John’s POV
Eu elaborava a tese de defesa do meu cliente estudando minuciosamente todos os argumentos que poderiam ser utilizados a fim de conseguir sua absolvição. Este seria o meu primeiro caso com cobertura da mídia, e isso estava me deixando um tanto quanto nervoso, afinal, a acusação leva uma vantagem muito grande, visto que é mais fácil acusar do que defender. Lee Feldmann era empresário e havia sido acusado de assassinar o banqueiro Mason Zummack, mas estava bem nítido que por trás disso havia alguém querendo incriminá-lo por meio de uma falsa acusação, e eu não permitiria que uma condenação injusta levasse um inocente para a cadeia. Eu havia conseguido uma revogação da sua prisão preventiva, porém, ele ficaria em prisão domiciliar até o dia do julgamento. Larguei os papéis sob a mesa por alguns segundos e apoiei os cotovelos nela. Massageei as têmporas e soltei um suspiro cansado, repassando tudo o que me fora dito a respeito do dia do assassinato de Mason.
O crime ocorreu em um sítio afastado da cidade, onde acontecia uma festa que reunia diversos empresários extremamente bem sucedidos. Todos foram interrogados e nada que eu pudesse usar a meu favor foi dito, o que só me deixava cada vez mais nervoso, pois encontraram a arma do crime no estofado do carro do meu cliente.
As câmeras, que seriam de extrema ajuda, pararam de funcionar no início do evento, só deixando pior o que já estava ruim. O culpado estava presente naquela noite e era um dos empresários convidados, e eu, com certeza, iria pegá-lo. Encontrava-me focado neste caso desde o momento em que pisei no escritório hoje mais cedo, logo após deixar Helena na faculdade. A cena que eu presenciei esta manhã saindo do condomínio só não foi mais engraçada, porque a situação da garota era realmente de dar pena. Ela corria totalmente atrapalhada conforme a forte carga d’água caía e fazia o seu guarda-chuva tornar-se inútil, os seus livros escorregaram de sua mão e eu podia apostar que aquela bolsa despencaria no chão a qualquer instante. Pressupus que Helena perdera a hora, o que só confirmou a minha suspeita ao ver a sua cara de sono ao me encarar com o semblante repleto de confusão. Comovido pelo que avistei, ofereci uma carona a ela, que, para minha surpresa, relutou em aceitar. Seu embaraço estava evidente na forma como fixou o olhar na janela e só o desfez para mexer em suas unhas, claramente sem jeito por estar ali comigo. Eu não a condenava, a sua atitude era plenamente cabível levando em conta que a nossa socialização era um tanto quanto limitada. Cassie desmascara novamente seu almoço comigo, pois hoje era aniversário de uma amiga sua, que planejou uma reunião no mesmo horário. Apesar de me sentir frustrado, disse que estava tudo bem, e, ao ser questionado pela minha namorada sobre eu estar chateado, neguei. Inclusive porque não adiantaria nada, de qualquer forma. No fim, eu almocei sozinho novamente e me enfiei em minha sala a tarde inteira.Batidas na porta me tiraram do meu pequeno devaneio. Murmurei um “entra” e a figura de Thompson fez-se presente.
—Com licença, Carter. Vim saber se você quer algum auxílio com o caso do Lee Feldmann. Deve ser difícil conseguir formular algo já que é a sua primeira defesa importante. - Ele ofertou e embora eu estivesse agradecido por sua boa vontade em ajudar, senti-me ofendido com o “deve estar difícil”. Não estava fácil, porém, nada que eu não estivesse apto a resolver.
— Obrigado, Thompson. Não será preciso, tenho tudo sob controle por aqui. - Sorri em agradecimento e educadamente recusei.
— Fico à disposição para qualquer eventualidade. - Eu assenti e ele retirou-se sem demora. Fitei os papéis e tornei a lê-los, ignorando a dor de cabeça que insistia em me incomodar.
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22hrs15 min.
Saí do escritório mais tarde do que planejava. Dirigir com destino à minha casa implorando mentalmente por um banho quente seguido da minha cama, tendo meus ombros rígidos e uma sensação incômoda de peso tomar conta dessa mesma região.
Embora estivesse esgotado pelo cansaço, grande parte de mim vibrava por ter conseguido pontuar diversos detalhes importantes na tese do caso Feldmann. Decidi que marcaria uma reunião com o meu cliente a fim de acertar o que não havia ficado claro nas conversas anteriores, auxiliando-o sobre como deveria se portar dali em diante até o dia da audiência de seu julgamento. Logo que cheguei, estranhei o fato de Bento não vir ao meu encontro como ele normalmente fazia no momento em que eu estacionava o carro, e, procurando pelos arredores da residência, o avistei deitado ao lado de Helena, que estava sentada em um banco de madeira localizado na pequena varanda da modesta casa em que morava com sua mãe. Uma coberta encontrava-se enrolada em seu corpo e também cobria o meu cachorro. Ela lia alguma coisa, passando o marca texto em algumas palavras. Lembrei-me do dia no qual a minha mãe deu a notícia de que as duas se mudariam para cá, ocupando o que antes era apenas um lugar que eu utilizava para as sociais com os meus amigos no início da minha adolescência.FLASHBACK
Sexta feira à noite geralmente significava uma coisa: As habituais reuniões que ocorriam sempre na casa aos fundos da minha. Bryan, eu e mais alguns amigos do colégio nos juntamos para fazer o que qualquer adolescente fazia: merda nenhuma que prestasse. Nós decidíamos sobre quem iria até a minha casa com objetivo de pegar cerveja – escondido – no bar do meu pai, e, naquele momento, era a minha vez. Eu caminhava sorrateiramente pela sala, até que a minha mãe simplesmente surgiu do nada, quase me matando do coração.—Onde você está indo, John?- questionou com o seu olhar desconfiado. Eu paralisei ali mesmo e respirei fundo, tentando achar uma desculpa cabível.
—Eu? Ah... Eu estava procurando a Mary. Queria saber se os sanduíches estão prontos.- respondi na maior naturalidade possível, agradecendo pela desculpa repentina que eu acabara de inventar. Minha mãe continuou me fitando intrigada, mas pareceu se convencer. Segurei-me para não soltar um suspiro aliviado.
— Os sanduíches estão na cozinha – frisou. – e a Mary já foi embora. Gostaria de falar sobre isso com você, aliás. Preciso que você tire suas coisas da casa perto da piscina.”
Olhei-a ultrajada, não acreditando no que ela havia acabado de dizer.
— Por quê? Como assim? – questionei mal humorado.
— A Mary está com alguns problemas, então ofereci a casa da piscina para ela e a sua filha morarem. - explicou e isso não diminuiu a minha revolta.
— E o que eu tenho a ver com isso? Onde eu vou fazer as reuniões com os meus amigos?
— Não fale assim, John. - repreendeu-me com o tom de voz duro e eu encolhi um pouco os ombros. Quando minha mãe ficava brava era de dar medo em qualquer um e eu imaginei que isso a ajudava muito no seu trabalho. — você e seus amigos podem fazer isso em outro lugar, eu não posso ficar sem cozinheira. Ela tinha vários problemas para resolver e faltava demais, essa foi a única saída, então não quero mais ouvir qualquer relutância da sua parte.”
Suspirei derrotado, sem ter como argumentar.
—Eu tenho até quando pra esvaziar a casa?
— Até domingo.- assenti desanimado e fui dar a notícia aos garotos.Naquele final de semana, no domingo, para ser mais exato, conheci Helena. A garota mais nova de semblante envergonhado me encarava com curiosidade e abaixava o olhar vez ou outra, enquanto eu devolvia o olhar, porém, emburrado.FIM DE FLASHBACK
Balancei a cabeça em negação, quase rindo por meu egoísmo naquela época e agradecendo pela minha mudança de valores. Aproximei-me um pouco até ficar visível para o meu cachorro, que, assim que me avistou, levantou a cabeça com as orelhas arqueadas e começou a balançar o seu rabo energeticamente, porém, não desceu do banco. Coloquei as mãos no bolso da minha calça e ergui uma sobrancelha, sem entender.Eu era dono de um traíra.— Ei, o que foi? Por que você ficou agitad…- Helena iniciou a fala, mas deixou a frase morrer ao desviar a sua atenção das folhas e acompanhar o olhar do Bento, dando de cara comigo ali.
— Depois de mim, você é a única que ele obedece e é carinhoso desse jeito.- comentei. Ela olhou para o cão que ainda balançava o seu rabo alegremente, porém, agora deitado e relaxado com a cabeça sob suas patas dianteiras.
— Ele é uma ótima companhia.- acariciou por trás de suas orelhas e sorriu. Eu concordei com a cabeça.
— Bento, vem!- bati a mão em minha perna algumas vezes para chamar sua atenção e fazê-lo vir até mim. Ele olhou para Helena e pulou do banco, andando em minha direção. Às vezes eu achava que esse cachorro começaria a falar. — Boa noite.- eu disse, já virando as costas com Bento ao meu encalço.
— Boa noite! - respondeu com a voz suave.
Entrei em casa e me deparei com a minha mãe na sala, lendo um livro sentada na poltrona em que ficava habitualmente.
— Oi, mãe. - depositei um beijo em seu rosto e sentei-me no sofá a sua frente.— Oi, filho. Chegou agora? - perguntou, me observando por cima do livro.— Agora a pouco. - respondi, jogando a cabeça no encosto do sofá e afrouxando a gravata que parecia querer me sufocar. — e você? Chegou do escritório há muito tempo?—Sim, cheguei há algumas horas.— Não está se esforçando demais, certo? O doutor deu ordens claras para você se cansar o mínimo possível.- a adverti me referindo aos seus desmaios recorrentes. — Eu estou bem, filho. Ficaria pior estando em casa sem fazer nada. Agora me responda... O que você estava falando com a filha da Mary?- levantei a cabeça e a olhei sem entender. Como ela havia visto? Eu não me importava que ela visse, não tinha nada a esconder, porém, chamar a minha atenção por algo tão banal me parecia bem incoerente.— Fui buscar o Bento que estava com ela. - continuei a encarando curioso e meio incerto sobre a sua pergunta repentina.— Hm. Desde quando vocês co
Direcionei-me à minha casa extremamente desanimada e frustrada, amaldiçoando Bryan por ter acabado com o meu bom humor, além de ter criado todo esse drama desnecessário quando tudo o que ele deveria fazer era fingir que eu não existo, tal como já havia feito tantas outras vezes. Joguei a minha bolsa em um canto da sala e pulei no sofá, fechando os olhos e sentindo o meu corpo relaxar, apesar da minha cabeça me torturar com uma dor desagradável. De repente me recordei do dia em que Bryan falara comigo pela primeira vez.FLASHBACKEncarava esgotada a terceira página de exercícios de matemática, sentindo o meu pulso doer de tanto escrever, anotar e apagar. Estava sentada em uma pequena mesinha que eu havia colocado na varanda para que estudar nos dias quentes ficasse mais agradável. Havia passado a tarde toda estudando, o último ano do colégio estava extremamente puxado e eu fazia o máximo para conseguir absorver todas as matérias, haja vista que tudo o que eu desejava era entrar na facu
John’s POVEu me sentia extremamente sem paciência.O que era para ser um dia agradável na companhia dos meus amigos acabou se transformando em um stress que poderia – e deveria – ser evitado, se não fosse Bryan e a sua infantilidade. Falar daquela forma com a Helena foi desprezível, ela havia ficado desestruturada e eu me incomodei com o pesar em suas feições enquanto ouvira as provocações do meu amigo, por isso, decidi intervir, embora tenha sido tarde demais levando em conta o tapa que a garota deu nele. Para ser sincero, fiquei admirado com a sua coragem em falar daquela forma tão confiante.Geralmente eu presenciava as provocações de Bryan direcionadas a ela, que sempre rebatia dignamente, e tudo o que eu fazia era observar o seu posicionamento diante do comportamento imaturo do meu amigo – comportamento este que eu reprovava plenamente – Eu já pensei em repreendê-lo diversas vezes, entretanto, Helena habitualmente tomava as rédeas da situação e se defendia muito bem, era interes
Cassie praticamente fingia que não me conhecia e me ignorava todas as vezes em que eu tentava falar com ela. Era surreal. Ela tinha o direito de ficar brava, eu não podia mudar isso, entretanto, aquela atitude birrenta excedia todos os limites. Estava encostado na sacada de vidro e imaginei que a minha expressão não era das melhores, pois o Paolo vinha me perguntar se estava tudo bem de cinco em cinco minutos, mesmo eu afirmando em todas elas. Avistei Cassie chegando perto de mim e a acompanhei com o olhar conforme ela se aproximava.- Vou embora com a Suzi e dormirei na casa dela – avisou como se não fosse nada demais me lançando um sorriso petulante.Dei uma risada de escárnio e a olhei incrédulo.- Você não está falando sério.- Pode apostar que eu estou – retrucou com o sorriso perdurando em seu rosto.- Mas que caralho, Cassie! Para com essa merda, já deu. Olha só o que você está fazendo – disse, tentando controlar o tom de voz, embora soubesse que a minha expressão esbanjava irr
- Eu sei que não é da minha conta, mas não acho uma boa ideia você voltar para casa dirigindo – ele desviou a atenção da vista à frente e me fitou, fazendo com que o seu olhar encontrasse com o meu, que o encarava. A meia luz iluminava o seu rosto, os seus olhos opacos pareciam querer desvendar os meus através da ausência de som. Por alguns instantes eu me senti desconcertada, a sua análise curiosa e silenciosa fez algo se desorganizar dentro de mim e eu queria muito que, seja lá o que fosse, parasse imediatamente. Como em um lampejo John voltou a se concentrar no horizonte de prédio e luzes, quebrando aquele estranho contato visual. Eu pisquei algumas vezes também voltando à realidade e sentindo o meu rosto esquentar.- Vou pedir um táxi e amanhã venho buscar o carro – respondeu a minha pergunta anterior, tomando o último gole da água que eu havia lhe trazido.Eu assenti silenciosamente e resolvi que era hora de sair dali e procurar pela Sophie, apesar de ter uma noção sobre onde – e
Passei as mãos no rosto e bufei, cansado. Sentei-me em uma das poltronas que ali ficavam e eu acendi um cigarro, tragando-o como se o ato tivesse a capacidade de fazer sumir a tal sensação esquisita.Permaneci mirando o nada por não sei quanto tempo, contudo, despertei ao ver Helena sair com um saco preto em mãos, o deixando dentro do compartimento fixado à parte mais afastada da casa. De longe, enxerguei Bento correr até ela, que se abaixou para brincar com o cão saltitante. O Pastor Alemão ergueu a cabeça e detectou a minha presença mais afastada, iniciando uma onda de latidos enérgicos que obrigou Helena a seguir o som agudo à procura do que o deixava tão agitado, logo me alcançando com o seu olhar. Ao contrário do que lhe era usual, a garota não sorriu ou acenou. Ela simplesmente voltou a prestar atenção no Bento como se nem houvesse me visto, me ignorando prontamente. Tal atitude não era normal, o que me motivou a levantar-me e rumar ao lugar em que Helena e o meu cachorro se en
A noite estava fria, o vento forte fazia com que as folhas das árvores balançam violentamente, indicando que certamente uma chuva intensa começaria a cair a qualquer minuto. Embora a temperatura estivesse baixa, frio era o que eu menos sentia naquele momento, haja vista que eu não parava um minuto sequer, pois me desdobrava entre colocar champagne nas luxuosas taças de cristal e arrumar os quitutes sofisticados na bandeja, a fim de que todos fossem levados dali pelos garçons e garçonetes contratados para aquele típico evento da classe alta. Olhei aquela cozinha abarrotada de pessoas que corriam de um lado para o outro, todas focadas em fazer o seu trabalho da maneira mais impecável possível, levando em conta que aquela era mais uma das tantas exímias festas da brilhante e popular família Carter, conhecida por sua tradição no ramo de advocacia, onde Kyara e Henrico Carter formavam o casal mais prestigiado nesta área.Kyara é a advogada mais influente na área de Direito de Família, on
“Pensei que tivesse se perdido pelos cômodos.” minha mãe comentou em um tom brincalhão.“Fiquei procurando as coisas, tive que ir até a despensa” respondi “O que eu faço agora?” indaguei olhando em volta.“Por enquanto nada, filha. Pode descansar. Se eu precisar de algo, te chamo” ela preparava alguns quitutes que pareciam maravilhosos. Eu peguei um e recebi um olhar repreendedor. Ri e olhei pela janela, percebendo que, como previsto, uma chuva tórrida começava a cair.De longe, ouvia-se a melodia suave de alguma canção. Fui à sala de jantar e me aproximei cuidadosamente da porta que dava para a enorme sala de estar, onde a festa acontecia. Tentei ficar o mais escondida possível, dado que não desejava parecer curiosa ou intrometida. Eu apenas gostava de apreciar o ambiente e as sempre lindas decorações que eram criadas. Diversas pessoas encontravam-se distribuídas por ali, todas em seus trajes luxuosos, rindo e conversando, como no mais perfeito comercial de leite em pó. Os garçons c