Eu não sou mais a mesma pessoa

Tudo continua como eu me lembro, fora o fato de que as plantas do jardim estão mortas, eu digitei a senha do sistema de segurança e entrei na minha casa, e assim como a entrada, ela continuava a mesma.

Dentro de casa eu pude ver os sinais do estado do Théo, não estava tudo sujo e bagunçado como se pode esperar, mas havia poeira em todos os lugares na cozinha havia caixas e caixas de entrega de comida e garrafas de bebidas e... Sorvete, eu ri um pouco com isso, exatamente como eu previ, meu bebê panda ainda é um bebê no final das contas.

Eu andei em direção ao quarto dele e estava escuro, mas eu pude ver que estava vazio, me perguntei se talvez ele não estava em casa...

Andei em direção ao meu antigo quarto, e lá estava ele meio encoberto pelo edredom rosa, abraçado ao meu urso gigante de panda e sem camisa, claro que mesmo dormindo angelicalmente eu ainda poderia ver as marcas dos seus olhos inchados e marcas de lágrimas secas, ele sempre teve olheiras, por isso o apelido de panda, mas agora com certeza elas estavam muito à mostra, parece que ele não dorme bem a semanas. Haviam garrafas de bebidas pelo chão e vômito no meu tapete. Eu ri um pouco seca da visão, voltei para a cozinha para jogar todo aquele lixo fora, cozinhar alguma coisa para nós dois e nossa provável dor de cabeça a seguir e então... Beber o resto das bebidas na geladeira, afinal, a coragem líquida nunca é demais.

Depois de olhar para ele só... Parece que tudo ficou muito mais sério.  

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Quando ele entrou na cozinha, me encontrou bebendo um pouco de Vodka, eu não sei o que ele pensou, talvez que estava alucinando por que seus olhos continuaram apáticos como antes, depois seus olhos viraram para o fogão e para a sopa que estava ali, ao que parece horas, mas na verdade apenas alguns segundos, e enfim a ficha caiu. Ele me olhou com os olhos cansados e inchados, depois surpresa, medo, culpa, e confusão. Ele ia falar alguma coisa mas eu fiz um gesto para ele sentar-se à mesa, e sem dizer nada ele fez isso.

Eu me levantei um pouco cambaleante não por estar bêbada, com certeza não, eu suporto muito álcool, mais sim dormência e sono, eram mais de 2 da madrugada, e amanhã tenho todos os horários com o demônio-bobo-unicórnio.

Peguei um prato e coloquei sopa, peguei um copo de água e uma aspirina para ele, ele ficou me olhando por um tempo até decidir tomar o remédio e depois começar a comer, acho que ele entendeu que eu queria conversar com ele depois do... Jantar?

Eu comi também, e assim que terminamos de comer ficou esse clima tenso, enquanto eu lavava a panela e os pratos.

Ele se sentou no sofá, ainda em completo silêncio e me esperou, ele não sabia por onde começar a falar assim como eu.

- Olívia eu... Desculpe-me – ele começou com olhos aguados, assim como eu pensei ele acha que a culpa disso tudo é dele que ele se transformou em alguma coisa que eu não gosto... Como se o fato de ele gostar de meninos tenha me deixado com nojo dele...

- Você não precisa pedir desculpas por nada, para falar a verdade, você nem sabe de nada. – Ele me olhou machucado, triste e choroso.

- Você me odeia? Eu sou nojento? – Ele perguntou, mas eu pude perceber que isso não era para mim, essas foram perguntas que ele fez para si mesmo muitas vezes antes de eu chegar, ele estava se martirizando, se culpando e se machucando pensando em várias coisas desnecessárias.

- Não... Você não entende Théo... – Ele me encarou e então eu finalmente decidi abrir o jogo, eu sentei do lado dele no sofá e encarei diretamente os seus olhos, coisa que eu não faço há um bom tempo... Então comecei a falar.

- Você sempre esteve lá, do meu lado em todos os momentos, desde pequenos, eu era sozinha, eu sofri muito, as pessoas brigavam comigo e me falavam coisas ruins, isso me machucava, mas você sempre esteve lá do meu lado me protegendo, sabe como uma espécie de herói. – Eu não pude evitar sorrir com as lembranças - Com o tempo, eu realmente não me importava mais com nada... Por que... Por que não importava o que eu fizesse ou o que acontecesse você sempre estaria comigo Théo, era isso que importava. – ele me olhou meio incrédulo, eu disse antes né, eu não sou do tipo sentimental, eu nunca agradeci nada do que ele fez ou disse o quanto à presença dele era importante na minha vida, eu sempre fui calada, enquanto ele era doce e gentil.

- Então... Por quê? – ele me fez essa pergunta a pergunta que eu não queria responder, duas palavras mais que significam tantas outras coisas: "Por que você me deixou?”, “Por que você me renegou como nossos pais?” “Por que você não pode me aceitar?”.

- ... – Eu tive que respirar fundo antes de abrir minha boca novamente - Eu sempre pensei que enquanto você estivesse comigo nada nesse mundo poderia me abalar, e quando tentaram abusar de mim e você estava lá pra me proteger... Essa admiração, esse amor fraterno... Ele mudou Théo – ele agora estava me encarando, meio curioso, meio sei lá indecifrável. E então quando o seu olhar mudou, como se a ficha finalmente tivesse caído para ele, eu finalmente quebrei em lágrimas que caíram sem fim, ele me encarou e ligou os pontos, e sem nem mesmo pensar me abraçou o mais forte possível.

- Eu... Théo~ Eu me apaixonei por você, me perdoa... Eu só~ - Soluços fortes começaram a escapar da minha boca e ele continuava murmurando que me amava e que ele queria o meu perdão – Théo, eu não tinha nojo ou... Ou ódio de você... Eu só~

- Tudo bem, tudo bem... – Ele continuava me abraçando e eu me apertei contra ele cada vez mais enquanto minhas lágrimas continuavam a me cegar. Eu tentei me acalmar e cessar as lágrimas, respirar compassadamente, deixar que o perfume dele me invadisse e aliviasse a minha dor e angústia.

- Eu fui embora, porque eu precisava parar de te amar. Eu precisava esquecer isso, me desculpe, eu fui egoísta, eu não pensei direito no mal que eu te causaria... Me perdoa, Théo. Me perdoa por ter te machucado dessa forma.

- Olívia eu... – Ele olhou pra mim como se ele fosse o culpado de tudo.

- Mais eu não consegui Théo, você é meu irmão, mas merda por que você é tão doce, bonito, legal, gentil e sexy porque puta merda – Eu praguejei e ele me encarou, eu nunca fui do tipo que xinga dentro de casa – Quem abraça a mulher que te ama sem camisa? Quem cuida de alguém como você faz? Como eu poderia me libertar desse sentimento quando tudo que eu tenho de você são as boas memórias? – Eu tentei rir um pouco enquanto ele ficava corado tão bonito, tão bonito, mais viril. Ele é sexy não importa por onde eu veja.

- Olívia – ele ia começar a falar mais eu o calei com um beijo, um beijo doce e molhado, onde eu estava botando todos os meus sentimentos, ele engasgou de surpresa e tentou me parar mais eu não deixei que ele me empurrasse no momento que eu apertei minhas mãos na sua nuca, eu passei a língua no seu lábio inferior e tentei forçar a minha entrada na sua boca, havia o leve gosto da comida assim como o álcool ainda dava para ser sentido mais deixei isso de mão, coloquei o meu braço ao redor do pescoço dele dessa vez segurando levemente as madeixas pretas e continuei beijando ele até que meu fôlego acabou – Não posso fazer isso Olívia você é minha irmã, por favor para.

- Eu sei disso, você sabe o quanto eu me senti nojenta e estranha minha vida inteira? Merda, eu sou apaixonada pelo meu irmão! Meu sangue... E você é gay... Eu sei que isso é impossível – Eu continuei olhando nos olhos dele embora seja difícil dizer tudo isso, agora eu não posso mais fugir. Eu o beijei de novo mesmo que seja só um selinho, depois beijei o seu pescoço macio.

- Eu não sou gay eu sou Bissexual, mas isso não vem ao caso Olívia não podemos – ele me negava e tentava me tirar de cima dele mais eu não deixei.

- Você me ama? – eu perguntei

- Claro que eu te amo e por isso eu não posso – ele continuou sério

- Então me ame me mostra isso me possua totalmente, e então, e só ai, eu poderei seguir em frente Théo – eu disse extremamente séria – Eu juro que eu tentei esquecer, droga, eu tentei esquecer eu tentei me apaixonar por outra pessoa, eu tentei transar com um cara, mais... – ele ficou me encarando surpreso por essas palavras, é claro que nenhum irmão consegue ver sua irmãzinha pequena como isso, que eu sou, ele com certeza me via como um anjinho puro que ele corrompeu mostrando sexo gay. – eu não consigo, eu quero só você, eu quero você... Mas eu também sei que eu preciso seguir em frente… Mas eu não consegui, eu realmente não consegui esquecer meus sentimentos. – eu sabia que não deveria estar fazendo isso, ou mesmo dizendo essas coisas, muito menos passando a mão pelo corpo bem tonificado pelos anos de treino e me deleitando com os arrepios que minhas unhas causavam na sua pele.

- Eu não totalmente gay Olívia, isso me afeta, você é linda mas... Mesmo que você seja atraente, a verdade é que eu amo o Brian. Não é por que é você, é só por que eu já amo ele. - ele começou relutante, e quando finalmente terminou com um último fôlego derrotado eu olhei para ele surpresa – eu contei para a Mamãe, e ela me disse que isso era errado, mas que ela não era contra, ela disse que sabia que não era culpa minha, mas o papai soube, ele fez um escândalo na casa do Brian, e então... Então me mandou para fora de casa, eu me culpo até hoje pela morte deles, se nós estivéssemos com eles, eles ainda estariam aqui conosco, se eu não tivesse contado, o Brian ainda teria a casa dele, se não fosse por minha causa a vida de todo mundo estaria totalmente diferente...Olívia essa é a cruz que eu carrego...

- Théo... Eu sei o quanto a morte dos nossos pais te afeta mas... E se nós estivéssemos lá mesmo? Todos estaríamos mortos? A nossa vida terminaria ali? – Nós já tivemos essa mesma conversa um milhão de vezes mas simplesmente não entra na cabeça dele que não foi nossa culpa.

- Olívia eles foram as pessoas que cuidaram da gente como filhos, eles nos amaram e protegeram quando nem mesmo era sua obrigação. – ele gritou com raiva... Que raios o Théo está falando? “protegeram quando nem mesmo era sua obrigação?”

- Como assim cuidaram da gente como filhos? – eu perguntei de supetão e então ele finalmente percebeu o que havia dito.

- ...

- Me diz a verdade, Théo! Agora! - eu não acredito que eu… Passei a vida inteira me culpando sendo que… Eu não acredito nisso!

- A mamãe não podia ter filhos, nós dois somos filhos de mulheres desconhecidas, e homens desconhecidos. Somos adotados – ele respondeu minha pergunta, e na mesma hora minha culpa murchou, não somos irmãos então... Então eu tenho essa chance?

Se nós não somos irmãos... Não tem nenhum pecado… Eu não preciso me sentir culpada por nada?

- Então, se não somos irmãos vamos em frente por favor... Théo eu estou implorando, me dê uma chance.

- Eu não posso, eu não posso fazer isso – Ele abaixou a cabeça com uma expressão derrotada.

- Então deixe que eu faça... – Eu me levantei e comecei a me despir na frente dele, embora ele não queira, ainda é homem e sente desejos... E eu estava confiando nisso, nos desejos dele.

- Você – Ele me olhou incrédulo, mas mesmo assim me aproximei calmamente dele novamente tentando sentar em seu colo de novo, mais dessa vez fui brutalmente jogada no sofá – Me ouça, eu sou seu irmão mais velho, eu amo o Brian, e eu saí de casa por isso, você decidiu vir comigo, e por nossa causa nossos pais morreram, eu não vou aguentar mais um pecado nas minhas costas Olívia eu não vou fazer isso! Eu não consigo! Entenda você nunca vai significar isso para mim, você não faz o meu coração bater como ele... – Ele agarrou fortemente meus braços e me chacoalhou como se isso fosse limpar a minha mente.

- Théo~ - As lágrimas caíram novamente, eu me levantei apressada e coloquei minha camisa e um casaco por cima da minha roupa leve de colegial. Peguei minha bolsa pronta para sair de novo.

- Aonde você vai? Olívia volte aqui! – Ele gritou para minhas costas assim que eu estava passando pela porta de entrada ele ainda tentou correr para pegar meu braço mas eu fui mais rápida e bati a porta.

- Eu vou atrás de alguém que me queira de verdade, então, não se preocupe, eu vou estar de volta amanhã. – Eu disse ácida, minhas roupas ainda estavam desajeitadas e minha camisa mal colocada por debaixo daquele casaco, eu não sabia para onde ir. A Aileen já deve estar dormindo e eu não quero perturbá-la não hoje, então uma ideia levemente insana apareceu na minha cabeça e eu comecei a correr em direção ao bar que eu estava mais cedo.

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- Não sabia que garotinhas andavam tão tarde da noite – Eu ouvi a voz grave e levemente rouca no meu ouvido e não pude deixar de sorrir alegre, eu fui até o bar e as portas já estavam fechadas, afinal passa das 3 da manhã, mais ele estava ali, fumando um cigarro em um beco.

- Kris! – Meu tom alegre não durou muito assim que eu me lembrei de tudo que aconteceu com o Théo meus olhos arderam com lágrimas não derramadas e ele viu, eu sei que ele já sabia que eu estava um caco a partir do momento que eu apareci por ali, se as coisas tivessem ido bem eu provavelmente estaria em casa desfrutando de uma bela noite com meu irmão.

- Vem cá, eu vou te deixar dormir na minha casa – Ele nem me perguntou nada apenas me abraçou, eu senti o seu queixo no topo da minha cabeça e não deixei de me sentir acolhida, o Kris é tão quentinho, ele realmente parece uma pessoa fria e má, mas nesses poucos momentos que eu o conheço ele se transformou numa espécie de herói, ele é gentil e amoroso comigo.

- Vamos... – Eu me deixei ser levada, estava levemente aconchegada no peito dele, a noite estava fria e eu deixei que os batimentos cardíacos dele me deixassem mais calma, as lágrimas não pararam de cair mais eu me senti melhor enquanto o Kris me levava para a sua casa.

- Cuidado – Ele me puxou com força uma vez que eu havia tropeçado na entrada, eu não sei se é consequência da minha bebedeira, mais me aconcheguei mais perto, eu passei as mãos em torno do pescoço leitoso dele e me deixei levar para o mundo dos sonhos.

- Eu vou cuidar de você, Olívia. Eu vou cuidar de você como eu não pude cuidar do Charlie. – Ele me carregou facilmente me levando através das portas e parando em um em especial, provavelmente o dele, com uma decoração impecável em tons neutros e uma cama king size, minha visão já estava turva e eu senti subitamente náuseas, ele percebeu já que me carregou até o banheiro e me apoiou enquanto eu vomitava no bidê.

Não sei como fomos parar na cama, minha visão estava muito turva e minha cabeça muito pesada, eu queria dormir mais logo que o álcool foi aliviando no meu sistema eu comecei a pensar no Théo.

Não resisti muito e me deixei levar pelas lágrimas novamente, passando longos minutos acordada sentindo uma série de carinhos que o Kris estava fazendo no meu rosto e nos meus braços, suas mãos que percorriam a minha pele me deixavam arrepiada mais em momento algum ele levou as coisas para uma situação mais íntima, o máximo foram alguns beijos na minha testa e abraços fortes.

Não lembro quando dormimos, mas me lembro de sentir o calor do corpo do Kris na minha costa assim como braços protetores sob minha cintura, e ele cumpriu o que disse, me deu segurança, carinho e aconchego naquela noite. 

Mas eu não consigo parar de pensar, em como raios eu confiei em alguém que eu havia acabado de conhecer dessa forma.

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