Terceiro Ato

Demoraria uns dias para os botocudos se levantarem contra os temininós. Jaciara e as mulheres vão até Jacuí buscar água. Desta vez, os homens do povo não vão. Isso colocava em risco as mulheres, elas poderiam ser raptadas pelo povo inimigo.

Era uma manhã quente. Saíram bem cedo, num grupo de cerca de vinte mulheres. Jaciara aprendia com as mais velhas sobre lendas e toda a sorte de assunto sobre mulheres.

Estavam todas rindo às margens do rio Santa Maria quando alguns da tribo inimiga chegaram. Homens e mulheres e entre eles um rosto conhecido por Jaciara, era ele.

Guaraci chegou e discretamente acenou para ela. A sua reação foi sorrir timidamente. Aquela manhã parecia mais tranquila do que o costume. As mulheres dos botocudos pareciam estar ali mais para se banhar do que coletar água. Jaciara comunicou suas companheiras de que iria ao campo coletar umas plantas – a região tem plantas com propriedades medicinais e, às vezes, algumas mulheres saíam para coletar muitas delas.

Nessa hora, Jaciara olhou em direção a Guaraci e acenou com a cabeça, indicando que estava se retirando a sós além de umas pequenas colinas, campo a dentro. Guaraci leu corretamente o gesto de sua amada e foi logo atrás para encontrá-la. Seria o primeiro encontro dos dois.

Ninguém dos temininós desconfiou da ausência de Guaraci. Estavam todos ocupados na retirada da água. Também estavam ali para coletar capim santo. A planta tem algumas propriedades medicinais, servindo como um bom antifúngico, anticoagulante e analgésico.

Pela primeira vez ficaram a sós. Jaciara parou de frente para Guaraci que caminhava depressa, cortando a vegetação rasteira com suas pisadas. Sorrisos se conectaram perfeitamente, criando uma atmosfera diferente e mexendo com o clima dos corações apaixonados.

Nas árvores, o som de muitos pássaros que alegremente cantavam a mais bela canção de amor para o jovem casal. Entre eles, a saíra-azul, a choca-listrada, o gaturamo, surucuás e sabiás. Todos, uníssonos, faziam uma bela canção.

À companhia das aves, estavam Guaraci e Jaciara, olhando um para o outro, estampando no rosto um belo sorriso. Os olhos de Jaciara brilhavam ao ver o seu amado. Guaraci se aproximou um pouco mais e estendeu a mão direita. Jaciara correspondeu.

– Qual o seu nome? – Perguntou Guaraci, sem saber se ela entendia a sua língua.

– Jaciara. – Respondeu timidamente, quase escondendo a última sílaba em seu sorriso.

Guaraci ficou espantado por ela saber a sua língua. Na verdade, os botocudos entendiam a língua dos tupis, devido ao contato que tiveram com outras tribos.

– Eu me chamo Guaraci. – Falou sorrindo, coração disparado. Há muito tempo queria ter tido essa conversa e agora estavam tendo o primeiro contato físico.

– Gua-ra-ci. – Jaciara repetiu pausadamente o seu nome, sorrindo e, sem entender, uma conexão muito forte havia entre eles.

Guaraci a abraçou e encostou o corpo de Jaciara junto ao seu. Sentiu o calor dos lábios da jovem de Cariacica. Um beijo doce capaz de arrebatar-lhes ao paraíso.

Enquanto se beijavam, não viram a hora passar. As mulheres dos botocudos já haviam coletado toda a água suficiente. Do lado dos temininós, todos já estavam prontos para voltar para a aldeia. Guaraci e Jaciara não apareciam.

– Onde será que está Jaciara? Ela demora tanto. – Indagou uma das mulheres.

– Acho melhor alguma de nós ir atrás dela por essa mata. Pode ser que ela se perdeu. – Idealizou outra delas.

– Isso, vá você mesmo Djukurnã.

Djukurnã entrou na mata rasteira rumo às pequenas colinas para saber do paradeiro de sua companheira. Ela não sabia que do outro lado estava Jaciara com o seu jovem Guaraci do povo inimigo.

Seria um absurdo se os dois fossem apanhados juntos. Quando Djukurnã apareceu nas campinas abertas, onde estava Jaciara, encontrou a jovem sozinha, caminhando com um sorriso no rosto. Guaraci já havia se retirado e pegado um caminho lateral que leva para o norte, além do rio.

Por pouco os dois não foram apanhados juntos, o que seria um grande problema para as tribos. Uma guerra estava prestes a ser declarada e esse romance proibido só traria problemas.

– Jaciara! Até que enfim! O que está fazendo aí?

Jaciara estava incapaz de pronunciar sequer uma palavra, com um sorriso estampado de ponta a ponta do seu belo rosto. Ela estava completamente diferente daquela menina que havia horas atrás deixado as mulheres às margens do rio.

Djukurnã perguntou novamente e, sem reposta, deu-lhe um cutucão no ombro.

– Hei! Estou falando com você! Me responde!

Jaciara, enfim, foi trazida de volta ao normal. E sorrindo como uma menina boba respondeu:

– Estou voltando pra aldeia e você?

Djukurnã fez sinal de desdém com a cabeça, pegando na mão esquerda de Jaciara e regressando pelo caminho rumo ao rio. “Ah, essas adolescentes...” – Pensou.  

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