ZOE MONDEGO

Rabisque o coração

insinue poemas

— Oscar De Jesus Klemz.

Encarei pela terceira vez ambos os convites que descansavam sobre a mesa de vidro.

Um com belas letras douradas e cursivas em um papel bege e refinado que até possui um cheiro de lavanda, e o outro com letras imprensas em um papel branco, tão sem graça mas que aparentemente é tudo para mim.

Irónico.

O bico bateu contra o chão polido, e o som dos meus saltos altos ecoaram por todo espaço que me rodeava, abafando todo o ruído que a enorme cidade de Los Angeles faz, talvez seja isso que me fazia sentir quase que engolida, sufocada, em um ambiente tão amplo que é a  minha sala.

O primeiro eu já estava esperando, o casamento de Kristen, confesso que achei que demorou bem mais do que eu imaginava, mas o segundo apanhou-me completamente de surpresa, ou nem tanto.

Passei com suavidade as mãos sobre o meu cabelo denso e respirei fundo tentando não ter um ataque de histeria.

Eu precisava me acalmar para poder pensar em um plano racional, nada que me fizesse decair mais ainda.

Eu sou a diretora comercial da Mrs. Walter 's, uma das maiores corretora de seguros do estado, e eles não podem simplesmente retirar o meu posto do evento como se eu não fizesse parte da empresa, como se todo o meu trabalho e esforço fossem para jogar aos ventos.

Eu tenho certeza que esse desprezível acaso deu-se sobre a conversa em relação a permanência do meu posto e da minha tão esperada promoção.

Não me admira, na mesa de congresso eu sou uma das poucas mulheres, e no caso, a única solteira, e mesmo eu provando as minhas capacidades profissionais, ainda assim não é o suficiente para manter o meu posto intacto.

Alcancei o café escaldante e o beberiquei pensativa.

Bom, se eu não for ao evento, isso significa que não terei a minha tão almejada promoção, aquela cujo eu tenho trabalhado sem parar durante esses longos dois anos, colocando minha vida social e meu descanso de lado.

E eu tenho certeza absoluta que tem o dedo maldito do Hugo nisso.

Voltei a respirar fundo assim que toques foram dados em minha porta, seguido da aparição do belo rosto tão bem conhecido de minha secretária.

— Srta. Mondego, o Sr. Lecos pretende falar com a senhora, posso transferir a chamada? — Ela perguntou.

— A vontade, Marie — autorizei e cocei a garganta para me recompor na cadeira.

Quase que imediatamente a videochamada pelo computador começou e voltei a respirar fundo umas duas vezes antes de atender.

— Pois não, Sr. Lecos — pousei a bela chávena de café ao meu lado e quanto voltava a levantar os olhos em direção a tela, observando o olhar de pena que Hugo depositou em mim.

— Não me trates assim, Zoey, eu não posso interferir numa reunião da mesa de congresso, além de ser uma questão de respeito, eu de qualquer forma eu não tenho tanto poder para isso, quem decidi é a mesa de congresso, você sabe que se eu pudesse jamais te colocaria em uma situação dessas.

— Mas não estão a ser respeitosos comigo, eu me esforcei tanto, me dediquei tanto e ninguém está levando em consideração isso — rebati desesperada.

— Eu sei, mas nesse momento eu estou de mãos atadas, eu lamento, Zoey, não é dessa vez —ele concluiu.

Eu seria promovida, o discurso que daria no seminário, no qual trabalhei muito durante os últimos meses, está sendo jogado por ralo abaixo. Minha cabeça aquece e não penso antes de proferir:

— Então certamente, terei que dar a novidade mais rápido do que imaginava.

— Que novidade? — perguntou desconfiado.

Respiro fundo antes de dizer a merda que tanto anseiam.

— Estou noiva! — eu disse de um jeito calmo, como se não estivesse dizendo a minha maior mentira e esperei a reação de meu superior.

Mas após um longo silêncio perturbador, uma sequência de risos invadiu o estado inquietante.

Eu podia ouvir todo eco que sua sala podia proporcionar devido às altas gargalhadas.

— Você, noiva? Boa, tens sempre uma boa piada para aliviar o momento — ele limpou a lágrima do canto dos seus olhos.

Ótimo, meu desespero é uma piada.

— Não estou brincando, Hugo, estou falando séria, eu estou noiva, não queria que o meu estado civil interferisse na vossa decisão, que vocês ignorassem todas minhas capacidades, mas se tem que ser, então será — afirmei determinada mas ele não pareceu nenhum pouco estar acreditando.

— Zoey, olha para mim, eu sei o quanto você trabalhou para isso, as noites mal dormidas, eu sei disso, mas...

— Mas nada, Hugo, chega! — respirei novamente fundo. — Eu irei fazer isso a bem ou a mal, não importa, eu estou noiva, se você não acredita nisso, isso já não é problema meu.

— Ok! — Ele levantou as mãos, se rendendo. — E agora o quê que você quer que eu faça?

— Eu quero que você mande uma carta para o vice-presidente, dizendo para ele analisar melhor o meu caso, e junto a carta, você mandará um convite de jantar para ele e sua esposa, e também para o restante do pessoal da mesa de congresso para eu apresentar o meu noivo — eu disse e ele pareceu ficar cada vez mais incrédulo.

Mas o que importa ?

— Você realmente não está pedindo algo fácil, Zoey, e de qualquer forma, eu espero não perder o meu tempo e principalmente não está desperdiçando o tempo do vice-presidente — ele respondeu abanando lentamente a cabeça, e depois ponderou um pouco antes de eu responder.

— Dê-me apenas um voto de confiança, Hugo, por favor — Implorei.

— Você tem 360 horas para arranjar um noivo, Zoe — e encerrou a ligação.

Fechei lentamente o computador e pousei a cabeça por cima da mesa, agora com um enorme sorriso delineando o meu rosto.

Bom... Talvez eu nem seja promovida, acredito que serei demitida se não arranjar um noivo até a próxima semana.

Voltei a pegar a minha chávena para continuar a beber o café.