Capítulo 1 – O Despertar da consciência

“Bem-aventurados os que guardam o juízo, que prática a justiça em todos os tempos.” Sl 106.3   

   As virtudes o atormentavam, não saberia concluir se o fardo que Cristo lhe proporcionou durante essa existência árdua, chamada de vida, teria um sentido a mais perante a razão que procurava loucamente em seus sonhos, em seu caminhar, em seu falar, possuía um destaque perante os outros homens, mas esse fator que o destacava se fosse verbalizada a outra pessoa, se pronunciada com convicção seriam delírios, no mínimo algum tipo de esquizofrenia, a época não era adequada às conclusões do que acreditava ser um d’Om E’spiritual que o todo poderoso concedeu-lhe, a questão que esse fardo excruciante o embaralhava, a mente perturbada, não gostaria de pensar em como explicar as alucinações que vivenciava.

***

Julho de 1982

Uma criança descobrindo um mundo restrito, em seu lazer no lar, desvendava novos lugares, sempre se questionou o que continha do outro lado da porta, seus pais categoricamente afirmavam  que era onde tudo aconteciam, é o mundo que o aguarda depois dessa porta, um mundo que devora todos os sonhos e esperança da juventude, um mundo ao qual a hipocrisia impera, um mundo onde vendemos o suor do nosso corpo em troca de capital, não era essas exatas palavras que os pais falavam para criança, resumia em coisas como, a rua, a cidade, outras casas, essa era a porta da frente de sua casa, poucas vezes a encontrava aberta, e das vezes que era aberta, não tinha a oportunidade de espreitar através dela, tampouco alcançar a janela, para descobrir o local onde residia.

Mas o instinto de aventura cada vez mais latente em seu ser, nas brincadeiras de infância, dizia ser um imperador, um líder, tinha um exercito em seu comando, ao menos os soldados eram invisíveis e imaginários, contentava-se com as cores que a televisão o oferecia, o breve conhecimento que os desenhos animados o proporcionavam em momentos de passividade de uma mente ativa por descobertas.

Samuel Carvalho, era uma criança ativa, inteligente, aprendia rápido, e tinha um conhecimento secular em tão poucos anos, aos quatros anos, pronunciavam palavras difíceis corretamente, e não existia mais um linguajar infantil similar aos demais de fala embolada e dócil, realmente os dias passavam, a curiosidade fomentava novos lugares a descobrir, filho único, na maioria das vezes solitário em suas brincadeiras, mas o imperador ou líder crescia a cada momento, a cada respirar que emitia.

Certa vez, encontrou um homem vestido de branco, de cabelos e barbas grisalhos, ao avistar tal pessoa sua mente formou um pensamento de ser alguém de extremo conhecimento.

- O que o senhor faz no sofá que assisto televisão. Indagou a inocente criança.

- O que faço todos os dias protejo você, seus pais, e aqueles que clamam ao meu favor. Respondeu o homem.

- O que é proteger? Inquieto insistiu em outra pergunta.

O diálogo não se prolongou, pois Samuel caiu em um sono profundo, no tapete da sala, o sonho o envolveu tão esbeltamente que dispensou comentários, realmente o sentido de proteção apareceu em seus sonhos, mas ele protegia outras crianças, crianças as quais ele desconhecia, mas se sentia responsável por elas. O pai o acorda levando para cama.

- Papai, cadê aquele homem que estava na sala?

- Que homem, samuca, o único homem dessa casa sou eu e você.

Realmente não se tratava de uma amizade imaginária, mas algo real, algo suficiente para dar forças para desbravar o mundo que seus pais decidiam esconder atrás daquela porta que não se abria.

Aquele homem que surgiu diante dos olhos da ingênua criatura, começou instigar a respeito do místico, do desconhecido, uma força começou a sussurrar ao seu ouvido, para os esclarecidos do cristianismo afirmava ser a voz do espirito santo ao ouvido daquela inocente criança, mas as questões que vinha na fase dos ‘porquês’ era respondida por essa voz misteriosa, que contava ao ouvido de Samuel coisas como sabedoria, fé, esperança, tentou mencionar aos seus pais que sempre ouvia uma voz de alguém explicando toda a situação a respeito de suas dúvidas, a psicologia dizia ser fantasias da idade, seus pais fielmente acreditaram, mas com o passar dos dias, seu conhecimento ficava mais denso, conseguia explicar com clareza a respeito da vida de Cristo, ou até assuntos escatológicos que perambula nas premeditações do fim da humanidade, realmente os seus pais admiravam aquele intelecto que estava se apresentado, mas ao mesmo tempo o assustava, incomodada a mãe decidiu chamar um pastor, que descaradamente o extorquiu em prol de um trabalho de intervenção, o único quem percebeu essa crueldade foi o menino, seus pais estavam sendo enganados, já possuía um senso de justiça em seu viés, triste com a situação, sentou no canto da parede com a cabeça entre as pernas e rompeu em lágrimas.

- Por que choras nobre criança? A voz questionou.

Não respondeu não em voz alta, sabia que conversar sozinho era uma espécie de loucura, canalizou suas energias e emitiu através dos pensamentos.

- Porque os homens são maus? Porque estou aqui preso? Não conheço o que tem depois dessa porta. Disse em pensamentos.

- Você pode atravessar aquela porta, sem necessitar abri-la.

- Como? Revolto e em prantos, gritou. A voz não respondeu mais.

Aquela ideia de se transportar sem abrir a porta o instigou como isso era possível. E a voz desapareceu por um bom tempo.

Ele já tinha se esquecido de que alguém há dias atrás lhe dizia ao seu ouvido, conhecimentos arcaicos a ciências ocultas, ele soube domar essa tempestade que começou a angustiar, o excesso de conhecimento, totalmente restrito no universo dos seus olhos.

Em uma ocasião a mãe preocupada com o menino, sentindo em seu semblante um peso de depressão. Disse:

- Filho, você pode brincar na porta da casa, o cercado da área irá proteger.

A palavra proteção o nocauteou com uma tontura, mas ao mesmo tempo um sorriso estonteante o envolveu, enfim ele poderia descobrir o desconhecido, o que ainda não foi revelado. A alegria o contagiou pegou dois carros de brinquedos e pediu para a mãe abrir a porta, ao abrir viu aquele céu límpido, azulado com nuvens nubladas, o sol, a grama, a rua, as casas dos vizinhos, tudo era tão novo para si, a primeira vez que ultrapassava a porta da sua casa, aquela sensação transbordou sua aura, emitindo um brilho que a mãe percebeu um brilho avermelhado com tons brancos, realmente, aquilo estava fazendo bem ao menino, só a mãe que não entendeu o que fazia a criança ter aquele brilho, conhecia superficialmente sobre aura, a luz que emanamos ao mundo, tão inédito para mãe e para o menino aquele momento, que com uma curiosidade que fazia ficar de boca aberta, observou por muito tempo o céu, o além chamava, começou correr, desbravar aquela área cercada de fronte a sua casa, a mãe observava atentamente, até que um vulto começou a envolver o menino. Preocupada disse:

- Filho está bom por hoje, vamos entrar.

Não fez menção de desobedecer, estava estarrecida com as projeções de clarividência que começou a ter, já o menino ampliou seus horizontes, os limites das paredes fora contemplado com a onipresença dos céus.

Aquela ideia ainda estava intacta como poderia atravessar aquela porta sem mesmo abrir, pensou muito a respeito, pensamentos ingênuos, um fluído metafísico o absorvia, questionava sua existência, se realmente a tudo e a todos que possam ter vidas, está vivo, já tinha visto em desenhos que fantasmas atravessam concreto, mas ele não era um fantasma o limite do seu corpo se esbarrava na parede, impedindo sua passagem.

Em determinada providência, como se a força do seu pensamento tivesse anunciado aquele momento, na oportunidade que sempre ansiava, a porta estava aberta, observou o lado de fora de outro ângulo, presenciava o fora e o dentro ao mesmo tempo, o interior lhe protegia, ele sentia receosamente que tinha que proteger demais pessoas, mas não tinha essas respostas, de forma involuntária encaminhou para o lado de fora, mas ao dar o primeiro passo para o lado de fora, percebeu uma imensa floresta, densa, um lugar que despertou um fascínio inarrável, esse novo lugar despertou todo o interesse de aventura, de descoberta, de horizontes as quais ele sabia que não encontraria no planeta Terra.

Ao atravessar totalmente a porta, um brilho incandesceu radiantemente e demonstrava um ser ainda frágil, nos primeiros anos da vida, com uma força que espantaria todos os mortais para quem pudesse observar tal efeito em um momento fora corpo, um envoltório espiritual, podia projetar qualquer imagem que observou em seus poucos dias de vida, todos os tipos de animais, lembrou certa vez de um pássaro que posou em sua janela, uma andorinha, que se pós a transformar-se e voar na imensidão da selva que desbravava insistentemente, o medo aterrador começou a dominar seus pensamentos.

- Quem é você, o que quer neste lugar?

Ouviu de alguma direção naquele local desconhecido, mas que se aventurava de uma forma que sempre aguardou, mas não poderia ter calculado o perigo deste mundo.

- Tem certeza que seu desejo é esse, se aventurar nesse mundo?

Voltou a assumir o envoltório espiritual de humano, parou diante um leito de um rio, viu seu reflexo através da água, com duas criaturas, duas sombras aproximaram dele, lhe paralisando, quando sacaram uma espada negra, tão escura quanto a sombra, iam desferir no garoto um golpe de arma branca, uma bola de energia verde, atingiu a espada do vulto, fazendo desaparecer a arma, os dois olharam para a origem do golpe, o menino que atravessou a porta se viu livre, sabia que era momentâneo, e começou a correr, indo de encontro, a outro garoto, pouco mais velho do que ele, dois anos, e de forma ríspida falou.

- Vamos correr, sair daqui, rápido venha.

Os dois começaram a correr desesperadamente.

- Para onde vamos? Perguntou Samuel.

- Ora essa você irá abrir o portal de novo, para sairmos daqui.

Portal, aquela palavra enraizou em sua consciência, fazendo despertar perante o universo.

Deveras real abrir o portal, parou por um instante segurando no braço do outro menino que o salvou momento antes.

- Como vou abrir o portal, onde está a porta? Replicou Samuel.

            - Você é a porta, certa vez o encontrei em minha casa no fundo dela, você ficou pouco tempo, enquanto tentava concentrar uma energia que se desenvolvia em minhas mãos, sabia que de certa forma nossa união despertava minha força, e quis mais do que nunca te encontrar novamente, mas não sabia aonde ir, até que dias depois, você aparece no meu campo de visão, começou caminhar para frente, até que você se transformou em um portal e atravessei esse lugar, ao ultrapassar, você parou por uns momentos, se transformando em um pássaro, sentia sua energia, e sentia que despertava as minhas também, o segui, até que lancei aquele golpe, faça do mesmo jeito que fiz, tente encontrar sua energia.

Realmente, ele precisava encontrar suas energias, mas como isso poderia acontecer ali parado, começou a solucionar a questão, se concentrando, sentia uma energia maléfica se aproximando a cada momento, talvez o medo vez ele despertar a porta que apareceu em sua frente, dando para dentro de sua casa, foi em direção a casa, o menino viu ele se transformando em um portal novamente, e atravessou.

***

Não gostaria de permear a experiência que sucedeu a ninguém, realmente se via extremamente conturbado com tudo que acontecia, sabia que tinha um propósito, sabia que tudo poderia ser transcendental nesse mundo de ocasiões que questionamos o sistema de forma complacente para saciar o desejo de busca que está em nossas entranhas a cada instante, saber de tudo o que queria, não era a questão, mas o motivo dos acontecimentos, essa inquisição aglomerava nos campos das ideias designando formas para possíveis conciliações com um local que tinha certeza que não era o planeta Terra.

Samuel Carvalho cresceu com fatos inexplicáveis, momentos depois de ter presenciado aquele local que fora transportado, uma dúvida insistente enraizava em seu viver, gostaria de ter uma explicação, mas sua pouca idade, não permitiu chegar à solução, sucessivo a esse caso, resolveu comunicar aos seus pais, que tinha ido parar em uma floresta, com seres diferentes ao planeta Terra, um local onde a ordem espiritual impera, não saberia informar se era pertinente insistir nisso que a doutora chamava de fantasia, os pais preocupados constantemente com o quadro do filho, que em certos momentos gritava.

- Por favor, senhor, preciso de respostas. Gritava ao léu repetida vezes, não tinha resposta de nenhum lado.

O pai começou a emitir um ódio ao tratar a criança, realmente ele possuía um intelecto invejável aos adultos, mas aquele indefeso ser, só tinha o seu lar e seus genitores para proteger, tinha esquecido se da proteção daquele homem que sorrateiramente apareceu em sua sala de estar, realmente se via responsável por proteger todos os homens, mas seu sofrimento abraçava ao mundo, rompia em lágrimas constantemente.

- Cadê você voz. Tentava e tentava e nada de ouvir a voz que o guiou por alguns momentos.

Os meses se passavam, a terapia com a psicóloga prosseguia, repetia a ideia de que aquele local que esteve, da voz que ouvia, eram coisas fantasiosas, não passava de um sonho que teve acordado, mas ele sabia que a ciência falava a respeito de delírios e alucinações e que muito provável já tinha um código internacional de doenças, nunca se interessou por qual numeração ele se encaixava, só queria desvendar aquele mistério.

Começou a estudar, não gostaria de mostrar todo conhecimento, pois sabia previamente que teria um tratamento especial, apenas ficava quieto em sua cadeira, vendo o explicar das aulas, respondia as atividades sem muito esforço intelectual e alguns momentos permitia errar, não eram essas respostas que ele estava atrás, no intervalo das aulas, ficava no parque do colégio, sentado no balanço, balançando de um lado para o outro, olhando para o céu, observando a intensidade e o calor que o Sol emite, das poucas certezas que tinha que aquele local não era comum em nenhum lugar do planeta Terra, o planeta em que a professora ensinou que um Ser Supremo criou, em seis dias, e descansou no sétimo, que éramos criaturas dessa superioridade toda.

Outra dúvida que o massacrava, foi aquele menino que apareceu naquele momento o salvando, se pudesse encontrar novamente, se encontraria perante o quê de racionalidade da vida, procurou em todas as salas da escola, em todos os rostos, mas nenhum era parecido com aquela criança que sabiamente soube solucionar como voltar suas origens.

Quisera que tudo pudera ser resolvido em um sonho, um sonho que não era alucinatório, começou a tomar uma medicação que deixava extremamente sonolento. Não possuía mais ânimo para viver, pensou em se matar, mas a tenra idade tinha o peso de um suicida que tenta desesperadamente ceifar a si próprio. Viu na televisão um homem que tinha se enforcado em casa, a ideia parecia tão simples, só precisaria de um momento de distração para executar o plano.

Realmente Samuel tem as características de um gênio precoce, mas não assume tal evidência.

Achou uma corda no porão de casa, e planejou tudo, a tarefa mais difícil era amarrar a corda nas madeiras que seguram as telhas, rapidamente resolveu subindo numa estante, segundo antes de pular com a corda amarrada no pescoço, eis que surge, aquele homem de cabelos e barbas brancas, mencionando.

- Não seja facilmente influenciado pela mídia.

- Quem é você, procurei por você desesperadamente, a solidão da minha dor o chamava, não ouvia mais seus ensinamentos, por que sumiu. Falou Samuel

- Você tomou outros rumos, acreditou que tudo seria explicado sem você batalhar pelo que deseja.

- Me explique o que aconteceu comigo, por favor. Clamou o menino.

Mais uma vez ele tinha desaparecido igualmente um vento que entra pela janela, bate no nosso rosto e continua seu trajeto, ao perceber não estava mais em cima da estante, mas sim no chão deitado, com as mãos e os pés amarrados e amordaçado.

Como posso me livrar dessas amarras, as cordas envolvia um terror que ele tentava neutralizar, mas a sensação de estar preso não atormentou tanto quanto a morte que planejava minutos antes, - Como me livrar? Pensou, esquecendo-se de tudo aquilo que buscava e só focando naquele instante de se libertar, quando o outro menino aparece rapidamente no porão.

- Toda vez que o encontro você está em perigo, do mesmo jeito que você se transforma em um portal, sua energia é capaz de livrar dessas amarras.

Duas visitas inesperadas em menos de dez minutos, o fez lembrar que tinha um propósito ainda desconhecido nesse mundo de meu Deus, a energia, aquele brilho o envolveu novamente, mas dessa vez ele percebeu, aquele envoltório cósmico o deixava mais forte, sentia isso em cada milímetro do seu corpo, rompeu as amarras das mãos e dos pés, como uma criança quebrava um palito, ficando parado refletindo em tudo, e a primeira conclusão que teve que era necessário purgar seus pensamentos, para despertar aquela força, ter uma alma límpida.

Realmente algo estava a ocorrer ele sentia com inquietude e passou a apreciar com paciência, realmente Deus que nos protege. Provavelmente aquele senhor que apareceu a ele duas vezes, era uma espécie de guia espiritual, ou ainda um ser evoluído que tinha como objetivo o guiar perante seus ideais, a latente dúvida sobre a razão da vida, mas do que nunca tomou forma, gostaria de explanar questões com que fizesse dele não um ser amorfo iguais aos demais, sentia plenamente um padrão atrás dos rostos das pessoas, os brinquedos não satisfazia mais sua diversão, divertia nas meditações do pensamento, nas nuanças que se formava, na apresentação e o no desencadear primordial de cada pensamento, realmente optou por preencher a lacuna do desaparecimento daquela voz, por ser algo que o guiou ainda que temporariamente de forma sábia, entendera que passava por um ritual de inicialização, alguma ordem celestial o aguardava isso que pensava essas conclusões que anotava em um caderno com o título “posteriori”, as artes permitiu vivificar o barulho da incompreensão que o causava, nas aulas do primário, se mostrava normal, mas percebeu que estava sendo um ator desempenhando uma função no quadro social, sua mãe a confidente de seus horrores perguntou à ela.

- Mãe o que você pensa a respeito dos artistas? Falou o filho.

- Os homens precisam das artes, esses são os seres mais próximos de Deus, que consegue captar uma raio fugaz da sociedade, retratando em uma música, uma pintura, um livro, um filme, isso abstraí o humano, criando uma rota de fuga aos tormentos, renovando seus ideias, formando valores.

A mãe de Samuel sabia mais do que nunca a cruz que Deus deu ao seu filho, mesmo ele sofrendo com toda a medicação, que não saberia dizer nem para quê funcionava, acreditava fielmente em seu filho, sabia que ele podia emitir um brilho estonteante, capaz de embriagar os padrões do homem, mas o silêncio da incompreensão a calava, sabia que a aquela época não tinha resposta a tudo, desde o ventre, sentia que aquele menino era especial, ele nasceu em uma manhã no mês de Maio de 1978, dois dias antes do seu nascimento, ela teve uma revelação que atribuía ao espírito santo, ao sair do banho, passou a mão sobre a barriga, o momento estava próximo, admirou as modificações do seu corpo, até que a lâmpada elétrica do banheiro explodiu, o escuro dispensou o instinto materno. Os acontecimentos a seguir ela escreveu, guardando no mais intimo dos lugares, na última página de uma bíblia da sua avó.

***

Relatos de Clarice Carvalho, Maio de 1978

Não sei por que raio estou relatando isso em um papel, mas vejo que foi a única formar de vomitar, ou pelo menos resguardar aquilo que pareceu um presságio divino, vivemos em uma sociedade preconceituosa, onde atributos fora do padrão, são perseguidos por todos, rotulando como loucos aqueles que não estão vibrando no eixo da realidade, não é minha pretensão descrever um tratado filosófico, sobre os tributos que homem tem por si para a justiça, mas é a justiça que está em questão, nisso que ouso desesperadamente de chamar a visão de Clarice.

Por volta das 18:40 saía do banho, quando admirava a barriga, o que estava dentro dela, o fruto de um amor puro e único, Magno Malta, foi tudo que sonhei, naqueles sonhos de uma adolescente que começa a desbravar pelas paixões, realmente ele soube me conquistar, tinha a palavra exata para que precisava e para que tinha que ouvir, era um misto, do meu eu projetado na figura de um homem, minha versão masculina, nos contemplávamos, tinha uma preferência em agradar os mais sortidos desejos, pensava em tudo que tínhamos vivido até o momento, tudo que construímos, minha mente vagava a respeito da dádiva que Deus concebia em nossas vidas, até que de forma divagada pensei no irmão do meu marido, tinha o matado a pouco tempo, o lincharam em praça pública após um inquérito social sobre magia negra, alguém saiu com o comentário que ele era uma capa preta, e neste momento a lâmpada do banheiro explodiu.

O que vem a seguir, não sei dizer se realmente estava acordada, mas o banheiro começou assumir um tom alaranjado, não havia mais banheiro, mas sim um mar de fogo, o fogo não me consumia, mas via uma pessoa sofrendo como que eternamente em meio as chamas, Júlio Malta, o irmão do meu marido, roguei pelo sofrimento dele ao senhor, quando fui novamente transportado, a uma cidade pós-apocalíptica, deserta, recoberta de escombros, quem sabe uma guerra teria acontecido, quando encontrei vagando por uma rua três jovens, dois rapazes e uma senhorita, um dos rapazes conheci, era forte, cabelos grandes, uma sobrancelha grossa, um olhar penetrante e uma força que só poderia ter saído das mãos do todos poderoso, veio ao meu encontro e disse.

- Não quis que o meu tormento fosse seu fim. E de forma tranquila beijou minha testa, fazendo justiça a uma maldição que sentira naquele instante que prevaleceria durante anos, quando seus lábios saíram da minha testa, mais uma vez estive em outro lugar, um lugar onde sentia a evolução de todos que ali habitavam uma evolução tão incrível que nenhum homem que conheci durante minha vida possuía, e neste local, vi meu cunhado sendo resgatado das chamas, ainda atordoado, com cicatrizes que diz restritamente a um viver da carne, não sei informar através do que vi, penso ter visto, se ele é culpado ou não pelas acusações de magia negra, nada tenho a declarar, mas uma Justiça divina se desdenhava naquele momento, e pude perceber que Deus protege a todos, mesmo em seu inferno ele nos resgata.

Acordo três dias depois, com um bebê ao lado, e o bebê era a forma infantil do rapaz que tinha presenciado naquele cenário de fim de mundo, por isso coloquei seu nome de Samuel que em hebraico Shemu’el significa seu nome é Deus, não que tenha dado a luz a um ser celestial tampouco que seria a imaculada que conceberia um novo messias, mas aquele campo vibracional tirou o tormento que junto ao meu amor passávamos, trouxe a calmaria, foi como ver uma flor no deserto.

***

A família retornava do litoral, todos haviam se divertido com a praia, com a multidão enlouquecida e enaltecida pelo verão, lugares novos iam ao encontro da criança, ao menos levavam a criança a lugares ao qual não conhecia pessoalmente, o carro estava devagar, quando Samuel avista entre a escuridão da floresta, um crocodilo e um homem em cima desse animal, poucos metros o separava, o carro em movimento fazia se aproximar cada vez mais, quando estão lado a lado, ele emite um campo cósmico tão irradiante de esplendor que faz com que o animal e vulto em cima dele se transformem em dois grandes olhos, quando de repente o veículo vira na estrada fazendo capotar, sua mãe sai pela janela e sua cabeça é imprensada com o teto externo do automóvel, morte instantânea, o pai fica levemente ferido, o filho não tem um arranhão, mas percebeu que o ser que era um porto em suas emoções, sua mãe que entendia todas suas loucuras, desvincula o espírito do corpo, e uma grande luz a absorve.

Duas vozes são escutadas pelo garoto.

A primeira dizia:

- Ainda iremos nos encontrar. Terrivelmente maléfica.

A segunda afirmava.

- Sua consciência está preste a ser despertada.

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