Capítulo 3

Nathália

Adoro usar saltos. Mas também adoro o momento de tirá-los quando chego em casa. Tenho o hábito de tirar os sapatos logo na entrada e de calçar meus chinelos macios antes mesmo de trocar de roupa.

Uma música baixinha tocava no som da sala, mas o ambiente estava na penumbra. Um cheiro delicioso de comida vinha da cozinha. Certamente Beatriz estava preparando alguma receita nova. Respirei fundo e olhei para a minha sala de estar. Eu tinha orgulho de cada pedacinho do meu apartamento. Ele foi decorado do jeitinho que sonhei. Ambiente aconchegante, com cores alegres e que ao mesmo tempo proporcionava um aconchego familiar.

Olhei para os sofás, um de três lugares e outro de dois. Quando os escolhi pensei em finalmente encher a casa de amigos para assistir filmes ou mesmo jogar conversa fora. Mas ainda não tinha cumprido essa promessa para mim mesma. O meu jeito workaholic de ser ainda não permitiu fazer as tão sonhadas reuniões nos fins de semana. Mas, pelo menos, eu teria Beatriz para me alegrar pelos próximos dias, mesmo que eu só pudesse aproveitar a sua companhia à noite.

Bia, como prefere ser chamada, é minha amiga de longa data, desde quando eu morava no interior. Sempre teve dotes culinários e conseguiu realizar o sonho de expandir a pequena pensão da sua família em um restaurante especializado em comida italiana. E todas as vezes que ela vinha para a cidade realizar algum curso fazia questão de hospedá-la em meu apartamento.

— Nath?! — Bia gritou da cozinha. — Cadê você, mulher? Vem aqui experimentar minha mais nova receita.

Tive que dar uma sonora gargalhada assim que entrei na cozinha. Ela estava toda paramentada com chapéu de mestre cuca e um avental. Uma luminária reforçava a iluminação e um tripé apoiava seu celular.

— Uau! Quer dizer que aqui virou um cenário de culinária? Gravou mais um vídeo para o seu canal do YouTube justamente aqui? Desse jeito a hospedagem vai ficar mais cara. — brinquei.

— É um pecado ter uma cozinha tão bem equipada e linda para esquentar congelados. — Bia deu uma rodadinha apontando para todos os cantos. — Deus castiga, sabia?

— E se os congelados forem essas delícias que você prepara? Meu pecado será amenizado? Vou para o purgatório em vez de ir direto para o inferno?

— Credo, Nathália! Aqui ninguém vai pra purgatório ou inferno. Você se lembra de um quadrinho que eu tinha no meu quarto com os dizeres “Meninas boas vão para o Céu e as más vão para onde quiserem.”.

— Eu me lembro! Você sempre curtiu essas coisas.

— Um dia eu vou comer algo preparado especialmente por você, Nath. Não desisti do meu plano ainda. Mas, justamente esse seu jeitinho me inspirou numa nova linha de receitas.

— Inspirada em mim?! Que honra!

— Exato. Apesar de achar um sacrilégio, esse seu jeito executiva e sem tempo me fez pensar em finalmente lançar uma linha de congelados. Vai se chamar Piccole Porzioni, que é a tradução de pequena porção em italiano. Porções individuais para solteiros que não tem tempo para cozinhar.

— Agora eu me senti representada! — Vibrei. — Parabéns. E cadê essa delícia?

— Experimente isso aqui.

Bia colocou uma pequena porção de nhoque a bolonhesa em um pratinho e, ao dar a primeira garfada, dei um gemido involuntário de prazer. A expressão dela era uma mistura de riso e deboche. Cruzou os braços sobre o peito, encostou-se na bancada e continuou me encarando.

— Por que você está me olhando com essa cara? — Perguntei ao mesmo tempo em que colocava outra generosa garfada na boca, soltando mais um gemido.

— Se você grunhir desse jeito quando finalmente conseguir transar com o Alex, ele vai te pedir em casamento no segundo seguinte. — Bia começou a fazer movimentos sensuais segurando a colher de pau e tive que rir. — Amiga, falando sério. Seu gemido foi tão sexual que desconfio que seus prazeres tenham sido apenas gastronômicos nos últimos tempos.

Puxei uma cadeira, larguei o corpo nela e apoiei o rosto em uma das mãos.

— Acho que o último cara que eu fiquei deve ter uns três meses. — confessei.

— Isso não faz bem pra saúde. — Ela gesticulava com a colher de pau e falava em tom de reprimenda. — Aprendi com um desses coaches que postam um bocado de vídeos na internet que devemos equilibrar todas as nossas partes da vida. E a sexual é uma delas, sabia? Você só pensa em trabalho.

— Olha quem fala. Você faz um curso atrás do outro.

— Faço mesmo. Mas já adicionei um dos alunos gatinhos nas redes sociais. Uma bundinha linda e uma tatuagem que pula das mangas da camisa apertada que usa. Já estou fazendo planos de checar até onde essa tatuagem vai.

— Você não tem jeito, Bia! — Joguei um pano de prato em cima dela. — Não perde tempo.

— Não perco mesmo. E você deveria fazer o mesmo. Um mulherão desses criando teia de aranha? E por vontade própria? Mas, agora me conte. Como pretende pegar o tal do Alex?

— Não sei ainda. Mas pode deixar que se isso acontecer saberá de todos os detalhes.

— Vamos corrigir isso agora, dona Nathália? Não gostei da parte do “se isso acontecer”. Vamos trocar por um “quando isso acontecer” agora mesmo.

— Que fogo, hein? Qual é mesmo o número dos bombeiros?

— Fogo?! Eu passei o último ano da sua faculdade ouvindo o quanto o cara era lindo, gostoso e rei da beleza que eu mereço, inclusive, ganhar um prêmio por melhor ouvinte na categoria “amores platônicos”.

— Eu vou ser a profissional exemplar de sempre durante uma semana. Mas, com o fim do trabalho, nada me impede de comemorar o sucesso do evento com ele.

— Agora minhas esperanças começaram a sair do CTI. Bom, com fome eu falo ainda mais besteiras do que o normal. Vamos jantar. — Ela desligou o fogo e começou a arrumar a pequena mesa da cozinha. — Ela fez aquela pose das mães italianas que falam gesticulando. — A senhorita vai agora tirar essa roupa de escritório e colocar uma roupa confortável. Vamos comer essa delícia e já deixei engatilhada a nova temporada de Outlander para assistirmos em seguida.

— Aquele ruivo maravilhoso? Sim, senhora, vou agora mesmo!

Levei um senhor tapa na bunda ao sair da cozinha e corri para o chuveiro. Ter a Bia em casa era certeza de diversão, boa comida e uma pitada de conversas picantes. A água escorrendo pelo corpo deu uma sensação gostosa de relaxamento. Foi um ótimo investimento o sabonete com óleos essenciais com lavanda aromática.

Antes de colocar o pijaminha confortável, olhei-me do espelho do quarto. Quando me senti feliz com o meu próprio corpo fiz questão de colocar um espelho de corpo inteiro. Foi um grande progresso para a minha autoestima. Antes eu mal conseguia me olhar naqueles espelhinhos de bolsa.

Não foi difícil me imaginar assim, nua, no mesmo quarto com o Alex. Eu tinha fantasiado aquilo durante muito tempo. A antiga Nathália nunca conseguiria. Não por ser excessivamente magra e sem jeito, mas por não confiar em si mesma.

A Bia estava certa. Eu estava negligenciando o meu lado mulher e focando muito no lado profissional. Desde que eu soube que seria promovida a diretora executiva, apesar de achar que seria o maior desafio profissional da minha vida, no fundo eu sabia que eu daria conta. Conheço aquela agência como se fosse minha. Essa mania de perfeccionismo às vezes me atrapalha. Eu realmente preciso aprender a relaxar mais.

O jantar com a Bia foi delicioso e divertido e com boas doses de Sam Heughan, o ator que interpreta o Jamie Fraser de Outlander.

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