Minhas profecias transformaram meu companheiro, Alfa Kane, em um rei. E no dia da coroação dele, ele me matou. Tudo porque o primeiro amor dele, Scarlett, foi exilada e morreu depois de tentar me envenenar.

O mundo desabou quando a lâmina de prata atravessou meu coração.

A última coisa que vi foi o olhar triunfante e cheio de ódio de Kane.

Soltei um suspiro, meus olhos se arregalaram. Eu estava respirando com dificuldade.

Nenhum ferimento mortal. Nenhum cheiro de sangue. Apenas o aroma de pinho vindo do fogo sagrado no Altar da Luz da Lua.

Isso não era o silêncio da morte. Era o canto baixo e ritualístico das alcateias.

— Santa Mira, por favor, escolha seu companheiro — disse o Ancião, sua voz ecoando como naquela noite fatídica, oito anos atrás.

Minhas mãos tremiam enquanto eu olhava para elas. Estavam perfeitas.

Dezoito anos. A Cerimônia da Escolha.

Eu… renasci.

As memórias voltaram como uma enchente: dor, raiva e traição me engolindo inteira.

A Grande Guerra entre o Norte e o Sul havia começado. Meu dom de profecia me transformou na Santa, a chave para o futuro do Norte.

Os Anciãos exigiram que eu escolhesse um companheiro entre os melhores Alfas das grandes alcateias.

Ele seria meu parceiro e, com minhas visões, guiaria o Norte à vitória.

E eu, cega e inocente, escolhi Kane.

Tudo porque ele apareceu como um Deus, me salvando de uma fera selvagem quando eu era apenas uma menina.

Eu era tão ingênua. Achei que aquela atração estranha entre nós fosse destino.

Eu dei tudo a ele: minha lealdade, meu corpo e minhas profecias que esgotavam a minha própria loba interior a cada vez que a usava.

Mas eu era cega ao desejo nos olhos dele quando olhava para Scarlett, sua Beta de infância.

Após nosso vínculo, o ciúme dela se tornou um veneno.

Ela me humilhou, me provocou e, no fim, tentou me envenenar.

Quando os Anciãos a exilaram e ela foi despedaçada pela Alcateia Lua Sangrenta, Kane apenas me abraçou e sussurrou:

— Ela trouxe isso para si mesma. Não tem nada a ver com você — murmurou ele

E eu acreditei.

Continuei drenando a minha loba interior, batalha após batalha, para que ele vencesse.

Até que, finalmente, foi coroado Rei do Norte. Então, em meu momento mais feliz, ele enfiou aquela lâmina de prata em meu coração.

— Se não fosse por você, Scarlett nunca teria enlouquecido de ciúme! Ela nunca teria morrido!! — rosnou Kane, sua voz mais fria que a lâmina.

— Você tem o dom da profecia. Por que não salvou ela? Você é inútil agora. Morra!

A dor do corte no coração, a traição da alma… tudo estava tão vivo dentro de mim.

— Santa, por favor coloque uma gota de seu sangue no símbolo do escolhido — disse o Ancião, oferecendo uma agulha.

Eu me forcei a sair da lembrança e olhei para os punhais no altar. Cada um representava um Alfa poderoso do Norte.

O punhal de Kane, incrustado de ouro e joias, brilhava na luz do fogo. Tão falso e chamativo quanto ele era.

Meus olhos pularam por ele, pousando em um ponto esquecido no canto mais distante. Era um punhal esculpido em obsidiana. Seu cabo era áspero, sem adornos, irradiando uma selvageria crua e primitiva.

Pertencia a Oliver, o Alfa do Bosque das Sombras. Um Alfa amaldiçoado.

A lenda dizia que sua linhagem de sangue era contaminada por magia negra. Qualquer companheira que se unisse a ele teria seus dons e sua loba interior inconscientemente drenada, até que não sobrasse nada além de uma casca vazia. Escolhê-lo era escolher uma morte lenta e dolorosa.

Em minha última vida, eu não teria chegado perto daquele punhal sinistro. Mas agora, um sorriso frio surgiu nos meus lábios.

De costas para os Anciãos, furei meu dedo sem hesitar. Uma única gota carmesim de sangue caiu, pousando exatamente no cabo de obsidiana preta como a noite. Uma luz fantasmagórica e roxa pulsou no punhal, absorvendo instantaneamente meu sangue.

A escolha estava feita.

Por tradição, o resultado final seria revelado pelo poder da própria Deusa da Lua na cerimônia de união, em três dias, na lua cheia.

A cerimônia terminou. Quando virei para ir embora, Kane bloqueou o caminho.

— Mira. Precisamos conversar — disse ele, com a arrogância de sempre.

— Não temos nada para conversar — respondi, fria, tentando passar.

Ele me agarrou pelo braço, apertando com força.

Ele me prensou contra uma árvore, seu hálito quente no meu rosto.

— Escuta aqui. Eu sei que você me escolheu. Quem mais em todo o Norte você poderia escolher? Mas é melhor você se lembrar disso…

Eu encarei ele com frieza. Ele parecia ridículo, como um palhaço patético.

— Mesmo depois que formos vinculados, meu coração sempre vai pertencer à Scarlett — disse ele, com os olhos frios como gelo.

— Então se livre de quaisquer ideias estúpidas. Nem pense em pegar o que é dela. E não ouse usar sua patente de "Santa" em minha companheira. Entendeu?

Isso era estranho. Eu não me lembrava dele ter dito nada antes da minha escolha na minha vida passada.

Mas eu deixei pra lá.

— Entendi — falei, obediente.

— O que você teme nunca vai acontecer — Minha calma o confundiu.

— Você… Está diferente hoje — murmurou.

— Estou? — dei um leve sorriso.

— Talvez eu tenha apenas crescido. Visto as coisas com mais clareza.

Ele me olhou por um momento, então finalmente me soltou.

— Apenas se lembre do seu lugar, Mira. Não me cause problemas

— Claro. — Virei e fui embora, deixando-o e seu ego ridículo para trás. Ao luar, eu mal conseguia conter minha alegria.

Oh, Kane, você nunca vai adivinhar.

Eu já te cortei da minha vida. Em três dias, na frente de todos as alcateias, eu vou pessoalmente esmagar seu orgulho arrogante em pedaços.

Desta vez, sem minhas profecias para te guiar, vamos ver como você sobrevive à guerra.