todos se espalhassem por todos os lados, olhou nos meus olhos e continuou, dessa vez em tom muito baixo – eu falei pra você deixar minha garota em paz, eu falei  Leonardo – era a primeira vez que ele falava meu nome.

– Eu nunca fiz nada pra ela terminar com você, não sou responsável por isso, – não haviam mais lágrimas a serem derramadas – deixa ela fora disso por favor, faz o que você quiser, me mata se você quiser, mas por favor deixa ela ir embora.

Só que aí ele perdeu a cabeça, me segurou pelo pescoço me enforcando com a mão esquerda.

– Você acha o que? Que eu tenho cara de palhaço? De idiota? – aí ele me soltou, deu um passo pra trás e continuou apontando o dedo indicador no meu nariz – Acha que eu ia deixar você comer minha garota e ia ficar tudo por isso mesmo? Acha que eu ia deixar ela ficar trepando com você na minha cara e ia DEIXAR ISSO POR NADA? Acontece que você estava errado nerd.

– Você traiu ela.

– CALA A BOCA! Isso não é da sua conta, você não tinha que se aproveitar da situação seu OPORTUNISTA! A Daniela é minha, minha, MINHA!!! – aí ele começou a me socar no estômago, no rosto, várias vezes, eu não tinha reação alguma, tinha três brutamontes me segurando, e cada soco parecia uma tora que batia ora no meu rosto ora no meu estômago, a pobre da Daniela já não tinha mais nem voz pra gritar, e era obrigada a olhar, pois quando ela fechava os olhos eles batiam nela também, a cada golpe ele ia gritando vários palavrões, me chamando dos piores nomes. Não sei quanto apanhei naquele dia, mas com toda a certeza a Danny sofreu muito mais, pois era obrigada assistir tudo, o próprio Daniel se cansou de tanto bater, se afastou e ficou ofegante com as duas mãos encostadas na van, eu já não me aguentava mais de pé, me soltaram e eu desabei, só consegui olhar pra ela, eu queria morrer logo mas não queria deixá-la ali. O Daniel continuava encostado na van, aí um dos caras que estavam me segurando olhou o Daniel pedindo:

– Dani? – ele respondeu apenas com um gesto de cabeça em sinal de afirmativo mas sem sair da posição em que estava. Apanhei de todas as formas, foram muitos chutes e pontapés por todo o corpo desde a cabeça até os pés, enquanto isso o Daniel foi até ela que continuava bem segura, de cabeça baixa, chorando ele segurou o queixo dela bem firme.

– 'Tá vendo isso? Poderia ter sido evitado, mas não, você tinha que bancar a melindrosa, sair correndo para o braços do primeiro idiota que apareceu. – ela fechava os olhos, aí é que ele batia na cara dela e gritava – OLHA PRA ELE!! OLHA PRO SEU NAMORADINHO, OLHA!!! – Sua vadia!! Isso é culpa sua, sabia? É tudo culpa sua, vagabunda.

Eu continuei apanhando até que o Daniel ordenou que parassem:

 – CHEGA!!! Agora “El gran finale”. Peguem ele. – me levantaram de novo na mesma posição de antes, mas agora eles é que tinham que me manter em pé, eu devia ter as duas pernas quebradas de tanto que me doíam. Minhas coisas estavam espalhadas pelo chão, instrumento e partituras, ele pegou meu violino, abriu o case, jogou de lado como se fosse de papelão, e deu o instrumento na mão de um cara – segura isso! Traz ela aqui mais perto, essa vadia vai ter que ver isso bem de perto – aí colocou ela bem do lado dele, mais ou menos a um metro e meio na minha frente – vamos lá pessoal, do jeitinho que a gente combinou.

A Danny estava de olhos arregalados, sem reação, tentando adivinhar o que aconteceria, o cara que me segurava por trás de novo me segurou da mesma forma que antes, os outros dois caras seguraram cada um num braço, e olhavam pro Daniel.

 – Tapem a boca dele, esse maldito vai gritar – pegaram minhas próprias partituras, amassaram e enfiaram na minha boca, pra que eu não gritasse aí ele chegou bem pertinho de mim e falou quase sussurrando – eu garanto que nunca mais você vai se meter no meu caminho nerdzinho de merda, aliás, ela já te falou que foi ela que te deu esse apelido lindo? – quando eu olhei pra ela, o que ele me obrigou a fazê-lo, seus olhos pareciam me pedir desculpas, pois ela tinha inventado isso na época em que não gostava de mim, aí ele se afastou de novo, e assentiu com a cabeça. Quando os dois ao lado começaram a torcer meus braços, os dois sincronizadamente comecei a gemer, depois a gritar e por último a berrar, porém tinha um monte de papel na minha boca, os gritos eram abafados, a Daniela que até então estava em silêncio, começou a se bater e a gritar, seus olhos se arregalaram muito quando o primeiro dos meus braços se quebrou fazendo um ruído abafado, em seguida o outro também quebrou, a dor era alucinante, apertei os olhos, minha garganta ardia de tanto gritar, mas eles continuaram a torcer, minha carne começou a se rasgar, os ossos dos meus dois antebraços rasgaram a pele saltando para fora do meu braço numa fratura exposta, a dor era tanta que meu dois braços inteiros estavam adormecidos, mas aí me soltaram, não consegui ficar de pé nem por um segundo, com toda a certeza eu tinha as duas pernas quebradas, e agora os dois braços com os ossos pra fora. Meu corpo todo doía, foi aí que abri os olhos a Danny me olhava com o rosto congelado, e o Daniel ainda não estava satisfeito.

      – 'Tá vendo isso? 'CÊ 'TÁ VENDO ISSO, SUA IDIOTA, OLHA PRO SEU NAMORADINHO, OLHA! – Ele segurou ela pelos cabelos arrastou até onde eu estava, sujou a mão com o sangue que jorrava feito água dos meus braços e se acumulava numa poça exatamente onde eu estava e esfregou na cara dela, eu aguentaria qualquer dor que me causassem, menos aquela, de ver o grande amor da minha vida sofrendo desse jeito, mas ele agora começou a esfregar a cara dela no sangue, passava ele nas roupas dela, batia no rosto e continuava a gritar como um alucinado – OLHA PRO SEU NAMORADINHO SUA VADIA, OLHA!!! – soltou-a no chão como uma boneca de pano, começou a chutar a barriga dela, lembrei do meu filho que crescia no ventre dela e que indiretamente também assistia a tudo, mas eu não conseguia mais nem me mexer, estava completamente imobilizado, eu não podia mais nem gritar, minha boca estava cheia de papel, minhas cordas vocais queimavam eu fui obrigado a assistir tudo sem poder fazer nada, fechei os olhos e apenas ouvia o som das botas dele socando o frágil corpo dela, enquanto ele torturava ela, torturava meu filho, se ele ao menos sonhasse que ela estava grávida seria capaz de matá-la ali mesmo, pegou nos cabelos dela, e levantou-a do chão, jogou ela em cima de um dos seus capangas  – SEGURA ESSA VADIA – Foi até o outro que ainda estava com meu violino nas mãos, segurou pelo braço e antes de bater sussurrou algo no ouvido dela depois bateu na cabeça dela com força, aquilo me rasgou o peito de vez, ao ver seu corpo inerte caindo no chão, julguei que ela estivesse morta, o instrumento despedaçou-se, aí ele veio na minha direção abaixou-se ao meu lado, levantou minha cabeça segurando-me pelos cabelos, olhou nos meus olhos por alguns segundos antes de bater minha cabeça no chão com força, era uma dor profunda, interna, funda, bateu uma, duas, três, quatro, aí tudo ficou escuro e eu não vi mais nada, perdi os sentidos, apaguei.

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