Por falta de roupa nova, passei o ferro na veia...

          Como cronista aprecio bastante o jogo de palavras, especialmente aqueles que contêm e instigam o bom humor.

          Aprendi até o momento – com pessoas mais sábias que eu – ao longo desta minha passagem neste Plano, que o humor é o tempero que dá vida à vida! Vida sem humor é como comida sem sal, é como sexo sem amor, é como a Primavera sem sabiá, como vida sem fé! É como um rio sem peixes, é como Inverno sem Ipê Roxo, é como um campo de girassóis sem um único girassol! Viver sem humor é como passar o tempo e pelo tempo, aqui no Planeta, vendo este tempo se acabar sem o encantamento do Amor...

          O humor nos apimenta e nos salga para que tenhamos gosto e sabor e, assim, possamos despertar no outro o interesse em degustar de nossa presença. Ele nos torna seres mais leves, mais alegres, mais felizes, mais cheios de graça, sim. O humor é uma sábia escolha para quem quer ser feliz e ajudar o outro a ser feliz também.  

          Num recente dia do passado, enquanto ouvia uma rádio de São João Del Rei, lá da região do Campo das Vertentes – MG, tocou uma música que me inspirou o título desta crônica. Autoria de Ivonildo do Nordeste, o qual eu não conhecia, pois não faz parte do meu gosto musical porque predomina em suas canções o tema sofrência, algo que respeito em quem gosta, mas que não pertence ao meu jeito de viver. Assim que começou a tocar, prestei atenção e me interessei pela letra e pela mensagem bem-humorada que ela transmitia.

          Ela comporta esse imenso e riquíssimo acervo da música regional brasileira. Compõe também a enciclopédia das músicas sertanejas de nosso interior nordestino.

          Interessante é que, tão logo comecei a ouvi-la, fui atraído pela duplicidade de sentido das palavras, fato que cria toda a especulação em torno da expressão “por falta de roupa nova, passei o ferro na veia”. Percebi isso tão logo entendi o contexto da frase em que ela se insere, o que, naturalmente me instigou a fazer esta crônica.

          Ora, caríssimos leitores, todos percebemos claramente a ambiguidade da frase-título. E se tivermos boa vontade e continuarmos ouvindo a música, fica ainda mais clara a intenção comunicativa inserida em sua mensagem.

          De fato, pode até ser que o sentimento pueril e, às vezes, piegas, que permeia as letras dessas canções não tenha tido uma segunda intenção, mas eu aproveito da nuance das palavras para me intrometer e aventar essa hipótese, o que tornaria mais interessante e atraente a música, sem dúvida alguma.

          Toda essa reflexão me remete às letras de grande parte dessas músicas brasileiras. Temos uma verdadeira colcha de retalhos de jogos de palavras, de traições escancaradas e lastimosas, de choro pela perda da mulher amada para o melhor amigo (sempre assim!), de flagrantes cheios de volúpia na cama do corno cantador, enfim, é de uma sofrência sem igual.

          Para que o nosso texto fique mais interessante ainda, transcrevo abaixo alguns versos de várias letras que, certamente, provocam em nós humor e chamam nossa atenção pela graça e ingenuidade típica da música sertaneja de nossa terra.

[...] “Quem tá com a roela do Eno

Quem tá com a roela do Eno

Quem tá com a roela do Eno

Não adianta disfarçar

Nem ficar escondendo” [...]

[...] “Porque a minha cunhada em rabada é muito boa

É muito boa, é muito boa.

Porque a minha cunhada em rabada é muito boa

Os vizinhos estão sabendo da fama que ela tem

Já estão de olho nela querendo comer também” [...]

[...] “Lá na rua onde eu moro, conheci uma vizinha

Separada do marido está morando sozinha

Além dela ser bonita é um poço de bondade

Vendo meu carro na chuva ofereceu sua garagem

Ela disse: ninguém usa desde que ele me deixou

Dentro da minha garagem teias de aranha juntou

Põe teu carro aqui dentro, senão vai enferrujar

A garagem é usada, mas teu carro vai gostar” [...]

          Peguei uma amostragem de três músicas apenas, ou seja, ative-me a trechos delas para lhes mostrar como o humor, a ironia e o conteúdo sempre picante que moram em suas mensagens subliminares e ambíguas criam toda a riqueza de suas letras. Tudo parte legítima de nossa brasilidade. Isso me encanta como poeta e prosador e como brasileiro que valoriza os costumes, tradições e a cultura de nossa terra, independentemente de qualquer coisa, desde que contenham um valor pátrio genuinamente intrínseco e perene.

          A propósito, de modo en passant e olhando do alto o comportamento do brasileiro frente a essa pandemia que nos acometeu e que ora – com a graça Divina e do Universo está,aos poucos, se acabando – podemos perceber como foi frequente a leveza com que boa parte de nós atravessamos esse longo e doloroso período da COVID – 19. Haja vista a quantidade de memes que circularam pelas redes sociais satirizando esse mal e o que ele estava provocando. Com todo o respeito aos que não concordam com minha forma de ver e de sentir essa situação, penso que há muito de sabedoria nessa atitude de nosso povo.

          Por essa e outras tantas razões tenho e sinto o mais profundo orgulho de nossa terra – Brasil!

          Gratidão a tudo e a todos; na casa da minha namorada Telma, às 10h42min de 16 de setembro de 2.010, recordista de temperaturas altas em toda a história desta linda Cidade Verde.

          E até outro dia em que “só o vento sabe a resposta...” do que pode acontecer após essa caloria, mas confiante em que uma ventania traga uma calmaria numa gostosa chuva que a tudo molharia...

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