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Me joguei no sofá, e liguei a TV pra ver se estava passando alguma coisa de bom. Nada tomou minha atenção, então decidi ir trocar de roupa. Não entendo o motivo de um uniforme. Eu preferia mil vezes minhas botas de cowboy e minha jardineira. Callen entrou na cozinha como um furacão para pegar batatas e refrigerante e depois olhou pra mim com aqueles olhos pedintes.

— Você pode me emprestar um dinheiro? — perguntou.

— Que educação a minha!! Olá maninha, como está? Como correu o dia? — ironizei.

— Desculpa — sorriu para mim — oi formiguinha, como foi o seu dia?

— Hugh, sabe que odeio que me chame assim — revirei os olhos — porque quer o dinheiro?

— Eu vi uma guitarra pela metade do preço, o resto da minha mesada não é o suficiente.

— E porque acha que eu tenho dinheiro? — cruzei os braços arqueando a sobrancelha.

— Fala sério, você é certinha demais, guarda seu dinheiro e nem usa — pegou as batatas no armário.

— Não estou precisando de nada — dei de ombros — não vou esbanjar dinheiro se não estou precisando.

— É por isso que eu te amo — me abraçou por trás — me empresta o dinheiro?

— Claro, pirralho — provoquei e ele engoliu a seco, mas eu bem sabia que ele queria revidar — vou depositar na sua conta — sai da cozinha.

Entrei na sala ao ver minha mãe preenchendo um papel usando seus óculos quadrados que eu tanto achava fofo em seu rosto. Minha mãe era uma mulher refinada, sempre usando o cabelo acastanhado e perfeitamente preso sem nenhum fio rebelde, seus lábios finos sempre carregados num batom vinho, seu nariz arrebitado e seus grandes olhos de mel.

Callen era a minha mãe só que numa versão masculina. Os dois bonitos e brilhantes. Já eu sai o meu pai só que numa versão um tanto ultrapassada. Assim como meu pai eu tinha cabelos lisos e castanhos, minha boca não era atrativa, meu nariz tinha um osso um tanto mais alto o que o tornava feio, e parecia que eu tinha olheiras sendo que eu sempre tinha uma boa noite de sono, e pra não falar das minhas sardas. Eu odeio sardas, tá, eu não odeio. Eu só não gosto porque estão no meu rosto. Digamos que não combina, mas eu tenho a certeza que que ficaria lindo numa atriz.

— O que tá fazendo mãe? — perguntei interessada na sua concentração.

— A lista de compras.

— Legal, eu quero ir com você — me animei logo.

No interior eu e minha mãe íamos juntas, era uma maneira de estarmos próximos, é como fazer compras no shopping, só que no mercado, e vamos comprar comida, não roupa.

— Na verdade, agora que estou voltando a empresa vou ter muito trabalho, então eu só estou adicionando coisas à lista, a governanta fará as compras, inclusive você tem que adicionar o que está precisando — falou minha mãe eu baixei a cabeça tentando esconder meu rosto entre meus cabelos — está tudo bem, filha?

Eu mordi o lábio segurando minhas lágrimas, não queria trazer minhas lágrimas à tona e preocupar a minha mãe. Não podia ser tão egoísta.

— Está sim mamãe — sorri forçado e me levantei num pulo — eu vou indo, tenho dever de casa e ainda quero estudar um pouco antes de dormir.

— Mas você não quer adicionar nada na lista? — perguntou franzindo o cenho.

— Não — subi as escadas apressada.

No final do corredor meu quarto me aguardava. Apenas me tranquei lá e procurei a minha vista, a que me acalmava. Eu olhei pela janela vendo o jardim verde e aparado, não era a visão que eu queria ter, não era nem o cheiro, tudo tinha cheiro a novo e fino, até as minhas calças cheiravam a lavanda, eu só queria poder ver lamas nas minhas botas e terra na minha roupa. Ouvi uma batida na porta e logo depois o corpo de modelo da minha mãe aparecendo na fresta da porta.

— Eu estava pensando que talvez pudéssemos fazer as compras desse mês só nós duas, o que acha? — sugeriu e eu alarguei um sorriso — te espero no carro — saiu logo entendendo minha animação.

Segui correndo até o carro preto, entrei no mesmo e mamãe pediu ao motorista que nós levasse ao mercado. Em minutos chegamos a um grande mercado e nós começamos pela primeiro corredor já pegando itens de limpeza.

— Pelo que diz no papel tá faltando aquele produto — apontou para o cimo da estante.

— Deixa comigo — peguei o produto me colocando na ponta dos pés.

Enquanto mamãe pegava tudo que estava na lista, eu decidi ir pegar doces na minha ala preferida, também peguei refrigerantes, salgadinhos tudo que uma adolescente normal come. Começo de aulas era a pior coisa, me fazia ficar ansiosa, aí que eu comia mesmo. Na hora de passar tudo no caixa, eu coloquei tudo em cima do caixa e minha mãe me olhou de soslaio como se não estivesse acreditando no tanto de calorias que eu ia comer.

— É para o começo de aulas — me justifiquei.

— Você já começou as aulas — me alembrou ao passar o cartão de crédito na máquina.

— Dizem que a primeira semana de aulas é a mais difícil — maneei a cabeça e ela suspirou.

Depois de colocar todas as nossas compras no carinho, guiamos até o carro onde o motorista colocou tudo no porta-malas. Durante a viagem de volta, pude abraçar a minha mãe, entendi que estava na hora de crescer. Eu não era uma criança mimada, tinha que entender os deveres dos meus pais. Eu podia lidar com umas horas a menos sem eles e uma escola com um bando de mauricinhos.

— Vou ficar bem — sussurrei para minha mãe e ela sorriu de lado orgulhosa.

Talvez eu estivesse apenas ampliando as coisas ruins e deixando as coisas boas passarem despercebidas, eu realmente não quero ser a deslocada.

Um recomeço, hum?!...

Bom... Amanhã seria um novo dia e talvez dessa vez eu conseguisse.

[...]

— Sua família está pronta para jantar! — a governanta veio me chamar.

— Às 07:00 da noite? — arregalei os olhos olhando para o meu relógio.

— Sim, senhorita — disse e logo depois saiu.

Desci as escadas apressadamente encontrando Callen a mãe e o pai, todos à mesa apenas me esperando.

— O que tá acontecendo? — perguntei não entendendo nada.

— Essa vai ser a nossa hora de jantar — avisou meu pai e eu sentei do lado da minha mãe.

Tudo parecia estar esquematizado, papai sentava na cadeira principal, na ponta da mesa retangular de vidro, a mãe se sentava na esquerda, eu do lado dela e Callen se sentava à direita do pai, parecíamos uma família de etiqueta.

— Mas eu nem estou com fome, acabei de lanchar — resmungou Callen.

— Então lanche mais cedo, vamos jantar em família nessa hora, e sem discussão — foi a vez de minha mãe falar.

Sentei da mesa fazendo careta para a refeição, o prato estava cheio de cores, mas o mais predominante era verde, cheio de ervilhas, brócolis, coisas gosmentas a qual eu me recusava a comer.

— Nem adianta fazer essa cara — avisou minha mãe que já estava de olho — de agora em diante você vai comer vegetais, nem que fique na mesa até amanhecer.

Fisguei o brócolis e coloquei boca a dentro, meu paladar implorava para que eu não o engolisse mas minha mãe me fitava com aqueles olhos como uma fera esperando pisar no limite da sua paciência. Eu mastiguei dolorosamente sentindo uma grande vontade de jogar tudo pra fora, mas eu bem sabia que eu não podia, então engoli aliviando minha mandíbula.

Uma garfada já foi, agora falta um prato inteiro por comer... É, a noite vai ser bem longa.

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