Capítulo 5: A Fuga

A manhã seguinte ao desastre com Kael foi, sem dúvida, uma das piores na vida de Tobias desde a traição de Anny. Ele chegou à clínica com a aparência quebrado, os olhos fundos pela noite mal dormida, as roupas um pouco amarrotadas pela pressa de se vestir e sair do apartamento de Kael.

O brilho usual de sua persona pública estava apagado, substituído por uma aura de desespero e confusão. O consultório de Tobias, geralmente um santuário de ordem e perfeição asséptica, parecia alheio ao caos que fervilhava dentro dele.

Zenon, seu assistente por cinco anos, estava na recepção, organizando a agenda do dia com sua eficiência habitual.

Zenon era o oposto de Tobias em muitos aspectos: calmo, centrado, com uma força silenciosa que transparecia em sua postura ereta e olhar atento. Ele usava óculos que descansavam na ponta do nariz quando estava concentrado, e suas mãos fortes e ágeis se moviam com precisão.

Zenon era mais do que um assistente; ele era o braço direito de Tobias, o confidente relutante de seus dramas pessoais (embora nunca completamente a par do jogo da aliança), e a rocha que mantinha a clínica funcionando perfeitamente enquanto Tobias navegava por suas complicações.

Ao ver Tobias entrando naquele estado deplorável, Zenon ergueu uma sobrancelha, um sinal sutil de que havia notado algo muito errado.

Ele esperou pacientemente enquanto Tobias jogava a pasta sobre a mesa e afrouxava a gravata como se ela o estivesse sufocando.

"Bom dia, Dr. Tobias", Zenon saudou, a voz neutra, mas com uma pitada de observação. "Parece que a noite foi... agitada."

Tobias soltou um suspiro pesado e caiu na cadeira atrás de sua mesa, passando as mãos pelos cabelos. "Agitada é um eufemismo, Zenon. Foi um completo e absoluto desastre."

Zenon largou a prancheta e se aproximou da mesa, sua expressão mudando para uma preocupação contida. "O que aconteceu? Problemas com o paciente das nove?"

"Não, pior. Cem vezes pior. É sobre... é sobre ontem à noite. Depois que Niran me deixou." Tobias hesitou por um momento, a vergonha e a frustração pesando sobre ele. Mas ele confiava em Zenon, mesmo que seu assistente tivesse o hábito de zombar de suas desventuras amorosas. Ele precisava contar a alguém.

Ele narrou a história. Começou com o encontro com Kael no bar, descreveu a conversa fácil, a química inesperada, a noite que, por um breve período, pareceu prometer algo real. E então, com a voz embargada, chegou à parte da manhã: a aliança caindo do bolso, a reação furiosa de Kael, a acusação de ser casado, a história dolorosa sobre o pai de Kael e a amante, e a expulsão humilhante.

Enquanto Tobias falava, Zenon o ouvia com atenção, a princípio com a testa franzida em preocupação, mas à medida que a história da aliança perdida e encontrada se desenrolava, um canto de seus lábios começou a se erguer.

Quando Tobias terminou, a expressão de Zenon era uma mistura de pena genuína pelo sofrimento do amigo e um divertimento incontrolável.

Zenon riu. Não uma risada alta e debochada, mas um riso contido, que sacudia seus ombros.

"Ah, Tobi... Tobi... Eu te disse!", ele exclamou, ainda rindo suavemente. "Eu te disse que essa sua ideia brilhante de usar uma aliança falsa ia te causar problemas! Você brinca com fogo, fingindo ser algo que não é, e eventualmente, a farsa te alcança e te morde!"

Tobias franziu a testa, um misto de irritação pela zombaria e reconhecimento da verdade nas palavras de Zenon. "Não é engraçado, Zenon! Eu... eu realmente me importei com ele. Foi a primeira vez em muito tempo que senti alguma coisa."

"Eu sei, eu sei", Zenon disse, tentando reprimir o sorriso, embora uma leve diversão ainda brilhasse em seus olhos. "Mas o universo tem um senso de humor irônico, não tem? A única vez que você se permite sentir algo, sua própria armadura explode na sua cara." Ele suspirou, voltando à sua postura mais séria. "Ok, piadas à parte. Você está em apuros. O que você quer fazer?"

Tobias se inclinou para a frente, desesperado. "Eu preciso consertar isso, Zenon. Ele não me deixou explicar! Ele pensa que eu sou um mentiroso e um traidor. Mas eu realmente gosto dele!" A confissão saiu em um fôlego.

"Gosta mesmo? Mais do que apenas um 'encontro casual'?", Zenon perguntou, surpreso com a intensidade da confissão de Tobias.

"Muito mais", Tobias confirmou, sua voz sincera. "O que eu faço? Como faço ele me escutar?"

Zenon pensou por um momento, voltando para sua mesa e pegando um bloquinho de notas, como se estivesse anotando uma tarefa da clínica, mas pensando em um plano de guerra romântica. "Bem, a primeira impressão foi péssima. Ele te viu como o cara casado que trai.

Você precisa mudar essa imagem. E rápido." Ele rabiscou algo. "Você tem que mostrar que a aliança não significa o que ele pensa que significa. A forma mais drástica de fazer isso é... bem, fingir que você está se livrando do 'casamento'."

"Fingir que estou me divorciando?", Tobias perguntou, cético. "Não é apenas mais uma mentira em cima da outra?"

"Sim", Zenon respondeu com um encolher de ombros pragmático. "Mas é uma mentira que invalida a primeira. Ele te rejeitou por você ser casado. Se você 'está se divorciando', a objeção principal dele cai por terra, certo? É ilógico, sim, mas relacionamentos são ilógicos. E ele está machucado e confuso, não pensando claramente.

Uma prova 'visual' ou 'narrativa' pode funcionar." Ele rasgou a folha e entregou a Tobias. "Mande flores para ele. Muitas. E coloque um cartão simples. Tipo... 'A aliança não significa o que você pensa. Estou cuidando disso. Estou me divorciando. Por favor, me deixe explicar. Tobias.'"

Tobias pegou o papel, contemplando a sugestão.

Era audaciosa, arriscada, mas... fazia um certo sentido retorcido dentro da lógica do caos que ele mesmo havia criado. Era uma escalada da mentira, mas uma que poderia, talvez, reabrir a porta com Kael.

"Ok", Tobias concordou, sentindo um lampejo de esperança. "Flores e o cartão. Eu faço isso agora."

Pouco depois, um enorme arranjo de flores extravagantes estava a caminho do apartamento de Kael, acompanhado do cartão cuidadosamente escrito com a nova mentira.

Tobias passou o resto da manhã em um estado de nervosismo, atendendo pacientes mecanicamente, sua mente fixada na reação de Kael.

O telefone de Tobias tocou no meio da tarde. Ele olhou para o identificador de chamadas e seu coração parou. Era Kael. Pegou o telefone rapidamente, a mão tremendo.

"Kael? Você... você recebeu as flores?"

A voz de Kael do outro lado da linha era tensa, ainda guardando ressentimento, mas havia uma faísca de incerteza. "Recebi. 'Estou me divorciando'?", Kael repetiu, o tom cético. "Tobias, eu não sei se posso acreditar em você. Depois de ontem... A aliança... Foi demais pra mim."

"Kael, por favor, é a verdade... quer dizer, é complicado, mas estou resolvendo! Eu juro, não sou casado no sentido que você pensa! Aquela aliança era... é uma longa história, mas está no passado. Estou cuidando de tudo para ter um futuro... com você", Tobias falou apressadamente, misturando a nova mentira com um pouco da verdade sobre seus sentimentos por Kael.

Houve uma pausa no telefone. Tobias prendeu a respiração.

Finalmente, Kael falou, a voz um pouco mais baixa, mas ainda exigente. O trauma com o pai parecia ditar suas condições. "Ok. 'Está se divorciando', então. Preciso de prova, Tobias. Não posso simplesmente acreditar em você de novo. Não depois de ontem.

Se você está mesmo se divorciando, então... me faça conhecer seu ex-parceiro. Preciso ver que essa pessoa existe, que você está realmente 'cuidando disso'. Essa é a prova que eu preciso."

O sangue de Tobias gelou. Conhecer seu ex-parceiro? Mas ele não tinha um ex-parceiro no contexto da aliança falsa! A aliança era um escudo, não um vestígio de um relacionamento real que se desfez. A mentira, que ele pensou que o salvaria, havia acabado de se tornar infinitamente mais complicada. O pânico ameaçou dominá-lo.

Ele olhou instintivamente para Zenon, que estava em sua mesa, observando-o com uma expressão interrogativa. A aliança. O "casamento" falso. O "divórcio" fingido. O "ex-parceiro" que precisava ser apresentado. A única pessoa que sabia sobre a aliança falsa e estava ali...

"Tudo bem, Kael", Tobias ouviu a si mesmo dizer, a voz um pouco trêmula. A adrenalina e o desespero o impulsionaram. Ele não conseguia perder Kael. "Eu... eu te apresento meu ex. A gente combina."

"Vou esperar", Kael respondeu secamente, e desligou.

Tobias baixou o telefone, a mão ainda apertando o aparelho, o suor frio brotando em sua testa. Ele olhou para Zenon, que agora tinha uma expressão de total incompreensão misturada com alerta.

"Zenon...", Tobias começou, a implicância pendurada no ar entre eles.

Zenon o encarou, a expressão se tornando uma de pavor crescente à medida que ele percebia o que Tobias tinha acabado de concordar em fazer. Ele sabia sobre a aliança. Ele sabia sobre a mentira do casamento. A única forma de Tobias apresentar um "ex-parceiro" que se encaixasse naquela farsa...

A fuga de uma mentira levou Tobias a uma mentira ainda maior e muito mais perigosa. E a chave para essa nova farsa estava sentada a poucos metros dele, o assistente leal que, sem querer, estava prestes a ser arrastado para o centro do caos de Tobias.

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