Wendy voltou para sua cidade natal depois de perder a vontade de continuar vivendo. Ela queria se reencontrar e reviver seus antigos sonhos, mesmo sem o apoio dos seus pais. É claro que ela sabia da possibilidade de se esbarrar Kevin, seu ex-namorado, a quem tanto amou durante a época da faculdade. Reencontrá-lo foi mais nostálgico do que ela esperava, e antigas lembranças foram desencadeadas, assim como os sentimentos que guardou por tanto tempo. Cinco anos se passaram e certamente eles não são mais as mesmas pessoas, mas o destino não parece ter desistido desse casal, e eles terão a impressão de estar revivendo o passado na atual fase de suas vidas.
Ler maisPaz. Meu celular finalmente estava silencioso e eu podia simplesmente navegar pelas redes sociais e jogar meus jogos bobos em paz, sem e-mails e mensagens desesperadas do escritório.
Será que dá para devolver um diploma? Porque, sinceramente, eu desejava não precisar mais usar o meu.
Mamãe passou por mim com a expressão de desgosto enquanto eu fuçava um aplicativo de fotos. Estava sentada no sofá da sala fazendo uma lista de compras e me perdi nas fotos de várias tortas. Já fazia uma semana desde que tinha voltado para casa, e passei de filha prodígio para tragédia em um segundo quando contei que havia largado meu emprego no escritório de advocacia.
Poderia ter recomeçado em Massan, onde tudo era muito agitado e repleto de novas oportunidades, mas o sentimento lá era diferente. Eu queria conseguir me reencontrar, então retornei para o lugar onde nasci.
Ninguém aceitou nada muito bem. Por que uma moça tão bem sucedida largaria tudo e voltaria desempregada para a casa dos pais? Pois é, hesitei o quanto deu, mas já não suportava mais nada daquilo. A vontade de viver e ser feliz foi se esvaindo sem que eu percebesse, e quando me sentei em frente ao psicólogo ele perguntou: por que você está fazendo isso afinal de contas? Não soube responder. Era conveniente, parecia confortável financeiramente, era ok dizer que eu era advogada e tinha um bom emprego, meus pais tinham orgulho disso... Mas não era mais o que eu queria para mim.
As indagações ficaram cada vez mais perturbadoras, o emprego cada dia mais insuportável, acordar era angustiante e eu esqueci. Esqueci de mim.
Depois de vários suspiros da mamãe eu saí. Coloquei a lista de compras na bolsa e comecei a dirigir entre as ruas de Chaves.
— Wendy? — olhei para trás assim que saí do carro no estacionamento do supermercado. Franzi as sobrancelhas vendo uma mulher grávida e abri a boca em reconhecer a Sara. Ela sorriu e se aproximou já me abraçando.
— Não acredito nisso! — correspondi o abraço. — Que barriga é essa? Me diga apenas que engordou! — ela riu me balançando de um lado para outro.
— Sua idiota! — reclamou me causando uma risada. — Como é que você está aqui e não me contou?
— Eu ia contar! Cheguei ontem! — segurei seus ombros quando ela se afastou. — Mas sério, e essa barriga?
— Vou ter um bebê! — sorriu e gargalhou da minha careta.
— Mas já?
— Wendy, logo teremos 30 anos — coloquei o dedo em sua boca.
— Shh! Quietinha!
Suspirei olhando a Sara. Ela parecia feliz e a vários passos em minha frente. Eu não concretizei nenhum caso romântico em Massan, e acabei deixando tudo para trás, mesmo que nem fosse muita coisa.
Minha amiga ainda parecia a garota de anos atrás, ela não abria mão dos cabelos compridos e da franja de testa, o que a deixava parecendo uma adolescente grávida. Sara tinha um temperamento difícil, mas quem a visse de longe a acharia meiga e gentil.
— Está de férias? — perguntou parecendo curiosa.
— Bem... — olhei em volta. — Saí do meu emprego — sua expressão mudou imediatamente. — Hey! Fique feliz por mim!
Ela demorou um tempo para processar e aceitar a nova informação, mas como boa amiga apenas ficou do meu lado. Sara era minha amiga do ensino médio e mesmo com a distância e o tempo, percebi naquele momento que nada havia mudado entre nós.
— Me conte tudo! — falei empurrando o carrinho de compras. Ela havia voltado ao supermercado para poder passar mais tempo comigo. — Você casou com o Jacob ano passado e já vai ter um filho?
— É — deu de ombros. — Estamos felizes! — concordei com a cabeça olhando o preço da farinha de trigo. — E você está namorando?
— Não estou — joguei alguns sacos no carrinho. — Deixei tudo em Massan, e não sinto falta de nada.
Sara sorriu parecendo interessada na informação e ajeitou suas feições quando a encarei.
— Você não vai perguntar sobre ele? — perguntou e levantei a sobrancelha. — Eu sei que já faz 5 anos, mas...
Sorri um pouco e continuei empurrando o carrinho. Eu já tinha deixado muita coisa no passado e quando resolvi voltar para casa não tinha nada a ver com conseguir tudo de volta.
— Ele está solteiro — Sara me seguiu e olhei para ela a canto de olho. — Sério, Wendy? Não está nem um pouquinho curiosa?
— Será que eles vendem cacau em pó aqui? — fingi estar concentrada na lista de compras.
— Tudo bem, não vou mais tocar no assunto — levantei o olhar. — Vou fazer um chá de bebê nesse final de semana, espero que como minha amiga desempregada e desocupada, você apareça! — cruzou os braços.
— Ok! — confirmei divertida com seu drama.
✴✴✴
No final de semana eu me tornei dona da cozinha e meus pais nem passaram perto, o desgosto ainda era muito grande. De certa forma tinha pensado em procurar um apartamento para privá-los de continuarem me vendo. Meu sonho de abrir uma confeitaria parecia rasgar minha família em mil pedacinhos.
Abri a boca quando meu celular vibrou e na tela de bloqueio apareceu uma mensagem da Sara. Havia esquecido completamente do chá. Comecei a arrumar as coisas apressadamente e coloquei o bolo na geladeira.
Passei maquiagem no caminho, quando encontrava um sinal vermelho. Como passei de alguém extremamente responsável para esquecida em tão pouco tempo?
A casa da Sara era muito bonita e tive que andar um pouco pela sala até conseguir a oportunidade de falar com ela. Pensei que Sara estivesse tramando algo, mas a reunião tinha apenas mulheres, e depois me senti patética por ter vagado meu olhar pelo ambiente como uma coruja.
— Achei que não viesse! — Sara me abraçou. Ela estava fofa usando um vestido rosa, que realçava seus seios de grávida, e a fazia parecer uma gordinha simpática.
— Eu esqueci o presente — contei a fazendo rir. — Mas trarei depois!
— Não se incomode! Eu só queria que você viesse.
O chá foi legal, foi bom ver como minha amiga estava feliz e que tudo estava dando certo, pelo menos para alguém.
Quando tudo acabou, acabei ficando para ajudá-la a arrumar as coisas, já que suas amigas da faculdade e colegas de trabalho se foram levando os docinhos que sobraram. Mas ficar me fez alvo da mãe dela, a qual me fez tantas indagações que passou a sentir o desgosto dos meus pais e me senti aliviada quando ela foi embora.
— Sentia falta da minha melhor amiga! — Sara disse sentada no sofá, quando desistiu de organizar as coisas por estar cansada. — Agora que você está aqui, percebo como esses anos foram difíceis sem você.
— Acho que a gravidez está te deixando muito emotiva — brinquei a fazendo jogar uma almofada em mim, numa cena misturada com risadas.
O clima mudou completamente quando Jacob chegou em casa, e ele não estava só. Lancei um olhar para Sara e ela sorriu como se não tivesse culpa.
Senti meu peito pinicar quando Kevin apareceu assim que Jacob lhe deu espaço para passar. Encará-lo foi mais estranho do que esperei ser. Kevin estava mais bonito, tinha mudado o corte de cabelo, e agora seus fios castanhos e lisos estavam mais curtos, a sobrancelha falhava continuava ali como se fosse um detalhe proposital em seu rosto. Ele manteve os lábios pálidos fechados enquanto me encarava sério.
— Não fiquem se encarando como se fossem estranhos! — Sara disse se aproximando dele. — É a Wendy! — cutucou o homem, animada.
— Oi — ele me saudou sorrindo um pouco. Aquele sorriso que o deixava parecendo um gatinho — Como vai, Wendy?
— Oi, Kevin — respondi sem graça. — Bem! E você?
— Bem — respondeu virando o rosto para o Jacob. — Eu só vim acompanhar o Jacob até em casa. Já estou indo!
— Ah, Kevin, e o jantar? — Sara segurou seu braço parecendo desapontada.
— Eu tenho um compromisso agora — ele tocou sua testa depois de travar os dentes e acabei rindo em silêncio.
— Não deveria irritar uma mulher grávida! — deu um tapa em sua mão.
Kevin e Sara viviam discutindo por qualquer coisa, enquanto eu e Jacob saíamos para ficar de fora. Parecia que eu estava revivendo uma cena do passado. Quando ri de forma audível todos me olharam de repente.
— Foi bom te ver! — Kevin acenou já se afastando. — Estou saindo — disse já no caminho para a porta.
Foi bom me ver? Jura? Porque vê-lo só me fazia lembrar que ele teve razão todo o tempo e eu errei. Saí de Massan não tendo que dar satisfações a ninguém, mas e ele? Devia dar aquela a oportunidade de ele me dizer "eu te avisei"? Mas ele não perguntou e eu já não sabia mais nada sobre ele.
Acabei não ficando para o jantar e quando cheguei em casa apenas me sentei no sofá assistindo o mesmo filme que meus pais.
— Como foi com a Sara? — mamãe perguntou olhando para a TV. — Ela disse o que sobre sua nova decisão de vida?
— Ela me apoiou — respondi divertida por ver mamãe contrariada. Papai me observou e apenas pressionou os lábios.
— É... Mas logo vai perceber que só você ficou para trás — ela riu. Mamãe odiava se sentir perdedora de uma discussão e não media as palavras para alcançar seus objetivos. — A cozinha está uma bagunça!
— E vou arrumar tudo agora!
Lavando as formas e os utensílios, comecei a me sentir nostálgica. Quando inventava de fazer tortas, a Sara estava lá me contando de como era apaixonada pelo Jacob e não tinha coragem de se confessar. Naqueles momentos Kevin aparecia para me ajudar com a bagunça e me dar alguns beijos sem que meus pais vissem.
— Se anime, Wendy! — falei para mim mesma, concentrada em lavar. — Finalmente pode fazer o que quer.
Me senti bem quando terminei de enfeitar minha torta de morango, mesmo que tenha comido sozinha e tenha lembrado de alguns beijos que troquei naquela cozinha.
✴✴✴
(Lembrança)
— Wendy, como estaremos daqui 10 anos? — Kevin perguntou segurando minhas mãos na frente da casa dos meus pais. De vez em quando ele levava minha mão a sua boca e me enganava mordendo-a em vez de beijá-la, que era o que eu esperava.
— Viva, eu espero — respondi tentando me soltar e ele torceu o nariz me segurando. Acabei rindo.
— E comigo? — me encarou sorrindo. Sua franja já estava crescendo de novo e eu gostava quando ele partia o cabelo ao meio.
— Você quer isso?
— Você não pode apenas responder o quanto quer ficar comigo? — soltou minha mão e fez uma careta.
Soltei um sorriso debochado. Era engraçado como Kevin era orgulhoso e mesmo assim esperava grandes declarações.
— Quero estar com você, tá bom? — cruzei os braços. — Meu elfo favorito!
Ganhei o sorriso e um beijo. Estava vivendo meu sonho de universitária com um namorado legal. Bom, pelo menos tê-lo em meus dias me dava força para continuar o curso e motivos para sorrir.
— Eu também! Vou sempre voltar para você — murmurou logo depois de se afastar, sem me dar tempo para abrir os olhos.
✴✴✴
Mas não foi assim, e era tudo culpa minha.
Flutuei pelos acontecimentos até me vestir de branco e encontrar Kevin me esperando no altar. Papai me acompanhou cuidadoso, e mesmo ainda discordando, mamãe compareceu ao meu casamento.Todo o momento da cerimônia foi acompanhado de um sorriso persistente em meu rosto. Eu e Kevin trocamos nossos votos, um beijo apaixonado e as alianças num dos momentos mais emocionantes da minha vida. Amei toda a cerimônia e a singela festa que resolvemos fazer ao lado dos nossos amigos e familiares. É claro que o bolo do casamento eu que fiz, mas contei com a ajuda da minha equipe de trabalho para fazer os doce
Eu fui tomada por um sentimento agradável durante a viagem até Veram. Kevin dirigiu tranquilamente e nossa conversa foi divertida em todo o percurso. Eu ainda não tinha um anel em meu dedo, mas eu me sentia bem, como se aquela formalidade fosse desnecessária entre nós.Veram era uma província rural, então ao longo da viagem pude contemplar as plantações e como a área ficava bonita sobre o sol da manhã. Trabalhei na padaria, mesmo que não tenha dormido na noite anterior. Eu e Kevin voltamos para casa pela madrugada e pegar no sono foi impossível para mim. Várias coisas passaram pela minha cabeça naquele dia.Mamãe ligou infinitas vezes, mas eu estava produzindo minha própria paciência antes de ficar de frente com ela, e quando me senti pronta fui direto para minha antiga casa.— Onde você estava? — ela reclamou assim que me viu, indignada. — Te liguei a manhã inteira!— Onde está o papai? — passei pela porta entre os suspiros do meu cansaço.— Ele ainda não chegou do trabalho.Esperei que ela se acalmasse e me sentei ao seu lado, no sofá, enquanto ela assistia ao episódio de uma novela. Mamãe estava emburrada, e talvez daquela vez ela nunca me perdoasse.— Eu não vou, tá bom? — Vinte e seis
Naquele dia conversamos sobre nosso término. Desde a minha volta eu preferia fingir que a aquela parte da nossa vida havia sido deletada e muitas vezes parecia que minha estadia em Massan nem existia.Mas infelizmente era nosso passado e Kevin sempre tocava no assunto.Não lembramos de jantar e passamos horas deitados na cama conversando sobre aquilo, que outrora era doloroso.— Ver você participar da seleção já havia me deixado intrigado — ele disse me encarando. Sua bochecha estava esmagada no travesseiro. — Eu tinha um pressentimento ruim sobre aquilo.— Achei que não iria passar na seleção, e quis apenas agradar minha mãe.— Você sempre fez tudo muito bem, Wendy! Poderia ter sido a presidente do país se quisesse — sorri com seu comentário, mas terminei com um suspiro. — Eu te apoiaria se viajasse por uma oport
Edna ainda era um pesadelo. Grande parte do conflito acontecia na minha cabeça, mas parecia que o destino queria nos colocar cara a cara, e a garota sentia que deveria bater de frente comigo. Sempre que nos encontrávamos ela dizia coisas sobre o Kevin e sua carreira do tempo em que estive fora.— É oficial, eu a odeio! — contei a Sara.— Você é muito boazinha, Wendy! — Sara suspirou alisando a barriga.Minha amiga já havia entrado em licença maternidade e estávamos todos à espera do bebê. Fazíamos de tudo para não deixá-la sozinha, e quando sua mãe finalmente ia embora eu corria para sua casa e conversávamos até ela se sentir muito cansada.— Eu já tinha agarrado o cabelo dela e perguntado qual o problema — Sara disse, o que me fez gargalhar. — É mais do que óbvio que ela quer te
Em dois dias eu já estava instalada na casa do meu namorado. Legolas adorou poder ficar permanentemente naquela casa com quintal.E embora estivesse muito feliz, algo me deixou muito curiosa, e por mais que eu não quisesse ser a namorada ciumenta, era impossível não pensar.— Edna está ligando outra vez — falei erguendo o celular para o Kevin, o qual estava na cozinha.Ele ergueu uma sobrancelha e enxugou suas mãos antes de pegar o aparelho. Não torci a boca, mas virei o rosto querendo esconder meu suspiro.Edna ligava muito, e ela sempre estava na clínica quando ele estava. Era muito nítido para mim que ela não o tratava como um simples colega de trabalho, e aquilo começou a me incomodar um pouco.— Vou ver o que tenho sobre isso e envio para seu e-mail — ouvi Kevin falar ao celular.Saí da sala e atravessei a rua querendo encontrar m
Último capítulo