Quando o sol surgiu, Bara observava o céu enquanto refletia sobre o sonho, ou seja lá o que for que tenha acontecido durante a noite. Ela arrumou-se para o dia que se iniciava e foi tomar o café da manhã, onde encontrou Jõo indo fazer o mesmo.
– Bom dia Rainha Jõo!
– Bom dia Bara.
– A senhora já está arrumada tão cedo? – perguntou Bara ao perceber as vestes de viagem da Rainha.
– Sim minha cara. – respondeu a Rainha – Assim que eu e meus aprendizes terminarmos o café, partiremos de volta para Kyuden. Teríamos partido ontem se não tivéssemos ficado tão cansados.
– Compreendo – Bara ria de leve – fico feliz de saber que aproveitaram bem a festa.
– Bom dia a todas! – cumprimentou Mahotsukai ao vê-las conversando.
– Bom dia papai!
– Bom dia majestade.
– Vocês... tiveram alguma discussão ontem quando juntos? – questionou Bara estranhando a resposta de Jõo, observando a ambos.
– Não minha filha. Eu e a Rainha Jõo não tivemos nenhuma discussão desde a chegada dela.
– Pelo menos até agora. – completou Jõo ironicamente e quase disfarçada.
– Mas isso é ótimo papai! – disse contente – E um bom começo também. Quem sabe isso não ajuda vocês a ficarem um pouco mais... próximos!
– Menina, não peça o impossível. A amizade entre nossos reinos já está de bom tamanho.
– Concordo. – completou Mahotsukai – Só com o milagre de você deixar de ser tão laica para sermos mais amigos.
Jõo começa a mudar de expressão e Bara interveio antes que começassem a discutir pra valer.
– Pode até ser... – Bara abraçava a ambos – mas ainda tenho esperanças para com vocês dois.
E seguiram todos para o desjejum.
Tomaram o café, Bara e seu pai acompanharam a Rainha Jõo e sua comitiva até a hora da partida (junto dos demais convidados que haviam ficado). Durante o almoço, Bara começou a falar com seu pai.
– Paizinho, posso lhe pedir um favor?
– Diga minha filha. – respondeu ele reconhecendo pelo jeito de Bara que ela lhe pediria algo no mínimo, complicado.
– Será que poderia reformar o teto de meu quarto na Torre Kendrada?
– Reformar o teto?!? – ele acertará em cheio.
– Sim papai. – Bara começava a temer um “não” como resposta.
– Claro, mas... porque? Surgiram goteiras ou coisa parecida?
– Não. É que, eu queria ser capaz de observar a lua sem ter que sair da minha cama. Independente de onde ela esteja no céu, só isso.
Ela bebia um gole de sua agua para disfarçar o leve temor. O rei começou a rir instantes após ela terminar de explicar.
– Ué? – ela não esperava aquela reação – Porque está rindo papai? O que foi que eu disse?
– Não minha filha, me desculpe. – ele recuperava a calma – É que você me fez lembrar de sua mãe.
– Da mamãe? – não era comum ele falar da mãe de Bara sem que ela o questionasse antes, e isso a surpreendeu.
– Sim! – Mahotsukai começou a se explicar – Quando Mahina era viva, amava observar a lua, quando era lua cheia então... Chegava a dormir nos telhados para se manter sob o luar.
– Sério?! – aquela era uma informação nova para Bara, nunca havia ouvido algo parecido, nem de sua ama.
– Oh... Se bem que era como um segredinho nosso. Nem quando estava esperando você ela deixava de fazer isso!
– Caramba... – Bara assimilava a nova informação e retomou o assunto após outro gole d’agua – Mas o senhor vai m****r fazer a reforma?
– Por favor! – disse ele chamando um dos criados que os serviam – Mande uma mensagem para os melhores pedreiros e vidraceiros do reino, para efetuarem a reforma que minha filha deseja. Se possível, vou querer que fique pronto em até uma semana.
– Sério papai! – exclamou Bara aliviada e feliz ao mesmo tempo.
– E porque não? Se você realmente tiver começando a puxar sua mãe neste assunto, quanto mais rápido melhor (vivia me preocupando com Mahina por causa disso).
– Obrigada papai! – ela o abraçava alegremente.
Em menos de três horas, as reformas do teto da Torre Kendrada tiveram início. Bara ficou no jardim à procura de lugar para dormir sobre o luar (como sua mãe provavelmente faria se não pudesse subir nos telhados) enquanto recordava do rapaz com quem “sonhara”.
– Bara, o que há com você? – Acnarepse estava junto de Bara.
– Como assim Ac?
– Ora como assim, toda vez que falo com você está distraída! E essa rosa, de onde ela surgiu?
Bara carregava a rosa que recebeu de Nemuru, observou-a e respirou fundo para explicar.
– Essa rosa, eu ganhei ontem como presente de aniversário...
– De quem se eu fiquei ao seu lado o tempo todo.
– Teve um momento em que fiquei sozinha Ac! E foi nesse momento que a ganhei.
– Tá! Vou fingir que acredito. Ao menos é uma bela rosa.
Houve um momento de silêncio entre elas que foi cortado pela Acnarepse.
– Então o motivo de sua distração é a pessoa que lhe deu a rosa?
– Talvez. – respondeu Bara tentando não prolongar o assunto (ainda).
– Você realmente pretende dormir no jardim hoje? – questionou Acnarepse mudando de assunto ao perceber as intenções de Bara.
– Se eu achar o lugar ideal...
– Ideal para quê?
– É que quero dormir hoje meio que da mesma forma que dormi ontem, e pra isso precisarei do lugar certo.
– Entendi.
Depois de umas duas horas mais ou menos, Bara ergueu acampamento entre a principal fonte do jardim e o labirinto de roseiras.
Bara esperou que Acnarepse pegasse no sono primeiro (já que ela recusou-se a deixá-la sozinha), tendo ocorrido, ela passou a admirar a lua cheia junto do camafeu igual à noite anterior, como Nemuru lhe pediu. Em pouco tempo Bara estava caminhando no mesmo jardim de antes, no seu sonho.
– Você veio. – disse Nemuru ao ver Bara aproximar-se.
– E porque não viria?! – respondeu ela sentando-se ao lado de Nemuru debaixo de uma cerejeira florida.
– Pensei que teria medo de voltar depois da forma com que a mandei ir embora.
– Pelo contrário, me deixou curiosa. E acho que já lhe mencionei que sempre cumpro minhas promessas.
– Sério?! – Bara acenou positivamente com a cabeça – Então sempre voltará quando quiser?
– Tenha certeza que sim. – respondeu ela confiantemente.
Nemuru sorriu feliz, houve uma pausa de silêncio entre os dois que foi quebrada por Bara perguntando:
– O que eram aquelas nuvens escuras que vimos ontem?
O sorriso de Nemuru sumiu.
– O aviso de uma péssima visita. – respondeu ele com o olhar distante e a voz seca.
– Péssima visita? Como assim? – Bara tentou ser cautelosa.
– Só lhe digo uma coisa, – Nemuru inclinou a cabeça para trás de olhos fechados e a voz triste – ...desde meus sete anos que recebo esta visita indesejada, e minha mãe sofre por conta dela. – ele voltou o rosto para Bara – Não queira conhecê-lo.
– Está bem. Não vou mais falar sobre isso já que o entristece tanto.
– Fico muito grato.
Os dois ficaram conversando sobre outras coisas, se conhecendo melhor. Nemuru tomava o cuidado de não revelar quem sua mãe era, mas não viu problema em deixá-la saber que era um nobre.
Tudo ia bem até ressurgirem as nuvens tempestuosas. Nemuru mandou Bara ir embora com um pouquinho mais de gentileza, porém com a mesma urgência e sem tirar os olhos das nuvens. Ao invés de ir como da outra vez, curiosa como era, Bara escondeu-se atrás de algumas cercas vivas a uma distância segura e ficou observando Nemuru.
De repente caiu um raio bem diante de Nemuru, a figura de um ancião apoiado numa espécie de cajado e vestes sinistras surgiu logo em seguida. Ela viu que conversavam algo que, de acordo com suas expressões, alegrava ao ancião e irritava o Nemuru. Do nada, sem ninguém tocar em ninguém, com o erguer de uma das mãos do ancião para Nemuru, uma espécie de energia começou a ser arrancada de Nemuru para o ancião. Em meio a uma expressão de dor, Nemuru caiu com tudo no chão ao ser libertado da drenagem, enquanto o ancião agora não parecia ter mais que uns vinte ou trinta anos de idade.
Nemuru estava quase inconsciente no chão. O ex-ancião aproximou-se dizendo-lhe algo ao ouvido e desaparecendo como uma duna de areia soprada pelo vento. Após tudo isso, o jardim começou a perder a cor, ficando tudo cinza, e a se desfazer da mesma forma que o feiticeiro.
Bara ficou tão surpresa, assustada e confusa com o que assistiu que, no primeiro impulso de querer ir embora, despertou.