A primeira traição — 1992
Alto, loiro e com as bochechas muito rosadas, o garoto parecia uma pintura no pátio do colégio. Quando colocou os olhos nele, vestido em um casaco de moletom cinza-claro, Isabela perdeu a compostura. As pernas bambearam, as mãos começaram a suar e o coração deu início a uma maratona solitária. Os braços já não mais obedeciam aos seus comandos, deixando-a estática diante daquela visão.
Descobriu que o seu nome era Iago e que estava duas séries à frente: tinha 14 anos e, a partir daquele momento, habitava cada um dos seus sonhos.
A melhor amiga, Maria Lúcia, foi a primeira a saber da sua paixão. Com ela, confidenciava olhares, comentava sensações e dividia devaneios. Juntas, idealizavam o momento em que ele se aproximaria, faria uma declaração e lhe daria o primeiro beijo.
Os cadernos tornaram-se ainda mais necessários para extravasar os sentimentos de Bela. Dizia, por escrito, tudo o que não era capaz de verbalizar. Além da amiga inseparável, os textos eram seus confidentes e armazenavam, com discrição, as revelações que a menina queria manter em segredo.
O aniversário de 12 anos estava próximo e haveria uma festa no play do seu prédio. Maria Lúcia se encarregou de convidar Iago e deixou Belinha em polvorosa. Ao mesmo tempo que contava os minutos para a comemoração, temia que ele não aparecesse, exatamente como Rafael havia feito três anos antes.
Mas isso não aconteceu. Iago foi à festa, ainda mais lindo do que de costume. Isabela estava no céu, engolindo borboletas e afundando em felicidade. Falava alegremente com os convidados, abraçava os amigos mais queridos e até arriscava alguns passos tímidos na pista de dança.
O DJ tocava os sucessos do momento, preenchendo o ambiente de fumaça e inebriando o espaço com luzes estroboscópicas. Mas, bem na hora que John Secada enchia os alto-falantes com o hit “Just another day”, toda a alegria se esvaiu em um segundo.
Just Another Day
Mornings alone
When you come home
I breath a little faster
Everytime we're together
It'd never be the same
If you're not here
How can you stay away, away so long.
Why can't we stay together
just
Give me a reason
Give me a reason.
Chorus
I, I don't wanna say it
I don't wanna find another way
Make it through the day without you
I, I can't resist
Trying to find exactly what I miss
It's just another day without you.
It's just another day
Making the time
Find the right lines
To make you stay forever
What do I have to tell you
I'm just trying to hold on to something
(Trying to hold on to something good)
Give us a chance to make it
To make it
Don't wanna hold on to never
I'm not that strong, I'm not that strong.
I, I don't wanna say it
I don't wanna find another way
Make it trough the day without you
I, I can't resist
Trying to find exactly what I miss
It's just another day without you.
Why can't you stay forever
Just give me a reason
Give me a reason
Apenas mais um dia
Sozinho de manhã
Quando você chega em casa
Eu respiro um pouco mais rápido
Cada vez que nós estamos juntos
Nunca será o mesmo
Se você não está aqui
Como você pode ficar longe, longe, tão longe
Por que nós não podemos ficar juntos?
Me dê um motivo
Me dê um motivo
Refrão
Eu, eu não quero dizer que
Eu não quero encontrar outro caminho
O dia se torna sem graça sem você
Eu, eu não posso resistir!
Tentando encontrar exatamente o que eu perdi
É apenas outro dia sem você
É somente outro dia
Dando o tempo
Encontrando as linhas certas
Para fazer você ficar para sempre
O que eu tenho para lhe dizer
Eu estou apenas tentando agarrar alguma coisa
(Tentando agarrar a alguma coisa boa)
Nos dê uma chance para fazer isso
Para fazer isso
Não quero segurá-la para sempre
Eu não sou forte assim, eu não sou tão forte assim
Eu, eu não quero dizer que
Eu não quero encontrar outro caminho
O dia se torna sem graça sem você
Eu, eu não posso resistir!
Tentando encontrar exatamente o que eu perdi
É apenas outro dia sem você
Por que você não pode ficar para sempre
Me dê apenas um motivo
Me dê um motivo
Bela foi paralisada por uma visão desconcertante: Maria Lúcia estava no colo de Iago, devorando o menino com beijos nada condizentes com a sua idade.
Petrificada, Isabela tentava entender o que acontecia, mas a realidade parecia uma piada de extremo mau gosto. A sua melhor amiga estava atracada à sua grande paixão. E isso estava acontecendo bem diante dos seus olhos e, para piorar, durante a sua própria festa de aniversário.
Bela correu para o banheiro, sem conseguir segurar o choro, sentindo uma dor latente. Fora traída e humilhada no dia que deveria ser exaltada. Os soluços sobrepunham-se, em espasmos, roubando-lhe toda a razão. A irmã, Valentina, percebeu o ocorrido e foi correndo consolá-la. Depois, possessa com o estado da caçula, jogou um copo inteiro de refrigerante no casal improvável, encharcando as suas roupas e convidando-o a partir.
Maria Lúcia e Iago foram embora, mas a dor permaneceu com a aniversariante e calou, por completo, o seu sorriso de outrora. Uma parte da ilusão morreu naquela noite, depositando uma primeira dose de amargura em seu lugar. Aprendera, da forma mais dolorida, a não confiar tanto nas pessoas. E a adolescência estava apenas começando.