Capítulo 1

Antes de voltar para Londres

Domingo, 2 de setembro de 2018

Acordamos algumas horas depois, com uma enfermeira entrando no quarto com o café da manhã. Não estou com fome, mas sei que preciso comer, então escolho uma fruta, mastigo e engulo. 

— O que vamos fazer? — pergunto para Harry.

— Quando chegarmos em Londres, terei que me internar em uma clínica em Manchester, por causa das drogas que injetaram, e teremos que fazer terapia. Acho que você deveria voltar para casa. — Harry sorri. Meu estômago revira. Harry fala isso como se fosse simples. Voltar para casa. Eu não tenho casa. E eu não quero fazer terapia.

Ele aponta com a cabeça para a bandeja.

— Pegue dois pãezinhos. Você precisa comer.

Sorrio e como devagar.

Então me ocorre que eu talvez esteja conhecendo o verdadeiro Harry só agora. É diferente quando não estamos presos e forçados a fazer coisas sob o risco de morte. Sinto, ao encará-lo, que estou finalmente vendo como ele é, e não como é em relação a mim. Então, o quão bem será que eu o conheço se eu nunca o havia visto assim antes?

Pergunto-me se não acabei de sonhar com o sequestro, a casa, os treinamentos e as mortes. Talvez eu tenha sonhado tudo. Tudo o que vivi com Harry até aqui. Talvez nada sequer tenha acontecido.

É difícil de acreditar em tudo o que aconteceu.

Mas então Harry se vira para mim e, como se fosse a coisa mais natural do mundo, me envolve em seus braços e me aproxima. Ele me beija enquanto meu corpo inteiro derrete junto ao dele. Me afasto de sua boca apenas por tempo suficiente para dizer:

— Tenho medo de que você corra para longe.

— O quê? — Harry murmura entre beijos.

— Acho que você vai sumir, como em um sonho que tive...

— Amor, eu estou aqui. Estarei sempre aqui. Agora, menos conversa e mais beijos — ele reclama, eu rio e obedeço.

Harry

Grace e eu estamos de pé no meio de uma sala no aeroporto, enquanto Natan me espera do lado de fora. Vamos seguir rumos diferentes hoje.

Meus braços estão apertados em volta de sua cintura, e descanso minha testa contra a dela. Seus dedos estão em torno do meu pescoço, seus lábios tocando os meus. Ela coloca a cabeça no meu peito, e eu a puxo o mais perto possível, e enterro meu rosto em seu cabelo.

— Eu amo você — sussurro.

— E eu amo você — Ela me aperta em seu abraço e olha para mim. — Me promete uma coisa?

— Qualquer coisa.

— Não se esqueça de mim, ok? — diz ela, calmamente. Tenho uma série de razões para não esquecer, mas resolvo apenas dizer:

— Ok. Eu prometo.

Ela suspira e me beija de novo, e então se afasta para me olhar.

— Não vou esperar por muito tempo. — Grace brinca e ri, embora eu tema que tenha uma verdade em sua frase. Sorrio.

— Eu definitivamente não quero isso. 

— Eu estarei esperando — promete ela.

 Seu rosto se aninha em meu pescoço e suas lágrimas umedecem minha pele. Aperto meu abraço e beijo sua cabeça.

— Vai ficar tudo bem, nós vamos ficar bem. Não há nada que possa nos separar, ok? — ignoro a rachadura em minha voz enquanto prometo. 

Ela inspira e expira, e eu limpo as lágrimas que caem em suas bochechas coradas. 

Nós ignoramos o pessoal batendo na porta, nos apressando. Ignoramos todos os sons à nossa volta. Estamos muito concentrados um no outro.

Com uma respiração profunda, Grace assente:

— É isso. Temos que ir. — Ela fica na ponta dos pés e me beija. Ficamos ali abraçados por mais alguns minutos, sabendo que o tempo não está do nosso lado. Relutantemente, tiro minhas mãos dela.

— Temos que ir — digo.

Ela assente mais uma vez, e se vira para a porta. O táxi está esperando e ela se apressa. Acena por cima do ombro e me manda um beijo. Fico imóvel enquanto a observo caminhar através das portas deslizantes do aeroporto. Então Natan me cutuca e consigo dar uns passos. Caminho relutante para o terminal de embarque.

Grace

Londres, Inglaterra

Domingo, 02 de setembro de 2018

Quando cheguei à casa de Hannah, ela ficou surpresa. Achou que eu tinha ido para o Brasil e não voltaria mais. Ela chorou e me abraçou, dizendo o quanto estava feliz por me ver e saber que eu estava bem. Jenny e Katherine não me soltavam e me seguiam para onde quer que eu fosse. Elas sentiram muito minha falta, apesar de eu ter estado com elas por um mês e ficado fora por quatro meses.

Hannah me contou que perdi o contrato com o programa de intercâmbio e a bolsa de estudos. Ela me pediu para ficar, dizendo que precisava de mim e que me ajudaria com o curso. Resolvi dar um tempo para as aulas. Não conseguirei me concentrar agora.

Liguei para minha mãe. Não contei os detalhes do sequestro. Tudo o que ela precisava saber é de que estou bem. E suspirei aliviada em saber que eles estão bem. Mas não posso voltar para o Brasil agora. Chase ainda está por aí planejando alguma coisa e minha família precisa ficar fora disso.

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